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Channel: Cultura Aeronáutica

Sobreviventes de desastres aéreos: escapando à morte por um triz

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A população em geral, aceita que o transporte aéreo é um dos mais seguros, mas, mesmo assim, tem medo dos aviões. As pessoas acreditam, ainda, que é difícil um avião se acidentar, mas se acidentar, a morte de todos a bordo é certeza.
Ilustração do desastre de Tenerife, em 1977 (Foto: NatGeo)
Isso não corresponde à realidade, já que grande parte dos passageiros e tripulantes sobrevive aos acidentes, muitas vezes totalmente ilesos. Muitos acidentes sequer têm vítimas fatais. Entretanto, em alguns casos, a sobrevivência pode ser considerada quase milagrosa, como veremos nos onze casos a seguir:

Robina Van Lanschot: O desastre de Tenerife, em 27 de março de 1977, foi o mais mortífero desastre aéreo da história, com 583 mortos em duas aeronaves, que se chocaram no solo. Um dos aviões envolvidos foi um Boeing 747-121 da Pan Am, com 396 passageiros e tripulantes a bordo (voo 1736), e o outro foi um Boeing 747-206B da KLM, que tinha 248 pessoas a bordo (voo 4805). 
Robina Van Lanschot e seu marido Paul, em março de 2017, 40 anos após o desastre de Tenerife
61 pessoas que estavam no avião da Pan Am sobreviveram, mas todos os ocupantes do Boeing 747 da KLM faleceram no acidente. O acidente ocorreu quando o avião da KLM decolou no meio do nevoeiro, sem saber que o avião da Pan Am ainda estava taxiando pela pista. 
A passagem de Robina no malfadado voo KLM 4805, que ela conserva até hoje
No entanto, o voo KLM 4805, quando saiu de Amsterdam, com destino final em Las Palmas, Canárias, tinha uma passageira a mais. Robina Van Lanschot, com 24 anos de idade, era essa passageira. O avião alternou Tenerife devido à explosão de uma bomba terrorista no Aeroporto de Las Palmas, mas Robina tinha um namorado, Paul Wessels, em Tenerife, e decidiu abandonar o voo ali mesmo, para se encontrar com ele, ainda que os funcionários da KLM insistissem que ela deveria reembarcar.
O PH-BUF, 747 que cumpria o voo KLM 4805, em 27 de março de 1977
Robina não embarcou, saiu do aeroporto e só ficou sabendo da tragédia que aconteceu algum tempo depois. Casou-se com o namorado, e o casal está junto até hoje. O amor salvou Robina da morte.

Ricardo Trajano: Em 11 de julho de 1973, Ricardo Trajano era um dos 117 passageiros a bordo do voo Varig 820, cumprido por um Boeing 707-345C, o PP-VJZ. Com 20 anos, estudava engenharia no Rio de Janeiro e guardou dinheiro para viajar a Londres, destino final do voo 820.
O PP-VJZ, aeronave acidentada no voo RG 820
O voo transcorreu na mais absoluta normalidade até poucos minutos antes do pouso no Aeroporto de Orly - Paris. Um incêndio no lavatório traseiro não pode ser controlado pelos comissários, e uma densa fumaça preta e tóxica se espalhou pela cabine.
O PP-VJZ pousou antes do aeroporto, mas foi totalmente destruído pelo fogo depois
Trajano estava na penúltima fileira, perto do incêndio, e prontamente se afastou de lá, indo para a seção dianteira da cabine. Não conseguia ver nada, mas sentiu o baque do pouso de emergência feito em uma lavoura, antes do aeroporto. Não conseguiu ver ou sentir mais nada a partir daí, e só foi acordar em um hospital em Paris 30 horas depois.

Ricardo Trajano mal sabia que ele era o único passageiro sobrevivente daquele trágico voo. Todos os outros passageiros morreram, assim como sete tripulantes que estavam na cabine. Dez tripulantes, que se refugiaram no cockpit, sobreviveram ao acidente, incluindo os pilotos.
Destroços do acidente do voo Varig 820
Trajano sofreu poucas queimaduras, mas sofreu lesões quase fatais nos pulmões, por conta da inalação de fumaça. Ficou 52 dias em um hospital na França e mais 29 em outro no Brasil, mas, graças à sua boa saúde, recuperou-se totalmente do acidente. Hoje, mora em Belo Horizonte, Minas Gerais.

Neuba Yessoh: Yessoh era um professor universitário da Universidade da Costa do Marfim quando embarcou no voo Varig 797, no Aeroporto Port Bouet, em Abdijan, na madrugada do dia 3 de janeiro de 1987. Seu destino era a cidade do Rio de Janeiro.

O voo RG797 estava sendo cumprido, naquele dia, pelo Boeing 707-379C PP-VJK. Seria o último voo da aeronave pela Varig, pois a empresa tinha vendido o avião para a Força Aérea Brasileira.
PP-VJK, acidentado no voo RG797, em 1987
20 minutos após a decolagem, um alarme de fogo no motor #1 coloca a tripulação em alerta. Embora houvesse indícios de que fosse um alarme falso, o comandante optou por voltar a Abdijan, mas a situação se deteriorou e o motor teve mesmo que ser cortado. Ao curvar para a esquerda, para pousar, no entanto, a tripulação acabou perdendo o controle do avião, que caiu numa área de floresta, inclinado a mais de 90 graus em relação à sua atitude normal de voo.

Os destroços se incendiaram, mas, apesar da violência do choque, vários passageiros sobreviveram. Entretanto, o fogo acabou matando quase todos. Yessoh estava quase ileso, e ainda conseguiu puxar o passageiro inglês Ahmad Wansa para longe dos destroços. Infelizmente, Wansa acabou morrendo três dias depois, quando era levado para um hospital na França.

Yessoh foi o único sobrevivente dos 51 ocupantes do voo 797. Ele faleceu em 4 de março de 2015, de um ataque cardíaco, aos 72 anos de idade.

Keiko Kawakami: Keiko Kawakami era uma adolescente de 12 anos quando embarcou no voo Japan Airlines 123 no Aeroporto de Haneda, em Tókyo, na tarde do dia 12 de agosto de 1985. Estava acompanhada dos seus pais e uma irmã.
O Boeing 747 JA-8119, acidentado no voo JAL 123, em 1985
O voo JAL123 tinha como destino o Aeroporto de Osaka. Era cumprido por um Boeing 747SR, versão doméstica da aeronave criada especificamente para operar voos de alta densidade de passageiros no Japão.

O voo estava praticamente lotado, com 509 passageiros e 15 tripulantes. No entanto, o avião sofreu uma descompressão explosiva 12 minutos após a decolagem, que acabou separando sua deriva e os lemes da fuselagem.
Não sobrou praticamente nada do voo JAL 123, mas 4 passageiros sobreviveram
A despeito de todos os esforços dos pilotos, que conseguiram manter o avião, ferido mortalmente, voando por mais de 30 minutos, o avião acabou se chocando com uma montanha. Milagrosamente, alguns passageiros sobreviveram. A demora no resgate fez com que muitos desses sobreviventes morressem, mas quatro passageiras, incluindo uma comissária da JAL, fora de serviço. Keiko Kawakami também foi uma dessas sobreviventes.
Resgate de Keiko Kawakami, encontrada viva, pendurada em uma árvore
Keiko foi localizada pendurada em um galho de árvore, mas, entre todas as sobreviventes, foi a que teve menos lesões. Todos os demais 520 ocupantes do avião morreram, no que foi o pior desastre aéreo da história envolvendo um único avião.
Keiko Kawakami no hospital
Keiko Kawakami recuperou-se totalmente das suas lesões e foi a primeira das quatro sobrevivente a ter alta do hospital.

Bahia Bakari: A francesa Bahia Bakari, então com 12 anos de idade, embarcou em Paris com a sua mãe, num voo cujo destino final, após escalas e uma uma conexão, eram as Ilhas Comores. Era o dia 30 de junho de 2009, e o voo era o Yemenia 626, cumprido por um Airbus A310.
Bahia Bakari no hospital
Durante a aproximação nas Comores,  a tripulação deixou o avião estolar, devido a uma desorientação espacial, e o avião mergulhou repentina e violentamente no Oceano Índico. Por incrível que possa parecer, Bakari foi ejetada da aeronave no momento do choque, caiu no oceano, ainda viva, mas com muitos ferimentos.
O Airbus A310 da Yemenia acidentado
A despeito de ser noite, e o mar estar agitado, Bakari ainda conseguiu se manter à tona. Não tinha um salva-vidas, mas agarrou-se a alguns destroços flutuantes, até ser resgatada pelos marinheiros de um navio, o Sima Com 2. Vou levada a um hospital local, mas, no dia seguinte, um jato Falcon do Governo da França a levou para Paris, onde ficou três semanas internada.

A sobrevivência de Bahia Bakari era altamente improvável, e foi considerada milagrosa por alguns. Ela escreveu um livro contando sua experiência posteriormente.

Juliane Koepcke: O voo Lansa 508, cumprido por um Lockheed L-188 Electra, decolou do Aeroporto Internacional Jorge Chavez, em Lima, Peru, pouco antes do meio-dia da véspera de Natal de 1971. Seu destino era o Aeroporto de Iquitos.
Electra da Lansa acidentado em 1971
Pouco mais de meia hora depois, voando a 21 mil pés de altitude, o avião passou por uma severa tempestade, e um raio atingiu um dos motores, causando uma falha estrutural que acabou separando a asa da fuselagem da aeronave.
Juliane Koepcke, um dia antes do acidente
O avião se desintegrou durante a queda, e uma das passageiras, ainda amarrada ao seu assento, caiu cerca de 10 mil pés abaixo, no meio da selva amazônica. Era Juliane Koepcke, de 17 anos, uma peruana descendente de alemães.

A despeito de ter quebrado uma vértebra cervical, e sofrido uma concussão, além de um profundo corte no braço e uma lesão ocular, Juliane conseguiu caminhar por dez dias na selva, até encontrar uma cabana de lenhadores, que a levaram, de canoa, à uma aldeia, de onde seguiu, de avião, para a cidade de Pucallpa, onde foi internada em um hospital.
Décadas depois, Juliane Koepcke visita os destroços do acidente
Juliane se recuperou totalmente, e foi a única sobrevivente do seu voo. Os demais 91 ocupantes do Electra, incluindo a sua mãe, não tiveram a mesma sorte e morreram no acidente.

Annette Herfkens: A holandesa Annete Herfkens nasceu em 1961, em Maracaibo, Venezuela. Ela trabalhava, em 1992, no Banco Santander, no setor de mercados emergentes, quando embarcou, no dia 14 de novembro, no voo 474 da Vietnan Airlines, na cidade de Ho-chi.Minh, com destino a Nha Trang.

O voo era cumprido por um avião Yakovlev Yak-40, de fabricação russa, que tinha a bordo 31 ocupantes, entre passageiros e tripulantes.
Yak 40 acidentado no voo 474
O tempo estava ruim durante todo o voo, afetado por uma tempestade tropical. A tripulação acabou conduzindo o voo abaixo do limite de segurança, e o avião acabou se chocando com uma montanha, num típico acidente do tipo CFIT - Controlled Flight Into Terrain.

Surpreendentemente, Annette Herfkens sobreviveu ao acidente. Os demais 30 ocupantes, incluindo seu noivo, morreram instantaneamente no momento do choque.
Herfkens ficou 8 dias no local, sobrevivendo apenas com a água da chuva, até ser resgatada. Acabou se recuperando totalmente. Hoje em dia, ela faz palestras motivacionais, não apenas em relação a acidentes aéreos, mas também em relação ao autismo, já que seu filho foi diagnosticado com a doença.

Vesna Vulovic: A comissária de voo sérvia Vesna Vulovic embarcou, no dia 26 de janeiro de 1972, no voo 367 da JAT Airways, empresa de bandeira da antiga Iugoslávia. O voo iria de Estocolmo, na Suécia, e tinha como destino Belgrado, com escalas em Copenhague e Zagreb. Vulovic assumiria seu lugar na tripulação em Copenhague, onde estava desde a manhã do dia anterior.
Destroços do acidente com o voo JAT 367
Vulovic não estava escalada originalmente para aquele voo, mas foi confundida com outra comissária com o nome Vesna. Apesar disso, gostou de ser escalada, pois nunca tinha ido para a Dinamarca, e gostaria de conhecer o país.

O voo decolou de Copenhague ás 15:15h, mas sofreu uma explosão em voo quando sobrevoava a aldeia de Srbská Kamenice, na Checoslováquia, às 16:01. Uma explosão devastou o compartimento de bagagem do avião, um McDonnell-Douglas DC-9. A aeronave se desintegrou no ar e Vulovic precipitou-se no ar, presa num pedaço de fuselagem por um trolle  de serviço de bordo. O acidente foi causado por uma bomba terrorista colocada no avião por um nacionalista bósnio.
DC-9 da JAT acidentado no voo 367
Essa parte do avião despencou por 33.330 pés e caiu sobre uma encosta arborizada e coberta de neve, o que amorteceu o impacto. Foi a maior queda sofrida por um sobrevivente humano sem paraquedas, segundo o Guinness Book, até hoje.
Vesna Vulovic, em 1971
Vesna foi avistada, por sorte, por um aldeão local, que ouviu seus gemidos no meio dos destroços. Foi salva, levada para Belgrado, mas sofreu ferimentos gravíssimos, incluindo quebra do quadril, de três vértebras e das duas pernas, mas acabou se recuperando, embora sobrassem algumas sequelas. Ficou meses hospitalizada.

Voltou a trabalhar na JAT, dessa vez no solo, mas depois foi demitida por ter protestado contra o governo iugoslavo.

Vesna Vulovic faleceu de causas naturais em 23 de dezembro de 2016, aos 66 anos de idade, em Belgrado.

Ruben Van Assouw: o garoto holandes Ruben Van Assouw, então com apenas 9 anos de idade, foi o único sobrevivente do voo Afriqiyah 771, acidentado em Trípoli, na Líbia, no dia 12 de maio de 2010.

Assouw viajava com seus pais e um irmão de Johannesburgo, na África do Sul, para Tripoli, na Líbia. A aeronave, um Airbus A330 fabricado em 2009, era praticamente nova. O avião chocou-se com o solo pouco antes de tocar na pista no Aeroporto de Tripoli, devido a erro do piloto, que estava voando abaixo do limite de segurança.
Ruben Van Assouw no hospital

Os socorristas chegaram ao local rapidamente, pois os destroços acabaram parando praticamente dentro da área do aeroporto. Assouw foi encontrado completamente sem roupas, ainda preso ao seu assento pelos cintos de segurança. Tinha lesões sérias nas pernas, mas seu estado geral era bom.
Destroços do acidente do voo 771: nada ficou intacto

Apesar das graves fraturas nas pernas, Ruben Van Assouw se recuperou totalmente e hoje mora na casa dos seus tios, na Holanda. Embora pretendesse voltar à Líbia, até hoje não conseguiu realizar seu desejo, já que a situação política naquele país tornou-se muito instável depois do seu acidente.

Cecelia Chichan: Cecelia Chichan tinha apenas 4 anos de idade quando embarcou no voo Northwest 255 no Aeroporto Metropolitano de Detroit, Michigan, na manhã do dia 16 de agosto de 1987. Estava acompanhada de de seus pais e de um irmão de 6 anos.

O voo 255 ia do Aeroporto MBS - Saginaw, Michigan, até Phoenix, Arizona, com escala em Detroit, onde a família Chichan embarcou. A aeronave era um McDonnell-Douglas MD-82.
Destroços do Northwest 255, em Detroit
Aparentemente, a tripulação não cumpriu corretamente os checks lists para a decolagem, que foi feita sem flaps e slats estendidos. A aeronave saiu da pista quase estolando e caiu logo após, cerca de 900 metros depois do final da pista, atravessando uma rua e se chocando com vários carros, antes de parar completamente.

Os destroços se incendiaram, mas os bombeiros conseguiram ver a pequena Cecelia Chichan ainda presa no seu assento, com os cintos. Não estava ilesa, mas foi resgatada e imediatamente mandada para um hospital. Os demais 154 passageiros e tripulantes do voo 255 morreram, incluindo os pais e o irmão de Cecelia, além de mais duas pessoas atingidas pela aeronave no chão.
Foto atual de Cecelia Chichan, hoje Crocker
Cecelia se recuperou totalmente, embora tenha ficado com cicatrizes da tragédia sofrida durante a infância. Se casou e usa agora o sobrenome de Crocker, e raramente fala da sua experiência, da qual diz não se lembrar mais.

Jonas Liasch Filho: Por ter envolvido o autor desse texto, que também sobreviveu a um grave acidente aeronáutico, vou me permitir falar na primeira pessoa.

Em 2001, comprei uma aeronave ultraleve básica, um avião Fox V-2, fabricado em 1987, que foi matriculado, por eu e meu sócio, Marco Antônio (Marquinho) Freire Gomes, como PU-TOM. Essa aeronave foi muito voada por nós e trouxe muitas alegrias. Ficava baseada no CAEP - Clube de Aviação Experimental do Paraná, em Ibiporã, na região metropolitana de Londrina.
Foto do Fox V-2 PU-TOM em abril de 2003, e seus dois sócios, eu e o Marquinho Gomes
Infelizmente, na tarde do dia 30 de abril de 2003, eu e meu sócio resolvemos abastecer a aeronave no vizinho Aeroporto 14Bis, no distrito da Warta, em Londrina. O voo até o Aeroporto 14Bis ocorreu sem incidentes, e a tarde estava magnífica.

Perto do por do sol, decolamos de volta para o CAEP. Ao atingir 700 pés de altura, meu sócio Marquinho, que estava no assento dianteiro e pilotava o avião, resolver fazer uma curva de 360 graus, para que pudéssemos admirar o magnífico por do sol que estava atrás de nós.

Durante a curva, no entanto, o entelamento da asa esquerda rasgou-se na costura e a maior parte dele se soltou, fazendo o avião despencar como uma pedra.  A perda de controle foi praticamente inevitável, mas Marquinho reduziu toda a potência, e o avião acabou se chocando contra uma grande árvore, bem na borda de um bosque.

O avião foi se despedaçando enquanto passava, na vertical, através da árvore, mas o cockpit acabou passando incólume e só parou quando, literalmente, encostou no chão, apenas empurrando delicadamente o tubo de pitot para dentro da carenagem.

Soltei os cintos de segurança e pulei para o chão, assim como o Marquinho. Estávamos ilesos, mas o avião ficou totalmente destroçado e com restos espalhados pela árvore, que também foi bastante destruída pelo acidente. Não acreditei que ainda estava vivo, assim como também nossos amigos do CAEP, que vieram resgatar os destroços.

A causa do acidente foi a deterioração da tela, que estava desbotada e bastante ruim, e que ia ser trocada assim que tivéssemos levantado recursos para tanto. Mas, deveríamos ter deixado de usar o avião enquanto isso, e acabamos por perdê-lo.

Os Douglas DC-6 na VASP: uma história de sucessos

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A aviação brasileira sofreu grandes transformações entre o final dos anos 1950, e o início da década de 1960. O Brasil vivia os "Anos Dourados", o Presidente Juscelino Kubitschek de Oliveira estava levando a cabo um ambicioso plano de crescimento econômico, cujo lema era "50 anos em 5", e o otimismo era reinante, ainda que a realidade não fosse tão "dourada" assim.
O PP-LFB, em 1973
Em 1957, o Lóide Aéreo Nacional, então uma das maiores empresas aéreas do país, encomendou quatro aeronaves Douglas DC-6C novas, aproveitando uma subvenção de incentivo de melhoria do equipamento do Governo Federal, recém aprovada. Nessa época, jatos comerciais ainda não estavam operando, e o DC-6, embora tivesse sido criado na década anterior, ainda estava em produção e  tinha excelente reputação e confiabilidade no mercado.

Em agosto de 1958, a Douglas entregou a primeira aeronave, que foi matriculada no RAB como PP-LFA. O problema é que o Lóide não sabia o que ia fazer com esses aviões. Muito grandes, pressurizados, e bem mais complexos que seu antecessor, o DC-4, o PP-LFA chegou e já ficou encostado, sem uso.
O PP-LFA, quando estava operando pela Panair do Brasil, 1960
O Lóide, nessa época, tinha um acordo operacional com a Panair do Brasil, e acabou arrendando toda a nova frota de Douglas DC-6 para a Panair. Em 9 de dezembro de 1958, o PP-LFA passou a operar para a Panair. A Panair precisava dos aviões, pois seus Lockheed Constellation já estavam velhos e cansados demais para cumprir voos internacionais. Alguns já passavam por um processo de desativação do seu sistema de pressurização, para que pudessem voar por algum tempo ainda, mas só em linhas domésticas. Os DC-6C, novos, foram ótimos substitutos.

Em novembro de 1958, chegou o PP-LFB, que foi arrendado para a Panair em 29 de dezembro do mesmo ano. Foi seguido pelo PP-LFD, que chegou em dezembro e foi arrendado à Panair no mesmo dia que o PP-LFB. O PP-LFC foi  entregue ao Lóide em 3 de fevereiro de 1959, e ficou poucos dias parado até ser arrendado à Panair,, em 10 de fevereiro.
Um Douglas DC-6C e um DC-7C, em Heathrow
Aparentemente, a designação DC-6C era informal, pois eram Douglas DC-6A na linha de produção. Os DC-6A eram aeronaves cargueiras, com uma grande porta  de carga na lateral traseira esquerda. Alguns nem tinham janelas, mas alguns dos últimos aviões fabricados tinham a útil capacidade de serem convertidos rapidamente em aeronaves de passageiros. Esse parece ter sido o caso dos aviões do Lóide. O PP-LFD foi o penúltimo Douglas DC-6 fabricado, e não o último, ao contrário do que afirmam algumas fontes. O último DC-6 fabricado foi o c/n 45564, um modelo DC-6B entregue à JAT da antiga Iugoslávia. mas o último avião do tipo a ser entregue parece ter sido mesmo o PP-LFC.
O PP-LFB, quando operava pela Panair do Brasl
De qualquer forma, todos os quatro Douglas DC-6C arrendados pela Panair foram usados como aeronaves exclusivas de passageiros, e atenderam às linhas internacionais da Panair, substituindo os Constellation mais surrados e complementando a frota de DC-7C da Panair. Até 1961, os DC-6C da Panair podiam ser vistos em Heathrow, Orly, Roma, Buenos Aires, Beirute e em outros destinos outrora servidos pelos veteranos Constellation.

A Panair, seguindo uma antiga tradição, batizou todos os quatro aviões com nome de bandeirantes: Assim, o PP-LFA foi batizado com o nome de "Bandeirante Bartolomeu Bueno de Siqueira", o PP-LFB de "Bandeirante Fernando de Camargo", o PP-LFC de "Bandeirante Francisco Dias de Ávila" e o PP-LFD de "Bandeirante Garcia de Ávila".

Em janeiro de 1961, a Panair devolveu dois DC-6, os PP-LFA e PP-LFC. Em março, devolveu os outros dois. O Lóide arrendou, então, três desses aviões para a Vasp, e usou, possivelmente, somente o PP-LFB nas suas próprias linhas.

Por essa época, no entanto, o Brasil já tinha deixado os "Anos Dourados" para trás, a situação econômica e política do país estava mais do que conturbada, e isso se refletia nas empresas aéreas. Em agosto de 1961, a Varig assumiu a REAL, e em janeiro de 1962, o Presidente do Lóide, Coronel Marcílio Gibson Jacques, vendeu a empresa para a Vasp, por 600 milhões de cruzeiros, com prazo de três anos para pagar. A compra foi vantajosa para a Vasp, que recuperou o investimento apenas com a venda dos imóveis adquiridos no pacote e, de quebra, passou a atender, ao todo, 72 destinos. A frota da empresa paulista foi acrescida de vários Curtiss C-46, oito Douglas DC-4 e dos quatro DC-6C.

Os Douglas DC-6C passaram, desde então, para a propriedade da Vasp. Foram batizados com os nomes de "Amazonas" (PP-LFA),  "São Paulo" (PP-LFB), "Rio Grande do Sul" (PP-LFC) e "Pernambuco" (PP-LFD).
O PP-LFD, quando operava pela VASP
 Embora seja difícil precisar, pela falta de documentação a respeito, parece que pelo menos três dos aviões continuaram a operar voos de passageiros, e o quarto, o PP-LFC, foi usado para transportar carga. Essa situação deve ter permanecido até a chegada dos primeiros Boeing 737-200 em abril de 1969. Entretanto, a Vasp foi obrigada a desativar todos os seus Viscount 701 também em 1969, e, pelo menos, o PP-LFB foi mantido como avião de passageiros para ajudar a suprir linhas que não podiam ser atendidas pelos novos jatos.
O PP-LFD da Vasp
Em uma época na qual praticamente não existiam as locadoras de carros, a Vasp oferecia uma promoção, na qual o passageiro viajava em dos aviões da empresa e seu carro era despachado para o mesmo destino, num dos DC-6C.

Em 1974, a Vasp já tinha uma frota considerável de Boeing737-200, e resolveu desativar seus aviões com motores a pistão, e mesmo os turboélices. Os Douglas DC-6C, ainda operacionais e em boas condições gerais, foram oferecidos no mercado de aeronaves usadas, e apenas o PP-LFB, ainda configurado com poltronas de passageiros, foi cedido ao Museu de Armas, Veículos e Máquinas, pertencente à família Matarazzo, em Bebedouro/SP. É provável que esse avião já estivesse paralisado em 1974, quando foi para o museu.
O PP-LFC da Vasp
Um dos DC-6C, o PP-LFC, foi vendido quase de imediato para a Atlas A/C Corporation, e foi para a América do Norte, onde voou por muito tempo na Trans-Air-Link. Os outros dois, PP-LFA e PP-LFD, amargaram três anos de pátio em Congonhas, até que, finalmente, foram vendidos, em 1977, para uma empresa boliviana, a La Cumbre, cujo principal negócio era transportar carne in natura da Província de Beni, na Amazônia boliviana, para La Paz.
O PP-LFA em Congonhas, parado, à espera de um comprador
Ao todo, a passagem dos Douglas DC-6C no Brasil foi muito feliz, nenhum acidente foi registrado com esses aviões durante os 16 anos em que operaram no Brasil. Mesmo depois que passaram para outros operadores no exterior, não há registro de acidentes com eles. No Brasil, permanece intacto, mas em sofríveis condições de conservação, o PP-LFB, no Museu de Bebedouro, atualmente administrado pelo município. Está completo, com motores, hélices, cockpit e interior de passageiros intactos, e perfeitamente restaurável. É visitável, é a maior, e, talvez, seja a aeronave mais atraente do Museu.
Nariz do PP-LFC da Vasp
Abaixo, segue a lista dos quatro aviões Douglas DC-6C operados pelo Lóide, Panair e Vasp durante o tempo em que estiveram no Brasil, e o seu destino final.

AERONAVES DOUGLAS DC-6C OPERADOS PELA VASP - VIAÇÃO AÉREA SÃO PAULO (1962-1974) E PANAIR DO BRASIL (1958 - 1961):

PP-LFA: Douglas DC-6A, c/n 45527, l/n 1017. Entregue novo ao Lóide Aéreo Nacional em 08/1958, e armazenado. Arrendado à Panair do Brasil em 09/12/1958, com a mesma matrícula, e devolvido em março de 1961. Arrendado à Vasp em 04/1961, comprado pela Vasp em 01/1962, e operado, tanto como aeronave de passageiros como cargueiro, até ser desativado em Congonhas, em 1974. Vendido em 1977 para a La Cumbre, da Bolívia, como CP-1283, e operado como cargueiro. Consta como armazenado no Aeroporto Internacional John F. Kennedy em La Paz, Bolívia (12/2017).
Restos do CP-1283, ex-PP-LFA da Vasp, ainda com o esquema básico de pintura da VASP
PP-LFB: Douglas DC-6A, c/n 45528, l/n 1027. Entregue novo ao Lóide Aéreo Nacional em 11/1958, e armazenado. Arrendado à Panair do Brasil, com a mesma matrícula, em 29/12/1958, e devolvido em março de 1961. Operado pelo Lóide, foi comprado pela Vasp em 01/1962, e operado como aeronave de passageiros, até ser desativado em Congonhas, em 1974.Foi doado ao Museu de Armas, Veículos e Máquinas de Bebedouro/SP, onde se encontra até hoje (2017), e nunca restaurado.
O PP-LFB encontra-se preservado em Bebedouro, com interior de passageiros e cockpit intactos
PP-LFC: Douglas DC-6A, c/n 45529, l/n 1036. Entregue novo ao Lóide Aéreo Nacional em 03/02/1959, e armazenado. Arrendado à Panair do Brasil, com a mesma matrícula, em 10/01/1959, e devolvido em janeiro de 1961. Arrendado à Vasp em 1961, e convertido em cargueiro. Comprado em 01/1962, e operado, como aeronave de carga, até ser desativado em Congonhas, em 1974. Vendido em 1974 para Atlas A/C Corporation, como N779TA, e operado como cargueiro. Operou pela Northern Air Cargo, no Alaska, com a mesma matrícula, e depois pela Everts Air Cargo, a partir de 2009. Possivelmente, está armazenado em Fairbanks, no Alaska, até hoje (12/2017).
O N779TA, ex-PT-LFC, no Alaska, em 2009.
PP-LFD: Douglas DC-6A, c/n 45530, l/n 1037. Entregue novo ao Lóide Aéreo Nacional em 12/1958, e armazenado. Arrendado à Panair do Brasil em 29/12/1958, com a mesma matrícula, e devolvido em janeiro de 1961. Arrendado à Vasp em 01/1961, comprado em 03/1962, e operado, tanto como aeronave de passageiros como cargueiro, até ser desativado em Congonhas, em 1974. Vendido em 1977 para a La Cumbre, da Bolívia, como CP-1282, e operado como cargueiro. Desativado em 1992. Consta como armazenado no Aeroporto Internacional John F. Kennedy em La Paz, Bolívia.
Restos do CP-1282, antigo PP-LFD da Vasp.

Os Airbus A300 da Vasp

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Os Airbus A300 foram os primeiros aviões wide-bodies bimotores, em 1972, um conceito até então desacreditado entre os fabricantes e operadores de aeronaves comerciais, mas que, hoje, tornou-se praticamente um padrão na aviação comercial.
O A300 voou pela primeira vez em 28 de outubro de 1972, e era uma aeronave de tecnologia e estrutura bastante convencionais, embora tivesse inovações, como o uso de composites na estrutura.

Alguns anos depois do início da sua operação comercial, com a Air France, em 1974, os A300 finalmente conseguiram grande aceitação no mercado, tendo como vantagens a facilidade de operar em pistas curtas e com grande capacidade de passageiros em voos de médio alcance, aliado a um baixo consumo de combustível.
O primeiro A300 da Vasp, logo após chegar em Congonhas
A primeira empresa a adquirir os A300 no Brasil foi a Cruzeiro, então subsidiária da Varig, que trouxe dois aviões A300-B4, os de maior capacidade de combustível e alcance então oferecidos pelo fabricante. Esses aviões foram encomendados em 1979, chegaram em junho de 1980, e foram certificados para operar das curtas pistas do Aeroporto de Congonhas, em São Paulo, onde sempre operaram sem maiores problemas.
O primeiro A300 da Vasp, em foto do fabricante, em Toulouse, França
Em 3 de outubro de 1980, a Vasp resolveu encomendar nada menos do que 12 aeronaves Airbus, sendo três A300-B4, e nove A310, aeronave semelhante, mas mais curta e de menor capacidade de passageiros.

Entretanto, as coisas não correram tão bem para a Vasp como tinha sido na Cruzeiro: na época, o DAC - Departamento de Aviação Civil tinha um representante na diretoria de cada companhia aérea, e intervinha fortemente em quaisquer planos das empresas. A compra dos aviões pela Vasp foi vetada, sendo autorizada apenas a compra de Airbus A300-B2, sem tanque central, de menor alcance e menor payload, então já reconhecida como obsoleta pelo próprio fabricante.
Primeiro comercial da Vasp do A300, com o gigante Epaminondas
Mesmo assim, a Vasp encomendou os aviões, e o primeiro deles, matriculado PP-SNL, chegou ao Aeroporto de Congonhas, sede da Vasp, no dia 5 de novembro de 1980, já ostentando um novo esquema de pintura especialmente desenhado para ele, rompendo com seu antigo esquema aplicado quase sem modificações desde os anos 60.

