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Querosene de aviação: conheça o combustível dos motores a reação

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Ao contrário do que ocorre com os motores a pistão, que são extremamente exigentes em termos de combustível, os motores a reação podem consumir, ao menos teoricamente, muitos tipos de combustível, desde gás natural até óleo diesel, incluindo óleos de origem vegetal ou até animal.
Abastecimento por pressão de uma aeronave com querosene de aviação
Logo após a Segunda Guerra Mundial, época de criação dos primeiros motores a reação, verificou-se que o melhor combustível para uso nos motores a reação aeronáuticos era o querosene. Esse tipo de combustível era utilizado em grande quantidade para iluminação e aquecimento nas casas do mundo todo, antes do advento da distribuição doméstica de energia elétrica, mas, pós isso, sua utilidade ficou bastante reduzida.

O que é o querosene, afinal? É um derivado do petróleo, composto de hidrocarbonetos com 8 a 16 átomos por molécula, ou seja, é um derivado um pouco mais denso e oleoso que a gasolina. Sendo bem menos volátil que a gasolina, e mais barato que esta, o querosene apresentou grandes vantagens para uso nos motores a reação, que consomem um volume consideravelmente maior de combustível que os motores a pistão.

O fato de ser menos volátil que a gasolina é uma grande vantagem em termos de segurança no manuseio. O querosene comum de aviação tem um ponto de fulgor entre 38ºC e 60ºC, ou seja, somente produz vapores inflamáveis a partir dessas temperaturas. Só para efeitos de comparação, a gasolina tem um ponto de fulgor de -42,8ºC, sendo, portanto, muito mais perigosa.
O querosene é um líquido cuja cor varia do incolor ao amarelo-palha, mais viscoso e mais denso que a gasolina. Não se mistura com a água, embora sua densidade permita que a água fique, eventualmente, em suspensão no combustível, decantando com maior dificuldade do que na gasolina. Não tem tendência a polimerizar, embora a oxidação de alguns de seus componentes tendam a criar uma espécie de goma em combustíveis envelhecidos.

Para uso em aviação, o querosene deve ser aditivado, para prevenir problemas como congelamento, corrosão química ou biológica dos reservatórios ou formação de goma. Os principais aditivos acrescentados ao querosene de aviação são: 
  • Antioxidantes: quando armazenado por longo tempo, alguns compostos do querosene oxidam e formam uma espécie de goma. Os aditivos antioxidantes retardam o tempo de oxidação do combustível e evita a formação de goma. São à base de alquilados fenóis;
  • Antiestáticos: a viscosidade do querosene faz com que o líquido em movimento crie eletricidade estática, que eventualmente pode produzir faíscas. O DINNSA, um arilo do ácido sulfônico, pode prevenir essa tendência;
  • Inibidores de corrosão: esses aditivos, como o DCI-4A, previnem corrosão no sistema de combustível e nos motores;
  • Biocidas: alguns tipos de bactérias e fungos prosperam e se alimentam de hidrocarbonetos, e podem criar extensas colônias nos tanques das aeronaves. Dois tipos de biocida são utilizados como  aditivos no querosene: Kathon FP 1,5 e o Biobor JF
  •  Inibidores de formação de gelo no combustível: a água decanta com dificuldade no querosene, ao contrário do que ocorre na gasolina. Então, simplesmente drenar os tanques não elimina a água contida no combustível, e nas baixas temperaturas, essa água, suspensa sob forma de gotículas, pode congelar e obstruir os filtros de combustível das aeronaves, resultando em falha do motor. Os aditivos anticongelantes previnem esse congelamento, sendo essenciais em aeronaves que não dispõem de sistema de aquecimento do combustível.
  • Desativadores de metal: são aditivos que removem traços de metais que interferem na estabilidade térmica do combustível.