Esses aviões podiam transportar até 240 passageiros em duas classes, com assentos dispostos em configuração 2-4-2 na classe econômica. 26 dos assentos eram de classe executiva. Sendo aeronaves domésticas e wide-bodies, podiam transportar uma quantidade respeitável de carga nos porões, perto de 30 toneladas, além da bagagem dos passageiros.
Propagando enfatizando a capacidade de carga do A300
O interessante é que os A300-B2 da Vasp não tinham bagageiros acima dos assentos da fileira central, como os wide-bodies internacionais. Isso acabava dando uma noção de maior espaço interno ao avião.
Interior do A300 da Vasp (foto: Arthur Amaral)
Em termos de frota doméstica, a Vasp operava os maiores aviões exclusivamente domésticos na época, os Boeing 727-200, desde 1977. Os Airbus A300-B2 iriam complementar especialmente essa frota, com um aumento notável na capacidade de passageiros. Em 8 de novembro, chegava a Congonhas o segundo A300, matriculado PP-SNM.

A partir de Congonhas, a Vasp passou a usar os dois aviões em duas rotas, que começavam e terminavam em São Paulo: uma atendia Brasília e Manaus, e a outra atendia Rio-Galeão, Salvador, Recife, Fortaleza, Belém e Manaus.
O PP-SNL, primeiro A300 da Vasp
A Vasp ficou muito satisfeita com o avião, que tinha ótimo desempenho operacional e permitia aos passageiros fazer voos domésticos em aeronaves de padrão de voo internacional. Melhor ainda, podia operar em Congonhas. Aliás, também eram bastante silenciosos, principalmente em relação aos Boeing 727 e 737-200.
O PP-SNM em Guarulhos
Uma campanha publicitária interessante marcou o início da operação dos A300 da Vasp: foi criado um personagem, o gigante Epaminondas, uma figura amigável que, na foto do anúncio, segurava uma enorme maquete do A300.  Era uma referência ao grande tamanho e poderio da aeronave.
O PP-SNL no seu esquema de pintura original
A chegada de um terceiro avião, em 31 de janeiro de 1983, possibilitou também a operação da aeronave em alguns fretamentos internacionais, a despeito do pequeno alcance do avião, para destinos como Aruba e Orlando. O primeiro fretamento decolou no dia 18 de fevereiro de 1984.
Passageiros ao pé da escada de um A300, em 1985 (foto: Arthur Amaral)
Os voos de fretamentos eram demorados, pois demandava escalas em Brasília, Manaus, Aruba e Orlando, já que os A300-B2 não tinham tanque central. Ainda que tivessem, não poderiam decolar muito pesados de Congonhas.

Os A300 da Vasp também foram utilizados em algumas linhas internacionais na América Latina, especialmente Buenos Aires.
O PP-SNM em Hamburgo, 1995, fazendo um Check pesado
Os A300 da Vasp deixaram de operar em Congonhas a partir da inauguração do aeroporto de Guarulhos, em janeiro de 1985, e permaneceram como os maiores aviões da empresa até 1991, quando a empresa, já privatizada, adquiriu aeronaves McDonnell-Douglas DC-10-30 e, depois, MD-11. Entretanto, a carreira dos A300 na Vasp estava longe de terminar.
O PP-SNM taxiando, 2003
Os novos controladores da Vasp adquiriram, também, o controle acionário das empresas Lloyd Aéreo Boliviano e Ecuatoriana, e o A300 PP-SNN foi repassado ao Lloyd, entre 1º de junho de 1990 e 1º de junho de 1991, voltado à frota da Vasp. Essas empresas, e mais o TAN - Transportes Aéreos de Neuquén, constituíam o denominado Vasp Air System, que mais tarde foi desfeito.
O PP-SNN taxia numa tarde tempestuosa, no Aeroporto do Galeão
Em 2000, as finanças da Vasp estavam perigosamente decaindo, e todas as aeronaves grandes, como os MD-11, foram devolvidas. Os A300 voltaram ao seu reinado como maiores aeronaves da empresa, mas, em meados de 2001, o PP-SNL foi retirado da escala para fazer um Check D em Congonhas.
O PP-SNL abandonado durante um Check D que jamais foi concluído
Esse Check D jamais chegou a ser concluído, e o PP-SNL nunca mais voou. Em vez disso, a aeronave foi canibalizada, e suas peças em bom estado foram utilizadas para manter os outros dois aviões em condição de voo.
O PP-SNL foi desmontado nesse mesmo local
Em 2004, o PP-SNN, ao decolar de Recife para cumprir o voo VP4195, teve um motor destruído por uma explosão, e retornou monomotor para o aeroporto. Sem motores reservas disponíveis no momento, a Vasp paralisou o PP-SNM e retirou um dos seus motores, para "emprestar" ao PP-SNN e possibilitar o seu translado até Congonhas. O motor foi levado ao Recife por um Boeing 737-200 cargueiro, o PP-SMW. O translado foi feito com sucesso, e o motor foi devolvido ao PP-SNM. O motor foi substituído, mas a aeronave logo foi novamente paralisada, dessa vez para um Check C, que nunca chegou a ser realizado. O avião ficou paralisado em Congonhas até 2012, quando foi desmontado.
O PP-SNN abandonado em Congonhas, 2011
A Vasp foi proibida de voar, pelo DAC, em 26 de janeiro de 2005. Na ocasião, o PP-SNM encontrava-se no Aeroporto Internacional de São Paulo, em Guarulhos, paralisado depois de uma pequena pane de motor. Foi encostado em uma posição remota. Nunca mais voaria novamente.

O PP-SNN, paralisado em Congonhas, foi desmontado em 18 de abril de 2012, no decorrer de uma operação, autorizada pela justiça, para "limpar" os pátios e hangares da antiga Vasp, a pedido da Infraero. No dia seguinte, o PP-SNL seguiu o mesmo destino. Vários outros aviões Boeing 737 e 727 foram desmontados naqueles tristes dias.
O PP-SNM no cemitério de aviões em Guarulhos
O PP-SNM permaneceu em Guarulhos durante vários anos ainda. Foi leiloado por um preço bastante alto, e, ao que parece, a intenção do novo proprietário era recolocar a aeronave em condições de voo novamente, pelo menos para um voo de translado. Entretanto, várias peças do avião foram roubadas, e os planos do novo proprietário se viram frustrados. As peças roubadas, provavelmente, foram alimentar o crescente mercado negro de peças aeronáuticas.

Em 17 de fevereiro de 2016, durante a madrugada, a aeronave foi desmanchada rapidamente e, literalmente, desapareceu do "cemitério" do aeroporto, situado perto da cabeceira 27R. Como a aeronave, embora arrematada, não foi retirada dentro do prazo previsto, o administrador do aeroporto, a GRU Airport, alegando abandono, solicitou autorização da justiça para demolir o avião e limpar o pátio. Terminava assim, melancolicamente, a história dos Airbus A300 da Vasp, que operaram durante 22 anos de forma praticamente ininterrupta.

AERONAVES AIRBUS A300 OPERADOS PELA VASP (1982-2004):

PP-SNL: Airbus A300B2-203, s/n 202, primeiro voo em 28/06/1982, com matrícula francesa F-WZMJ. Entregue novo para a Vasp em 05/11/1982. Retirado de serviço para Check D em 2001, que nunca foi concluído. Aeronave canibalizada e abandonada após a paralisação da Vasp, em 26/01/2005. Desmontado em 19/04/2012 no Aeroporto de Congonhas/SP;

PP-SNM: Airbus A300B2-203, s/n 205, primeiro voo em 13/07/1982, com matrícula francesa F-WZMP. Entregue novo para a Vasp em 08/11/1982. Aeronave canibalizada e abandonada após a paralisação da Vasp, em 26/01/2005. Desmontado em 17/02/2016 no Aeroporto Internacional de Guarulhos/SP;

PP-SNN: Airbus A300B2-203, s/n 225, primeiro voo em 16/12/1982, com matrícula francesa F-WZMB. Entregue novo para a Vasp em 31/01/1983. Operado pelo Lloyd Aéreo Boliviano a partir de 01/06/1990, devolvido à Vasp em 01/06/1991. Retirado de serviço após incidente de explosão do motor em 2004, para reparos. Foi novamente retirado de serviço para fazer um Check C, que nunca foi concluído. Aeronave canibalizada e abandonada após a paralisação da Vasp, em 26/01/2005. Desmontado em 18/04/2012 no Aeroporto de Congonhas/SP.

Ciências Aeronáuticas: o curso superior na aviação

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No início da década de 1990, a aviação brasileira, livre de amarras como o tabelamento oficial de preços e a proibição de se dar descontos em passagens, ensaiava um crescimento. É claro que, para isso, mais tripulantes teriam que ser contratados.
Objetivo dos alunos de Ciências Aeronáuticas: voar um jato comercial
O problema é que, com a abertura do mercado, os custos em geral teriam que ser reduzidos, inclusive no que diz respeito à formação de tripulantes. Todavia, a realidade dos cursos de formação de pilotos era a mais precária possível, e alguma solução teria que ser adotada.

Até a década de 1990, seguir carreira na aviação, em geral, exigia uma escolha bastante difícil para o candidato a tripulante: ou ele fazia os cursos de aviação, em aeroclubes ou escolas de aviação civil homologadas, ou fazia um curso superior em alguma universidade ou faculdade.
A Embry-Riddle americana inspirou a criação dos cursos de ciências aeronáuticas no Brasil
Era difícil seguir carreira de piloto, e fazer curso superior ao mesmo tempo. O candidato a piloto fazia os cursos teóricos e práticos nas escolas e aeroclubes, e após concluir esses cursos, partia para uma carreira incerta na aviação geral até ter experiência suficiente para poder fazer um processo seletivo em uma companhia aérea. Voando na aviação geral, era difícil frequentar qualquer curso superior, especialmente naquela época, na qual a educação a distância era, ainda, incipiente.

Cursos técnicos de Piloto Privado, Piloto Comercial, Voo por Instrumentos, e Aeronaves Multimotoras, tinham a finalidade de, simplesmente, habilitar o aluno para tirar suas licenças e certificados legalmente exigidos pelo então Ministério da Aeronáutica, através do DAC - Departamento de Aviação Civil. Não tinham a finalidade de formar cultura aeronáutica, muito menos de nível superior, uma vez que eram apenas reconhecidos pelo DAC, e não pelo MEC - Ministério de Educação e Cultura
A Faculdade de Ciências Aeronáuticas da PUC/RS foi pioneira na criação dos cursos de Ciências Aeronáuticas
Paralelamente às necessidades das empresas aéreas, o nível de complexidade da aviação cresceu drasticamente, principalmente em nome da eficiência operacional e da segurança. Vislumbrava-se, assim, a necessidade de um curso superior voltado exclusivamente para a aviação civil.

Até então, a grande maioria dos pilotos das empresas aéreas não tinham qualquer tipo de curso superior, uma situação inusitada: milhões de passageiros viajavam em aeronaves comandadas por pilotos de nível médio de ensino, a despeito da enorme responsabilidade exigida pela profissão.

Isso começou a mudar, no Brasil, a partir de 1993, quando a Varig e a Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul uniram esforços para criar o então Instituto de Ciências Aeronáuticas, em Porto Alegre/RS. Como incentivo ao curso, a Varig dava, abertamente, preferência dos formados em Ciências Aeronáuticas na contratação de seus pilotos.

A Faculdade de Ciências Aeronáuticas da PUC/RS se inspirou na universidade aeronáutica americana Embry-Riddle, instituição de grande renome internacional nessa área.
Aula de navegação da UNOPAR, de Londrina/PR
Começou, então, uma mudança de cultura na aviação. Outras instituições de ensino superior, ainda na década de 1990, criaram seus cursos, como a Universidade Tuiuti do Paraná e a UNOPAR - Universidade Norte do Paraná.

Um dos problemas que os alunos enfrentavam era o alto custo da formação: o aluno era obrigado a concluir a formação prática de voo, em nível de Piloto Comercial/IFR, até o fim do curso, para obter seu diploma de Bacharel em Ciências Aeronáuticas.

No final do ano 2000, a UNOPAR rompeu esse esquema, ao permitir que o aluno fizesse o curso superior sem depender da conclusão da prática de voo e da obtenção de Licenças de piloto para obter o diploma, apesar da pressão do MEC em contrário. O curso da UNOPAR foi reconhecido em 2002 e a não exigência da formação prática foi mantida. Isso permitiu o ingresso de alunos sem condições de arcar com os altos custos e também de alunos que não podiam ou não queriam seguir, necessariamente, a carreira de piloto, preferindo funções em terra, como despachantes operacionais de voo e mecânicos de manutenção aeronáutica.
Evento promovido pela UNOPAR, em Londrina, com a presença da FAB e de companhias aéreas
Reconhecidos pelo MEC e pelo DAC, os cursos, após um período de certo descrédito entre os candidatos a tripulantes, obtiveram grande aceitação, e logo as empresas aéreas viram grande vantagem em admitir pilotos formados em Ciências Aeronáuticas. O grande valor desses cursos foi, finalmente, reconhecido pelo mercado.

O crescimento da aviação brasileira durante a década de 2000  obrigou à contratação de grande número de pilotos, mesmo que as então "três grandes" companhias aéreas da época, Varig, Vasp e Transbrasil, tenham encerrado suas atividades.  O nível de exigência de experiência mudou muito: em 2001, a Vasp, por exemplo, exigia experiência de, no mínimo, 2500 horas de voo, para admissão de copilotos, em início de carreira. Obviamente, essa exigência foi muito reduzida, mas, em contrapartida, as companhias passaram exigir maior nível de educação formal para a contratação.
Oficina experimental da UNOPAR
No ano de 2010, o grande auge das contratações de pilotos, as empresas estavam exigindo de 500 a 1000 horas de voo de experiência mínima para contratação, para quem não tivesse curso de ciências aeronáuticas, e de 250 a 500 horas de voo, para quem tivesse o diploma.

Os resultados dessa política foram muito positivos e logo se fizeram valer, e muitas empresas aéreas começaram a exigir que seus pilotos antigos também obtivessem curso superior. O resultado disso é que as salas de aula dos cursos de ciências aeronáuticas logo mesclavam alunos iniciantes com pilotos de companhias aéreas já bem experientes, e isso teve ganhos para todos. É bastante comum a presença de copilotos e comandantes de grandes empresas aéreas nas salas de aula, como alunos.
Projetos com a comunidade também fazem parte dos cursos
Hoje, embora a ANAC ainda não exija curso superior completo para a obtenção de qualquer licença de pilotagem, é praticamente impossível uma empresa aérea admitir pilotos sem nível superior, preferencialmente em Ciências Aeronáuticas.

A tendência natural é que a ANAC passe a exigir a conclusão de curso superior para a obtenção, pelo menos, das licenças de Piloto Comercial e Piloto de Linha Aérea. Não é questão de que se isso vai acontecer, mas sim, de quando vai acontecer.
Simulador de voo por instrumentos
Depois de alguns anos em crise e encolhimento do mercado, há claros sinais que essa tendência já se inverteu. A aviação comercial deve ter um crescimento considerável a partir de 2018, e ter um curso de Ciências Aeronáuticas significa ter uma vantagem considerável contra os concorrentes, mesmo que sejam muito experientes em termos de horas de voo.

A recente mudança na Regulamentação da Lei do Aeronauta, que reduz a carga de trabalho e aumenta o número de folgas, vai forçar em curto prazo a contratação de mais pilotos e comissários, e tal regulamentação já entrou em vigor. Com certeza, vai haver uma grande falta de pilotos qualificados no mercado.
A prática de voo é feita em escolas de aviação conveniadas (Aeroclube de Londrina)
Com a retomada da economia, e a nova regulamentação da profissão do aeronauta, que já está  em vigor, as empresas já esperam uma falta de pilotos capacitados para contratar. É uma tendência que deve durar alguns anos. Muitos pilotos que perderam seus postos durante a crise já não atendem os requisitos pedidos pelas empresas, mudaram de profissão, se aposentaram, ou morreram. Então, para quem almeja uma vaga, a chance é começar a estudar agora. Se esperar o mercado ficar em alta para começar a estudar, quem se antecipou vai estar sendo contratado, enquanto quem esperou chegar a alta do mercado ainda está se preparando, não está pronto.
As diversas palestras aproximam o aluno do universo da aviação civil
Alguns cursos, mesmo sem o nome de Ciências Aeronáuticas, têm o mesmo objetivo, como os cursos de Aviação Civil, ou Pilotagem Profissional de Aeronaves, por exemplo. Entretanto, existem os cursos em nível de bacharelado, com duração de três anos, e os cursos em nível de tecnólogo, com duração de dois anos. 

Permitindo-me falar em primeira pessoa, como professor do curso de Ciências Aeronáuticas da UNOPAR de Londrina/PR, e com quase 18 anos de experiência nesse curso, inclusive um período de quatro anos como Coordenador de Curso, posso afirmar que os cursos de bacharelado são mais vantajosos para quem ingressa no mercado. 

É uma opinião pessoal, mas se baseia na premissa de que uma carga horária 50 por cento maior que a dos cursos de tecnólogo se traduz em melhor qualidade e mais conhecimento agregado, além de possibilitar seguir uma carreira docente nos próprios cursos de Ciências Aeronáuticas, e com possibilidades de se obter diplomas em pós-graduação Stricto Sensu, Mestrado e Doutorado, não admissíveis para os diplomados como tecnólogos. Os cursos de tecnólogo são adequados, no entanto, em determinadas situações, como segundo curso superior para quem tem outra graduação, e para quem não tem tanto tempo para fazer um curso de bacharelado.

Hoje, as instituições que oferecem o curso de Ciências Aeronáuticas também oferecem cursos de pós-graduação, aperfeiçoando ainda mais a a formação dos tripulantes, em alto nível. Esses cursos são mais específicos, e são oferecidos para alunos formados em qualquer área, sendo uma excelente opção para quem deseja conhecer mais sobre a área de aviação e já tem diploma de curso superior.

Uma coisa, no entanto, é certa: Não existe mais futuro na aviação comercial para quem tem apenas o Ensino Médio completo, por mais experiência de voo que se tenha.


Como ser um comissário de voo?

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A profissão de comissário de voo foi criada em 1930, pela Boeing Air Transport, antecessora da United Airlines. As primeiras comissárias eram todas enfermeiras de profissão, e sua função inicial era atender passageiros que passavam mal a bordo, algo relativamente comum naqueles tempos, nos quais os aviões voavam baixo e em baixa velocidade, o que deixava o voo turbulento, causando enjoos nas pessoas a bordo.
As aeronaves evoluíram, naturalmente. Mas, até os anos 1950, a função de comissário era mais voltada para o conforto e ao atendimento ao passageiro do que para a segurança.

Isso tudo mudou quando a aviação comercial passou a voar com aeronaves a jato. Essas aeronaves eram muito mais rápidas e complexas que os aviões antigos, todas tinham fuselagens pressurizadas, e levavam muito mais passageiros.
Tudo isso fez mudar o foco da função do comissário: em vez de priorizar o atendimento e o conforto, a prioridade era a segurança de todos a bordo. De fato, a NASA americana fez um grande estudo a respeito da segurança de voo com a introdução dos jatos, e verificou que, em caso de acidentes, em quase 90 por cento dos casos, os passageiros sobreviviam aos choques. Todavia, fatores supervenientes aos choques, especialmente incêndios, podiam ceifar a vida de muitos a bordo, a não ser que fossem rapidamente retirados da aeronave. O tempo para isso era muito curto, variava entre 0 a 120 segundos. Baseado nesses estudos, a NASA estipulou um tempo médio de 90 segundos para que uma aeronave acidentada pudesse ser evacuada, após acontecer um acidente.
Comissários em treinamento no Aeroclube de Londrina, em 2017
É claro que, sem o auxílio dos comissários, tal requisito seria impossível de ser cumprido. Isso tornou a função essencial para a segurança na aviação comercial. Efetivamente, a experiência de quase 60 anos de operação dos jatos comerciais demonstrou que os comissários de voo salvaram 10 vezes mais vidas, do que todos os mortos em acidentes aéreos desde o início da aviação comercial até hoje.
Então, hoje em dia todas as aeronaves comerciais que levem acima de 19 passageiros devem ter comissários de bordo devidamente treinados para as atividades de segurança das pessoas a bordo, mas sem deixar de lado o trabalho de atender os passageiros em suas necessidades de conforto, e segurança durante o voo, mesmo que não ocorram acidentes.
A profissão, realmente, é atraente, embora não tenha todo o glamour que lhe é, frequentemente, atribuída. O trabalho é árduo, mas não é mal remunerado, na maioria dos casos. E, talvez, a função de comissário de voo seja a mais acessível a quem deseja ser um tripulante de aeronave comercial.

Como ser um comissário de voo? Em primeiro lugar, o candidato deve ter 18 anos de idade, no mínimo, e ensino médio completo. Embora pareça que as mulheres têm preferência, ambos os sexos tem chances iguais de contratação, na prática. Quanto antes se começa na profissão, melhor. As chances diminuem para candidatos mais velhos, acima dos 35 anos de idade, especialmente, mas várias empresas contratam comissários com mais de 40 anos. Não existe nenhuma restrição legal a respeito.
No Brasil, o candidato a comissário de voo deve ser aprovado em um curso certificado (homologado) pela ANAC - Agência Nacional de Aviação Civil, e depois aprovado em uma banca examinadora da Agência, para poder se candidatar a uma vaga em qualquer empresa aérea brasileira.

Os cursos certificados são oferecidos por muitas escolas de aviação civil, felizmente. O site da ANAC tem uma relação de todos os cursos certificados (https://sistemas.anac.gov.br/educator/Index2.aspx). O candidato deve procurar a escola que mais lhe convier, e fazer o curso, que tem a duração mínima de 138 horas-aula.
Qualquer candidato a tripulante deve, no entanto, fazer um exame de saúde para obter o CMA - Certificado Médico Aeronáutico, que, no caso do Comissário de Voo, é o CMA de Segunda Classe. Tal exame pode ser feito em Clínicas certificadas, ou em hospitais da Aeronáutica. As escolas de aviação civil homologadas podem indicar os locais mais convenientes para o candidato. Os requisitos médicos estão estabelecidos em lei, que no caso é o RBAC 67, cujo texto pode ser consultado na Internet, e cabe recurso em caso de eventual reprovação. Via de regra, candidatos com boa saúde geral não encontram dificuldades na obtenção do CMA.
Os candidatos não devem esperar um curso fácil: as escolas são avaliadas por índice de aprovação de candidatos nas bancas examinadoras, e podem perder a homologação em caso de muitas reprovações, então os cursos são exigentes e reprovam os candidatos que não atinjam notas mínimas (70 por cento em cada disciplina) ou frequência mínima (75 por cento de presença).

Os cursos abrangem, em geral, quatro blocos, ou grupos, principais de disciplinas, seguindo o Manual de Curso da ANAC: o primeiro grupo abrange as matérias de Emergências e Sobrevivência, o segunda grupo abrange as matérias de Legislação e Sistema de Aviação Civil, o terceiro grupo abrange as matérias relativas a Primeiros Socorros e Medicina de Aviação, e o quarto grupo abrange as matérias relativas aos conhecimentos gerais de aviação, como Conhecimentos Gerais de Aeronaves, Navegação Aérea e Meteorologia. Outras disciplinas complementares são oferecidas, algumas obrigatórias, e outras úteis, mas não exigidas pela legislação. Um treinamento prático de sobrevivência na selva e na água, e outro de combate ao fogo, são parte integrante dos cursos.
Na prática, os cursos homologados podem durar de 11 semanas a um ano, dependendo do número de aulas diárias e semanais, existindo cursos diários, noturnos, somente em finais de semana ou intensivos. Procure a escola que lhe oferecer o horário que mais lhe convier.
A obtenção de aprovação no curso homologado é obrigatória para o candidato fazer a próxima etapa, que é ser aprovado em uma banca examinadora da ANAC. Essas bancas são feitas nos escritórios da ANAC em várias capitais estaduais, e são marcadas via telefone ou pela internet. Há uma taxa de inscrição, que deve ser paga, via GRU - Guia de Recolhimento da União, antes de se marcar a inscrição.

A banca consiste em um teste de conhecimento online, de 80 questões, sendo 20 questões de cada grupo ou bloco de conhecimentos. O candidato deve acertar, pelo menos, 70 por cento das questões de cada bloco, para obter aprovação. Caso seja reprovado em apenas um grupo, e consiga acertar pelo menos 30 por cento das questões nesse grupo, pode fazer a prova de"segunda época", apenas nessa matéria, pagando apenas pela taxa de inscrição desse grupo. Se for reprovado de novo, deve passar por novo exame completo para ser aprovado.
Uma vez aprovado na banca, e de posse de um CMA, que vale por cinco anos, inicialmente, o candidato pode procurar diretamente por uma empresa aérea, e mandar seu currículo. É comum o envio de currículos online, não apenas para as empresas aéreas, mas para sites especializados, largamente utilizados pelas empresas aéreas para contratação.

Não se deve desanimar nessa fase de envio de currículos. O candidato deve insistir, não desanimando pela falta de resposta. Os que insistem é que acabam sendo contratados. Ao contrário do que se pensa, a contratação de comissários é contínua, pois a demanda é grande e existe uma certa rotatividade na profissão, maior do que a da profissão de piloto.

Uma vez convocado para um processo seletivo, o candidato a comissário será examinado segundo os critérios exigidos por cada companhia aérea, segundo seus próprios padrões. Compareça aos processos de seleção rigorosamente no horário estabelecido, bem vestido, cabelos e unhas aparados, mulheres maquiadas discretamente, e sem acessórios grandes ou espalhafatosos.
Uma vez selecionado, o candidato a comissário terá que passar pelos cursos estabelecidos pela empresa aérea, sendo o principal o de habilitação do candidato no equipamento (avião) no qual irá tripular, exigido pela ANAC, de, no mínimo, 27 horas de duração. Esse curso exige dedicação e estudo, e é eliminatório, se o candidato não passar, pode começar tudo de novo, pois estará excluído do processo seletivo.
Depois do curso de habilitação, que inclui parte do treinamento em voo, o candidato obtém, depois do voo de check, seu certificado de habilitação técnica, o CHT, que o habilita a tripular a aeronave na qual foi treinado e habilitado. Aí começa, realmente, a vida profissional do comissário de voo.

Existem os programas de crescimento na carreira, por tempo de empresa, desempenho ou por promoção ao voo internacional, ou a chefe de equipe.




A profissão de comissário pode ser muito interessante para quem almeja ser piloto na empresa onde trabalha. A maioria das empresas aéreas faz processos seletivos internos, e isso pode ser muito vantajoso. Muitos candidatos a piloto começam a vida na empresa como comissários.

Entre os fatores que melhoram as chances do candidato ser contratado, podemos enumerar vários, mas ter conhecimento de um segundo idioma, especialmente o Inglês, é essencial. O conhecimento de outros idiomas também é bom, especialmente quando se considera que  mesmo os tripulantes iniciantes, no Brasil, podem voar por aeroportos da América Latina, onde se fala, predominantemente, o Espanhol.

É aconselhável que o candidato mantenha um perfil nas redes sociais, que são pesquisados pelas empresas contratantes. Manter-se longe das redes sociais pode ser ruim, tanto quanto manter perfis negativos nas redes. Aparecer no Facebook ou no Instagram em baladas, se entupindo de bebidas alcoólicas ou fazendo comentários inconvenientes, discriminatórios, fofoqueiros ou mesmo políticos pode ser o caminho mais certo para procurar outras profissões. É melhor ter um perfil social familiar, cultural, discreto e elegante. Perfis sociais muito restritos e não acessíveis são desaconselhados, pois a profissão exige um bom grau de interação social do candidato.



Muitas empresas aéreas internacionais fazem processos seletivos no Brasil, como a Qatar e a Emirates. Esses processos seletivos não exigem que o candidato tenha feito bancas da ANAC, mas é aconselhável que o candidato tenha feito, pelo menos, um curso de comissário. Em qualquer caso, para participar com chances a uma vaga dessas, o candidato deve ser fluente em Inglês, no mínimo, e ter pelo menos 21 anos de idade.


O candidato à profissão de Comissário de Voo deve ter em mente que tal profissão, embora seja atraente, tem os seus inconvenientes. Quem tem vida mais independente e gosta de viajar, vai se dar muito bem, mas pessoas mais apegadas à família e ao lugar onde moram podem ter mais dificuldades em se adaptar. Manter a vida familiar, especialmente para quem é casado ou tem filhos, pode ser difícil. Em muitos casos a carreira de comissário de voo termina com um casamento, ou com o nascimento de um filho. Também existem os casos nos quais a profissão acaba encerrando muitos relacionamentos ou mesmo casamentos.
Por fim, eis alguns conselhos úteis para quem quer seguir a profissão de comissário de voo:
  • Seja organizado com  seus horários, suas contas e  seus compromissos;
  • Esteja sempre disposto a aprender e a estudar. A vida de qualquer tripulante de avião é estudar, pois a aviação evolui sempre;
  • Tome muito cuidado com a saúde, afaste-se de drogas, mesmo as  de uso legal, e do excessivo consumo de álcool e tabaco, pois isso pode encurtar a sua carreira na aviação;
  • Evite o uso de tatuagens em excesso ou em locais muito visíveis do corpo, ou o uso de piercings ou acessórios ostensivos ou espalhafatosos. Mantenha sempre boa aparência pessoal, e cuidados com a pele, cabelos, dentes e unhas;
  • Jamais critique as empresas onde trabalha  ou estuda em público, especialmente nas redes sociais, sempre discuta isso apenas com seu empregador.
O blog Cultura Aeronáutica deseja sorte a todos os leitores desse artigo na busca da sua profissão!

Os Douglas DC-8 da Panair do Brasil e da Varig

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Os Douglas DC-8 e os Boeing 707 foram os primeiros jatos comerciais de grande sucesso. Embora tenham sido precedidos por outros jatos, como os DeHavilland Comet britânicos e os Tupolev Tu-104 soviéticos, foram os dois jatos americanos que efetivamente colocaram o mundo na era do jato.
O PP-PDT, em Orly-Paris, junho de 1962
A Pan Am foi a cliente lançadora dos Boeing 707 e  a primeira empresa a encomendar o Douglas DC-8. A Panair do Brasil, que nasceu como subsidiária da Pan Am, escolheu o Douglas DC-8 como seu primeiro jato comercial, que deveria substituir os Douglas DC-7C que faziam suas rotas internacionais mais longas, que alcançavam, na época, até o Oriente Médio.
O PP-PDS no ano em que chegou, 1961
De fato, a Panair comprou dois aviões que originalmente tinham sido encomendados pela Pan Am. Eram dois DC-8-33, o primeiro dos quais foi entregue em 02 de março de 1961, e matriculado no RAB como PP-PDS. Essa aeronave logo foi seguida por outra, ainda em março, matriculada no RAB como PP-PDT.
PP-PDS no Aeroporto do Galeão
Esses DC-8-33 eram equipados com motores turbojatos Pratt & Whitney JT-4A-11, de 17625 Lbf de empuxo, e tinham capacidade para 121 passageiros em duas classes. As aeronaves dispunham ainda de um pequeno lounge a bordo, para maior conforto dos passageiros. Os aviões entraram em operação em 21 de março de 1961, em uma linha que tinha origem em Buenos Aires, escalava no Rio de Janeiro, Lisboa e Paris, tendo destino final em Londres, três vezes por semana, ou Frankfurt., uma vez por semana Substituiu o DC-7C nesse linha.
Rara foto colorida do PP-PDS
Outras linhas operadas foram Buenos Aires, São Paulo (Viracopos) e Rio de Janeiro (Galeão), três vezes por semana, uma delas com escala em Montevideo, e uma linha semanal ligando Santigo - Assunção - São Paulo (Viracopos) - Rio de Janeiro (Galeão).
Motores do PP-PEA, em 1965
Por fim, a linha semanal para o Oriente Médio foi passada para os DC-8, escalando em Dakar, Lisboa, Roma e Beirute, no Líbano.
O PP-PDT em Orly, dois meses antes de se acidentar, em 1962
Os dois aviões, portanto, foram intensamente usados. Mas uma tragédia, no entanto, aconteceu com o PP-PDT em 20 de agosto de 1962. Essa aeronave cumpria o voo Panair 026, que tinha origem em Buenos Aires e destino final em Londres. Ao decolar da pista 14 do Aeroporto do Galeão, às 22 horas e 30 minutos, bastante pesado e com 120 pessoas a bordo, o piloto, após passar pela V1 (velocidade de decisão), e chegando na rotate de 175 Knots, puxou o manche para trás, mas a aeronave não decolou. Vendo que o nariz não subia de jeito nenhum, iniciou o procedimento de abortar a decolagem, mas a velocidade estava muito alta para isso, mesmo acionando os reversores de empuxo e os freios de emergência. Próximo ao final da pista, o piloto tirou o avião da pista para o lado direito, mas a aeronave acabou passando pelo muro, cruzou a avenida, perdendo motores e parte do trem de pouso, e caiu na Baía da Guanabara.
Trajetória do PP-PDT ao se acidentar, em agosto de 1962
 Embora tenha se incendiado, os destroços flutuaram por cerca de 25 minutos, permitindo que 11 tripulantes e 94 passageiros abandonassem o avião e fossem salvos. Mas um tripulante e 14 passageiros infelizmente faleceram no acidente.
Destroços do PP-PDT, acidentado em 1962
A investigação chegou à conclusão que o estabilizador tinha sido colocado na posição errada, o que impossibilitou que o nariz subisse quando o piloto puxou o manche para trás.

Para manter as rotas, a Panair adquiriu outro DC-8-33, que veio da Pan Am, pouco mais de um mês após o acidente, em 29 de setembro de 1962. Essa aeronave foi matriculada no RAB como PP-PEA. A chegada desse avião permitiu manter as mesmas rotas com pouco impacto nas operações. O PP-PEA era da mesma "safra" dos outros aviões da Panair, e tinha sido fabricado pouco mais de um ano antes.
O PP-PEA substituiu o PP-PDT, perdido em acidente
Em 13 de novembro de 1963, a Panair arrendou da Pan Am um quarto DC-8-33, que foi matriculado como PP-PEF.

Os três aviões voaram as rotas para a Europa e Oriente Médio em 4 frequências semanais, duas delas indo para Lisboa-Paris-Londres, outra indo para Lisboa-Paris-Frankfurt e outra indo para Monróvia - Madri - Roma - Beirute. As linhas sul americanas foram repassadas para os Caravelles.
O PP-PDS no hangar de manutenção no Galeão, hoje demolido
Em 10 de fevereiro de 1965, no entanto, um DC-8 da Panair estava pronto para a decolagem no Aeroporto do Galeão, com destino à Lisboa e Paris, quando o comandante foi informado por oficiais do DAC que o governo brasileiro tinha cassado suas linhas e autorizações de voo, e foi impedido de prosseguir. Os passageiros e suas bagagens foram desembarcados, e, curiosamente, um Boeing 707 da Varig foi posicionado ao lado, para reembarcar os passageiros. O avião da Varig iria substituir o DC-8 e cumprir a rota prevista normalmente.
O PP-PEF foi arrendado da Pan Am, e devolvido depois da falência da Panair
Com o fechamento forçado da Panair, todos seus aviões foram paralisados onde estavam. Em 15 de julho de 1965, a Varig arrendou da Massa Falida da Panair dois DC-8, os PP-PDS e PP-PEA, por 75 mil dólares mensais cada um.

Pintados com as cores da Varig, mas mantendo as mesmas matrículas, os dois aviões passaram a voar para a Europa quatro vezes por semana, indo para Lisboa-Paris-Londres, para Lisboa-Paris - Frankfurt, para Monróvia-Madri-Roma-Beirute e a última indo para Recife-Madri-Roma-Milão, todas em uma frequência semanal.
O PP-PDS já nas cores da Varig
Em 9 de setembro de 1965, o PP-PEF foi devolvido à Pan Am, voando para os Estados Unidos no mês seguinte.

Em 5 de março de 1967, o PP-PEA se acidentou em Monróvia, na Libéria. O avião cumpria a rota Beirute-Roma-Monróvia-Recife-Galeão. Ao se aproximar do Aeroporto de Monróvia, os pilotos entraram baixo demais com o avião, que acabou atingindo algumas casas de um bairro próximo ao aeroporto, antes de atingir a pista. Foi um típico acidente do tipo CFIT - Controlled Flight Into Terrain, voo controlado em direção ao solo, comuns naquela época.
O PP-PEA nas cores da Varig. Acidentou-se em Monróvia em 1967
O avião tinha 90 pessoas a bordo, sendo 71 passageiros e 19 tripulantes. Apesar da violência do impacto, 39 pessoas conseguiram sobreviver, mas 5 pessoas em terra acabaram vitimadas pela queda da aeronaves em suas casas naquela madrugada. A investigação concluiu que houve erro do piloto, que voou abaixo das altitudes mínimas de segurança durante a aproximação.

Com a perda do PP-PEA, a Varig acabou cancelando a rota para Beirute, e os voos para a Europa passaram a operar com os Boeing 707.

O solitário PP-PDS permaneceu na frota, mas foi deslocado para cumprir a rota Rio-Miami, com escalas em Belém, duas vezes por semana, e com escala em Caracas, uma vez por semana.
PP-PDS na década de 70, na Varig
Em 1969, o Departamento de Aviação Civil adjudicou o PP-PDS para o patrimônio da União, mas o avião permaneceu arrendado para a Varig, que acabou desativando a aeronave em 1975, quando o avião foi colocado à venda, ficando estacionado no Aeroporto Salgado Filho, em Porto Alegre, à espera de compradores. Sendo já antigo e equipado com motores turbojatos, ávidos consumidores de querosene, o avião ficou parado por mais de 2 anos, até que foi adquirido pela empresa americana American Jet Industries em 15 de fevereiro de 1978. O avião teria uma longa vida pela frente, com outros operadores.

A desativação do PP-PDS não foi o fim dos DC-8 de passageiros no Brasil, pois em novembro de 1994 a empresa Air Vias empregou uma aeronave DC-8-62H, matriculada PT-AIY, em voos de fretamentos, mas por curto período, já que o avião foi retomado pelo proprietário menos de um ano depois, por falta de pagamento do leasing. Outros DC-8 foram usados no Brasil como cargueiros até a década de 2000.

AERONAVES DOUGLAS DC-8 UTILIZADOS PELA PANAIR DO BRASIL E PELA VARIG:

PP-PDS: Douglas DC-8-33, c/n 45272, l/n 118. Fabricado para a Pan American World Airways, como N819PA, nome Clipper Ocean Rover, mas não entregue. Entregue novo para a Panair do Brasil em 02/03/1961 como PP-PDS, nome Bandeirante Manoel da Borba Gato. Arrendado para a Varig pela Massa Falida da Panair do Brasil em 15/07/1965, como PP-PDS. Desativado em 1975, vendido para a American Jet Industries em 15/02/1978, como N59AJ. Foi para a Gulfstream America em 03/1979 e estocado em 01/1985 em Mojave, Califórnia, onde permaneceu até 29/01/1988, quando foi para a Charlotte Aerospace. Em 14/06/1989, foi para a Jet Aviation Components & Aircraft International Inc., em Miami, Flórida, e vendido para a LAC - Lineas Aereas Del Caribe, do Panamá, como HP-1166TCA, em 09/01/1991. Vendido para a Export Air Cargo, do Peru, como OB-1456 e perdido em acidente em Iquitos, no Peru, sem vítimas, em 28/03/1992, sendo canibalizado e abandonado.
Os tristes destroços do antigo PP-PDS em Iquitos, no Peru
PP-PDT: Douglas DC-8-33, c/n 45273, l/n 121. Fabricado para a Pan American World Airways, como N820PA, nome Clipper Morning Star, mas não entregue. Entregue novo para a Panair do Brasil em 21/03/1961 como PP-PDT, nome Bandeirante Brás Cubas. Acidentado com perda total em 20/08/1962 no Aeroporto do Galeão, Rio de Janeiro, com 15 vítimas fatais.

PP-PEA: Douglas DC-8-33, c/n 45253, l/n 5, primeiro voo em 20/02/1961. Entregue para a Pan American World Airways, como N800PA, nome Clipper Flying Cloud. Entregue para a Panair do Brasil em 29/09/1962 como PP-PEA, nome Bandeirante Garcia D'Ávila. Arrendado para a Varig pela Massa Falida da Panair do Brasil em 15/07/1965, como PP-PEA. Acidentado com perda total em 05/03/1967 em Monróvia, Libéria, com 56 vítimas fatais.
O PP-PEF voou apenas um ano na Panair do Brasil
PP-PEF: Douglas DC-8-33, c/n 45271, l/n 114. Entregue em 22/12/1960 para a Pan American World Airways, como N818PA, nome Clipper Rambler. Entregue para a Panair do Brasil em 13/11/1963 como PP-PEF, nome Bandeirante Brás Cubas. Devolvido para a Pan Am em 09/09/1965, como N818PA. Foi para a Delta Airlines em 30/12/1968, como N8184A, para a Charlotte Aviation Corporation em 22/01/1974, convertido em cargueiro em 09/1974. Arrendado para a Ranger Air Cargo e para a Ghana Airways. Arrendado para a  Intercontinental Airways em 21/10/1977, e comprado pela mesma empresa em 10/1978, foi retirado de serviço em 10/1981, e desmontado em 05/2003

Os Vôos da Amizade Brasil - Portugal

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Em 1960, as empresas aéreas Panair do Brasil e TAP - Transportes Aéreos Portugueses fizeram um acordo operacional para um serviço aéreo de baixo custo ligando o Brasil a Portugal, utilizando somente aeronaves com motores a pistão e hélice, e serviço de bordo consideravelmente simplificado, mas com tarifas muito mais baratas que as dos serviços regulares normais já existentes.
O PP-PDO inaugurou o primeiro Voo da Amizade
O acordo tinha várias cláusulas até então inéditas na aviação comercial:
  • As passagens aéreas, que custavam consideravelmente mais barato que as passagens normais, só podiam ser adquiridas por cidadãos portugueses ou brasileiros, ou, excepcionalmente, por estrangeiros com residência permanente no Brasil ou em Portugal;
  • A franquia de bagagem era reduzida a apenas 20 Kg por passageiro;
  • O serviço de bordo era consideravelmente simplificado, e as necessárias refeições aos passageiros, em um voo tão longo, seriam feitas nas escalas técnicas para reabastecimento durante o voo, em restaurantes nos aeroportos, e não a bordo;
  • A rota executada era Rio de Janeiro (Galeão) - Recife - Ilha do Sal (Cabo Verde) - Lisboa. Alguns dos voos operavam em São Paulo (Congonhas);
  • Os aviões eram configurados em classe única (turística).
Inicialmente,  todos os voos eram executados com as aeronaves Douglas DC-7C da Panair do Brasil, e duas aeronaves, o PP-PDO e o PP-PDN, foram preparadas especialmente para atender essa rota, com a reconfiguração do interior e o acréscimo do logotipo TAP junto ao logotipo da Panair, nas laterais das aeronaves.
O PP-PDO ostentando os logos Panair do Brasil - TAP na fuselagem
Os voos seriam feitos duas vezes por semana em ambos os sentidos, com números de voo TAP e Panair, sendo que os voos TAP tinham tripulações mistas, com comissários de voo da empresa portuguesa e tripulação técnica da Panair.

Em julho de 1964, por exemplo, os voos eram:
  • Segundas-feiras:TAP 55: Decolava de Lisboa às 16:00 h, hora de verão local, 15:00 UTC. Pousava na Ilha do Sal às 19:25 local, 21:25 UTC. Permanecia no aeroporto por pouco mais de duas horas, enquanto a aeronave passava por manutenção de trânsito e os passageiros faziam um jantar no restaurante. Decolava de Sal às 20:40 local, 22:40 UTC, em direção ao Recife. onde pousava às 02:20 local, 05:20 UTC, na terça-feira. Decolava de Recife às 03:05 local, depois que os passageiros fizessem um café da manhã e a aeronave era reabastecida. O avião pousava no Galeão às 07:05 local, 10:05 UTC de terça-feira, ponto final do voo. Os voos da amizade TAP não operavam em São Paulo;
  • Sextas-feiras:PB 57: Decolava de Lisboa às 18:30 h, hora de verão local, 17:30 UTC. Pousava na Ilha do Sal às 21:55 local, 23:55 UTC. Permanecia no aeroporto por pouco menos de duas horas, enquanto a aeronave passava por manutenção de trânsito e os passageiros faziam um jantar no restaurante. Decolava de Sal às 22:50 local, 00:500 UTC, em direção ao Recife. onde pousava às 04:30 local, 07:30 UTC, no sábado. Decolava de Recife às 05:30 local, 08:30 UTC, depois que os passageiros fizessem um café da manhã e a aeronave era reabastecida. O avião seguia direto para Congonhas, onde pousava às 10:20 local, 13:20 UTC. Decolava de Congonhas às 11:00 local, 14:00 UTC, se seguia para o Rio de Janeiro. Pousava no Galeão às 12:10 local, 15:10 UTC de sábado, ponto final do voo
  • Segundas-feiras:TAP 54: Decolava do Galeão às 14:00 h, hora local, 17:00 UTC.Pousava no Recife às 18:10 local, 21:00 UTC, onde permanecia por uma hora e 20 minutos, para que os passageiros pudessem fazer um jantar e aeronave fosse abastecida. O avião decolava às 19:30 local, 22:00 UTC, e seguia para Cabo Verde, pousando na Ilha do Sal às 03:20 local, 06:20 UTC, onde o avião era reabastecido e os passageiros desembarcavam para o café da manhã. Às 04:30 local, 07:30 UTC, o avião decolava para Lisboa, onde pousava às 13:40 local, 12:40 UTC, ponto final do voo.
  • Sextas-feiras:PB 56: Decolava do Galeão às 14:00 h, hora local, 17:00 UTC.Pousava em Congonhas, São Paulo, às 15:10 local, 18:10 UTC. Decolava para o Recife às 15:50 local, 18:50 UTC, Pousava no Recife às 20:50 local, 23:50 UTC, onde permanecia por uma hora e 20 minutos, para que os passageiros pudessem fazer um jantar e aeronave fosse abastecida. O avião decolava às 22:10 local, 00:10 UTC, e seguia para Cabo Verde, pousando na Ilha do Sal às 06:00 local, 09:00 UTC, onde o avião era reabastecido e os passageiros desembarcavam para o café da manhã. Às 07:00 local, 10:00 UTC, o avião decolava para Lisboa, onde pousava às 16:10 local, 15:10 UTC, ponto final do voo.
Analisando-se os voos, pode se ver que eram bastante cansativos, considerando que as poltronas eram todas de classe econômica, durando entre 19 e 22 horas na prática, se não houvesse nenhum problema de manutenção ou meteorológico. Mas eram o voos mais baratos do Brasil para a Europa naquela época, e isso compensava o desconforto. Os DC-7C eram ainda bem novos, e bem mantidos. Apesar da má fama dos motores Wright TC-18, as panes eram relativamente poucas.
O PP-PDN também foi utilizado nos Voos da Amizade
Os voos regulares entre Brasil e Portugal foram mantidos, e a partir de 1961, com aeronaves a jato, muito mais rápidos, sem os inconvenientes de refeições em restaurantes de aeroportos e com serviço de bordo muito melhor.
 
O primeiro Voo da Amizade foi realizado em 30 de novembro de 1960, com o DC-7C PP-PDO, com apenas uma frequência semanal, que saía do Rio de Janeiro para Lisboa às quartas-feiras e retornava às sextas-feiras. Em agosto de 1961, os voo passaram a ter duas frequências semanais, e em agosto de 1962, três frequências semanais, com o uso de uma terceira aeronave, o PP-PEG, que substituiu o PP-PDO, acidentado em 1961. Houve uma redução na demanda, e em maio de 1964, a frequência voltou a ser de duas frequências semanais em ambos os sentidos da viagem.
A rotatória de acesso ao Aeroporto de Lisboa, em 1961
Infelizmente, os Voos da Amizade ficaram marcados por um sério acidente, ocorrido em 1º de novembro de 1961. O PP-PDO decolou, na tarde do dia anterior, às 16 horas, para o voo ao Rio de Janeiro. Após a escala na Ilha do Sal, e já na madrugada do dia 1º, o avião fez uma aproximação visual para a pista 15 do Aeroporto do Recife. A pista mais longa 18-36 estava em obras e não operacional.
O remoto aeroporto da Ilha do Sal, nos anos 60
A tripulação fez a aproximação, mas muito abaixo do perfil recomendado. Naquela época, ainda não existiam os VASIS, sistemas de luzes que indicam a rampa ideal de pouso. O avião bateu num pequeno morro de 63 metros de altura, na zona norte da cidade, a três quilômetros das pistas norte do aeroporto
O PP-PDO no esquema Panair-TAP
A aeronave teve seus trens de pouso e a parte inferior da fuselagem destruídos no choque, e depois precipitou-se logo abaixo, dividindo-se em dois grandes pedaços e se incendiando.
O PP-PEG substituiu o PP-PDO nos Voos da Amizade
Apesar da violência do choque, o acidente teve sobreviventes: dos 79 passageiros e 9 tripulantes a bordo, 43 sobreviveram. Mas 45 morreram, no que foi o pior acidente da Panair do Brasil.
 
A causa do acidente foi erro da tripulação, que fez a aproximação muito baixa, pois deveriam estar a 600 pés (200 metros) de altura naquele momento, muito acima da altura do morro.
A bela foto de Vito Cedrini mostra um Constellation da TAP operando o voo da amizade, em 27 de março de 1967, no Aeroporto do Galeão
Os Voos da Amizade Panair-TAP continuaram normalmente, no entanto, até que no dia 7 de fevereiro de 1965, o PP-PEG fez um voo de retorno entre Lisboa e o Rio de Janeiro. Seria o último. No dia 10 de fevereiro, a Panair teve suas linhas cassadas arbitrariamente pelo Departamento de Aviação Civil, e foi impedida de voar novamente.

Houve uma interrupção nos voos, mas, em 22 de abril de 1965, um Lockheed L1049G Super Constellation da TAP reiniciou o serviço, bem no dia do aniversário do descobrimento do Brasil. Dessa vez, em vez da Panair, a parceira era a Varig, que também utilizou, a princípio, seus Super Constellation nos voos, posteriormente substituídos pelos Lockheed L-188 Electra.
O Super Constellation foi o primeiro avião da Varig a ser empregado nos Voos da Amizade
Em dezembro de 1965, quando tanto a TAP quanto a Varig ainda utilizavam os Super Constellation, os voos operados eram:
  • Domingos: TP 055: Decolava de Lisboa às 18:00 local, 18:00 UTC, pousando na Ilha do Sal às 22:45 local, 00:45 UTC. Ficava apenas uma hora e decolava às 23:45 local, 01:45 UTC. Pousava no Recife às 06:45 hora de verão local, 08:45 UTC. Decolava às 07:45 hora de verão local, 09:45 UTC e pousava no Rio de Janeiro-Galeão, às 12:30 hora de verão local, 14:30 UTC, da segunda feira;
  • Quintas-feiras: RG 857:Decolava de Lisboa às 18:00 local, 18:00 UTC, pousando na Ilha do Sal às 23:00 local, 01:00 UTC. Ficava apenas uma hora e decolava às 23:59 local, 01:59 UTC. Pousava no Recife às 07:00 hora de verão local, 09:00 UTC. Decolava às 08:00 hora de verão local, 10:00 UTC e pousava no Rio de Janeiro-Galeão, às 12:30 da hora de verão local, 14:30 UTC, da segunda feira. Decolava do Galeão às 13:30 hora de verão local, 16:30 UTC, e pousava em São Paulo-Congonhas, às 14:30 da hora de verão local, 16:30 UTC;
  • Segundas-feiras: RG 856: Decolava de São Paulo-Congonhas às 16:00 da hora de verão local, 18:00 UTC. Pousava no Rio-Galeão às 17:00 da hora de verão local, 19:00 UTC, e decolava ás 18:00 da hora de verão local, 20:00 UTC. Pousava no Recife às 22:40 hora de verão local, 00:40 UTC, e decolava às 23:40 hora de verão local, 01:40 UTC, para Cabo Verde. Pousava na Ilha do Sal às 06:50 local, 08:00 UTC, e decolava para Lisboa às 07:50 local, 09:00 UTC, onde pousava às 16:30 local e UTC;
  • Domingos: TP 054: Decolava do Rio-Galeão ás 18:00 da hora de verão local, 20:00 UTC. Pousava no Recife às 22:50 hora de verão local, 00:50 UTC, e decolava às 23:50 hora de verão local, 01:50 UTC, para Cabo Verde. Pousava na Ilha do Sal às 06:50 local, 08:00 UTC, e decolava para Lisboa às 07:50 local, 09:00 UTC, onde pousava às 16:30 local e UTC;
A Varig depois substituiu os Super Constellations pelos Lockheed L-188 Electra, mas aí mantinha tripulações de voo separadas, uma para os voos entre São Paulo-Rio-Recife, e outra para a parte internacional, a qual incluía mais um piloto e dois navegadores. Como os Electras não possuíam, assim como os Constellations, de equipamento Doppler ou Inercial, os navegadores usavam sextantes para se orientar na navegação sobre o Atlântico.
Os Electras substituíram os L-1049G da Varig nos Voos da Amizade
Ao se aproximar o fim da operação conjunta, os voos TP 054 e TP 055 tinham já duas frequências semanais, em semanas alternadas, nos dois sentidos. Os voos RG 856 e RG 857, usando os Electras, eram semanais e começavam sempre em São Paulo. Esse voos eram bem mais rápidos, graças ao melhor desempenho dos Electras, pois decolavam de São Paulo-Congonhas às 22:00 local, 01:00 UTC, e chegavam em Lisboa às 19:10 local/UTC, do dia seguinte.
Um Constellation da TAP já no fnal da sua carreira de 12 anos de operação
Em 1967, no entanto, a operação dos aviões a hélice, especialmente as dos Super Constellation da TAP, já estava muito onerosa e os custos forçavam a retirada de serviço desses aviões, e as duas empresas optaram então pelo encerramento dos Voos da Amizade, que, no entanto, fizeram história na aviação comercial dos dois países. De fato, o último voo de um Super Constellation da TAP foi justamente o último Voo da Amizade, do Rio de Janeiro para Lisboa, cumprido pela aeronave CS-TLC "Gago Coutinho", que pousou em Lisboa às 17:35 do dia 14 de setembro de 1967. Foi o fim de uma era.

North American X-15: o avião mais veloz da história

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Após a Segunda Guerra Mundial, os engenheiros aeronáuticos americanos começaram a fazer estudos a respeito do voo em alta velocidade. Ainda durante a guerra, os primeiros aviões a jato apareceram, as velocidades aumentavam e novos e inesperados problemas surgiram também.
X-15A-2, segunda aeronave de produção, depois da conversão para um modelo aperfeiçoado
Pela primeira vez, a Força Aérea do Exército dos Estados Unidos, depois Força Aérea dos Estados Unidos, criava uma aeronave puramente experimental, que não tinha fins operacionais e que visava essencialmente ao estudo de aerodinâmica e do comportamento de uma aeronave em voo em alta velocidade.
A primeira aeronave da série "X" foi o X-1, de 1947
Essa aeronave foi o Bell X-1, que, em 1947, foi o primeiro avião a voar acima da velocidade do som. O X-1 iniciou uma série de aeronaves experimentais, que permanece até os dias atuais, muitas delas não tripuladas, mas que deram considerável respaldo ao estudo da aerodinâmica e que renderam grandes conhecimentos não apenas para a aviação, mas também para as naves espaciais.

Além do X-1, outra aeronave da série X notável e famosa foi o North American X-15. Assim como o Bell X-1, o X-15 também foi um avião foguete.
X-15 em voo, foto tirada do NB-52 lançador
A gênese do X-15 começou com um estudo de conceito, do engenheiro e militar alemão Walter Dornberger, para uma aeronave hipersônica para a NACA - National Advisory Committee for Aeronautics, antecessora da NASA. Dornberger trabalhou no programa de mísseis alemães V-2, durante a Segunda Guerra Mundial, e foi recrutado pelos americanos quando a guerra acabou, assim como vários outros cientistas alemães daquele programa.
Lançamento de um X-15 de um NB-52
O Pentágono emitiu editais (RFP - Requests for Proposal) para a produção de uma aeronave hipersônica, em 30 de dezembro de 1954, para a célula e, em 4 de fevereiro de 1955, para o motor a foguete. Esses editais resultaram na seleção da North American Aviation para a fabricação da célula, e da Reaction Motors para a construção do motor.

Assim como em várias aeronaves da série X, o X-15 deveria ser lançado em voo por uma aeronave-mãe. Dois bombardeiros B-52 das primeiras séries foram convertidos para isso, um B-52A e um RB-52B, que após a conversão foram redenominados, respectivamente, NC-52A e NC-52B. Os X-15 eram transportados em um pod instalado embaixo da asa direita.

Os desafios do projeto eram muitos. Um dos principais problemas era o superaquecimento da estrutura devido à compressibilidade do ar e ao atrito. Outro problema sério era o controle de voo da aeronave em grandes altitudes, onde o ar muito rarefeito torna os controles aerodinâmicos quase inoperantes.
X-15A-2
Para vencer o problema da temperatura, a North American resolveu usar uma liga metálica denominada Inconel-X 750, constituída principalmente de níquel (70% da liga), cromo (14 a 17%), e outros metais como ferro, nióbio, cobalto, cobre e manganês. Essa liga mantém sua resistência mecânica inalterada a altas temperatura e foi usada para as partes da fuselagem mais sujeitas ao aquecimento.
Cockpit do S-15
A fuselagem era cilíndrica, mas tinha carenagens aerodinâmicas na traseira que achatavam a silhueta traseira da aeronave. As asas eram diminutas, e a empenagem era em formato de cruz, com a deriva e uma barbatana ventral em forma de cunha, que causavam enorme arrasto durante o voo em baixa altitude e maior densidade do ar. De fato, só o arrasto resultante do formato de cunha dessas superfícies era equivalente ao arrasto de um avião Lockheed F-104 inteiro.

Freios aerodinâmicos foram incorporados na seção traseira, abrindo-se lateralmente.

O trem de pouso era constituído de um trem de nariz escamoteável com duas rodas, e dois esquis retráteis na parte traseira. Não havia espaço disponível para um trem de pouso com rodas na traseira. Os freios eram inexistentes. A barbatana ventral da cauda devia ser descartada em voo antes do pouso, e caia de paraquedas, sendo resgatada depois.
O Boeing NB-52B, o principal lançador dos X-15
O controle de voo usava não apenas os controles aerodinâmicos, mas também foguetes direcionais, necessários nas altitudes mais altas, onde o ar extremamente rarefeito praticamente impossibilitava o uso das superfícies aerodinâmicas.
Foguetes de controle da aeronave em grande altitude
O RCS - Reaction Control System usava pequenos foguetes, que foram os primitivos antecessores dos atuais sistemas de controle dos veículos espaciais, além de alguns satélites e sondas. O RCS podia ser operado manualmente ou automaticamente, e era usado, normalmente, por apenas três minutos de voo do X-15, antes dos foguetes pararem de funcionar. O conjunto de foguetes direcionais era instalado no nariz do X-15.

A primeira configuração do cockpit usou um sistema de controle baseado em 3 manches: O manche central era um manche convencional, que operava as superfícies de controle, o da esquerda operava o sistema de controle dos foguetes direcionais (RCS) e o da direita era usado durante a brutal aceleração da aeronave, quando o motor era acendido, ajudando o piloto a manobrar durante essa condição. A carga G horizontal que o piloto sofria era muito grande, quando os motores eram ligados.
O piloto Bill Dana posa para uma foto ao lado do X-15
Os instrumentos de voo do X-15 eram apenas os essenciais para o voo, e totalmente convencionais, dando um aspecto simples ao cockpit, apesar do altíssimo desempenho da aeronave.

O X-15 usou um recurso extra para ajudar a estabilizar a aeronave, o SAS - Stability Augmentation System. Esse sistema, um tipo de piloto automático, operava as superfícies aerodinâmicas ajudando artificialmente o piloto a manter a atitude da aeronave.

O sistema de controle de três manches foi depois substituído por um de manche único, denominado MH-96, que combinava os controles aerodinâmicos e de foguetes automaticamente dependendo da eficácia de cada comando nas diferentes altitudes. Isso simplificou a operação para o piloto. O piloto também dispunha de uma manete de motor, dispositivo raro em motores a foguete, para poder fazer limitados ajustes de potência.
Lançamento do X-15
Para poder voar muito alto, o piloto usava um traje de voo pressurizado com nitrogênio, e respirava oxigênio através de um sistema à parte. Quando a aeronave voava acima de 35 mil pés, o cockpit era pressurizado, com nitrogênio e hélio, a 3,5 PSI, para limitar a inflação do traje na rarefeita atmosfera superior.

Um assento ejetável foi instalado, para preservar a segurança do piloto em caso de necessidade. O assento podia ser usado em velocidades de até Mach 4, e altitudes de até 120 mil pés. O assento possuía pequenas aletas removíveis, que o estabilizava até uma altitude segura de abertura do paraquedas. Os assentos ejetáveis do X-15 nunca foram usados na prática.
O X-15, pendurado na asa de um NB-52
A Reaction Motors forneceu os foguetes XLR-11, de 16.000 lbf de empuxo (71 kN) aperfeiçoados e com 10 mil lbf a mais que o mesmo motor usado no Bell X-1, em 1947, e que levou a aeronave ao voo supersônico, pela primeira vez na história. Os motores eram alimentados com etanol e oxigênio líquido.

Esses motores a foguete foram utilizados apenas nos primeiros 24 voos motorizados do X-15, e depois foram substituídos pelos novos foguetes XLR-99, fornecidos pela Reaction Motors a partir de novembro de 1960. Os XLR-99 consumiam amônia anidra e oxigênio líquido, e produziam, inicialmente, impressionantes 57.000 lbf de empuxo (250 kN), praticamente o mesmo produzido por um motor turbofan de um Boeing 747. Modelos posteriores do motor XLR-99 instalados no X-15 forneciam mais de 70 mil lbf de empuxo.
Motor XLR-99
A autonomia dos motores era muito baixa, em torno de 90 segundos. Após o esgotamento do combustível, a aeronave tornava-se um planador. Os foguetes direcionais usavam HTP, basicamente um mistura de alta concentração de peróxido de hidrogênio em água, como combustível. A autonomia aproximada desses foguetes era de, aproximadamente, 140 segundos.

Como motores a foguete não podem operar bombas e geradores para a aeronave, foi necessário prover o X-15 de um APU - Auxiliary Power Unit como fonte de potência para operar os sistemas do avião. Esse APU era alimentado com o mesmo HTP utilizado pelos foguetes direcionais. O HTP também era usado como combustível para operar as bombas de alta vazão de combustível do motor principal.
O X-15A-2 com tanques auxiliares
O X-15 ainda tinha tanques adicionais que levavam hélio e nitrogênio líquido, necessários para pressurizar a cabine e refrigerar alguns sistemas do avião.

Aerodinamicamente, o voo hipersônico apresentava, relativamente, poucos problemas além do já citado aquecimento superficial. As superfícies verticais da cauda eram enormes, e em forma de cunha, considerada pelos engenheiros como o melhor formato para as necessidades do voo. Essas superfícies em forma de cunha, no entanto, causavam enorme arrasto no voo em baixa altitude. O piloto devia ejetar a parte inferior antes de pousar, através de um comando para isso no cockpit.
Um NB-52 decola com um X-15
As aeronaves-mãe NB-52A e NB-52B levavam o X-15 à sua altitude lançamento de 40 mil pés em um pilone na asa direita, entre a fuselagem e os dois motores internos, e o X-15 era fixado ao pilone por 3 travas operadas hidraulicamente.  Normalmente, os  NB-52 decolavam de Edwards AFB e subiam em espiral, mantendo-se  perto do Lago Seco Rogers, no Deserto de Mojave, local previsto para o pouso, ou do Lago Seco Rosamond, o local de pouso alternativo.
Desenhos do três X-15
Isso era necessário devido pequeno alcance do X-15, mesmo em voo planado. A razão de planeio do X-15 era de, apenas, 4 para 1, e a razão de descida era, em consequência, estonteante. No voo planado, logo após o desligamento da nave-mãe, era de 12 mil pés por minuto. De grandes altitudes, era muito maior.