Existem vários tipos de querosene, mas basicamente apenas três tipos são utilizados na aviação civil:
  • Jet-A: Esse tipo de querosene atualmente só é oferecido no mercado nos Estados Unidos e em alguns aeroportos canadenses, como Toronto e Vancouver;
  • Jet-A1: Diferindo do Jet-A principalmente pelo ponto de congelamento mais baixo, -47ºC ao invés de -40º do Jet-A, é o querosene mais utilizado no mundo, disponível em todos os países do mundo. No Brasil, o maior distribuidor desse combustível, a Petrobrás, denomina esse combustível de QAV1;
  • Jet-B: Querosene bem mais volátil e com ponto de congelamento bem mais baixo que os Jet-A e Jet A-1, é utilizado apenas em regiões extremamente frias, sendo comparável ao combustível militar JP-4, e muitas vezes confundido com este. É composto de hidrocarbonetos de 5 a 15 átomos de carbono por molécula, sendo na prática uma mistura de gasolina com querosene.
Na aviação militar dos Estados Unidos e da OTAN, existem vários tipos de querosene com especificação militar, denominados:
  • JP-1: querosene mineral praticamente sem aditivação, utilizado antigamente, mas obsoleto na atualidade;
  • JP-2: querosene obsoleto desenvolvido durante a Segunda Guerra Mundial;
  • JP-3: querosene obsoleto desenvolvido durante a Segunda Guerra Mundial;
  • JP-4: mistura de querosene com gasolina, em proporção 50%-50%, muito volátil e perigosa. Foi amplamente. e preferencialmente, utilizada em aeronaves militares americanas e da OTAN entre 1951 e 1995. É muito semelhante ao combustível civil Jet-B. Não está mais em uso;
  • JP-5: querosene pouco volátil utilizada em aeronaves embarcadas em navios-aeródromos, e semelhante ao combustível civil Jet-A;
  • JP-6: querosene pouco volátil utilizada apenas na aeronave North American XB-70 Valkyrie, e abandonado com o cancelamento do programa desse avião;
  • JP-7: querosene pouco volátil utilizado apenas nas aeronaves Lockheed SR-71 Blackbird e similares (A-12 e YF-12A). Era bastante viscoso e exigia aquecimento prévio em terra para a partida dos motores;
  •  JP-8: praticamente idêntico ao combustível civil Jet-A, o JP-8 substituiu o perigoso JP-4 nas forças aéreas dos EUA e da OTAN em 1996.
  • JP-9 e JP-10: querosenes com ponto de congelamento consideravelmente mais baixo que os querosenes normais. Apenas o JP-9 ainda permanece em uso;
  • JTPS: tipo de querosene com baixo ponto de congelamento desenvolvido especificamente para as aeronaves Lockheed U-2;
  • Zip Fuel: combustível de alta energia, contendo boranos, compostos orgânicos com boro. Foi projetado para aeronaves estratégicas de longo alcance durante a Guerra Fria, mas ficou obsoleto com o advento dos mísseis balísticos intercontinentais, que tornou as aeronaves de ultralongo alcance dispensáveis;
  • Syntroleum: combustível sintético, não derivado de petróleo, desenvolvido pela empresa Syntroleum Corporation especialmente para uso militar nos Estados Unidos. Esse combustível é produzido a partir de gás natural, carvão ou biomassa pelo processo Fischer-Tropsch. Está sendo certificado para uso em todas as aeronaves militares norte americanas.
A presença de água no querosene de aviação é um dos maiores problemas enfrentados pelos operadores de aeronaves a reação. A umidade do ar, condensada em baixas temperaturas, encontradas em grandes altitudes, se mistura sob a forma de gotículas ao querosene e se decanta com grande dificuldade. Eliminar totalmente a água do querosene é praticamente impossível, e o maior problema é essa água congelar e entupir os filtros. Embora a maioria das aeronaves comerciais modernas tenham trocadores de calor lubrificante-combustível, nem sempre esses sistemas conseguem evitar o congelamento da água e a falha dos motores que ocorre em consequência. Um grave acidente ocorreu com o voo British 038, em 17 de janeiro de 2008. O Boeing 777-200 G-YMMM passou, durante o voo, por uma área de temperaturas próximas de -70ºC, o que causou a formação de gelo dentro do combustível, acima da capacidade dos trocadores de calor fazerem o degelo. Os motores falharam durante a aproximação e a aeronave chocou-se com o solo no Aeroporto de Heahtrow, felizmente sem fatalidades, mas com perda total da aeronave.

O querosene de aviação simplesmente não funciona em motores de ciclo Otto. Para evitar o abastecimento indevido de motores a gasolina com querosene, o que é catastrófico, os bocais de abastecimento das aeronaves de motor a pistão não podem ter mais que 60 mm, o que não permite a introdução do equipamento de abastecimento usado nos jatos. Todavia, ainda ocorrem casos de abastecimento indevido de motores a pistão com querosene.

Embora o combustível de jato seja concebido para uso em motores a reação, diversos tipo de motor a pistão de ciclo diesel podem utilizá-lo, sem problemas. É uma alternativa interessante aos motores de ciclo Otto, que usam a cara, perigosa e altamente venenosa gasolina de aviação. e poderá ficar ainda mais interessante, se a gasolina com adição de chumbo for proibida por normas ambientais, o que parece muito perto de acontecer.

Atualmente, diversas pesquisas estão em desenvolvimento para a criação de combustível de motores a reação não derivados de petróleo, mas sim de biomassa, mas isso será objeto de um artigo específico, futuramente.

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