De fato, um voo inteiro de X-1 durava, no máximo, entre 10 a 12 minutos, já incluído o tempo de voo motorizado, de 85 a 90 segundos. A North American calculou a velocidade de pouso, inicialmente, em cerca de 200 Knots.

Os combustíveis e oxidantes gelados, nitrogênio e oxigênio líquidos, deviam ser fornecidos em voo ao X-15 pelo NB-52, pois são extremamente voláteis e escapam dos tanques continuamente por ebulição, através de tubos de ventilação.
Motor XLR-99. Ao lado, os tubos de ventilação dos tanques de combustível
O primeiro voo do X-15 ocorreu no dia 8 de junho de 1959.  O NB-52, levando o X-15, decolou pela manhã, e após subir para 37.550 pés, estabilizou na proa 140 na vertical do Lago Seco Rosamond. Tratava-se de um teste de voo planado, sem combustível a bordo. O piloto de provas da North American, Scott Crossfield, conduziu o X-15 nesse voo. O lançamento ocorreu às 08:38:40 horas, e o voo deveria durar cerca de 5 minutos apenas, até o pouso.

Dessa forma, o veterano Crossfield teve bem pouco tempo para aprender a lidar com o X-15. Algumas panes afetaram o APU, e o sistema SAS não estava funcionando no modo pitch (arfagem), tornando os comandos extremamente sensíveis. Durante o voo, e ainda alto, testou as qualidades de voo com os flaps abaixados, recolheu novamente, até pouco antes do pouso, quando baixou os flaps para tocar na superfície salgada do Lago Seco Rogers, a 145 Knots.
Bill Dana no X-15-2
A North American executou vários testes de planeio a partir de junho de 1959, e fez voar o primeiro voo motorizado em 17 de setembro de 1959. 23 voos motorizados se seguiram até que o primeiro teste com o novo motor XLR-99 foi executado, em 15 de novembro de 1959. Todos esses voos foram conduzidos pelo piloto Scott Crossfield.

A North American construiu três células do X-15, as quais fizeram um total de 199 voos. Doze pilotos de teste voaram a aeronave: Scott Crossfield, Joe Engle, Bob Rushworth, Neil Armstrong, Pete Knight, Mitt Thompson, John McKay, Joseph Walker, Michael J. Adams, Bill Dana, Forrest S. Petersen e Robert M. White. O piloto que mais voou o X-15 foi Robert Rushworth, 34 vezes.

Os voos do X-15 bateram vários recordes, muitos dos quais ainda não foram superador, até fevereiro de 2018, data desse artigo, como os de velocidade, para aeronaves de asas fixas.

Na verdade, 13 voos do X-15 superaram 50 milhas (cerca de 80 Km) de altitude, ou 264 mil pés, considerado como a fronteira entre a atmosfera e o espaço pela Força Aérea dos Estados Unidos. Dois desses voos superaram 100 Km, 328 mil pés, limite entre a atmosfera e o espaço considerado pela Federação Aeronáutica Internacional. Os pilotos que voaram acima de 80 Km receberam, em consequência, suas Asas de Astronautas.
Os restos do acidente do X-15-1
Em 15 de novembro de 1967, aconteceu o único acidente fatal com o X-15: O major Michael J. Adams pilotava o X-15-3, durante a missão 191, quando perdeu o controle da aeronave, que começou a girar violentamente enquanto descia. As forças G disso resultantes, 15 G na vertical e 8 G lateralmente, acabaram por desintegrar o avião a 60 mil pés de altitude, e os destroços foram espalhados por 139 Km quadrados. Adams não teve a menor chance de usar o assento ejetável.
X-15-2 acidentado no pouso, em 1959
Houve vários acidentes ou incidentes no pouso, desde 5 de novembro de 1959, quando Scott Crossfield pousou em emergência em Rosamond com combustível a bordo, devido a um princípio de incêndio no motor foguete. Estando muito pesado, o X-15-2 teve sua fuselagem quebrada, mas Crossfield nada sofreu, e três meses depois o avião já tinha sido reconstruído.
O grave acidente com o X-15-2, em 1962
O X-15-2 sofreu outro grave acidente no pouso, no Lago Seco Mud, em 9 de novembro de 1962, mas o piloto,  John McKay, embora ferido, salvou-se. McKey resolveu pousar em emergência após sofrer queda de empuxo durante o voo. A aeronave tocou no lago Mud com muito combustível ainda a bordo, e o excesso de peso causou o colapso de um dos esquis, fazendo a aeronave capotar, ficando gravemente danificada, e ficou muito tempo fora de serviço. Todavia, a aeronave foi reconstruída pela North American com várias melhorias, tornando-se um novo modelo, o X-15A-2, voltando ao voo em 28 de junho de 1964.
O X-15A-2, com tanques auxiliares
O X-15A-2 teve várias melhorias em relação à aeronave original, com um acréscimo de  73 cm no comprimento, um novo revestimento resistente ao calor, dois tanques auxiliares de combustível, além de outras melhorias menores.

Em 22 de agosto de 1963, o piloto Joseph Walker estabeleceu o recorde de altitude do programa, ao atingir 353,7 mil pés. Até hoje (fevereiro de 2018), tal marca permaneceu como o recorde de altitude até outubro de 2004, quando foi superado pelo SpaceShip One, que alcançou 367 mil pés, isso, se considerarmos o SpaceShip One com um avião, e não como nave espacial. Todavia, o X-15 poderia ter ido acima de 400 mil pés, mas isso foi evitado para evitar perigosas temperaturas de reentrada na atmosfera.
Pouso do X-15 no Lago Seco Rogers
Em 3 de outubro de 1967, o X-15A-2 bateu o recorde de velocidade para aviões, 3.928 Knots, ou 7.274 Km/h, aproximadamente Mach 6,7. Esse recorde se mantém até hoje para qualquer avião tripulado, mesmo tendo se passado mais de 50 anos desde que foi batido. O piloto foi Willian "Pete" Knight, da USAF. A aeronave, no entanto, sofreu danos estruturais durante esse voo, e sua pintura foi severamente danificada pelo calor, ficando carbonizada. Os reparos foram considerados antieconômicos, e não foram realizados. O avião foi armazenado e nunca mais voou.
Joseph Walker e o X-15
O X-15-1 realizou o último voo, nº 199, no dia 24 de outubro de 1968. Um 200º voo foi programado, mas foi sucessivamente adiado, e por fim foi canceladom junto com o programa inteiro, em 20 de dezembro de 1968. O X-15-1 foi removido do NB-52 e colocado em armazenamento, para nunca mais voar novamente.

As experiências feitas pela NASA com o X-15 mostraram-se extremamente úteis para o programa espacial americano, sendo aproveitadas nos programas Mercury, Gemini, Apollo e Space Shuttle. Tanto os dois X-15 sobreviventes quanto os dois NB-52 lançadores foram preservados. Abaixo, segue uma lista das cinco aeronaves utilizadas pelo programa, e o destino de cada uma.

AERONAVES UTILIZADAS NO PROGRAMA X-15 (1959-1968):

North American X-15-1: USAF #56-6670: Executou os primeiros voos (planado e motorizado) do X-15, e mais 82 voos motorizados. Primeiro voo em 08/06/1959. Fez também o último voo, em 24/10/1968. Foi preservado e hoje encontra-se no National Air and Space Museum, em Washington, DC;

North American X-15-2: USAF #56-6671: Primeiro voo em 17/09/1959. Executou 31 voos motorizados na configuração original, até sofrer um sério acidente no pouso em 09/11/1962. Foi recuperado e retrofitado pela North American, como um novo modelo, X-15A-2. Voltou ao serviço em 28/06/1964) Fez mais 22 voos motorizados nessa configuração. Retirado de serviço em 03/10/11968. Preservado, é exibido hoje no Air Force Museum, em Dayton, Ohio;

North American X-15-3: USAF #56-6672: Primeiro voo em 20/12/1961. Executou 64 voos motorizados até ser perdido em um acidente fatal, em 15/11/1967, com perda total. Destruído;
O NB-52A aposentado em Tucson, Arizona
Boeing NB-52A: USAF #52-003:  Voou pela primeira vez como Boeing B-52A em 05/08/1954, e convertido como nave-mãe do programa X-15 em 1959, sendo redenominado NB-52A. Apelidado como "The High and Mighty One", ou "Balls 3". Retirado de serviço em 10/1969. Preservado, é exibido atualmente no Pima Air & Space Museum, em Tucson, Arizona.
O NB-52B aposentado, no portão de Edwards AFB
Boeing NB-52B: USAF #52-008:  Voou pela primeira vez como Boeing RB-52B em 11/06/1955, e convertido como nave-mãe do programa X-15 em 1959, sendo redenominado NB-52B. Apelidado como "The Challenger", ou "Balls 8", executou a maioria dos lançamentos dos X-15. Após o encerramento do programa X-15, voou missões para os programas X-24, HiMAT, X-43, e também os lançamentos iniciais dos foguetes Pegasus. Foi desativado somente em 17/12/2004, quando era o mais antigo B-52 em serviço, com quase 50 anos de idade. Está exposto no portão de entrada da Base Aérea de Edwards, na Califórnia.

Curiosidades aeronáuticas - XI

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Décimo primeiro artigo dedicado às curiosidades aeronáuticas. Divirtam-se:
A APU do Airbus A380 tem a potência de uma locomotiva de porte médio
APU - Auxilary Power Unit: As APU - unidades auxiliares de potência Pratt & Whitney Canada P&WC 980A, de dois eixos, utilizadas nas aeronaves Airbus A380, possuem cerca de 1800 HP de potência, equivalente à potência de uma locomotiva de médio porte. As APU produzem eletricidade e pressão pneumática para os aviões, quando seus motores estão desligados, no solo;
Serviço de bordo internacional da Azul Linhas Aéreas
Refeições de bordo: A empresa aérea Lufhansa é a maior consumidora de caviar do mundo, que é servido na primeira classe e na executiva de suas aeronaves. A companhia compra cerca de 10 toneladas da iguaria a cada mês. Por outro lado, a Emirates é a maior consumidora de champanhe do mundo, desbancando a British Airways, que consumia  90 mil garrafas por ano;
Um Boeing 787-8 produz eletricidade suficiente para funcionar quase meio milhão de aparelhos de TV
Energia elétrica produzida por um Boeing 747-8: a energia elétrica produzida pelos geradores de um Boeing 747-8 pode alimentar 480 mil aparelhos de TV de tela plana, de plasma ou de LEDs, de 32 polegadas. Cada aeronave dessas possui cerca de 280 Km. de cabos elétricos;

A atmosfera do interior de um avião comercial:  o ar do interior da cabine do avião vem dos motores, sangrado em algum estágio dos seus compressores, e condicionado pelas packs, que ajustam a temperatura e a umidade do ar. A pressão interna não é equivalente à pressão do nível do solo, mas sim de uma altitude de, aproximadamente, 8 mil pés. Para evitar a condensação da umidade nas paredes internas da estrutura, que poderia criar corrosão, a umidade é muito baixa, cerca de 20 por cento de umidade relativa. Por isso, um passageiro pode perder um litro e meio de água do corpo num voo de três horas de duração. Como a pressurização consome uma apreciável quantidade de potência da aeronave, a renovação do ar é desigual, sendo que o cockpit e a primeira classe recebem o ar mais renovado, e a classe econômica tem o ar recirculado mais vezes, para economizar combustível;
O Boeing 787 possui a melhor qualidade do ar a bordo
Entre todas as aeronaves atuais, o Boeing 787 é o que possui a atmosfera mais confortável para os seus ocupantes. A pressão de cabine é mais alta, equivalente à pressão de uma altitude de 5 mil pés, e a umidade do ar é bem maior, já que a fuselagem do 787 não é metálica e não é sujeita à corrosão;

É muito comum os pilotos dormirem enquanto estão pilotando o avião
Pilotos dormindo durante o voo:  Uma pesquisa no Reino Unido, Suécia e Noruega constatou, preocupantemente, que entre 43 a 54 por cento dos pilotos de aviões comerciais já admitiram ter dormido, inadvertidamente, enquanto estavam pilotando o avião, e pelo menos um terço deles verificou que, ao acordar, seus copilotos também tinham pegado no sono;
O LZ-10 Schwaben foi a primeira aeronave a ter um comissário de voo, em 1912
Primeiro comissário de voo da história: Embora a srta. Helen Church tenha sido a primeira comissária de bordo de um avião, o primeiro comissário de voo da história foi um alemão, Heinrich Kubis, que foi contratado pela empresa Delag para trabalhar a bordo do dirigível Zeppelin Schwaben, em 1912. Posteriormente, Kubis trabalhou em outras naves da empresa, incluindo os famosos Graf Zeppelin e Hindenburg;

População que nunca fez uma viagem aérea: 95 por cento da população mundial jamais entrou a bordo de um avião para fazer uma viagem, embora o transporte aéreo hoje seja bastante comum e até relativamente barato;

Por que os pilotos reduzem a iluminação interna do avião durante os pousos e decolagens? Como são fases críticas do voo, a iluminação é reduzida durante os pousos e decolagens para que os olhos dos passageiros se acomodem com a escuridão e consigam enxergar com maior facilidade, caso ocorra uma emergência e uma eventual necessidade de evacuação da aeronave.
Cinzeiro do lavatório de um avião comercial
Cinzeiros nos lavatórios: Apesar de ser estritamente proibido fumar a bordo de um avião, ainda existem cinzeiros nos aviões. E eles ficam, pasmem, nos lavatórios! Apesar da proibição e das multas pesadas aplicadas aos fumantes, as empresas e os projetistas sabem que alguns passageiros vão violar as normas e fumar justamente no espaço confinado e reservado do lavatório. Então, é preferível ter um cinzeiro do que arriscar que o passageiro coloque fogo acidentalmente no cesto de papéis usados.
Os compartimentos de bagagem são pressurizados, mas não são aquecidos
Aquecimento dos bagageiros dos aviões: Embora os bagageiros dos aviões sejam pressurizados, normalmente eles não são aquecidos, possuindo portanto uma temperatura bastante baixa durante os voos. Apenas os bagageiros dianteiros possuem certo aquecimento, que vem do compartimento de aviônicos, os módulos de equipamento eletrônico do avião. Mesmo assim, a temperatura é bastante baixa. Pense nisso antes de despachar teu animalzinho de estimação para o porão. Além da baixa temperatura, alguns equipamentos eletrônicos, como os sistemas inerciais de navegação, emitem um ruído quase insuportável;
Serviço dos lavatórios
A água do lavatório do avião NÃO é potável: Nunca tome a água dos lavatórios do avião, e nem mesmo escove os dentes com ela. Eles são abastecidos com água potável, mas costumam criar colônias de fungos e bactérias com o decorrer do tempo. O abastecimento de água é feito num ponto vizinho ao de dreno de esgoto dos lavatórios. Evite até mesmo lavar as mãos com essa água, caso possa evitar.

Certificado Médico Aeronáutico: entenda e obtenha o seu

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Qualquer pessoal que queira fazer um curso de piloto ou comissário de voo deve obter, antes de começar seu treinamento prático, um Certificado Médico Aeronáutico, também conhecido simplesmente como CMA.
Existem muitos mitos a respeito dos requisitos exigidos para obtenção de tal certificado, e logicamente isso pode assustar e desanimar muitos candidatos. Alguns sites da Internet informam (ou desinformam...) requisitos para admissão de pilotos militares como se fossem requisitos para Piloto Privado, por exemplo, citando critérios que sequer são avaliados para obtenção de CMA de qualquer categoria.

Até recentemente, o Certificado Médico Aeronáutico tinha o nome de Certificado de Capacidade Física - CCF, e era emitido pelo Comando da Aeronáutica. Suas regras e requisitos médicos estavam no Regulamento Brasileiro de Homologação Aeronáutica - RBHA 67. O RBHA 67 foi revogado, e substituído pelo Regulamento Brasileiro de Aviação Civil - RBAC 67, e as mudanças foram muitas.
A maioria das mudanças foi para melhor. Os exames para obtenção do antigo CCF eram feitos nos Hospitais da Aeronáutica, só disponíveis nas capitais e nas cidades que possuíam bases aéreas, o que forçava os tripulantes do interior a viajar para fazer os exames, e ainda se submeter a longas filas, já que os Hospitais da Aeronáutica atendem, prioritariamente, aos militares da Força Aérea e seus dependentes. 

Os CMA, no entanto, são realizados por clínicas credenciadas pela ANAC, as quais estão disponíveis em muitas cidades do interior, e possuem agendas mais flexíveis, o que facilita muito o acesso. Muitos exames necessários podem ser feito através de convênios médicos, o que baixa o custo total, que infelizmente ainda é elevado, principalmente levando-se em conta o número de exames necessário. Em fevereiro de 2018, uma clínica credenciada em Londrina/PR, informou valores básicos em torno de 900 a 1100 reais para obtenção de um CMA inicial, sem utilização de nenhum convênio que o examinando possa ter, eventualmente. O uso de convênios pode abaixar sensivelmente o valor.
Evitar o sedentarismo é essencial para se manter em condições de voar
Não se exige, para um tripulante de aeronave civil, requisitos muito maiores que os exigidos para se obter uma simples carteira de habilitação para carro ou moto. Qualquer pessoa em boas condições de saúde vai conseguir obter e manter seu certificado com tranquilidade, mas não deve descuidar da saúde de forma alguma.

Conforme a categoria do tripulante, existem 5 classes de CMA:

  • 1ª Classe:É o exame mais criterioso, exigido para os Pilotos Comerciais, Pilotos de Linha Aérea e Pilotos Privados que tenham habilitação para voo por instrumentos;
  • 2ª Classe: É o exame exigido para Pilotos Pivados em geral, Comissários de Voo, Operador de Equipamentos Especiais, Piloto de Balão Livre - PBL e Mecânico de Voo;
  • 3ª Classe:  É o exame exigido para Controladores de Tráfego Aéreo, e cujas normas e requisitos não são tratados pelo RBAC 67, ficando na alçada do Comando da Aeronaútica;
  • 4ª Classe:É o exame exigido para Pilotos de Planador - PPL e Pilotos de Aeronave Leve - CPL;
  • 5ª Classe: É o exame exigido para pilotos de aeronaves remotamente comandadas (drones).
Todos os certificados possuem validade determinada no próprio certificado, e são improrrogáveis. Podem ser revalidados dentro do prazo de cinco anos após o seu vencimento. Após esse prazo, o candidato deve fazer um novo exame inicial.

A validade do certificado varia, em geral, com a licença e a idade do tripulante:
  • PP e PLA: 12 meses em geral, mas reduzido a 6 meses se o tripulante tiver mais de 40 anos de idade e operar como único piloto no transporte comercial de passageiros, ou com mais de 60 anos que opere em qualquer voo de transporte comercial;
  • PP, PP-IFR, CMS, PBL, PPL e CPL:  60 meses em geral, reduzido a 24 meses caso o tripulante tenha 40 anos ou mais, e menos de 50 anos de idade, e 12 meses, caso tenha mais de 50 anos de idade, ou seja Mecânico de Voo ou Operador de Equipamentos Especiais;
  • Piloto de VANT - Veículo Aéreo não Tripulado: 48 meses.
Quando um candidato a tripulante ou tripulante tiver dúvidas a respeito de sua condição de saúde, se existe ou não alguma restrição, ele deve consultar o RBAC 67, antes de ler qualquer coisa a respeito. O texto integral e atualizado até 20 de fevereiro de 2018 está abaixo:

http://www.anac.gov.br/assuntos/legislacao/legislacao-1/rbha-e-rbac/rbac/rbac-067-emd-00/@@display-file/arquivo_norma/RBAC67EMD01.pdf

Um médico de confiança poderá esclarecer dúvidas, antes do candidato se submeter aos exames. Não dê atenção aos mitos propalados pela Internet, que são muitos. O Blog Cultura Aeronáutica fez uma pesquisa, e verificou muitas informações falsas e assustadoras, inclusive em sites famosos e supostamente confiáveis. Não dê atenção, veja o texto da lei, que é o correto.

O candidato pode obter três tipos de laudos, após submetido aos exames:
  • Apto: O CMA será emitido sem problemas, dentro da validade prevista na legislação;
  • Inapto com restrições temporárias ou sanáveis: o CMA não será emitido, ou será emitido com validade reduzida. Depois de sanadas as restrições, o candidato deve se submeter a novos exames na mesma clínica onde realizou seus exames inicialmente;
  • Inapto em definitivo: o CMA não será emitido, e o candidato não poderá se submeter a novos exames, ficando definitivamente incapaz de voar. Cabe recurso à ANAC, que deverá indicar outra clínica ou corpo médico, diferentes do inicial, para fazer a reavaliação. O CEMAL - Centro Médico Aeroespacial, não faz mais avaliações para aeronavegantes civis.
 O CMA pode ser suspenso ou cassado pela autoridade aeronáutica. A suspensão se dá, geralmente, após o tripulante sofrer um acidente ou incidente grave, e a autoridade pode exigir um exame de revalidação do certificado. A cassação se dá, no entanto, por motivos que vão da fraude na realização dos exames até o uso de certificados falsos, o que implica na comunicação do fato ao Ministério Público Federal para as providências penais e administrativas cabíveis.
O tripulante deve ter uma rotina de manutenção do corpo
Para um piloto profissional, a perda do CMA é, realmente, um pesadelo: o tripulante perde sua profissão. Na realidade brasileira de hoje, sua chance de se aposentar por invalidez, no caso de perder o CMA, será muito reduzida, e o profissional terá que, simplesmente, arrumar e se readaptar em outra profissão, e isso, depois do 40 ou 50 anos de idade, será sem dúvida muito difícil. Por isso mesmo, qualquer tripulante que quiser se aposentar na profissão que escolheu deve cuidar muito bem da saúde.

Os cuidados com a alimentação e o condicionamento físico devem ser constantes. Muitos pilotos perdem o CMA por obesidade, hipertensão não controlada, perda de audição por falta de cuidados e prevenção e falta de consulta aos médicos de sua confiança.
Controladores de voo também devem ter um CMA
A profissão de aeronauta é claramente sedentária, tanto quanto a de motorista de ônibus ou de caminhão, ou ao do burocrata de escritório. Isso deve ser contrabalançado por hábitos saudáveis, como caminhadas, ciclismo e outras atividades físicas, por menos tempo que a escala permita.

Tripulantes jovens e adeptos de carros "tunados", ouvintes de música em volumes altíssimos, além de incomodarem vizinhos e transeuntes, já foram "aposentados" prematuramente da profissão na audiometria, por estarem fora dos padrões exigidos para obtenção do CMA. 

O consumo de álcool e tabaco em excesso também são listados como grandes fins de linha para profissionais promissores. O consumo de drogas, então, é fatal, e deve-se dizer que não se trata apenas de drogas ilegais, como cannabis, heroína e cocaína. 

Muitas drogas legais e até receitadas pelos médicos são totalmente contraindicadas para o voo. Quanto a isso, os pilotos profissionais devem tomar muito cuidado, pois o RBAC 120 instituiu um programa muito sério para prevenir o uso indevido do álcool e drogas no ambiente da aviação, incluindo até mecânicos e auxiliares. O seu desconhecimento pode levar ao encerramento de carreiras de modo muito prematuro.

Conheça abaixo o texto do RBAC 120:

http://www.anac.gov.br/assuntos/legislacao/legislacao-1/boletim-de-pessoal/2011/21s1/rbac-120

O Blog Cultura Aeronáutica deseja boa sorte a todos os candidatos que vão se submeter ao exame inicial ou à revalidação dos seus CMAs, assim como uma longa e feliz carreira, mas lembra que cada um deve fazer a sua parte.



Ontos: a história de um C-82 Packet

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Poucas aeronaves individuais, na ainda curta história da aviação, merecem algum destaque especial. Entretanto, algumas parecem superar o status de ser uma simples máquina voadora para ter, até mesmo, algum tipo de alma. O Fairchild C-82 Packet N9701F, apelidado de "Ontos" quando voava como "oficina volante na empresa aérea TWA, sem dúvida, é uma dessas máquinas.
O Fairchild C-82 Ontos, em Orly
Os Fairchild C-82 Packets foram típicos transportes militares do período pós-Segunda Guerra Mundial. Chamavam atenção pela sua configuração não convencional, e não chegaram a ser muito populares entre os pilotos, devido ao grande tamanho e peso em relação aos motores, que pareciam muito fracos e que tornavam qualquer decolagem em uma grande aventura.

Esses bimotores tinham uma fuselagem central, com grandes portas de carga na parte traseira, o que permitia até mesmo o transporte de veículos. A empenagem dupla era fixada a dois "boons" que eram, na verdade, extensões da estrutura da nacele dos motores. A asa e a cauda bem elevadas proporcionavam boas condições de carregamento e segurança para lançamento de tropas paraquedistas. A Força Aérea do Exército dos Estados Unidos, posteriormente Força Aérea dos Estados Unidos (USAF), usou esses aviões, relativamente bem sucedidos, de junho de 1945 até 1954, e várias células foram vendidos no mercado de aeronaves civis pelo mundo afora, depois da sua desativação como aeronave militar.
O Ontos ficava de prontidão 24 horas por dia
O N9701F, apelidado de "Ontos" ("A Coisa", em grego antigo), foi um desses aviões vendidos pela USAF aos civis. É o mais famoso, o mais fotografado e o mais bem sucedido C-82 do mundo, entre todos os 223 que foram fabricados até 1948.

O Ontos começou sua vida operacional como 45-57814, e foi entregue à USAF no dia 26 de março de 1948. Foi inicialmente utilizado pelo 316º Troop Carrier Group, baseado em Greenville AFB, na Carolina do Norte. Passou depois para  o 316º Maintenance & Supply Group, ainda baseado em Greenville, até ser transferido para bases americanas na Terra Nova e em Labrador, onde serviu até junho de 1953, quando foi praticamente desativado e enviado para Kelly AFB, no Texas, no San Antonio Air Material Command. Pouco mais de um ano depois, em 6 de julho de 1954, foi baixado do inventário da Força Aérea como excedente, e ficou disponível para o mercado.

Em 30 de junho de 1955, o avião foi comprado pela empresa Aerodex Inc., de Miami, Flórida, e matriculada no FAA como N2047A. A Aerodex era negociante de aeronaves, e logo vendeu o C-82 para a L.B. Smith Aircraft Corporation, outro negociante, que acabou vendendo o avião para a empresa Selk Company, em North Hollywood, California, em 25 de agosto de 1955.

Finalmente, em 14 de abril de 1956, o C-82 foi adquirido pela TWA - Trans World Airlines Inc., de Kansas City, que pretendia usar o avião como oficina voadora, para atender aeronaves com problemas de manutenção na Europa.

De fato, era necessário usar uma aeronave para esse serviço, pois nessa época, os últimos grandes aviões com motores a pistão usavam motores altamente problemáticos, como os famigerados Wright R-3350 com turbo compound, muito potentes, mas também muito temperamentais, usados nos Lockheed Super Constellation da TWA. Esses motores eram tão problemáticos que acabaram dando ao avião o apelido, nada lisonjeiro, de "o melhor trimotor do mundo". Uma aeronave capaz de transportar motores através da Europa significaria aumentar a disponibilidade dos aviões em menos tempo, como também evitar custos de levar motores dos Estados Unidos para a Europa com urgência.

A TWA transformou o C-82 em uma verdadeira estação de reparação voadora. O avião foi restaurado e reequipado, no aeroporto de Orly, nos arredores de Paris, que seria sua base de operação. Os motores originais foram substituídos por novos motores Pratt & Whitney R2800CB4, de 2400 HP, e isso significou 600 HP acrescentados ao avião em relação ao original. Novas hélices também foram instaladas, para melhor aproveitamento da potência.

Para aumentar o desempenho do avião, especialmente nas decolagem com carga máxima, a TWA instalou, no topo da fuselagem, um motor a jato auxiliar Fairchild J44, de 1000 libras de empuxo. Os sistemas elétricos, de combustível, aquecimento, instrumentos e navegação foram atualizados para o padrão mais moderno então existente, em uso nos Super Constellations da empresa à época.

Vários equipamentos de manutenção remota, incluindo uma APU - Auxiliary Power Unit, foram acrescentados ao C-82, permitindo o uso de recursos de uma grande oficina em qualquer lugar onde fosse necessário. Curiosamente, a APU era propulsionada por um motor Volkswagen  de 4 cilindros, automotivo.

Tais modificações levaram o peso vazio do avião ao total de 36.595 libras, mas mesmo assim o desempenho ficou muito superior. As grandes dimensões do compartimento de carga permitia transportar conjuntos moto-propulsores completos, em tempo muito curto, reduzindo o tempo de indisponibilidade, especialmente dos Super Constellations.

A TWA contratou uma tripulação francesa para o avião, comandada por Claude Girard. Girard atou praticamente durante toda a carreira do avião na Europa, que durou praticamente 16 anos. Isso agilizou a operação europeia, eliminando barreiras de idioma, então bem comuns e que atrapalhavam bastante.
O Ontos em Orly, 1969
Para superar alguns problemas burocráticos e de custos, o C-82 foi baixado no FAA e registrado na Etiópia, como  ET-T-12, por algum tempo. Era complicado levar o avião para os Estados Unidos para homologar as transformações, e também não tinha como registrar na Franca, devido a alguns acordos bilaterais entre esse país e os Estados Unidos. Depois, a TWA finalmente conseguiu registrar o avião novamente no FAA americano, como N9701F, a partir de 1º de março de 1960.

A era do jato começou em 1959, para a TWA. O C-82 também passou a atender os novos jatos, tão problemáticos em termos de manutenção quando os últimos motores a pistão, a tal ponto que alguns chegaram a levar um motor extra pendurados numa nacele sob as asas. O C-82 conseguia levar dois motores Pratt & Whitney JT-3A, usados nos Boeing 707, completos.
O Ontos de prontidão. Era visto em todos os principais aeroportos da Europa
Durante 1958, último ano no qual a TWA operou apenas aeronaves a pistão, o C-82, apelidado de Ontos, palavra grega que quer dizer "a coisa", transportou nada menos que 103 motores completos para reparar aeronaves em pane, principalmente os Super Constellations. O nome Ontos foi atribuído ao avião por Larry Trimble, diretor de operações no exterior da TWA, depois que ele respondeu muitas vezes à pergunta; "por que vocês compraram essa coisa?"

Voar o Ontos através da Europa não era uma tarefa fácil. O velho avião tinha suas manias. Demorava a acelerar e seus comandos eram bem lentos. Operar com vento cruzado era um verdadeiro desafio. O motor a jato era ligado só na corrida de decolagem, e tão logo o avião ganhava alguma altura, era desligado, pois consumia muito combustível, a mesma gasolina dos motores a pistão. O jato não tinha manete, quando ligado só operava na potência máxima, e não podia ser reduzido, somente desligado.
Ao fundo, o C-82 e seus clientes, um Starliner eum Boeing 707

Embora sua missão principal fosse atender as aeronaves na Europa, o Ontos atendeu missões em lugares tão distantes quanto Bombaim, na Índia, um voo de 58 horas de duração, e até Manila, nas Filipinas, 112 horas de voo durante a missão.
Cockpit do N9701F

A carreira do avião foi muito feliz, mas não foi isenta de panes. Num voo para Manila, o avião teve que fazer um pouso monomotor em Bangkok, na Tailândia. Em Shannon, na Irlanda, o avião perdeu os freios devido a uma falha hidráulica e varou a pista, atolando no lodaçal, mas sem maiores consequências.

A tripulação normal do Ontos era de dois pilotos, três mecânicos e um supervisor de manutenção. O avião era mantido de prontidão 24 horas por dia, e conjuntos moto-propulsores eram deixados de prontidão já embalados, prontos para o embarque. 

Em 28 de outubro de 1961, a TWA encerrou os voos para a Europa com aviões de motores a pistão. Isso significou menos trabalho para o Ontos, devido à maior confiabilidade dos motores a jato, mas continuou sendo muito útil. Devido à maior complexidade dos jatos, era comum o Ontos levar suprimentos e componentes essenciais para manter as aeronaves em voo. Até comissários de voo foram transportados em algumas situações.

As missões do Ontos, mais disponível depois do encerramento da operação com os Constellations e seus temperamentais motores, foram estendidas para mais lugares, como a África e a Ásia, até o distante Vietnam.

Em 1968, uma greve dos petroleiros na França obrigou a maioria das empresas a cancelar seus voos. A TWA conseguiu burlar a greve, usando uma base aérea militar ao sul de Orly, não afetada pela greve, e usando o Ontos para transportar todo o equipamento de solo necessário.

Em 1970, a TWA começou a operar aeronaves Boeing 747-100. Não demorou muito tempo até que o Ontos fosse designado para uma missão inédita: transportar um motor turbofan Pratt & Whitney JT-9D. Ainda que o compartimento de carga do C-82 fosse muito grande, o motor do 747 é enorme. Os mecânicos, antes de aceitar o desafio, fizeram um gabarito em madeira, nas dimensões externas do motor, e viram que era possível transportar, embora com uma folga mínima, apenas uma polegada de todas os lados. E a missão foi feita.
O motor JT-9D de um Boeing 747 mal cabia no compartimento de carga do Ontos
Mesmo com o Ontos reequipado com um jetpack  mais potente, um Westinghouse J34, de 2750 lb de empuxo (instalada entre 1962 e 1963), a decolagem do Ontos foi tensa, e a razão de subida oscilava entre 600 a 800 pés por minuto apenas, mas a missão foi cumprida e o 747 voltou logo ao serviço graças ao velho C-82.

Por essa época, o nome Ontos foi removido da fuselagem do avião, pois descobriram que a fonética dessa palavra era muito parecida com a palavra francesa "honteaux", que significa "vergonhoso".
Decolagem do Ontos. Seu desempenho era superior ao dos C-82 padrão

A TWA aposentou o avião em 1972. A melhor confiabilidade dos motores a jato na época diminuiu drasticamente a necessidade de trocas de motores e o avião tornou-se ocioso e dispendioso demais para ser mantido em operação. A TWA mandou o avião de Orly para Melun-Villaroche em 13 de janeiro de 1972, para ser armazenado. Entretanto, a carreira do velho C-82 estava longe de terminar.
Desativado pela TWA, o Ontos aguarda um comprador

Pouco mais de um ano depois, em 30 de janeiro de 1973, a Steward & Davis Inc., de Long Beach, Califórnia, que comprou e fez o translado do avião para a suas instalações. A empresa remotorizou o C-82 com motores R2800CB16 e um jetpack Westinghouse J3400B, e o vendeu para a Briles Wing & Helicopter, do Oregon, para entregar helicópteros completos ou seus componentes,  em 20 de fevereiro de 1973. O velho avião fez muitas viagens para entregar helicópteros, principalmente na América do Sul, e chegou a fazer uma viagem à Austrália para entregar um Bell 205 a um cliente.
O C-82 nas cores da Briles Wingg & Helicopter

Em 1º de maio de 1978, o avião foi vendido para a Balls & Brothers Inc., que utilizou o C-82 para transporte de carga no Alaska, estado onde teve uma longa carreira. Mas, entre 1980 e 1982, sofreu uma série de problemas e incidentes no táxi em em pousos, e foi paralisado. Em 20 de dezembro de 1982 foi vendido para a Northern Pacific Transport Inc., de Anchorage, Alaska.
O problemas continuaram, e o avião acabou sofrendo com uma retração acidental do trem de pouso, em 1983, mas sofreu poucos danos e foi recolocado em voo. A velho avião já estava em serviço há 35 anos.

O avião foi repassado em 1987 para a Alaska Aircrafts Leasing Inc, mas essa empresa faliu em 1992 e seus ativos foram retomados pelo First National Bank of Anchorage.

O banco ofereceu a aeronave ao mercado, e um interessado apareceu, a Hawker & Powers Aviation  Inc., de Greybull, Wyoming. O avião, apesar da idade, estava em boa forma, praticamente sem corrosão e com motores ainda novos, e a empresa comprou o avião, para ser usado como aeronave bombeiro, para apagar incêndios florestais.
O N9701F, na época em que era operado pela Hawkers & Powers

A Hawkers & Powers usou o avião até 2005, quando fechou as suas portas, tornando-se o último operador do tipo no mundo. O avião foi leiloado e terminou sendo adquirido pelo Hagerstown Museum, de Maryland, em 23 de agosto de 2006, que pagou 127.500 dólares pelo avião, o último C-82 aeronavegável do mundo.
O N9701F em vista a Oshkosh, quando era da Hawkers & Powers
Em 12 de outubro de 2006, após uma reforma que custou 45 mil dólares adicionais, o C-82 fez a última viagem do seu tipo no mundo, um translado até a sede do Museu.
O N9701F agora descansa no museu, em Hagerstown, Maryland

O N9701A foi pintado com seu antigo esquema militar, mas ainda é visível o esquema do seu maior e mais célebre operador, a TWA.  Sem dúvida alguma, é o C-82 melhor conservado no mundo todo, o mais famoso e o mais bem sucedido da história, cuja carreira durou nada menos que 57 anos.





















































































































O que você deve saber antes de viajar de avião?

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Até 1990, viajar de avião era um luxo, reservado à pessoas mais ricas. Até esse ano, as passagens eram tabeladas pelo Governo Federal, e era simplesmente proibido dar descontos no preço. Felizmente isso mudou, e rapidamente o transporte aéreo se popularizou, competindo seriamente com o transporte rodoviário, por carro ou por ônibus.
 
A seguir, postamos algumas considerações e conselhos para quem deseja viajar de avião, principalmente para os passageiros de primeira viagem, mas também úteis para quem já usa o transporte aéreo eventualmente.
Aviões turboélices são tão seguros quanto os jatos

Em primeiro lugar, o avião é um meio de transporte muito seguro, embora inspire algum medo em muitos passageiros. Não se preocupem, pois é mais provável o passageiro se acidentar no percurso de casa até o aeroporto do que se acidentar em uma aeronave. Pouquíssimos aeroportos no Brasil são servidos por algum tipo de transporte ferroviário ou metrô.

ESCOLHENDO O MELHOR MEIO DE TRANSPORTE:

Para percursos inferiores a 400 Km, o ônibus é provavelmente o melhor meio de transporte, já que a aviação regional no Brasil ainda é muito deficitária, os horários dos voo são poucos e os preços dos ônibus é inferior. O passageiro deve considerar que deve chegar uma hora antes para fazer o check-in, muitos aeroportos ficam longe dos centros urbanos e são muito mal servidos de meios de transporte rápidos que os liguem aos centros urbanos.

As estações rodoviárias de São Paulo, por exemplo, são atendidas por várias linhas de trem suburbano, metrô e ônibus, vantagens que os usuários de aeroportos não vão ter, aqui no Brasil.
Os ônibus modernos são muito confortáveis, e são a melhor opção para distâncias de até 400 Km.

O passageiro deve se lembrar também que as operações aéreas podem ser afetadas seriamente por motivos meteorológicos, principalmente visibilidade restrita. A maioria dos aeroportos brasileiros não possui equipamento para operar em condições de visibilidade ruim, como o ILS - Instrument Landing System,  e não é incomum, no Brasil, o passageiro ir tomar um avião e acabar embarcando em um ônibus.
Neblina muito intensa pode fechar até mesmo os aeroportos mais bem equipados

Entre 400 e 600 Km, de distância, o ônibus ainda é uma opção válida, mas o avião já consegue mostrar mostrar suas vantagens. Acima de 600 Km., o avião é a melhor opção.

Aviões não são nada confortáveis. As poltronas são bem apertadas e quase não reclinam. Algumas delas simplesmente não reclinam. Opções como classe executiva praticamente não existem em voos doméstico, e são muito caras quando estão disponíveis. Quem é obeso ou muito alto vai encontrar bastante dificuldade em se acomodar. Isso vale também para os voos internacionais, mesmo os mais longos, que podem durar até 15 horas.

COMPRANDO A SUA PASSAGEM:

Em geral, comprar passagem pela Internet é a melhor e mais vantajosa opção, principalmente em relação ao preço. As empresas aéreas atuam dessa forma para incentivar esse meio de compra. As compras podem ser feitas com cartão de crédito ou débito, e podem ser parceladas. Agentes de viagem podem ter preços competitivos, especialmente quando o passageiro tem alguma flexibilidade de data e horário para voar.

Não interessa muito o dia ou o horário de compra da passagem, mas sim as datas e os horários dos voos. Tarifas promocionais são oferecidas para compras bem antecipadas. Se o passageiro comprar passagens com 14 dias ou menos de antecedência, vai pagar bem caro, em geral a chamada "tarifa cheia", sem nenhum desconto. O ideal é se programar para comprar as passagens com 54 dias ou mais de antecedência, um prazo bastante factível para viagens de férias, mas difícil para viagens de negócios.

Voos na chamada alta temporada, os meses de julho, dezembro e janeiro, em geral, costumam ser bem mais caros. O mesmo se aplica a feriados prolongados. Entretanto, pode ser muito vantajoso marcar o voo para o meio de um feriado prolongado. Programar o voo para horário pela manhã ou no início da noite deve se preparar para pagar mais caro, assim como voar às segundas ou sextas feiras.

Deve-se conhecer quais são as condições de cada promoção. Em geral, as promoções  são para dias específicos de viagem, e remarcações e cancelamentos são passíveis de multas aplicáveis a cada promoção específica.
O passageiro deve ficar atento para não circular nos pátios fora da área delimitada para isso (em azul)

Em geral, compras pela Internet podem ser feitas sem necessidade de imprimir nenhum papel. Se quiser anotar o código do localizar, pode anotar, mas em geral, se apresentar ao check-in apenas com um documento pessoal é suficiente.

É muito importante escrever seu nome corretamente ao comprar, pois o passageiro pode até mesmo ser impedido de viajar se seu nome estiver errado. Use sempre o primeiro nome e o último sobrenome.
Típico cartão de embarque

É possível comprar passagens internacionais que tenham início num aeroporto doméstico. Em muitos casos, mesmo que a empresa aérea não atenda diretamente o destino que você deseja. Muitos operadores possuem acordos (code-share) com operadores internacionais, e com uma passagem você pode voar para praticamente qualquer lugar com um único bilhete de passagem. O mesmo se aplica a determinados destinos domésticos.

FIQUE ATENTO:

Aeronaves comerciais são geralmente pressurizadas, permitindo que vc voe sem problema nenhum, a não ser que tenha algum tipo de doença no sistema respiratório, pois a pressão interna do avião não é a mesma que a pressão atmosférica do solo, mas sim a de uma altitude equivalente a 8 mil pés, aproximadamente 2.400 metros.
Cilindros de oxigênio a bordo de um avião comercial
Se o passageiro for portador de doenças como enfisema pulmonar, câncer no pulmão, tuberculose, pneumonia, ou fumar mais de um maço de cigarros por dia, pode ter dificuldades de respirar a bordo e passar mal. Os aviões possuem cilindros de oxigênio terapêutico a bordo, mas se puder evitar a viagem, melhor, ou então considerar o uso de outro modal de transporte, se for disponível. Consulte a empresa aérea em casos como gravidez, com passageiros menores de idade ou muito idosos.

 VOOS COM ESCALAS E/OU CONEXÕES:

Uma escala é um aeroporto onde a aeronave vai pousar antes de chegar ao seu aeroporto de destino. Não é necessário desembarcar do avião. Nas conexões, há troca de aeronave, e o passageiro deve desembarcar da aeronaves e embarcar em outra. Não precisa se preocupar com a bagagem, ela será transferida de aeronave pelo pessoal da empresa aérea, e você só vai recolher a bagagem no seu destino final. Isso pode não ser válido se houver algum voo internacional no seu percurso.


HORÁRIO DE APRESENTAÇÃO NO AEROPORTO:

Em voos domésticos, o passageiro deve se apresentar o check-in com, pelo menos, uma hora de antecedência, mesmo que não tenha bagagem para despachar e a empresa ofereça o serviço de check-in em postos de auto-atendimento. Em voos internacionais, o passageiro deve se apresentar pelo menos duas horas antes do voo.
O check-in em tótens de auto-atendimento ainda não são populares, e não há filas

Trinta minutos antes do voo, o embarque é encerrado e não há mais como embarcar, mesmo que você esteja com o cartão de embarque na mão. Nesse caso, se você despachou bagagem, ela será desembarcada da aeronave. Consulte o pessoal da empresa aérea, para ver quais são os procedimentos que você deve seguir, como remarcação ou cancelamento do voo, e recolha sua bagagem despachada, se for o caso.

Quanto antes o passageiro se apresentar, menor a chance de sofrer o inconveniente do overbookingOverbookingé uma situação na qual mais passageiros se apresentam para o voo do que lugares existentes a bordo. É uma situação irregular, mas as empresas, mesmo assim, aceitam mais reservas do que lugares existentes a bordo, já que muitos passageiros fazem reservas e acabam não se apresentando (situação chamada de no show). O passageiro tem os seus direitos e deve reclamar, caso isso aconteça, e a empresa deve oferecer uma solução para o problema.

BAGAGENS E PERTENCES PESSOAIS:

Evite a qualquer custo levar bagagem desnecessária. Atualmente, as empresas aéreas podem cobrar por qualquer bagagem despachada, e isso é feito por peso. Levando até 10 Kg, aproximadamente, é possível levar sua bagagem a bordo, como bagagem de mão, sem nenhum pagamento adicional. Em voos internacionais, você deve consultar a empresa aérea.
Transportar bagagem em excesso pode custar muito caro, avalie se vale a pena

Nunca leve objetos como armas de fogo, armas brancas, incluindo qualquer coisa que possa ser interpretada como tal, como guarda-chuvas e estiletes, produtos líquidos, exceto mamadeiras cheias, se você viajar com um bebê. Muitos outros itens são proibidos, então consulte a lista completa, que geralmente está exposta em cartazes na área pública do aeroporto.
Seu caro canivete suíço é item proibido a bordo, e o passageiro deve simplesmente descartá-lo para poder viajar. Melhor deixar em casa

Furto de objetos nas bagagem infelizmente é uma coisa comum, então cuidado ao levar itens caros, como tênis de marcas famosas, mesmo se forem falsos, na bagagem de porão. O sumiço da bagagem inteira também está longe de ser uma ocorrência incomum. Quanto à bagagem e pertences de mão levados a bordo, você é responsável por eles e dificilmente a empresa aérea vai se responsabilizar por furtos ou extravios, mesmo se acionada a justiça comum ou do consumidor.

ESCOLHENDO SEU LUGAR A BORDO:

A maioria das empresas aéreas oferece o serviço de marcação antecipada de assentos. Atualmente, a legislação proíbe que se cobre por esse serviço, mas isso pode mudar com o tempo.

Os assentos são numerados no nariz até a cauda, e os assentos em cada fileira possuem letras, do lado esquerdo para o lado direito. Normalmente, nas aeronaves mais comuns, os Boeing 737 e Airbus A319/A320. existem seis fileiras de poltronas, sendo as poltronas A e F nas janelas, do lado esquerdo e direito, respectivamente, as poltronas B e E entre as poltronas das janelas e do corredor, e as poltronas C e D corredores. As piores são as B e E, tente evitar voar nesses lugares. Nas aeronaves ATR 42 e 72, tais poltronas "do meio" não existem, pois há apenas 4 fileiras nesses aviões.

Em algumas aeronaves da Boeing existem  assentos com janelas cegas, ou seja, simplesmente não existe janela, tente evitá-los. São locais onde passam dutos do ar condicionado.
Mapa de assentos (seat map) de um Boeing 737-800
Se o passageiro é sujeito a enjoar a bordo, é melhor voar no centro do avião e evitar a cauda. Poltronas com mais espaço para as pernas, como os situados nas saídas de emergência, podem ter um sobrepreço cobrado a parte, e não adianta reclamar, pois tal procedimento não é ilegal.

Nas aeronaves de fuselagem larga, geralmente usadas em longos voos internacionais, a numeração das poltronas segue a mesma lógica de numeração, mas elas possuem dois corredores e de 7 a 10 fileiras de poltronas. Aqui nesse blog, consulte o artigo sobre escolha do melhor assento em um avião, nesse link: http://culturaaeronautica.blogspot.com/2011/03/como-escolher-um-bom-assento-na-classe.html.
O espaço para os passageiros é exíguo, mesmo em aviões que fazem voos internacionais, como esse Boeing 777

Siga sempre as instruções fornecidas pela tripulação do avião. Elas são feitas para a sua segurança. Fumar a bordo é estritamente proibido, desde o momento que você adentre a área pública do aeroporto até sair deles. Desligue o telefone celular se for solicitado. Qualquer teimosia em fazer uso de cigarros ou equipamentos eletrônicos proibidos pode implicar até no seu desembarque compulsório e uma possível visita a um órgão policial em terra.

Assentos de ônibus convencionais, como esses, oferecem mais conforto que qualquer classe econômica de avião
Se houver um conflito de assentos, com certeza um dos passageiros está no avião ou no horário errado, chame um dos comissários para resolver o problema.

Em cada poltrona existe um cartão de segurança, que deve ser observado antes de cada decolagem, mesmo se você for um passageiro frequente. Geralmente, estão sob a forma de quadrinhos sem texto, para evitar conflito ou má compreensão por questões de idioma.
Sala de embarque lotada.
Fique sempre atento, quando estiver na sala de embarque, aos avisos do sistema de som. As empresas podem mudar os portões de embarque, especialmente em aeroporto muito movimentados, como Viracopos e Congonhas, e os outros portões podem estar bem distantes. Se se sentir perdido ma multidão, peça ajuda aos atendentes da empresa aérea pela qual viaja. Geralmente, se houver um aviso referente ao seus voo, siga os demais passageiros que irão embarcar que você não irá se perder.

Ao receber o cartão de embarque. verifique qual é a sala e o portão de embarque, e o assento marcado, se houver. Tome cuidado para não perder o cartão. Enquanto o passageiro estiver na área pública do aeroporto, deve cuidar dos seus pertences, pois furtos de bagagem, laptops, telefones celulares, bolsa e carteiras são muito comuns. Isso também pode acontecer dentro da sala de embarque, mas é bem menos comum.

DURANTE A DECOLAGEM E O VOO:

Cintos de segurança devem ser usados sempre que o passageiro estiver sentado, independente se as luzes de usar cintos estejam ligadas ou não. Elas sempre estarão ligadas durante o táxi, pousos e decolagens e abaixo de 10 mil pés de altitude. Também são ligadas em caso de risco de turbulência.
Avisos de não fumar e de atar os cintos

Caso as luzes dos cintos estejam desligadas, o passageiro pode usar os lavatórios e até mesmo dar uma passeada pelo avião, para esticar as pernas, especialmente em voos mais longos. É até recomendável que o passageiro faça alguns passeios a bordo, para melhorar a circulação do sangue, mas os cintos devem estar afivelados quando o passageiro estiver sentado. Boas empresas aéreas fornecem um necessaire que inclui escovas e pasta de dentes, pentes, tapa-olhos e um par de meias grossas, para uso nos passeios a bordo. Não pise no tapete do avião totalmente descalço, use as meias.

Exceto para escovar os dentes, não consuma a água dos lavatórios, essa água não é considerada potável e é amplamente passível de contaminação. De preferência, escove os dentes com água mineral.

Durante o voo, é estritamente proibido consumir bebidas alcoólicas, a não ser que seja fornecida pela empresa aérea. Cuidado com o consumo de álcool, antes e durante o voo, seu efeito pode ser muito potencializado pela baixa pressão de ar a bordo.
Serviço de bordo muito bom, infelizmente incomum em quase todas as empresas aéreas

A cobrança pelos alimentos consumidos a bordo é permitida pela legislação, e isso hoje é muito comum. Geralmente, os preços cobrados a bordo são bem mais baixos que os preços extorsivos cobrados nos aeroportos, e é uma opção a ser considerada. Em voos internacionais, devido à grande duração dos voos, o serviço de bordo é geralmente cortesia da empresa. Para assentos na primeira classe ou na executiva, o serviço de bordo é muito mais farto e nunca é cobrado à parte.

Caso o avião possua sistema que permita o uso do celular a bordo, evite conversas longas, pois os aviões fazem uso de canais de satélite pagos e o preço por conversa fiada durante o voo pode sair bem caro.
 
Em caso de turbulência, siga as instruções dos comissários, e aperte os cintos. Caso o avião atravesse uma área com raios e relâmpagos, eles irão solicitar que vc feche as venezianas das janelas. Isso é para evitar o ofuscamento com o clarão dos raios. A vista não será afetada de modo permanente, mas você pode ficar uns 10 a 20 minutos sem enxergar nada. Não se assuste, depois disso você voltará a enxergar normalmente. Os raios geralmente não são perigosos, ainda que passem pela aeronave, mas evite usar fones de ouvido durante esses eventos, e desligue qualquer equipamento eletrônico.
Nuvem de trovoada vista de bordo de uma aeronave.

Visitar o cockpit (cabine de comando) é estritamente proibido durante qualquer voo, por motivos de segurança. Não insista. Não entre nas galleys (a "cozinha" do avião), pois são áreas de acesso exclusivo da tripulação, e não entre nas áreas das poltronas das classes executivas ou primeira classe, a não ser, é óbvio, que você tenha passagens dessas classes.

Atualmente, visitas de passageiros ao cockpit do avião são estritamente proibidos
Em nenhum momento do voo, faça piadas sobre sequestros, bombas ou coisas parecidas, pois provavelmente você será desembarcado, se a aeronave ainda estiver no solo, ou terá que fazer uma pouco agradável visita a um posto policial, após o voo, e se explicar. Deixe as piadas de mal gosto para depois do desembarque, quando já estiver fora do aeroporto. Evite ficar conversando sobre desastres aéreos durante qualquer voo, os demais passageiros podem ficar nervosos e até ter ataques de pânico.

Durante a aproximação e o pouso, preste muita atenção nas instruções dos comissários, desligue qualquer aparelho eletrônico e curta o pouso. Não tenha medo. É vinte vezes mais provável que você sofra um acidente em casa do que um acidente no pouso de um avião.
Airbus A330 da Azul, que atende linhas internacionais

Resista ao desejo de bater palmas por um pouso suave, e não reclame de um pouso que considere muito duro. Pousos "duros" são feitos em caso de ventos cruzados fortes, pista molhada, e nessas condições um pouso firme é estritamente necessário para a segurança da aeronave e de seus ocupantes. Nunca vaie os pilotos, nesse caso.
Aeronaves no pátio do Aeroporto de Viracopos, em Campinas

Após o desembarque, siga os demais passageiros após o desembarque e, caso tenha despachado a sua bagagem, aguarde a devolução da mesma na esteira. Certifique-se que está esperando a bagagem na esteira correta. Depois de receber a bagagem, não hesite em conferir se a mesma não está violada ou danificada. Se estiver, reclame na empresa aérea. O mesmo se aplica a um possível extravio da bagagem. Caso a empresa for nacional, você pode apelar até para o Procon ou ao Código de Defesa do Consumidor, mas isso não se aplica à nenhuma empresa estrangeira, que seguem a Convenção de Varsóvia, que limita o valor de indenização por danos ou extravio de bagagem.

OUTROS CONSELHOS ÚTEIS:
  •  Use malas coloridas, bem chamativas, para distinguir sua bagagem mais facilmente das malas pretas, geralmente usadas pela maioria dos passageiros, na esteira de desembarque. Não é incomum que um passageiro mal intencionado furte malas na esteira, porque, se abordado, ele vai alegar que foi engano, vai pedir desculpas e tudo vai ficar por isso mesmo. Se ele não for abordado, vai embora com a mala. Esses ladrões vão evitar malas coloridas. Caso a sua mala seja preta, prenda uma fita colorida nela, na cor mais chamativa possível;
    Use malas coloridas, e não pretas. São mais fáceis de visualizar na esteira
  • Não adianta criar caso com os atendente em terra sobre voos atrasados ou cancelados. Eles não tem culpa nenhuma, mas em alguns casos são até agredidos por passageiros estúpidos;
  • Voos cancelados ou que vão para aeroportos de alternativa por motivos meteorológicos o fazem por falta de condições de segurança para pousar ou decolar. Tenha um mínimo de compreensão a respeito disso, e não faça exigências absurdas à empresa. Alguns passageiros chegam ao cúmulo de pedir limousines ou até helicópteros para ir de um aeroporto de alternativa ao seu destino, hipóteses absurdas que só vão atrapalhar a vida de todos. Tenha compreensão e tome seu lugar nos ônibus ou nos hotéis que serão colocados à disposição;
  • Use roupas e calçados confortáveis para voar. Deixe os sapatos de salto alto e gravatas na bagagem de mão. Nunca use roupas de banho para voar, nem que for para destinos praianos, pois isso é proibido. Homens não podem voar sem camisa, mas bermudas e chinelos são bem aceitos;
  • Sempre esteja de posse de um documento de identidade válido e original ao usar o transporte aéreo. Ao voar para o exterior, tenha em mãos um passaporte válido, e com vistos, caso haja exigência. Mesmo ao voar para países vizinhos, nos quais o passaporte não é essencial, leve um, válido, pois se você precisar de assistência de um órgão diplomático, em caso de acidentes de trânsito ou pequenas infrações, ou qualquer mal entendido com autoridades locais isso será necessário. Lembre-se que Carteiras Nacionais de Habilitação só são consideradas como documento de identidade dentro do território nacional, e o mesmo vale para carteiras da OAB, CREA e outras identidades funcionais. Carteiras de Identidade emitidas pelas secretarias de segurança pública são aceitos, mas devem ser recentes, com menos de 5 anos de emissão;
    Passaporte é essencial em qualquer viagem internacional, mesmo se não exigido
  • Caso faça uso de remédios, especialmente se forem de uso controlado, não se esqueça de levar a receita médica. Jamais leve ao exterior remédios sem receita, alimentos crus ou mesmo processados, a chance deles serem confiscados e destruídos pela vigilância sanitária é muito grande;
  • Pense bem antes de levar seu animal de estimação a bordo. Algumas empresas permitem que animais de pequeno porte, dentro de uma gaiolinha apropriada, sejam levados na cabine de passageiros, mas, caso contrário, os animais vão viajar no porão de carga, que é muito frio, com temperaturas variando entre zero e 5º Celsius. Cachorros de focinho curto são os animais mais vulneráveis e podem chegar mortos ao destino. Levar ao exterior é pior ainda, muitos terão que passar por quarentena e isso vai demorar, sem contar o risco de terem que ser sacrificados pelos motivos mais esdrúxulos;
  • Alguns lugares no avião são muito frios, especialmente aqueles que ficam perto das janelas de emergência, que são justamente os mais confortáveis para as pernas. O isolamento térmico das portas é ruim, bem pior que o da fuselagem. Leve agasalhos, ou uma manta;
  • Quando desembarcar pelas portas traseiras, direto no pátio, não passe embaixo das asas e nem da fuselagem, pois é proibido, por motivos de segurança. Não toque em nenhuma superfície do avião, especialmente as que estão em aço inoxidável, podem estar extremamente quentes. Tire suas selfies sem tocar em nada;
    Cartão de segurança dos aviões
  • Se quiser levar "lembranças" do seu voo, leve os fones de ouvido, que são descartáveis, e revistas de bordo. Levar cintos de segurança, assentos, rádios localizadores de emergência ou kits de sobrevivência podem levar o passageiro a uma detenção policial por furto qualificado. Também evite levar os cartões de segurança. Se quiser levar um, peça para um comissário, se ele deixar, tudo bem.
O Blog Cultura Aeronáutica deseja a todos uma ótima viagem.

Gunships: Aviões de transporte usados como plataformas armadas no Vietnam

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Durante a Guerra do Vietnam, os generais americanos sentiram necessidade de aeronaves de ataque eficientes e com grande poder de fogo, para prover apoio aéreo aproximado e neutralizar grandes concentrações de instalações e de guerrilheiros vietcongues, que colocavam as tropas americanas e sul vietnamitas em xeque.
Douglas AC-47 Spooky
Embora muitas aeronaves de ataque estivessem disponíveis, incluindo aviões e helicópteros, nenhuma delas conseguia alcançar o poder de fogo exigido pelos generais em determinadas situações de combate.

Em agosto de 1964,  houve o Incidente do Golfo de Tonquin, que levaria os Estados Unidos a se envolver diretamente na guerra. No mesmo mês, a Força Aérea iniciou o Projeto Tailchaser, sob o comando do Capitão John C. Simons. O Projeto usou uma aeronave Convair C-131B como base para uma plataforma de ataque armada, equipada com uma única metralhadora GE GAU-2/A Minigun, instalada para atirar da lateral esquerda do avião. Testes foram feitos a partir de Eglin AFB, na Flórida. Os resultados foram bons, e um piloto conseguia atingir seus alvos facilmente, curvando à esquerda. e usando uma mira simplesmente desenhada com lápis de maquiagem no vidro lateral do cockpit.

Sem meios de financiamento suficiente, os testes foram suspensos, mas, ainda em 1964, o Capitão Ron W. Terry, que servira no Vietnan no Comando de Sistemas da Força Aérea, retornou aos Estados Unidos e reportou que aeronaves C-47 e C-123 haviam sido de grande utilidade para clarear com artefatos luminosos as posições fortificadas dos vietcongues em operações noturnas.

O Capitão Terry conseguiu reavivar o projeto e recebeu autorização do alto comando para fazer testes com um C-131 equipado com metralhadoras rotativas na lateral.

Finalmente, a Força Aérea lançou o projeto Gunship, que, nos mesmos moldes do Projeto Tailchaser, resolveu modificar um avião de transporte, já um tanto obsoleto, mas ainda bastante útil para a tarefa: o Douglas C-47. A ideia era instalar metralhadoras rotativas de seis canos, as GE M134 Miniguns, cuja cadência de tiro varia entre 2000 a 6000 tiros por minutos, na lateral esquerda da aeronave, dentro do compartimento de carga. Ao invés dos ataques frontais feitos pelos aviões de ataque normais, essa aeronave deveria circular os seus alvos, curvando pelo lado esquerdo, e despejar um fogo pesado sobre ele.
Naturalmente, dada a fraca capacidade de autoproteção, e à baixa velocidade dessas aeronaves, os ataques somente poderiam ser feitos em condição de superioridade aérea garantida. Não havia garantia nenhuma, no entanto, que tal ideia daria certo, pois inexistia qualquer tipo de experiência anterior nesse tipo de ação.

O primeiro C-47 convertido, o Douglas C-47B-5-DK 43-48579,  foi redesignado como FC-47 . Os trabalhos de conversão começaram em 2 de dezembro de 1964, na Base Aérea de Bien Hoa, no Vietnam do Sul. No dia 11 de dezembro, tal protótipo estava pronto, e no dia 15, outro FC-47 se tornou disponível para os testes de fogo real.

As modificações feitas no FC-47, compreenderam a instalação de três metralhadoras Miniguns que atiravam através de duas janelas e da porta de carga lateral do avião. As armas eram instaladas em pods SUU-11/A, inicialmente, montados sobre suportes produzidos localmente pelos mecânicos de armamento. Normalmente, o comando das armas ficava a cargo do piloto, que podia atirar com o número de armas que quisesse, mas alguns artilheiros ficavam posicionados na fuselagem para atender eventuais falhas das armas e outros problemas. O FC-47 podia ficar orbitando por horas sobre os alvos, provendo pesado apoio de fogo aproximado sempre que fosse necessário.

Inicialmente, o FC-47 usou o indicativo de chamada de rádio "Puff", cuja origem está ligada à música do conjunto pop Peter, Paul and Mary, "Puff the Magic Dragon" (Puff, o Dragão Mágico), e que acabou se tornando o primeiro apelido desse avião.

A primeira missão notavelmente bem sucedida do FC-47 ocorreu na noite de 23 para 24 de dezembro de 1964. Um FC-47 foi requisitado pelas Forças Especiais posicionadas em Tranh Yend, no Delta do Rio Mekong. Chegou em apenas 37 minutos, e depois de disparar 4500 tiros, acabou com o ataque dos guerrilheiros vietcongues.

Então, apesar do ceticismo de alguns militares, a ideia funcionou, e mais aviões foram modificados. Mas, na terceira aeronave convertida, não foi possível conseguir as metralhadoras Miniguns, e os quatro aviões seguintes foram equipados com metralhadoras AN/M2, de calibre .30, das safras da Segunda Guerra Mundial e da Guerra da Coreia. A solução estava longe de ser o ideal, pois as armas produziam grande quantidade de gases dentro da fuselagem, e era necessário ter 10 metralhadoras dessas para igualar o poder de fogo de uma única Minigun.

Logo que mais Miniguns se tornaram disponíveis, os quatro aviões que tinham metralhadoras comuns foram prontamente reequipados. Outros C-47 disponíveis logo foram convertidos, e algumas melhorias logo vieram, como os pods  Emerson Eletric MXU-470/A, que substituíram as antigas SUU-11/A, e equiparam todas as aeronaves posteriores.

Os FC-47 cumpriram 16 missões de combate entre 16 e 26 de dezembro de 1964, e todas foram bem sucedidas. Em 8 de fevereiro de 1965, um FC-47 fez uma missão de quatro horas sobre uma posição vietcongue em cima de uma colina, na área de Bong Son, e conseguiu abater 300 guerrilheiros, tendo disparado nada menos que 20500 projéteis.

Os resultados alcançados foram tão animadores que o segundo FC-47 foi enviado para os Estados Unidos para fazer parte de um programa de treinamento de tripulantes. O quartel general da USAF ordenou ao Comando Aéreo Tático (TAC) que estabelecesse um esquadrão de FC-47, que foram redesignados como AC-47. Em agosto de 1965, o 4º Air Commando Squadron (ACS) foi ativado, inicialmente com 5 aeronaves, e uma unidade de treinamento foi estabelecida em Forbes AFB, no Texas. Até o final do ano, 26 aeronaves já haviam sido convertidas.
Montagem das armas a bordo do AC-47

O 4º ACS foi enviado para a Base Aérea de Tan Son Nhut, em 14 de novembro de 1965. Passou a usar o indicativo de chamada de rádio Spooky (assustador, em inglês). Em maio de 1966, o 4º ACS foi transferido para base de Nha Trang, e um novo esquadrão de AC-47, o 3º ACS, foi ativado. Cada um dos dois esquadrões tinha um efetivo de 16 aeronaves operacionais, e algumas eram mantidas na reserva, para compensar eventuais perdas ou indisponibilidades.
Interior de um AC-47

As missões operacionais eram realizadas a 3 mil pés de altura, com velocidade de 120 Knots. Cada avião levava 45 paraquedas iluminativos e 24000 cartuchos de munição .30. Caso todas as armas fossem disparadas na sua cadência total de 6000 tiros por minuto, a munição total poderia se esgotar em apenas 1 minuto e 20 segundo, mas o normal era voar por várias horas sobre os alvos, mantendo fogo intermitente.

A grande maioria dos tripulantes dos AC-47 era mais jovem que as aeronaves que operavam.

Os AC-47 foram muito ativos durante a guerra, e o grande sucesso deles resultou na criação de aeronaves mais pesadas para sua substituição, como os Fairchild C-119 e os Lokheed C-130. 53 aeronaves AC-47 foram convertidas, e os remanescente, após a ativação dos C-130 e C-119, foram cedidas para as forças aéreas do Vietnan do Sul, Laos e Camboja.
AC-130 usando munição traçante

Em 1967, a USAF lançou o programa Gunship II, que era uma evolução dos bem sucedidos AC-47, mas agora usando os Lockheed C-130 como aeronave base.

A ideia geral era a mesma, mas o uso de uma aeronave bem maior possibilitava um apoio de fogo aproximado muito maior também. O C-130 podia levar uma quantidade muito maior de munição e era mais rápida que os velhos AC-47. Armas mais pesadas poderiam ser levadas a bordo

A aeronave JC-130A 54-1626 foi selecionada para conversão.  Embora o fabricante da aeronave fosse a Lockheed, a Boeing foi selecionada para fazer a conversão do transporte para um avião de ataque ao solo. As modificações foram feitas na Base Aérea de Wright-Patterson, em Dayton, Ohio.
AC-130A

Um telescópio de visão noturna foi instalado na porta dianteira da cabine, e um FLIR (Forward Look Infra Red) foi instalado à frente do compartimento do trem de pouso esquerdo. As metralhadoras rotativas foram instaladas todas do lado esquerdo, voltadas para trás e para baixo. Um computador analógico de controle de fogo foi feito pelo Wing Commander da RAF Tom Pinkerton, no laboratório de aviônicos da USAF de Wright-Patterson.

Os testes de voo desse protótipo foram feitos na Base Aérea de Eglin, na Flórida, e algumas atualizações e modificações foram feitas, antes que a aeronave fosse considerada apta, em setembro de 1967, para conduzir um programa de testes de 90 dias no Vietnan do Sul, a partir de Nha Trang.
AC-130 em ação

Mais sete aeronaves foram convertidas em  1968, para o padrão "Plain Jane", usada no protótipo, mas uma aeronave recebeu uma configuração de armamento diferente, chamado de "Surprise Package", com a instalação de um canhão rotativo de 20 mm e um canhão Bofors de 40 mm. e essa aeronave foi a base de teste para os sistemas de aviônicos e armamento para o AC-130E.

Em 1970, 10 C-130A foram convertidas para um padrão denominado "Pave Pronto", e foram apelidadas de Thor, e o protótipo com o "Surprise Package" também foi adaptado para o mesmo padrão. Ao todo, 19 AC-130A foram convertidos durante a Guerra do Vietnan. Seis deles foram abatidos em ação, entre maio de 1969 e dezembro de 1972. Com o fim da guerra, em 1975, os aviões remanescentes passaram para a reserva e foram definitivamente desativados em 1995.
AC-130A em voo
Posteriormente, 11 aeronaves AC-130E foram convertidas, no projeto Pave Spectre, mas acabaram sendo apelidadas pelo seu código de chamada de rádio, Spectre. Ainda durante o conflito, oito aeronaves AC-130H foram convertidas, e essa versão foi usada até 2015, alcançando uma notável vida útil de 46 anos de serviço (1969-2015), mais do que qualquer outro avião do tipo.
AC-130A
Os AC-130 foram muito usados para atacar a "Trilha Ho-Chi-Minh".  As táticas de combate eram parecidas com as do AC-47, voando em círculos ao redor do alvo por horas, e mantendo um apoio de fogo muito mais pesado do que o apoio que podia ser fornecido por qualquer outro tipo de aeronave. Os AC-130, no entanto, voavam mais alto (7 mil pés) e mais rápido que os AC-47.
AC-130H

Com a retirada das forças americanas da Guerra do Vietnan, em 1973, os AC-130 atuaram no Laos e no Camboja, até 1975, e prestaram apoio à retirada final dos remanescentes americanos do Vietnam em 1975, quando Saigon foi tomada pelos comunistas.
AC-130H em voo

Os AC-130 continuaram a ser usados depois da Guerra do Vietnam, e foram usados nos conflitos de Granada (1983), Panamá (1989), Golfo Pérsico (1991), Somália (1993), Bósnia (1995), e atualmente ainda estão em uso no Afeganistão e no Iraque. Os modelos atuais utilizados são o AC-130U Spooky AC-130W Stinger II, e 32 aeronaves AC-130J estão projetadas para substituir os antigos AC-130H.
AC-119G
Entretanto, havia necessidade de mais aviões, e os AC-130 estavam ocupados demais, na interdição da trilha Ho-Chi-Minh e nas missões de reconhecimento armado. Infelizmente, poucas células de C-130 estavam disponíveis para conversão, pois eram aeronaves de transporte vitais para o esforço de guerra.
AC-119K e seu armamento na lateral esquerda
Felizmente, a Força Aérea acabou encontrando uma aeronave capaz de substituir os AC-47 e complementar os AC-130: os Fairchild C-119 Flying Boxcar. Essas aeronaves já tinham sido substituídas como transportes na linha de frente pelos C-130 Hercules e C-123 Provider, e havia um bom estoque delas já na reserva. O C-119 foi escolhido, então, como aeronave base para o Projeto Gunship III.
AC-119K

Em fevereiro de 1968, a USAF contratou a Fairchild-Hiller, que converteu 26 aeronaves C-119G para o padrão AC-119G, inicialmente com o nome "Creep", mas depois redesignadas com o indicativo de rádio "Shadow". A Fairchild-Hiller também converteu outras 26 aeronaves C-119G para o padrão C-110K, cujo indicativo de chamada de rádio era "Stinger".

Os AC-119G levavam, como armamento, quatro metralhadoras Minigun, e os AC-119K levam, adicionalmente, mais dois canhões Vulcan M61 de 20 mm. Para compensar o maior peso dos AC-119K, essas aeronaves foram equipadas com dois motores turbo-jatos GE J85 em naceles abaixo das asas externas. Os C-119K também levavam aviônicos e equipamentos eletrônicos adicionais.
Diferenças básica entre o C-119G Shadow e o C-119K Stinger

Os AC-119G foram enviados para o Vietnam e formaram o 71º Esquadrão de Operações Especiais em novembro de 1968, que permaneceu ativo até 1969, quando as aeronaves passaram para o recém-formado 17º Esquadrão de Operações Especiais. Os C-119K foram alocados ao 18º Esquadrão de Operações Especiais. Ambos os grupos foram desativados em 1971, Alguns aviões continuaram operando até 1972 a partir da Tailândia e, depois disso, apenas um pequeno número de AC-119 permaneceu em ação no Vietnam, agora operados pela Força Aérea da República do Vietnam, até 1975, quando o país foi reunificado de fato.

Durante a guerra, cinco AC-119 foram perdidos em ação, por acidente ou atingidos por fogo inimigo.

AERONAVES AC-47, AC-130 E AC-119 DA GUERRA DO VIETNAM REMANESCENTES:

Nenhuma aeronave AC-47 original sobreviveu até os nossos dias. Duas aeronaves C-47 de transporte foram "convertidas" apenas para exibição e estão hoje no Museu de Armamento da Força Aérea em Eglin AFB, na Flórida, e em Hurlburt Field, também na Flórida.

Um Fairchild AC-130G, # 53-3144, está em exibição no Air Commando Heritage Park em Hurlburt Field, na Flórida.

Cinco aeronaves AC-130 usadas na Guerra do Vietnam sobrevivem até hoje:
  • AC-130A # 53-3129, apelidado com First Lady,  está em exibição no Air Force Armament Museum em Eglin AFB, na Flórida;
  • AC-130A # 56-0509, apelidado comp Ultimate End,  está em exibição no Air Commando Heritage Park em Hurlburt Field, na Flórida;
  • AC-130A # 54-1630, apelidado como Asrael, está em exibição no Air Force National Museum em Wright-Patterson AFB, em Dayton, Ohio;
  • AC-130A # 54-1626, protótipo original do AC-130, apelidado como Gunship II, está em exibição ao livre no Air Force National Museum em Wright-Patterson AFB, em Dayton, Ohio;
  •  AC-130A # 54-1623, apelidado como Ghost Rider, está em exibição no Lockheed Museum, em Marietta, na Georgia.

Triste fim de belas máquinas voadoras

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Nada é para sempre. Nem mesmo os diamantes são eternos, ao contrário do que diz a lenda. Aeronaves também têm vida útil, e ao final de alguns anos ou décadas, tornam-se inviáveis de prosseguirem em operação e são aposentadas. Algumas, no entanto, são desmontadas depois de muito pouco tempo, por terem sofrido algum incidente ou pequeno acidente, e cuja recuperação não seja economicamente viável, ou por serem protótipos, cuja venda não seja recomendável por algum motivo.
Airbus A300-B4, ex-PP-CLA da Cruzeiro
A grande maioria das aeronaves aposentadas são recicladas, peças em bom estado são aproveitadas e a sua estrutura é desmanchada com o uso de máquinas pesadas. São cenas tristes, mas infelizmente isso faz parte da vida. Alguns poucos aviões sobrevivem em museus para contar alguma coisa da sua história, mas são uma pequena minoria.

Eis alguns aviões prestes a ser desmontados ou já em processo de desmanche. A maioria dessas fotos foi tirada nos desertos do sudoeste dos Estados Unidos, onde permanecem por algum tempo à espera de algum comprador, mas que depois terminam no abandono e no desmanche, com um breve histórico de cada uma:
Airbus A300-B4 6Y-JMR, Air Jamaica
A aeronave mostrada na foto acima e na foto de capa desse artigo era o Airbus A300-B4 6Y-JMR, que fez seu primeiro voo em 23 de abril de 1980, e que foi entregue ao seu operador original, a Varig-Cruzeiro, em 20 de junho de 1980, com o esquema de pintura da Cruzeiro e com a matrícula PP-CLA. Após voar 10 anos pela empresa, foi vendida para a Air Jamaica, em maio de 1990. Foi desmontado em Kingston, Jamaica, em 2008.

Boeing 647-475 ZK-SUH, Air New Zealand
O Boeing 747-475 ZK-SUH fez seu primeiro voo em 8 de maio de 1991, e foi entregue para seu primeiro operador, a Varig, em 31 de maio, como PP-VPI. Operou na empresa até ser devolvido para a ILFC, em agosto de 1994, como N891LF. Passou a operar na Air New Zealand em novembro de 1994, sendo retirado de serviço em 16 de julho de 2014. Chegou a Victorville, Califórnia em 29 de julho e vem sendo desmontado aos poucos desde então.
Concorde 211 F-BVFD, Air France
O Concorde F-BVFD fez seu primeiro voo em 10 de fevereiro de 1977, e entrou em operação pela Air France em 26 de março. Sofreu grave dano estrutural ao pousar em Dakar em novembro de 1977. Retirado de uso após o cancelamento da rota Rio-Paris em 1982. e armazenado em Paris/Charles de Gaule. Canibalizado e com corrosão intensa, foi desmontado em 1994. O conjunto do nariz foi vendido para um milionário americano, e os restos da fuselagem foram para um ferro-velho em Dugny, França.
Boeing 777-300 JA8942, Japan Air Lines
 O Boeing 777-346 JA8942 fez seu primeiro voo em 8 de setembro de 1998, e foi um dos primeiros Boeing 777-300 a ser fabricados. Foi entregue à JAL em 26 de agosto e voou até fevereiro de 2015. Sem encontrar novos operadores, por não ser modelo ER, acabou sendo desmontado para aproveitamento de peças em Haneda, Tokyo, em dezembro de 2015, junto com o seu avião irmão JA8941. Um terceiro Boeing 777-300 da JAL, o JA8943, foi retirado de uso em janeiro de 2016 e aguarda seu destino fatal.
Boeing 707-345C  5X-UCM, Uganda Airlines
O Boeing 707-324C , foi comprado usado da Continental, onde era N17325, e entregue em 7 de abril de 1973 para a Varig. Foi vendido para a ALG/Buffalo em agosto de 1989. Foi desmontado em Ostende, Bélgica, onde foi abandonado pela Uganda Airways, em 30 de junho de 2004, ainda com o esquema básico de pintura da Varig, onde operou com a matrícula PP-VLN
Boeing 737-76N PR-GOM e PR-GOV, Gol Linhas Aéreas
Os Boeing 737-700 PR-GOM e PR-GOV fizeram, respectivamente, seus primeiros voos em 23 de dezembro e 13 de outubro de 1998. O PR-GOM veio usado da Midway Airlines, em 2 fde julho de 2002, e foi retirado de serviço em 1º de setembro de 2016. Foi vendido para a Delta Airlines (N324GL), como fonte de peças de reposição, e foi desmontado em Marana, Arizona, ao lado da sua nave-irmã PR-GOV, que foi entregue ao seu operador original, a Varig, como PP-VQA, em 25 de novembro de 1998. Devolvido pela Varig à ILFC, foi para a Gol em 2 de abril de 2003, sendo vendido também para a Delta para aproveitamento de peças, e vem sendo desmontado em Marana desde 3 de novembro de 2016.
Airbus A380 F-WXXL, Airbus
O Airbus A380 F-WXXL foi o segundo A380 a ser construído, e fez parte do programa de certificação do tipo após seu primeiro voo, em 11 de abril de 2005. Foi o primeiro A380 a possuir uma cabine de passageiros completa, e mais tarde foi equipado com um interior VIP, e seria vendido para a empresa saudita Kingdon Holding Company, mas nunca foi entregue, e desde 2007 permanece estacionado sem uso em Toulouse. Embora esteja parcialmente desmontado e sem motores, permanece bem conservado, mas seu futuro é muito incerto, e a maior possibilidade é que seja desmontado, já que é grande demais para museus e não voa há muito tempo.
McDonnell-Douglas MD-11, KLM
A KLM desativou todos os seus McDonnell-Douglas MD-11 entre 2012 e 2014, e todos foram enviados a Victorville, na Califórnia, para serem desmontados. Não restou nenhuma dessas aeronaves intactas. Sugerimos a leitura do artigo específico sobre o fim dos MD-11 da KLM nesse blog: https://culturaaeronautica.blogspot.com/2016/02/os-mcdonnell-douglas-md-11-da-klm-os.html
Boeing 787-8, N787FT, Boeing
O N787FT foi o quinto Boeing 787 a ser construído. Voou pela primeira vez em 16 de junho de 2010 e foi extensivamente usado no programa de certificação do tipo. Como foi usado em testes estruturais intensos, a Boeing preferiu desmontar a aeronave em agosto de 2014 para avaliar com mais cuidado os danos ocorridos na sua revolucionária estrutura de fibra de carbono, embora o N787FT devesse ser entregue a um operador, a ANA - All Nippon Airways, onde seria o JA897A.
Boeing 747-121, N748PA, Pan Am
O Boeing 747-121 N748PA voou pela primeira vez em 15 de março de 1970, e foi o segundo Boeing 747 a ser fabricado, mas foi apenas o 26º a ser concluído. Foi entregue à Pan Am em 31 de março de 1970, e foi operado até ser retirado de uso e estocado em Marana, no Arizona, em fevereiro de 1987. Voltou brevemente ao serviço entre 1988 e 1992. Com a falência da Pan Am, foi adjudicado pelo Citibank, e terminou sendo desmontado em 1995.







N707JT: O Boeing 707 do John Travolta

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John Travolta é um ator muito bem sucedido, e ainda é muito lembrado pelos grandes sucessos de bilheteria da década de 1970, "Saturday Night Fever" (Os embalos de sábado a noite), e "Grease" (Nos Tempos da Brilhantina).
Decolagem do N707JT
John Travolta também é conhecido pela sua paixão pelos aviões. Obteve um Licença de Piloto Privado e acabou comprando vários aviões, entre grandes jatos executivos e pequenos jatos militares. Uma aeronave de sua propriedade, no entanto, chama muito a atenção dos seus fãs e dos aficionados por aviação.
John Travolta e seu 707
Trata-se de um Boeing 707, fabricado em 1964, com nada menos que 54 anos de idade. O veterano jato comercial tem uma história bastante feliz e interessante.

O Boeing 707-138B c/n 18740/388 foi entregue ao seu operador original, a QANTAS - Queensland and Northern Territory Air Service, em 10 de setembro de 1964, recebendo a matrícula VH-EBM. 

Esse modelo do Boeing 707 tem uma fuselagem três metros mais curta que a dos outros modelos do 707, mas o peso reduzido e uma maior capacidade de combustível (17.334 galões americanos, contra 15.427 galões americanos dos modelos -120 de fuselagem longa) permitia maior alcance, necessário em face das distâncias percorridas pela QANTAS desde e para a Austrália.
O VH-EBM, em 1964, quando foi entregue à QANTAS
Os Boeing 707-138B da QANTAS eram usados em longas rotas internacionais, da Austrália para a Europa, Ásia ou América do Norte. O VH-EBM foi o último dos 13 Boeing 707-138 fabricados e entregues para a QANTAS, que a partir do avião seguinte introduziu os modelos 707-338.

Em  junho de 1969, o VH-EBM foi vendido pela QANTAS, e foi para a Braniff International, dos Estados Unidos, recebendo a matrícula N108BN, passando a operar voos de passageiros com um esquema de pintura em tons de azul. A Braniff usava vários esquemas de cores para seus aviões, geralmente cores vivas.
O N108BN operando pela Braniff, entre 1969 e 1973
A Braniff usou o N108BN até outubro de 1973, quando retirou o avião de serviço e o entregou para a Boeing, num processo de negociação com novas aeronaves desse fabricante. O N108BN, da Boeing, foi para a Great American Insurance Co. em janeiro de 1975, e depois para a Kirk Krekorian Tradey Investment Corp, em setembro do mesmo ano.

Em setembro de 1977, o avião foi para a TAG Aviation, que reconfigurou o avião para interior executivo e instalou kits de redução de ruído Stagge III nos motores Pratt & Whitney JT3-D. A aeronave passou por vários períodos de armazenamento e reativação, durante o período em que foi a TAG foi proprietária do avião. Durante essa época, a aeronave, com seu interior luxuoso, foi alugada para várias celebridades, como o cantor Frank Sinatra.
A aeronave operando na TAG, como jato executivo
Em julho de 1990, 0 Boeing 707 recebeu nova matrícula na FAA, N707XX, mas ainda operando com a TAG Aviation.
Ainda voando como jato executivo, mas com matrícula N707XX
Disponível para venda, o Boeing 707 interessou ao ator John Travolta, que acabou adquirindo a aeronave, recebendo-a em 20 de maior de 1998, registrando-a em nome de uma empresa, a Jett Clipper Johnny Llc. Ainda em boas condições, com preço atraente, mas bem dispendiosa com relação a revisões e cumprimento de boletins de manutenção obrigatórios, a aeronave precisava de um patrocinador, e Travolta procurou o seu operador original, a QANTAS.
O N707JT visto ao lado do Super Constellation do HARS, o VH-EAG
O resultado dessa negociação é que, a partir de 2002, a QANTAS assumiu boa parcela das despesas operacionais do avião, autorizou que a aeronave fosse pintada no seu esquema original de pintura, de 1964, apenas com a troca da matrícula, que foi registrada na FAA americano como N707JT. Em contrapartida, John Travolta se tornou uma espécie de "garoto-propaganda" da QANTAS, uma excelente ação de marketing para a empresa.
Bela visão do N707JT em Genebra
John Travolta batizou a aeronave com o nome "Jett Clipper Ella", em homenagem aos seus filhos, Jett, já falecido, e Ella. O nome "Clipper" deriva da antiga denominação que a Pan Am dava a todas as suas aeronaves. Em algum ponto da carreira do N707JT, o avião chegou a receber um esquema parcial de cores da Pan Am.
O N707JT com pintura parcial da Pan Am, logo removida
Com um interior bastante luxuoso, o N707JT voou bastante, pelo mundo afora, com Travolta nos comandos. Seus motores com kit Stagge III permitiam a operação na maioria dos aeroportos pelos mundo afora, com poucas exceções. Mantido com extremo cuidado e esmero, por muito tempo foi o Boeing 707 melhor conservado, no mundo todo, e provavelmente ainda é.
Travolta acena da janela do cockpit do seu Boeing 707
O N707JT passou a operar, depois de algum tempo, diretamente da casa de 5 milhões de dólares do ator, em Anthony, na Flórida, em um luxuoso condomínio de proprietários de aeronaves, o Jumbolair Airport. A pista é bem restrita, mas permite operação com baixo peso. O aeroporto de Golden Isles, na vizinha Geórgia, pode receber o avião sem maiores restrições.
Casa do John Travolta no Jumbolair Airport, em Anthony, Flórida.
Além dos voos promocionais patrocinados pela QANTAS, Travolta pode fazer vários voos  por pura diversão, com seus convidados. Mesmo assim, o N707JT foi usado pelo ator para missões humanitárias para o Haiti, levando ajuda e suprimentos essenciais para as vítimas do terremoto de 12 de janeiro de 2010.

O N707JT, na verdade, resiste à inexorável extinção do tipo. A Boeing deixou de fabricar os 707 de passageiros em 1978, e peças de reposição são raras, e todas oriundas de aeronaves desmontadas pelo mundo afora, nem todas muito confiáveis. O fabricante ainda mantém a certificação, mas, praticamente, não existem mais aeronaves do tipo em operação, de qualquer espécie.
O N707JT estacionado em Golden Isles, a espera do voo de translado para a Austrália
Enquanto for mantida a certificação, a Boeing ainda mantém boletins de manutenção obrigatórios, e isso estava tornando a aeronavegabilidade do 707 cada vez mais cara e complicada de manter.

O N707FT não voa desde 2014, e está estacionado, atualmente (09/2018), no aeroporto de Golden Isles, na Georgia. O custo de manter a aeronave voando ficou tão alto que Travolta, finalmente, manifestou desejo de se desfazer da aeronave, que nessa altura, era uma das duas únicas do tipo ainda capazes de voar no mundo todo.
O luxuoso, mas discreto interior do N707JT
Na Austrália, uma sociedade privada, a HARS - Historic Aviation Restoration Society, de Wollongong, teve grande interesse na aeronave. A entidade tem um excelente histórico de atividades de restauração de aeronaves antigas, incluindo um dos dois únicos Lockheed Super Constellation ainda em operação no mundo, o qual foi voado por John Travolta numa das suas muitas viagens à Austrália como "embaixador" da QANTAS.

Para preservar a condição de voo da aeronave, e sabendo da competência do HARS para isso, Travolta resolveu doar o N707JT para a entidade. Foi uma doação relevante, já que, mesmo com todos os problemas para manter a aeronavegabilidade, o avião valia cerca de 10 milhões de dólares.
O cockpit do N707JT, bastante original
O HARS assumiu a posse da aeronave no dia 29 de junho de 2017, com um endereço em Naples, Flórida, e mantendo o registro americano, portanto. A aeronave possui hoje (09/2018) um certificado de aeronavegabilidade válido até 30 de junho de 2020, não significando, no entanto, que já tem condições de fazer o logo translado até a Austrália, sem fazer serviços indispensáveis à segurança da operação.
John Travolta manifestou seu desejo de pilotar o avião até a Austrália, nesse translado. Não será fácil manter a aeronave em voo no HARS, mas devemos lembrar que o Super Constellation operado pela instituição estava num estado tão ruim, quando foi resgatado, que foi rejeitado pelos sucateiros do Arizona, devido à corrosão muito intensa.

Os fãs do Travolta e do Boeing 707, no entanto, esperam que a aeronave seja mantida em condição de voo, e será, nesse caso, a última do seu tipo ainda capaz de levantar voo.









Guerra Fria: A bomba nuclear perdida de Tybee Island

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A Guerra Fria durou mais de 40 anos, e foi repleta de incidentes e acidentes relacionados ou não com a aviação. Alguns foram até engraçados, como o caso do piloto alemão que invadiu a União Soviética com um Cessna, ou mais trágicos, como o Incidente de Palomares, ambos reportados aqui nesse blog em artigos passados.
Boeing B-47B
Podem ser considerados muito graves, é claro, qualquer acidente ou incidente que envolva armas nucleares. De fato, durante a Guerra Fria, era comum aeronaves americanas, da OTAN ou soviéticas, voarem com bombas nucleares ativas a bordo, muitas vezes em manobras de treinamento. Os americanos chamam esses incidentes envolvendo armas nucleares com o nome código de Broken Arrow.

Felizmente, até hoje, nenhum incidente Broken Arrow resultou em explosão atômica acidental. Mas, somente os Estados Unidos reconhecem oficialmente mais de 30 desses incidentes. Pior, o Pentágono admite oficialmente que, ao menos, 10 armas nucleares foram perdidas nesses incidentes e jamais foram resgatadas. Em alguns casos, sequer se sabe onde as armas foram realmente perdidas. Obviamente, outras armas podem ter sido perdidas por acidente e esses ainda estarem classificados como "secretos".
Boeing B-47B muito similar ao avião acidentado
Um dos mais conhecidos incidentes Broken Arrow aconteceu na noite de 4 para 5 de fevereiro de 1958. Dois bombardeiros Boeing B-47 foram designados para uma missão simulada de bombardeio nuclear, na Base Aérea MacDill, na Flórida. Essas missões eram muito comuns naquela época, assim como era comum levar armas nucleares ativas a bordo, para acostumar os tripulantes com a pressão e a responsabilidade de ter um artefato desses na aeronave.
Boeing B-47B
O B-47B-50-BW #51-2349, com código de chamada de rádio Ivory Two, deveria seguir atrás do avião líder da missão, o B-47 Ivory One, voando para o norte, sobre o continente, executar sua missão simulada, em grande altitude, 38 mil pés, e retornar a MacDill. Ambas as aeronaves levavam a bordo uma bomba termonuclear Mark 15, que tinha aproximadamente 3,8 Megatons de poderio explosivo, cada uma.
Bomba termonuclear Mk 15
O Ivory Two, comandado pelo Major Howard Richardson, também era tripulado pelo Primeiro Tenente Bob Lagerstron, co-piloto, e pelo Capitão Leland Woolard, navegador e operador de radar. A bomba Mk. 15 levada a bordo era a #47782. A missão era relativamente simples, mas as tripulações deveriam ficar atentas a eventuais interceptações simuladas de unidades de caça em treinamento.
Tripulação do Ivory Two
De fato, uma unidade da Guarda Aérea Nacional da Carolina do Sul, baseada em Charleston AFB, recebeu, às 00h 09min, um alerta para interceptação simulada de dois bombardeiros provenientes do sul. Essa unidade era equipada com aeronaves North American F-86L, uma versão modernizada dos velhos F-86D.
North American F-86L, semelhante ao acidentado
Três F-86L já estavam decolando e subindo apenas 5 minutos depois, para interceptar os dois bombardeiros B-47 de MacDill, que voavam em direção norte. Esses aviões estavam totalmente armados, com 24 foguetes de 70 mm cada um.

Após localizarem os bombardeiros, com o auxílio do radar de defesa aérea de solo, e voando a 35000 pés, os caças subiram e se posicionaram atrás do Ivory One, avião líder da formação. O radar de bordo detectou o Ivory One, e os caças bloquearam o alvo no radar, mas nem o radar de bordo e nem o radar de solo, detectaram o Ivory Two, que seguia o Ivory One, apenas uma milha atrás.
North American F-86L, semelhante ao acidentado
O F-86L-50-NA #502-10108, comandado pelo Primeiro Tenente Clarence A. Stewart, código de chamada Pug Gold Two, era o número 2 da formação, e quando se aproximou por trás do seu alvo, às 00h 33min 30seg de 5 de fevereiro, subitamente, se deparou com o não detectado Ivory Two do Major Richardson à sua frente.

Seu caça bateu na deriva do B-47, na fuselagem direita e depois no motor nº 6 do bombardeiro e a asa direita. O F-86 perdeu as duas asas, e o Tenente Stewart imediatamente ejetou, enquanto o seu avião caía e se espatifava sobre uma fazenda situada a 10 milhas a leste de Sylvania, Geórgia.

O Tenente levou nada mais do que 22 minutos até chegar de paraquedas ao solo, e não tinha ferimentos relevantes, devido ao acidente, mas suas mãos ficaram congeladas e ele passou cinco semanas no hospital militar até se recuperar totalmente.
Danos na fuselagem traseira do Ivory Two
Por sua vez, o Ivory Two estava severamente danificado. O motor #6 atingido perdeu um dos seus pinos de suporte, mas ainda ficou pendurado na asa num ângulo de 45 graus com a asa, inoperante, mas felizmente sem sinais de fogo. A longarina principal da asa quebrou-se, e o aileron direito foi seriamente danificado, ficando praticamente inoperante.

Em grandes altitudes, o B-47 estava quase impossível de ser pilotado, e Richardson somente pode obter controle abaixo de 20 mil pés.

Se o motor #6 caísse, a situação iria ficar ainda pior, pois isso poderia romper linhas hidráulicas ainda intactas, e poderia danificar outros sistemas na asa atingida.

O Major Richardson avaliou que o avião não tinha condições de retornar a MacDill, e procurou uma pista mais próxima. O avião não estava conseguindo manter altura, e o aeródromo adequado mais próximo era a Base Aérea Hunter, em Savannah, Georgia.
O motor #6 do Ivory Two quase caiu da asa
A pista de Hunter estava em reparos, e o Major Richardson avaliou que um acidente no pouso, tendo em vista as suas dificuldades com a aeronave, era provável. Todos os três tripulantes tinham a opção de ejetar, mas isso deixaria o avião, bastante grande, e sua terrível carga, uma bomba termonuclear, cair sobre alguma área habitada da Geórgia. Embora o risco de haver explosão nuclear acidental fosse considerado baixo, isso poderia acontecer, em tese, e a tripulação resolveu não apostar nisso.

A manutenção da altitude estava cada vez mais complicada, e com a possibilidade haver acidente no pouso, o Major Richardson resolveu descartar a sua carga, a bomba nuclear. O artefato não estava ativado, mas, para diminuir os riscos, Richardson resolveu sobrevoar o mar, em Wassaw Sound, a pouco mais de 25 Km de Savannahm abriu as portas de bomba, e a lançou, de 7200 pés de altitude. A bomba caiu ao sul da ilha de Tybee, em uma área onde a água tinha cerca de 40 metros de profundidade. Nenhuma explosão ocorreu.
Danos pesados na asa direita do Ivory Two
Descartar a bomba estava de acordo com a doutrina da Força Aérea, que levava em conta, em primeiro lugar, a segurança da tripulação.

O Ivory Two pousou sem maiores incidentes em Hunter AFB. Richardson recebeu uma medalha DFC (Distinguished Flying Cross), pela sua bravura e habilidade de conduzir a aeronave até um pouso seguro. O seu B-47, no entanto, estava tão danificado que jamais voltou a voar novamente.

Missões para a recuperação da bomba Mk 15 foram conduzidas, a seguir, por mais de 100 homens do Air Force 2700th Explosive Ordnance Disposal Squadron, mas o artefato afundou profundamente na areia e na lama daquelas águas rasas, e todos os esforços para recuperá-lo foram infrutíferos, apesar do uso de equipamentos sofisticados pela equipe de buscas.

Finalmente, a Força Aérea desistiu e suspendeu as buscas em 16 de abril. Ate´hoje, 60 anos passados, a bomba nuclear está lá, em Tybee Island, numa área frequentemente varrida pelas redes de pescar camarões. O local não é demarcado e nem de acesso restrito.
Estrutura da bomba Mk 15, de 3,8 Megatons
O Major Richardson afirma que o artefato estava, de fato, desarmado. Uma bomba termonuclear consiste basicamente de uma bomba atômica de plutônio, que explode para ativar um núcleo secundário, de urânio empobrecido ou levemente enriquecido, contendo uma mistura de gases deutério e trítio, isótopos de hidrogênio. Richardson tinha certeza de que  a parte de plutônio não estava dentro da bomba. Sua premissa baseia-s, principalmente,  no Formulário AL-569 Temporary Custodian Receipt (para manobras), que previa um "detonador" de treinamento, contendo chumbo, no lugar de plutônio. Richardson assinou esse documento e baseia nele para afirmar que é impossível detonar a bomba de Tybee Island, de qualquer forma possível.

Há sérias dúvidas de que isso seja verdade. Em 1966, em um depoimento no Congresso, o Secretário Assistente da Defesa, W. J. Howard, declarou que a bomba de Tybee Island era uma arma completa, uma bomba contendo uma cápsula nuclear ativa, e que essa era uma das duas armas perdidas naquela época contendo um detonador de plutônio.  

Seja como for, e em vista dos conflitos entre as normas previstas para o manuseio de armas nucleares naquela época, não se pode ter certeza alguma de qualquer coisa. Ninguém sabe, na verdade, se a bomba de Tybee Island era ativa ou não. A Força Aérea jamais reiniciou as buscas,

Segundo relatórios e estudos  hidrológicos, a bomba deve estar sob uma camada de 3 a 5 metros de lama e areia.
Mapa da área de Tybee Island

Alguns civis, como o Tenente Coronel da Reserva da Força Aérea Derek Duke, conduziram algumas buscas por sua própria conta. Depois de alguns esforços, em 2004, Duke afirma ter reduzido a área de buscas para o tamanho de uma campo de futebol.
Vista atual de Wassaw Sound
 Todavia, nada indica que o artefato esteja com algum tipo de vazamento de radiação, mesmo depois de 60 anos de corrosão. Houve detecção de radiação, mas que depois verificou-se ter originado da areia monazítica típica da região, um material naturalmente radioativo.

A bomba de Tybee ainda hoje, lança uma sinistra, mesmo que remota, possibilidade de uma explosão nuclear acidental, que poderia afetar severamente Savannah, que fica a 25 Km de distância, e uma grande área da Geórgia e da Carolina do Sul. Ainda existe a possibilidade de resgate da bomba por algum grupo terrorista, o que poderia ter consequências catastróficas, e que não é tão irrealista quanto se supõe.




Os Boeing 727 da VASP

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Em 1977, a Vasp estava em uma ótima fase operacional, operando uma frota formada exclusivamente por aeronaves a jato, os versáteis Boeing 737-200. Os turboélices Viscount, YS-11 e Bandeirante já não operavam mais na empresa.
PP-SNG
Para suportar o aumento da demanda, a Vasp vinha reivindicando, há muito tempo, junto ao DAC, autorização para a aquisição de aeronaves Boeing 727-200, mas somente em 1977 tal autorização foi obtida. Na época, o DAC mantinha severo e nem sempre isento controle sobre as companhias aéreas, e a Vasp sempre foi prejudicada por esse controle, sempre em favor quase declarado pela Varig.
Boeings 727 e 737 da Vasp em Congonhas, 1980
Quatro aeronaves foram encomendadas inicialmente pela VASP. Os dois primeiros chegaram em 29 de março de 1977, 0 PP-SNF, e em 19 de abril, o PP-SNE. Foram os primeiros Boeing 727-200 operados no Brasil, já que suas rivais Varig, Transbrasil e Cruzeiro operavam modelos Boeing 727-100, menores e mais antigos.
O PP-SNF, primeiro Boeing 727-200 a chegar para a Vasp
Com uma confortável disposição de 152 assentos, os dois 727 foram inicialmente colocados na rota que ligava São Paulo - Congonhas, Brasília e Manaus. Eram os maiores e mais modernos aviões da empresa, assim como os mais modernos e maiores aviões usados na aviação doméstica brasileira naquela época.
PP-SNE

Os dois outros aviões chegaram a ser fabricados, mas a Vasp declinou de recebê-los, e os dois foram entregues pela Boeing à Avianca, que os operou inicialmente, como HK-2151 e HK-2152X, ambos modelos B727-2A1. Esses aviões seriam entregues em 1978 para a empresa paulista. Não é claro o motivo de terem sido recusados. Em consequência, os dois aviões, PP-SNE e PP-SNF foram os dois únicos 727-200 da Vasp a operar durante os anos 70.
PP-SNE
Para suprir a demanda por voos de carga, no entanto, a Vasp arrendou, em fevereiro de 1979, dois Boeing 727-30C da Evergreen, que originalmente tinham sido operados pela Lufthansa. Eram aeronaves já antigas, fabricadas em 1967. Ambos foram usados por curto tempo, e em outubro de 1980, a Vasp devolveu o PP-SRY,  e em fevereiro de 1981, o PP-SRZ.
O PP-SRY, mantendo o esquema básico de cores da Lufthansa

Somente em 1980, a Vasp retomou as encomendas dos Boeing 727. Em rápida sequência, vieram os PP-SNG, em 7 de outubro de 1980, PP-SNH em 21 de outubro, PP-SNI em 3 de novembro, e PP-SNJ em 25 de novembro, todos novos de fábrica.
PP-SRZ

Esses aviões passaram a atender as linhas que ligavam São Paulo ao Nordeste, passando pelo Aeroporto Internacional do Galeão, no Rio de Janeiro.

PP-SNG no Galeão (Foto de Vito Cedrini)

Além dos aviões novos, adquiridos diretamente à Boeing, a Vasp arrendou dois 727 da Singapore Airlines, o PP-SMK, ex-9V-SGB, e o PP-SRK, ex-9V-SGA, em junho de 1980, ambos fabricados em 1977.
PP-SMK, arrendado da Singapore.
1981 foi o ano do auge da carreira dos Boeing 727-200 da Vasp, que então operava 8 aeronaves, além de um 727-100 cargueiro.
PP-SRK, arrendado da Singapore, tinha a barriga pintada de cinza.
Em 1982, uma grande tragédia ofuscou o sucesso dos Boeing 727 da Vasp. O voo VP168 decolou de São Paulo - Congonhas às 22 horas e 53 minutos da segunda feira, dia 7 de junho de 1982. Era um dos voos VEN - Voos Econômicos Noturnos, com tarifas mais baixas que as normais. Tal voo tinha como destino Fortaleza, no Ceará, com escala no Aeroporto do Galeão, no Rio de Janeiro. Às 00 hora, 12 minutos, o VP168 decolou do Galeão para Fortaleza, com 137 pessoas a bordo, dentre as quais nove tripulantes, chefiados pelo Comandante Fernando Antonio Vieira de Paiva, de 43 anos. O copiloto era Carlos Roberto Barbosa e o Engenheiro de Voo era José Erimar.
PP-SRK, perdido em acidente em 1982

O VP168 fez um voo absolutamente normal, até começar a aproximação do Aeroporto de Fortaleza. Às 02 horas e 25 minutos, cerca de 30 minutos para o horário estimado de pouso, a tripulação faz seu primeiro contato com o APP (Controle de Aproximação) de Fortaleza, a 140 milhas náuticas do destino.
Destroços do PP-SRK, em foto de jornal da época

Durante a aproximação, o avião começou a descer muito antes do previsto, e aparentemente o comandante pretendia cancelar o plano de voo por instrumentos e voar visual até o aeroporto de Fortaleza. O Alerta de Altitude tocou duas vezes durante a aproximação, a primeira vez a 5800 pés, e a segunda a 2300 pés. A essa altura, o copiloto alertou o comandante: - Não tem uns morrotes aí na frente? A cidade e a pista de Fortaleza já estavam no visual da tripulação, mas, à frente, tudo era escuridão.
Estado atual dos motores do PP-SRK, na Serra de Aratanha.
Infelizmente, logo à frente da trajetória do avião, fica a Serra de Aratanha, no município de Pacatuba. Sem ver os morros, o piloto levou o avião a se chocar com uma montanha, às 02 horas e 53 minutos do dia 7 de  junho de 1982. A aeronave se pulverizou, e não restou nenhum sobrevivente.

O acidente do VP168 permaneceu como o pior desastre aéreo brasileiro até a queda do Boeing 737 do voo Gol 1907, em 2006. 128 vítimas não puderam ser reconhecidas e foram sepultadas em um túmulo coletivo em Fortaleza.
PP-SNG

O fim do reinado dos Boeing 727 como os maiores e mais modernos aviões da empresa chegou ao fim no dia 5 de novembro de 1982. Nesse dia, chegou ao Aeroporto de Congonhas o primeiro Airbus A300-B2 da Vasp, o PP-SNL, primeiro avião de um lote de três.
PP-SNJ

Dos sete 737-200, o primeiro a sair da frota foi o PP-SMK, em março de 1982, que foi devolvido à ILFC. Em 1984, a Vasp arrendou para outros operadores os PP-SNE, PP-SNF e PP-SNG, que não mais voaram pela empresa. Em 1985, os PP-SNH e PP-SNI também saíram da frota, e apenas o solitário PP-SNJ ficou fazendo voos até abril de 1989, data final de operação dos voos de passageiros do Boeing 727-200 da Vasp.
PP-SNG com outro esquema de pintura

Em 1985, por exemplo, uma das linhas servidas pelos 727 era o voo VP166, que saía de Porto Alegre às 8 horas, e ia até Recife, passando por São Paulo, Rio - Galeão, Salvador e Maceió. Chegava ao Recife às 15 horas e 10 minutos. Era um longo e cansativo voo, compensado, no entanto, por um bom serviço de bordo.
PP-SNJ no Galeão
Ainda não era o fim da carreira do modelo na Vasp, no entanto.

A Vasp foi privatizada em 1990, e seus novos controladores, liderados pelo empresário Wagner Canhedo, iniciaram um grande programa de aumento da frota e ampliação das operações, incluindo destinos internacionais.
PP-SFC, da VaspEx

Em 1996, a Vasp iniciou um projeto de transporte de cargas e encomendas expressas, mais ou menos nos moldes da FedEx americana, e criou uma subsidiária, a VaspEx, com essa finalidade. A frota deveria ser constituída de duas aeronaves Boeing 737-200F, dois Boeing 737-200F e um DC-10-30F. As operações começaram no dia 12 de outubro de 1996, com a decolagem do PP-SFC, um Boeing 727-200F, de Congonhas. Um segundo 727, o PP-SFE, começou a operar em dezembro.


Em 1997, a Vasp trouxe mais dois Boeing 727-200F, que foram matriculados PP-SFF e PP-SFG, e devolveu o DC-10-30F, no ano seguinte. Os quatro aviões voaram regularmente na VaspEx até que, em maio de 2000, o PP-SFF foi devolvido, e viria a operar na VarigLog como PP-VQU, em novembro do mesmo ano. Em fevereiro de 2001, o PP-SFE deixou a frota, e passou a operar pela VarigLog, como PP-VQV.
PP-SFG

Os dois Boeing 727-200F remanescentes voaram mais ou menos regularmente até a paralisação das atividades da Vasp, em janeiro de 2005. O PP-SFC foi paralisado em Recife, e o PP-SFG foi paralisado no Aeroporto do São Luiz/MA.
O PP-SFQ, que nunca chegou a operar

Um quinto Boeing 727-200F deveria ter operado na VaspEx. Essa aeronave tinha operado no Brasil pela AirVias e pela TABA, como PP-AIW. Foi adquirida pelo grupo Vasp Air System em fevereiro de 1996, mas foi voar no Lloyd Aéreo Boliviano - LAB, como CP-2294, transportando passageiros. A Vasp acabou trazendo o avião da Bolívia para o Brasil, como PP-SFQ, transformou-o em cargueiro, mas retirou a aeronave de uso, sem maiores explicações. Houve boatos, nunca confirmados, de que a porta de carga teria sido cortada no lugar errado, o que deu perda total na aeronave, fato isso jamais confirmado ou desmentido. O avião ficou abandonado em Congonhas até ser desmanchado, com os demais aviões da empresa abandonados, em abril de 2012.
O PP-SFC, junto ao PP-SPI, aguardam a máquina que irá destruí-los
De todos os aviões 727 que voaram pela Vasp, ainda resta um, abandonado em São Luiz, cujo destino hoje (10/2018) é muito incerto. O PP-SFC foi desmontado no Recife, junto a um Boeing 737-200 da Vasp, o PP-SPI. Dois aviões que voaram na Vasp têm destino incerto, os ex-PP-SNH e PP-SNG. Talvez um esteja ainda operando, no Panamá, o ex-PP-SNG, hoje HP-1937UCG. Existem fotos da aeronave operando em agosto de 2018.
O ex-PP-SNG ainda operando no Panamá, em agosto de 2018


AERONAVES BOEING 727 OPERADAS PELA VASP:

PT-SNE: Boeing 727-2A1, c/n 21341/1253. Primeiro voo em 17/03/1977. Comprado novo, e entregue à Vasp em 19/04/1977. Foi arrendado à GPA en 01/06/1984, operou pela Northeastern International Airways, e retornou á Vasp em 04/03/1985. Foi vendido para a UPS en 28/06/1985, como N213UP, e convertido em cargueiro em 11/1985. Foi vendido em 27/09/2002 para para a Platinum Holdings, que o arrendou para a Varig Logistíca, como PR-LGB. Retirado de uso em 2007 e canibalizado.

PT-SNF: Boeing 727-2A1, c/n 21342/1256. Primeiro voo em 29/03/1977. Comprado novo, e entregue à Vasp em 2904/1977. Foi arrendado à GPA en 30/05/1984, operou pela Northeastern International Airways, e retornou á Vasp em 04/03/1985. Foi vendido para a UPS en 28/06/1985, como N214UP, e convertido em cargueiro em 11/1985. Foi vendido em 11/2002 para a Varig Logistíca, como PR-LGC. Retirado de uso em 2008, e desde então está abandonado, em más condições, em São José dos Campos/SP.

PT-SNG: Boeing 727-2A1, c/n 21345/1673. Primeiro voo em 07/10/1980. Comprado novo, e entregue à Vasp em 16/10/1980.Foi arrendado em wet leasing para a Capitol Air e para a Arrow Air entre 1984 e 1985, Em 22/03/1989, foi para a Alaska Airlines, como N327AS. Foi para a Sun Country Airlines em 01/1994, como N287SC, e depois para a American Trans Air, em 22/11/99, com a mesma matrícula. Foi para a Capital Cargo International Airlines em 29/12/1999, convertido em cargueiro em 04/2000. Vendido para a Uniworld Air Cargo em 24/04/2017, como HP-1937UCG. Aparentemente, está operacional até hoje (10/2018).

PT-SNH: Boeing 727-2A1, c/n 21346/1675. Primeiro voo em 07/10/1980. Comprado novo, e entregue à Vasp em 21/10/1980. Foi arrendado à Mexicana em 10/1985, como XA-MXF, e depois como XA-MXI. Em 09/2001, foi para a Chanchangi Airlines, como 5N-BDE. Retirado de serviço em data e local desconhecidos.

PT-SNI: Boeing 727-2A1, c/n 21600/1679. Primeiro voo em23/10/1980. Comprado novo, e entregue à Vasp em 03/11/1980.Foi para a Mexicana como XA-MSG (depois XA-MXJ), em 08/1985. Foi para a Aero Capital Corp. em 27/02/2003, e estocado em Goodyear, Arizona, como N216AP. Em 19/11/2003, foi exportado para a Nigéria, desconhecendo-se o operador e o status atual da aeronave.

PP-SNJ: Boeing 727-2A1, c/n 21601/1694. Primeiro voo em 25/11/1980. Comprado novo, e entregue à Vasp em 12/12/1980. Foi para a Polaris em 17/04/1989, como N328AS, e operado pela Alaska Airlines (17/04/1989), Sun Country (01/09/1993) e American Trans Air (18/10/1999). Em 30/12/1999, foi para a Aviation Capital Group, para ser operado pela Cargo Aircraft management (30/11/2011. Já foi desmontado.

PP-SMK: Boeing 727-212, c/n 21348/1287. Primeiro voo em 14/09/1977. entregue à Singapore Airlines em 26/09/1977, como 9V-SGB. Foi arrendado à Vasp em 06/1980, como PP-SMK. Devolvido em 03/1982, foi para a Alaska Airlines, como N26729, depois como N293AS. Operou depois pela Express One (03/1993), Air Atlantic (11/1995), e Champion Air (09/1997). Foi depois vendio para a Grand Holdings (24/08/1995) e para a Airlease internacional Inc (08/01/2009). Foi usado em um teste de destruição, controlado remotamente, em Mexicali, no México (Laguna Salata), em 27/04/2012, já com a matrícula XB-MNP, para um programa do Discovery Channel.

PP-SRK: Boeing 727-212, c/n 21347/1282. Primeiro voo em 23/07/1977. entregue à Singapore Airlines em 30/08/1977, como 9V-SGA. Foi arrendado à Vasp em 06/1980, como PP-SRK. Acidentou-se com perda total e 137 fatalidades em 08/06/1982, em Pacatuba/CE.


PP-SRY: Boeing 727-30C, c/n 19310/395, Primeiro voo em 06/04/1967, entregue à Lufthansa em 18/04/1967, como D-ABII. Vendido à Evergreen em 01/1979 como N701EV, e arrendado à Vasp em 02/1979, como PP-SRY. Devolvido para a Evergreen, operou depois na UPS, até ser vendido para a Stewart Industries International, em 05/2005. Desmontado no ano seguinte, registro cancelado em 23/08/2006.

PP-SRZ: Boeing 727-30C. c/n 19311/399. Primeiro voo em 13/04/1967, entregue à Lufthansa em 28/04/1967, como D-ABIO. Vendido à Evergreen em 01/1979 como N703EV, e arrendado à Vasp em 02/1979, como PP-SRZ.Devolvido à Evergreen en 02/1981, voou arrendado à Air Tungaru (T3-ATB, em 06/1981) e à Spirit of America Airlines (N726EEV, em 12/1986). Retornou à Evergreen em 06/1988, e retirado de uso em 1992. Desmontado em Marana, Arizona.


AERONAVES BOEING 727 OPERADAS PELA VASPEX:

PP-SFC: Boeing 727-264F, c/n 21071/1143. Primeiro voo em 09/06/1975, Entregue para a Mexicana, em 23/06/2975, como XA-FID e retirado de uso em 12/1992. Arrendado para o Expresso Aéreo em 05/1993, como OB-1537. Foi depois para a Ages Aviation, em 09/1995, e vendido para a Vasp, como PP-SFC, e convertido em cargueiro em 10/1996 para operar na VaspEx. Paralisado em janeiro de 2005, no Aeroporto de Recife, foi desmontado vários anos depois.

PP-SFE: Boeing 727-243F, c/n 22168/1725. Primeiro voo em 27/02/1981. Entregue para a Alitalia como I-DIRQ. Vendido para a People Express em 11/1984, como N584PE. A People Express fundiu-se à Continental Airlines em 02/2987, e a aeronave passou a voar para a Continental. Foi para a Vasp em 12/1996, como PP-SFE. Devolvido em 02/2001, foi para a VarigLog, como PP-VQV. Retirado de uso, e abandonado no Aeroporto do Galeão/RJ.

PP-SFF: Boeing 727-2J7F, c/n 20880/1037. Primeiro voo em 02/05/1974. Entregue à Air Jamaica como N129NA, em 07/11/1974. Em 12/1975, foi para a Mexicana, e em 1994, convertido para cargueiro, foi para a Aeroperu, sempre mantendo a matrícula americana. Em 06/1997, foi arrendado para a Vasp, como PP-SFF, para operar na VaspEx. Retomado pelo arrendador em 06/2000, retornou à Pegasus Avation. em 11/2000, foi para a VarigLog, como PP-VQU. Retirado de serviço em 07/11/2011, e paralisado no Aeroporto do Galeão/RJ.

PP-SFG: Boeing 727-2Q4F, c/n 22425/1698. Primeiro voo em 08/12/1980. Entregue à Mexicana como XA-MER em 22/12/1980. Arrendado à SARO entre 04/1993 a 12/1995. Depois foi a Qatar Airways, como P4-ABF, EM 08/1996. Registro alterado para A7-ABF. Em 03/1997, foi para WTC Wilmington Trust Company, como N63063, e convertido em cargueiro. Em 07/1997, foi para a Vasp, como PP-SFG, para operar na VaspEx. Paralisado em janeiro de 2005, com o fim das operações da Vasp. Atualmente abandonado no Aeroporto de São Luiz/MA.

PP-SFQ: Beoing 727-234F, c/n 22079/1588. Primeiro voo em 21/02/1980, entregue à Sterling Airways em 11/03/1980, como OY-SBE. Vendido para a AirVias em 02/1994, como PP-AIW. Operou por curto tempo na TABA, por arrendamento, de 08/1995 até ser vendida para o grupo Vasp, em 02/1996, operando no Lloyd Aéreo Boliviano como CP-2294. Retornou para a Vasp para ser convertido em cargueiro, em 1998, mas depois da conversão não voltou mais a voar. Nunca operou pela VaspPex. Canibalizado, foi desmontado em Congonhas, em abril de 2012.

A longa carreira dos helicópteros UH-1 na Força Aérea Brasileira

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A história dos helicópteros Bell UH-1 Iroquois na Força Aérea Brasileira está ligada diretamente ao serviço de busca e salvamento (SAR - Search and Rescue). que foi criado na FAB para que o governo pudesse atender aos requisitos da Convenção de Chicago de 1944, que resultou na criação da ICAO - International Civil Aviation Organization (Organização da Aviação Civil Internacional).
Bell UH-1H da FAB
Os documentos assinados pelo Brasil na Convenção de Chicago colocaram o Brasil na responsabilidade de atender todas as missões SAR sobre o seu próprio território e sobre uma imensa faixa do Oceano Atlântico Sul. Inicialmente,  a única aeronave que o Brasil dispunha para atender essa importante missão era um solitário Consolidatec PBY-5A Catalina, o FAB 6516. baseado em Belém/PA. Somente em 1950 foi criado  o Serviço de Busca e Salvamento Aeronáutico da FAB, vinculado à Diretoria de Rotas Aéreas do Ministério da Aeronáutica.

O serviço de busca e salvamento foi inicialmente restrito às tarefas de busca, com uso de aeronaves Boeing SB-17, e. depois, com os helicópteros Bell H-13. Em 1958, foram acrescentados à frota SAR os aviões anfíbios Grumman SA-16 Albatroz e os helicópteros Sikorki H-19, que integraram a primeira unidade SAR autônoma da FAB, o 3º/10º GAV, que tinha sido criado em 6 de dezembro de 1957.
O Sikorki H-19 foi o antecessor do SH-1D na FAB
Infelizmente, o número de helicópteros H-19 era muito pequeno para atender a imensidão do território e da faixa de oceano sob responsabilidade do Brasil, apenas 4 aeronaves, que foram reduzidas a 3, com a perda de um H-19 em 1961. Os H-13 tinham autonomia e capacidade muito pequena para atender tais missões. Isso forçou a FAB a buscar uma aeronave mais adequada e em número suficiente para atender à demanda do serviço SAR.

Em 1964, o Ministério da Aeronáutica encomendou, diretamente do fabricante Bell Helicopter Corporation, seis aeronaves Bell 205D, com motores a turbina. Tais aeronaves chegaram apenas em 1967, devido à grande demanda nos Estados Unidos por esses aparelhos, criada pela Guerra do Vietnam, onde esses helicópteros se tornariam lendários.
Bell SH-1D da FAB
Os Bell 205D receberam, na FAB, a designação SH-1D, e as matrículas 8530 a 8535. Não demorou muito para que essas máquinas entrassem em ação no 2º/10º Grupo.

De fato, ainda em 1967, um Douglas C-47, o 2068, desapareceu na floresta amazônica com 24 pessoas a bordo. O 2º/10º Grupo foi acionado, e as buscas, numa área difícil e inóspita, levaram 10 dias, até que os destroços da aeronave fossem localizados. O Bell SH-1D 8530 participou da missão resgatando os cinco sobreviventes e os 19 mortos no acidente. O evento foi tão marcante, na época, que o dia do resgate, 27 de junho, é lembrado pela FAB como o dia da Aviação de Busca e Salvamento.
SH-1D
O SH-1D teve, dessa forma, o seu batismo operacional, e sua carreira no SAR duraria mais de 50 anos. Estáveis e poderosos, esses helicópteros se mostraram extremamente úteis e confiáveis para atender o serviço SAR.
O 8541 em ação na Guerrilha do Araguaia, em Xambioá/TO
No final dos anos 60, o Governo brasileiro, então sob o regime militar, enfrentava dois focos de guerrilhas comunistas, em Registro/SP e Xambioá/GO, atualmente Tocantins. Sentido a necessidade de um vetor de combate anti-insurgência (COIN), o Ministério da Aeronáutica encomendou um lote de 8 aeronaves UH-1D para a missão, que receberam as matrículas FAB 8536 a 8543. Esses helicópteros foram inicialmente alocados na Base de Santos, no CIH - Centro de Instrução de Helicópteros, e no 5º EMRA - Esquadrão Misto de Reconhecimento e Ataque, também chamado de Esquadrão Pantera, baseado em Santa Maria/RS.
Para equipar outras unidades da FAB, o Ministério da Aeronáutica comprou 24 outros helicópteros, dessa vez do modelo UH-1H, que vieram usados, do US Army, mas que foram revisadas e estavam em ótimas condições gerais. Essas 24 aeronaves receberam, na FAB, as matrículas 8650 a 8673. Tais aeronaves foram alocadas a unidades EMRA em Belém, Recife, Santa Cruz e São Paulo.

Em 1º de fevereiro de 1974, um UH-1H da FAB, baseado em Santos, tripulado pelo Major-Aviador Pradaztki, pelo Tenente-Aviador Taketani e pelo Sargento Silva (mecânico), fez uma memorável missão sobre o Edifício Joelma, que sofreu um catastrófico incêndio. 
Um solitário UH-1H da FAB resgatou sobreviventes do teto do incendiado edifício Joelma
O UH-1H não era equipado para voo por instrumentos, e seus tripulantes subiram a enevoada Serra do Mar voando baixo. acima das rodovias, se orientado por elas até chegar a São Paulo. Foi quase uma missão de guerra.
O UH-1H pairando acima do teto do edifício Joelma
O UH-1H foi de fundamental importância nessa missão, pois era o único helicóptero presente que conseguia manter voo pairado sobre o edifício tomado pelas chamas. Os resgatados se agarravam ao esqui do helicóptero, e eram puxados para dentro com o auxilio da tripulação do helicóptero. O Joelma não tinha laje no teto, e não era possível pousar em cima dele. 
O UH-1H ao lado do edifício Joelma
Um helicóptero civil da Pirelli, pilotado pelo Comandante Carlos Alberto, o primeiro piloto de helicóptero do Brasil, conseguiu pousar numa pequena laje de um edifício ao lado, e também resgatou alguns sobreviventes. Infelizmente, não foi possível fazer uma missão de resgate como a que foi feita no incêndio do Edifício Andraus, dois anos antes, e a perda de vidas no Joelma foi muito maior, 188 mortos e mais de 300 feridos.

Em 1976. dois outros UH-1H foram adquiridos do US Army para repor perdas operacionais, e receberam as matrículas FAB 8674 e 8675.

Em 1979, para uniformizar a frota, todos os SD-1D e UH-1D foram convertidos para o modelo UH-1H, o que diminuiu os problemas logísticos relacionados, especialmente, com a manutenção dessas aeronaves.

Por volta de 1980, os UH-1H estavam espalhados em unidades da FAB em todo o país. O Ministério da Aeronáutica sentiu a necessidade de adquirir ainda mais exemplares, dessa feita 8 aeronaves que foram compradas da Heyl Ha' Avir (Força Aérea de Israel. Cinco dessas aeronaves eram de procedência americana, originalmente UH-1D, mas que já vieram convertidas para o modelo UH-1H, e três eram de procedência italiana, produzidas pela Agusta sob licença da Bell. Esses UH-1H receberam as matrículas FAB 8676 a 8683.
Os UH-1H comprados de Israel tinham atuado em combate, e muitos tinham buracos de bala de armas leves, que foram reparados pela aplicação de chapas sobrepostas, os famosos "bacalhaus".

Durante a sua vida operacionais, as células eram revisadas no Parque de Material Aeronáutico dos Afonsos (PAMA-AF), e os motores Lycoming T-53 eram revisados no Parque de Material Aeronáutico de São Paulo (PAMA-SP), no Campo de Marte.

Em 1997, 30 anos depois da primeira aquisição do modelo pela FAB, houve a última aquisição de aeronaves UH-1H. Essas aeronaves vieram da Alemanha e eram sobras do US Army. Foram matriculadas FAB 8694 a 8703. Essas aeronaves possibilitaram o uso de óculos de visão noturna, pois eram especialmente adaptados para essa função.
Os UH-1H foram usados nas mais diversas missões, entre as quais mapeamento nos programas RADAM (Radar na Amazônia), DINCART (Cartografia Dinâmica), além de auxiliar nos serviços de vacinação dos índios na Amazônia, auxílio em catástrofes naturais, demarcação de fronteiras, transporte de urnas eleitorais. Praticamente todos foram usados em missões SAR, em auxílio ao 2º/10º GAv, o Esquadrão Pelicano, por estarem em áreas mais próximos ao local dos sinistros.

Em 2006, a FAB renomeou os UH-1H como H-1H. Quase 40 anos já haviam se passado desde que o primeiro helicóptero do tipo começasse a operar no Brasil.
foto: Revista ASAS
O processo de desativação dos H-1H foi iniciado em 25 de junho de 2012, com a doação de quatro aeronaves para a Força Aérea Boliviana, onde deveriam servir para o combate ao narcotráfico.  A maioria das aeronaves ainda em serviço foi paralisada, restando apenas 5 aeronaves justamente no Esquadrão Pelicano, o 2º/10º GAv.
O FAB 8537 em Brasília
Duas aeronaves, inteiramente revisadas, foram, em 22 de novembro de 2014, para a Secretaria de Estado de Segurança Pública do Rio de Janeiro,  para serem usadas como helicópteros policiais. Essas aeronaves voaram na FAB como 8688 e 8695.
Foto: Revista ASAS
Em 18 de outubro de 2018, finalmente as últimas aeronaves foram definitivamente aposentadas. O H-1H 2703 fez o último corte do motor em Campo Grande no dia 22 de outubro, encerrando uma brilhante carreira de 51 anos de serviço, uma das mais longevas da Força Aérea Brasileira. As aeronaves remanescentes esperam sua destinação final.
Sem dúvida, os H-1H, carinhosamente chamados na FAB de "Sapão", marcaram gerações de oficiais e praças na FAB, ao longo dos 51 anos de carreira. Foram 68 aeronaves usadas ao longo desses anos, que eram ouvidas ao longe, devido ao característico barulho dos seus longos rotores bipás, Certamente, deixarão saudades. O 8668 foi entregue ao MUSAL - Museu Aeroespacial no Rio de Janeiro, em 2012, e está em exposição, dispensando restauração, pois estava em serviço antes disso.

O modelo teve uso civil no Brasil, embora fosse uma aeronave fabricada principalmente para uso militar.  A Líder foi um dos operadores, e tinha duas aeronaves modelo 205A-1.

O que está errado na aviação brasileira?

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O Brasil é um país de dimensões continentais e, portanto, precisa do transporte aéreo. O avião é uma ferramenta indispensável para o crescimento do país, ainda mais levando-se em consideração a ausência de trens de passageiros, e estradas de rodagem bem degradadas e sem segurança em grande parte do país.
(Logos Informação e Tecnologia)
Todavia, o setor aéreo, como um todo, tem sérios problemas no Brasil. A culpa de muitos desses problemas recai em grande parte sobre o governo, mas nem todos.

Talvez o pior problema seja a infraestrutura sobrecarregada. O Governo Michel Temer já deu ciência desse fato, por sinal incontestável, ao presidente eleito Jair Bolsonaro, que terá que lidar com o problema, de um jeito ou de outro.
Aeroporto de Brasília super lotado (UOL)
A falta de infraestrutura adequada tem potencial para, literalmente, estrangular qualquer retomada de crescimento econômico no Brasil. E a situação é extremamente grave. A criação ou reestruturação de aeroportos deveria ser regra, mas é exceção. Nos últimos 30 anos, apenas um grande aeroporto foi construído, o de Natal-São Gonçalo do Amarante. Alguns aeroportos regionais importantes também surgiram, como o de Maringá, no Paraná.
Aeroporto de Natal (Canindé Soares)
A reestruturação de aeroportos já existentes, infelizmente, se concentrou muito mais na ampliação dos terminais do que na infraestrutura de pistas, pátios e taxiways. Claro que a segunda pista do Aeroporto Internacional de Brasília foi muito bem vinda, assim como a nova pista do Aeroporto de Vitória, mas outros aeroportos muito importantes, como Curitiba e Porto Alegre, carecem de ampliação de suas pistas, hoje totalmente defasadas.
Aeroporto de Curitiba (Aeroin)
Curitiba é um caso emblemático: os passageiros avaliam muito bem o terminal de passageiros, a melhor avaliação do Brasil, mas algumas empresas operam aeronaves wide-bodies, como o Boeing 747-8 da Cargolux, e o McDonnell-Douglas MD-11 cargo da Lufthansa, entre outros, numa pista de, apenas, 2218 metros de extensão. Existe uma pista auxiliar, que, no entanto, não chega a ter 1800 metros. Levando-se em consideração a elevação de aproximadamente 3000 pés do aeroporto, o que deteriora o desempenho das aeronaves, essas pistas são totalmente inadequadas, e até mesmo inseguras para esse porte de avião.

O Aeroporto Salgado Filho, em Porto Alegre, também tem problemas parecidos, e com a desvantagem de ter apenas uma pista.
Aeroporto Salgado Filho

O nível de dificuldade para se construir ou ampliar aeroportos, no Brasil, é extremamente alto. Alguns são incompreensíveis, pois é mais fácil, por exemplo, desapropriar imóveis regularizados, do que remover "comunidades", na verdade imóveis irregulares de invasores de terrenos públicos ou privados, como a terrível Vila Dique, em Porto Alegre, onde o poder público conseguiu desalojar os moradores, mas nem todos. Por sinal, os moradores da Vila Dique jogavam o lixo dentro do terreno do aeroporto. Enquanto isso, a ampliação da pista vai sendo postergada ad aeternum. Ainda existe espaço para construir uma segunda pista, mas, à medida que passa  o tempo, a existência dessa área tende a ser ocupada de outras maneiras, o que torna uma segunda pista dificilmente factível.

Outra dificuldade é a Licença Ambiental. Desde 1986, qualquer atividade que possa afetar o meio ambiente deve ter um Estudo de Impactos Ambientais e um Relatório de Impacto no Meio Ambiente (EIA-RIMA) aprovado pelas autoridades ambientais. Obviamente, um aeroporto é uma atividade muito impactante, e, então, obter tal Licença Ambiental pode ser virtualmente impossível na maioria dos casos. Em Londrina, no Paraná, estava em estudo um novo aeroporto para complementar o atual, infelizmente cercado em três quartos pela cidade. A função de tal aeroporto seria atender a região metropolitana de Londrina, especialmente voos de carga, pois estaria melhor localizado, mas foi vetado, pois afetava, segundo alguns ambientalistas, uma "zona de amortecimento" de um parque ambiental, que nem fica tão perto assim da futura localização do aeroporto. E, fim de conversa, não haverá aeroporto novo.
Aeroporto de Londrina

É óbvio que os ambientalistas parecem não se preocupar tanto com as rodovias e seus caminhões, e nem com as lavouras, nem sempre bem conduzidas do ponto de vista ambiental. Atualmente, seus alvos principais são usinas hidrelétricas e aeroportos. Muitos desses ambientalistas sequer são autoridades, pois fazem parte de ONGs, mas são mais ouvidos que os desenvolvimentistas.

Outro problema, no Brasil, é o controle de tráfego aéreo. Esse serviço é prestado pelo Comando da Aeronáutica, através do DECEA - Departamento de Controle do Espaço Aéreo, que faz parte integrante da Força Aérea Brasileira. Embora o sistema de aviação civil tenha saído das mãos dos militares, no geral, com a criação da ANAC e da extinção do DAC - Departamento de Aviação Civil, o controle do tráfego aéreo permaneceu como os militares, pois o sistema foi construído, desde os anos 1970, para atender tanto a defesa aérea quanto o controle de tráfego aéreo.
(FAB)

O sistema de controle de tráfego aéreo está estrangulado, e no limite da sua capacidade operacional. Os governos pouco investiram no sistema nos últimos 30 anos, e pouca coisa mudou desde os anos 1980. O pouco que foi feito foi resultado do trabalho árduo e quase não reconhecido das equipes operacionais, quando deveria ter sido o resultado de uma política pública consistente, que, hoje, simplesmente, não existe.

De fato, mesmo que houvesse um incremento da infraestrutura, a engrenagem iria emperrar no controle. O sistema vive com restrições cada vez maiores, chegando ao ponto de ter que paralisar parte do tráfego, principalmente da aviação geral, para poder operar com segurança. Parece haver um pensamento doutrinário dos anos 1980, a despeito das enormes inovações tecnológicas que aconteceram desde então.
Antenas de localizador de ILS
Até mesmo a implantação de tecnologias antigas, como os sistemas de pouso por instrumento, o ILS, que já tem quase 80 anos de uso, parece sempre encontrar obstáculos. O custo é um dos piores, mas as normas técnicas para implantação desses sistemas, ainda muito eficientes, parecem ter sido escritas para os anos 1960, ignorando todas as grandes inovações tecnológicas que surgiram depois.

Por vezes, o sistema chega a impasses tamanhos, que é obrigado a se render. Foi o caso do controle de tráfego de helicópteros sobre a cidade de São Paulo. O número de aeronaves e o tráfego aumentou tanto, que hoje os helicópteros devem, literalmente, se lidar por conta própria, e com as responsabilidades daí decorrentes, sem a intervenção do controle.
Já que foi aberta essa brecha na legislação, o DECEA bem que poderia liberar as aeronaves da aviação geral, que voassem abaixo de certo nível, para voar sem controle, mantendo apenas contato entre elas, nas áreas onde estivessem voando, e ficando o Plano de Voo opcional. Por enquanto, isso parece estar muito distante.

Quando se fala de aviação geral, a impressão que se tem é que tal modalidade de aviação parece estar fadada à extinção. É claro que a grande maioria dos operadores da aviação geral usa aviões e helicópteros para o trabalho. Muitos são executivos, que constante viajam a trabalho e não conseguem ficar dependentes da aviação regular, sob pena de não conseguir manter o controle e a gestão dos seus negócios. Mas, o governo não parece pensar dessa forma.
De fato, a aviação geral parece estar sendo, literalmente, chutada para fora dos aeroportos, especialmente das grandes cidades. Quase não há espaço para a aviação geral operar em Congonhas, São Paulo, mas o uso do aeroporto executivo de Marte parece ser claramente desincentivado, pelo brutal aumento das tarifas aeroportuárias, e o próprio aeroporto parece estar fadado a ser fechado para sempre pelas autoridades. Parece que os governos, tanto federal quanto estadual, não entende que, expulsando os aviões da aviação geral, seus donos também vão embora, assim como os negócios e empregos que criaram na cidade. Quase ninguém usa uma ferramenta tão cara apenas para passear.
Aeroporto de Jundiaí
Em São Paulo, o aeroporto de aviação geral mais próximo, fora Congonhas e Marte, é Jundiaí, hoje sobrecarregado de operações e escolas, e que sequer tem torre de controle. Jundiaí fica a 57 Km de São Paulo, o que, francamente. desanima até o mais persistente executivo que se utiliza de avião próprio.

A ANAC, em relação ao antigo DAC, sem dúvida, teve algumas evoluções, mas, em muitos casos, estão criando obstáculos imensos para o desenvolvimento da aviação, tanto a comercial quanto a geral. Muitas normas editadas parecem ter sido escritas para uma realidade que não temos aqui no Brasil. Nesse caso, cabe uma parte da culpa aos operadores, pois normas importantes são normalmente colocadas em consulta pública pela agência, e a maioria dos operadores sequer chegam a dar a sua importante opinião.

Algumas normas parecem ter o dom de apenas perturbar os operadores e tripulantes. O preenchimento das cadernetas de registro de horas de voo é um verdadeiro tormento. A ANAC criou um sistema digital, mas ainda exige o preenchimento das cadernetas em papel. Pergunto: para que? O sistema é tão complicado e cheio de melindres que existem pessoas que se especializaram nisso, e cobram caro dos pilotos para fazer uma tarefa que poderia ser bem mais simples e fácil.

A instrução de voo também caminha mal. O serviço é prestado tanto pelos aeroclubes quanto por escolas privadas, mas o sistema tem muitas mazelas. O custo é muito alto, onerando os alunos, que não raro são obrigados a se desfazer até dos bens da família para completar os cursos. Ninguém fabrica aeronaves de instrução adequadas para o mercado brasileiro, e aeronaves usadas em outros países, como os Cessnas 172, tem custo de aquisição e operacional virtualmente incompatíveis para a nossa realidade.
Aeroclube de São Paulo

Como resultado, a maioria das escolas de aviação e aeroclube utiliza aeronaves de mais de 30 anos de uso, já muito desgastadas e com peças de reposição raras e caras, e alguns aviões chegam a ter mais de 70 anos de fabricação, como os velhos CAP-4 Paulistinhas, que hoje deveriam estar relegados ao status de relíquias, aeronaves históricas. Seria como se as auto escolas ainda usassem DKWs e Gordinis para dar aulas de direção para os seus alunos.
Piper fabricado em 1950, ainda na ativa

A ANAC parece incentivar esse status quo: herdeira das aeronaves cedidas em comodato pelo DAC aos aeroclubes, para uso somente na instrução, ainda cobra das instituições a manutenção das aeronaves  em uso, qualquer que seja a sua idade e condição. Parece que expressões e palavras como "vida útil", obsolescência, depreciação e falta de peças de reposição não fazem parte do vocabulário dos funcionários da ANAC, tampouco da legislação por ela publicada.

A ANAC chega ao ponto de cobrar a manutenção em voo de aeronaves que foram doadas pelo DAC aos aeroclubes há 30 anos. Tais aeronaves antigas, muitas delas dos anos 1940, aliás, não podem ser vendidas ou alienadas de qualquer forma, e quando um aeroclube fecha, as aeronaves são abandonadas, simplesmente.

Os manuais de curso da ANAC são "engessados", e francamente obsoletos em termos de didática e técnica de ensino, por qualquer parâmetro que se possa analisar. Muitas vezes, os programas são absolutamente impraticáveis, e são cumpridos apenas no papel, não por má fé, mas pela impossibilidade de cumprir os requisitos pedidos. Isso se aplica tanto aos cursos teóricos quanto aos práticos.

Alguns materiais são tão obsoletos, que possuem referência a sistemas há muito desativados, com os sistemas Ômega de navegação, que não existem mais, sua infraestrutura foi demolida, e sequer citam sistemas muito utilizados, como o GPS.

Os cursos de Mecânico de Manutenção de Aeronaves, assim  como as bancas avaliadoras da ANAC desses cursos, são baseados em um manual cuja última tradução e atualização ocorreu em 1978, 40 anos atrás. Existem muitas referências nesses manuais a respeito de aeronaves e sistemas que nem existem mais, ou existem como relíquias, como Douglas DC-3 e Boeing 707, e seus sistemas pra lá de antiquados. Existem manuais atualizados desse material, mas estão em inglês e a própria agência parece desincentivar seu uso, a julgar pelas questões aplicadas nas bancas examinadoras, ignorando a evolução tecnológica.

A documentação e a burocracia exigidos pela ANAC para as escolas e aeroclubes é de desanimar qualquer pessoa que se atreva a operar essas empresas. Os aeroclubes estão minguando, e os poucos sobreviventes lutam para sobreviver. Para dar um exemplo das exigências absurdas, um instrutor de simulador básico de voo por instrumentos é obrigado a ter habilitação técnica e exame de saúde válidos para dar instrução, o que afasta experientes comandantes de jato que se aposentaram ou perderam os exames de saúde por alguma doença. Pergunto: para que isso?

Se um dia a demanda por tripulantes aumentar, vai faltar gente para trabalhar, depois que for superada a demanda reprimida pela crise econômica atual.

Manter e operar uma oficina de manutenção aeronáutica exige, então, que seu operador seja meio masoquista. A manutenção pode ser feita de qualquer jeito, mas os inúmeros documentos exigidos tem que estar absolutamente em ordem, pois a grande maioria dos fiscais da ANAC nem chegam perto das aeronaves, querem só ver papéis. A adoção de uma nova legislação, o RBAC 145, torna os processos tão complicados e custosos, que muitos proprietários optam por fechar seus estabelecimentos e mudar de ramo.

Por fim, a aviação comercial não fica isenta de turbulências. Muito pelo contrário. Embora a maior parte da atuação da ANAC diga respeito, prioritariamente, ao serviço de transporte aéreo comercial, as empresas aéreas estão entre os elos mais vulneráveis do sistema. Recentemente, a empresa Avianca Brasil foi obrigada a entrar com um pedido de recuperação judicial, pois já estava inadimplente com fornecedores e lessors de aeronaves, que inclusive chegaram a retomar algumas delas por falta de pagamento do leasing. O caso parece pontual, mas as aparências enganam.
Airbus da Avianca Brasil

Um dos maiores custos da aviação comercial, no Brasil, combustível, sofre muito com a cobrança desigual, e, muitas vezes, abusiva, de ICMS sobre o preço do querosene. Alguns estados da Federação cobram ICMS tão alto, que as empresas enchem o tanque para a ida e para a volta, evitando abastecer a aeronaves nesses estados. Por fim, acabam por encerrar ou reduzir drasticamente as operações nesses estados, e quem perde é o usuário de transporte aéreo, e o próprio estado.

O governo e a ANAC não têm nenhuma política voltada para o transporte aéreo regional. Com os grandes aeroportos no limite da capacidade, linhas regionais operando ponto a ponto, usando aeronaves turboélice de pequena capacidade, seriam uma ótima solução, mas não existe incentivo e nem uma política consistente para operações de aeronaves de baixa capacidade, e a maioria das grandes empresas prefere operar jatos de médio porte e fazer escalas e conexões nos já abarrotados aeroportos das capitais e grandes metrópoles do interior, o que só piora a situação nesses aeroportos.

O novo governo, do Presidente Jair Bolsonaro, promete algumas ações, mas mesmo assim algumas são polêmicas e altamente questionáveis. Uma delas é a privatização da maioria dos aeroportos comerciais. As concessões serão dadas por lotes de aeroportos, que incluem aeroportos altamente rentáveis e aeroportos deficitários. No caso das ferrovias, cuja privatização aconteceu no tempo no Presidente Fernando Henrique Cardoso, as empresas concessionárias "ficaram com o filé e jogaram fora o osso", e existe a preocupação de que isso ocorra também com os aeroportos. Algumas fontes do governo afirmam que a estatal INFRAERO seja extinta, no máximo, em três anos, o que também é polêmico e de resultados imprevisíveis, já que, apesar de algumas mazelas, a INFRAERO tornou a administração dos aeroporto mais técnica e mais profissional.

A abertura do mercado doméstico para empresas estrangeiras já começou, na prática, já que o governo Michel Temer permitiu capital 100 por cento estrangeiro nas empresas aéreas nacionais. O resultado disso é absolutamente imprevisível. O operador nacional fica em desvantagem ao concorrer com gigantes estrangeiros, que podem fazer práticas proibidas, como o dumping, até quebrar a concorrência. Somos obrigados a considerar que, no Brasil, o crime compensa... Por outro lado, isso pode favorecer o consumidor, mas na prática as consequências disso são absolutamente imprevisíveis.

Esse artigo expressa a minha opinião pessoal, baseada na minha experiência como ex-dirigente de aeroclube e professor de aviação civil, além de ser grande estudioso no assunto. Também vale a minha experiência como piloto e passageiro. Vou assinar o artigo, embora isso não seja usual nos meus artigos nesse blog, que publico há nove anos. Aceito correções, caso tenha cometido algum erro e também opiniões contra e favor, que podem ser colocadas nos comentários, sempre mantendo o devido respeito. Me reservo ao direito de replicar os comentários. Muito obrigado.

JONAS LIASCH















Os Douglas DC-6 da REAL, VARIG e FAB.

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Em 1961, após um longo tempo de prosperidade na aviação brasileira, nuvens negras se avizinhavam no horizonte. Ainda assim, as várias empresas aéreas brasileiras levavam a frente seus planos de expansão, e a REAL não foi exceção.
Rara foto colorida do DC-6B, nas cores da REAL
Embora a REAL estive em sérios apuros financeiros, com grandes prejuízos acumulados ao longo de 1960, manteve seus planos de adquirir jatos, os Convair 880/990, e grandes turboélices quadrimotores, os Lockheed Electra.
Ainda com a matrícula original dinamarquesa, o primeiro DC-6B da REAL, parcialmente pintado nas cores da empresa e um tanto fora do padrão
No início de 1961, a REAL fez sua última aquisição de aeronaves, um lote de cinco aeronaves Douglas DC-6B, exclusivos para passageiros. Eram aeronaves usadas, que vieram da empresa sueca SAS - Scandinavian Airlines System, e que voaram as pioneiras rotas polares regulares, através do Ártico, a partir de 1957, e da Northwest americana.

Os aviões foram matriculados no RAB como PP-YSI, PP-YSJ, PP-YSL, todos ex-SAS, e como PP-YSM e PP-YSN, ex- Northwest. Essas matrículas foram mantidas após a compra da REAL pela Varig.
Destinados a voar rotas domésticas de alta densidade, os DC-6B da REAL eram configurados para levar 80 passageiros, em configuração geral 3+2.  Isso fazia sentido, já que a REAL era a empresa mais "popular" da época. No geral, as poltronas eram separadas longitudinalmente entre 36 e 38 polegadas, configuração apertada para a época, mas muito mais espaçosos que os aviões atuais.
Painel de um DC-6B americano
Os DC-6B chegaram a operar para a REAL, ao invés dos Convair 990 e Electras, mas por muito pouco tempo. O recém empossado Presidente da República Jânio Quadros recomendou uma "racionalização" das linhas aéreas tão logo assumiu, e a Varig foi "convidada" pelo DAC a assumir 50 por cento do Consorcio REAL-Aerovias, o que aconteceu a 2 de maio de 1961. Em agosto, a Varig acabou adquirindo o restante, e a REAL acabou.
No negócio da aquisição da REAL, nasceu a maior empresa aérea brasileira. Mas, o DAC, em contrapartida, empurrou toda a enorme malha de linhas domésticas para a Varig, que foi obrigada a aproveitar a maior parte da heterogênea frota da REAL para o serviço.
O PP-YSN
Os DC-6B foram muito úteis  para essas rotas. Eram aeronaves fabricadas entre 1952 e 1953, mas tinham motores e hélices mais confiáveis que as dos Super Constellation.  Os aviões foram colocados em serviço principalmente nas linhas que ligavam Rio de Janeiro, São Paulo, Curitiba e Porto Alegre, enquanto os Constellations, e, depois, os Electras, voavam mais para as regiões Nordeste e Norte do país. Mas, os DC-6B da Varig, em certos momentos, voavam entre todas as principais capitais, de norte a sul
DC-6B pronto para o embarque, no Santos-Dumont, em 1966
Os DC-6B cumpriram bem o seu papel, durante o seu período na Varig, e voaram até 1968 sem acidentes. Pressurizados e relativamente rápidos, eram confortáveis, mesmo em configuração de alta densidade. Os pilotos apreciavam a qualidade de voo dos aviões, e os consideravam muito confiáveis. De fato, os DC-6 foram um dos aviões comerciais com motores a pistão de sobrevida mais longa no mundo.

Quando desativados pela Varig, os aviões, todos, estavam ainda em muito boas condições, e a FAB adquiriu todos os 5. 
O FAB 2414 foi perdido num acidente em Manaus, em 1971
A FAB carecia de aeronaves de transporte de longo alcance, na época. Estava envolvida com as missões de paz na Faixa de Gaza e na República Dominicana, e utilizando os já muito cansados Boeing SB-17G, em detrimento da sua missão original, como aeronaves de aerofotogrametria e busca e salvamento. A FAB também precisava de aeronaves para manter suas linhas do Correio Aéreo Nacional para as Regiões Norte e Nordeste.

Os aviões, agora redesignados como C-118, e a FAB trocou suas matrículas para 2412 (ex-PP-YSI), 2413 (ex-PP-YSJ), 2414 (ex-PP-YSL), 2415 (ex-PP-YSM) e 2416 (ex-PP-YSN).

Sem porta de carga e configurados apenas para o transporte de passageiros, os C-118 foram alocados ao 2º/2º Grupo de Transporte, baseado no Galeão, no Rio de Janeiro.
O FAB 2415 já desativado e oferecido no mercado, no Galeão
Na FAB, sem contar as missões em prol das ações internacionais em Gaza e República Dominicana, os C-118 foram empregados como aeronaves de passageiros do Sudeste para o Norte, principalmente em prol do Projeto Rondon. Nessa época, era muito comum a FAB transportar passageiros civis para o Norte, em prol dos projetos de desenvolvimento da Amazônia.
O FAB 2416 cumprindo uma missão de transporte na Argentina, em 1972
Em 28 de abril de 1971, o C-118 2414 sofreu o único acidente com Douglas DC-6 no Brasil: logo após decolar de Manaus, um dos motores do lado direito, o #3, apresentou forte vibração, e a tripulação optou por cortá-lo, e retornar. Durante a corrida de pouso, feito com sucesso, o motor avariado começou a pegar fogo, e a aeronave foi evacuada. Todavia, a aeronave acabou destruída. Apesar do pronto atendimento, 16 ocupantes acabaram por perder a vida nesse acidente.
Um dos ex-C-118 da FAB (PP-YSM) na Fuerza Aérea Paraguaya
Em final de carreira, e já com muitas dificuldades de suprimento, a FAB paralisou o 2413, que foi usado como fonte de peças de reposição para os 3 aviões restantes, que foram sendo paralisados durante o início dos anos 70. Por fim, os 3 aviões foram colocados á venda no Galeão, e suas funções foram assumidas pelos Avro C-91, e, quando necessário, pelos Lockheed C-130.
À esquerda da foto, os três DC-6B e um Electra podem ser vistos, provavelmente já paralisados, em 1991
Em 1975, os 3 C-118 foram vendidos para a Força Aérea do Paraguai, e o que restou da célula do 2413 foi transformado em sucata. Todos operaram no Paraguai por muito tempo, mas, por volta de 1991, já pareciam estar inoperantes e estacionados em uma área gramada do Aeroporto de Assunção, sem motores, embora oficialmente ativos. Em 2001, foram definitivamente retirados de serviço e desmontados.
O cemitério dos DC-6B no Paraguai, nos anos 90
Infelizmente, nenhuma dessas aeronaves foi preservada.

AERONAVES DOUGLAS  DC-6B/C-118 QUE OPERARAM NA REAL, VARIG E FAB (1961/1975)

PP-YSI (FAB 2412): c/n 44166/416. Fabricado em 1953. Entregue novo à SAS - Scandinavian Airlines System, como OY-KMI. Vendido à REAL-Aerovias em 1961, como PP-YSI, passou para a Varig em agosto de 1961 com todo o acervo da empresa. Retirado de serviço em 1968, vendido para a FAB, como 2412. Vendido depois para a FAP - Fuerza Aérea Paraguaya, em 1975, como 4003 - T-91.  Abandonado e depois desmanchado no Aeroporto Silvio Pettirossi, em Assunção, Paraguai, m 2001.

PP-YSJ (FAB 2413): c/n 43745/296. Fabricado em 1952. Entregue novo à SAS - Scandinavian Airlines System, como LN-LMO. Vendido à REAL-Aerovias em 1961, como PP-YSJ, passou para a Varig em agosto de 1961 com todo o acervo da empresa. Retirado de serviço em 1968, vendido para a FAB, como 2413. Retirado de serviço para canibalização no início dos anos 70.

PP-YSL (FAB 2414): c/n 43746/297. Fabricado em 1952. Entregue novo à SAS - Scandinavian Airlines System, como LN-LMP. Vendido à REAL-Aerovias em 1961, como PP-YSL, passou para a Varig em agosto de 1961 com todo o acervo da empresa. Retirado de serviço em 1968, vendido para a FAB, como 2414. Acidentado com perda total em Manaus/AM, com 16 vítimas fatais, em 8 de abril de 1971.
Cemitério dos DC-6B no Paraguay
PP-YSM (FAB 2415): c/n 43822/291. Fabricado em 1952. Entregue novo à Western Airlines, em 11/1952 como N91302. Retirado em 09/1958, foi para a Northwest com o mesmo prefixo. Vendido à REAL-Aerovias em 08/1961, como PP-YSM, passou para a Varig em agosto de 1961 com todo o acervo da empresa. Retirado de serviço em 1968, vendido para a FAB, como 2415. Vendido depois para a FAP - Fuerza Aérea Paraguaya, em 1975, como 4001 - T-87.  Retirado de uso em Assunção, Paraguai, 2001.
PP-YSN (FAB 2416): c/n 438224/299. Fabricado em 1952. Entregue novo à Western Airlines, em 12/1952 como N91304. Retirado em 09/1958, foi para a Northwest com o mesmo prefixo em 1959. Vendido à REAL-Aerovias em 08/1961, como PP-YSN, passou para a Varig em agosto de 1961 com todo o acervo da empresa. Retirado de serviço em 1968, vendido para a FAB, como 2416. Vendido depois para a FAP - Fuerza Aérea Paraguaya, em 1975, como 4002 - T-89.  Retirado de uso e desmontado em 2001.
Os restos dos DC-6B aos poucos foram desaparecendo






A vida de um piloto de linha aérea

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Richard Fernandes

Manhã gelada de outubro, são 5 horas da manhã, no charmoso bairro de Vitacura, em Santiago do Chile. Me levanto, e me preparo para meu terceiro dia de trabalho, desde que deixei minha casa no Paraná. 
Antes de pousarmos aqui, na tarde de segunda-feira, iniciei o dia cedo, no domingo, indo de Guarulhos-SP a Campo Grande-MS, voltando a Guarulhos, e encerrando em Foz do Iguaçu-PR.

Ontem, foi Foz do Iguaçu à Guarulhos, para mais tarde ir a Santiago do Chile. Muita turbulência para alcançarmos nosso destino, devido à linha de instabilidade, que praticamente bloqueava nosso caminho sobre território argentino.

Agora, no check-out do hotel, vejo o simpático José, cidadão chileno, que fala muito bem o português, nos aguardando com sua van. Nessa hora da manhã, é um percurso de 30 minutinhos até o Aeroporto Internacional Arturo Merino Benitez. Na chegada, cumprimos todos os procedimentos padrão, assim como os passageiros: imigração, alfandega, raio-x e tanto os pilotos quanto os comissários despacham suas bagagens.

Encontramos o DOV (Despachante Operacional de Voo) na porta da aeronave, para um briefingsobre nossa viagem. Ele é responsável pela confecção do nosso planejamento de voo, dados como meteorologia ao longo da rota, possíveis aeroportos de alternativa, consumo estimado de combustível, cálculo de peso para decisão dos níveis de altitude que vamos voar e estudo dos ventos para, finalmente, decidir qual será a melhor rota. 
Temos, basicamente, três para São Paulo, e são primariamente decididas baseadas no nível de turbulência que possivelmente encontraremos ao cruzarmos as Cordilheiras. Esses dados são colhidos pela diferença de pressão que se tem entre Santiago e Mendoza. Quanto maior essa diferença, maior será a possível turbulência. Esse fenômeno único é conhecido por Ábaco de Harrison.

Temos 156 convidados essa manhã, sendo 12 na classe executiva, muito bom para uma aeronave com 154 assentos. Já na aeronave, precisamos de pelo menos 30 a 45 minutos para prepará-la. Os comissários preparam e checam todos os itens de segurança, limpeza e alimentação, antes que se inicie o embarque. Enquanto isso, nós temos uma breve conversa com o mecânico a respeito da situação da aeronave (um pneu foi substituído durante a noite), checamos todos os itens de segurança, verificamos se estão a bordo e adequadamente funcionando.
Uma inspeção visual externa é executada pelos pilotos, além daquela já feita pelo mecânico, mesmo lá fora, a uma temperatura de 2 graus e um vento cortante. De volta ao cockpit, inicia-se a programação dos computadores de bordo, onde toda a documentação entregue pelo DOV é inserida e conferida com o auxilio dos mesmos. 
Ouço, por frequência especifica de rádio, as informações meteorológicas e a pista em uso atual do aeroporto. Um briefing completo entre os pilotos é executado, itens como procedimento de subida, desaceleração, meteorologia, peso, bem como os briefings em caso de emergência são devidamente comentados e memorizados. 

A aeronave está perfeita, abastecida com 14.100 kg, embarque dos passageiros concluído, a carga nos porões devidamente acomodadas e as portas são fechadas. Inicia-se mais uma jornada técnica e divertida até nosso destino.


Check lists(lista de verificações) lidos e conferidos, e os motores são acionados. O mecânico sinaliza lá embaixo que tudo está OK, e o controle de solo nos autoriza o táxi até a cabeceira 17 direita. 

Durante essa lenta rolagem, mais alguns itens são conferidos, como situação dos controles de voo, posição de flap para decolagem, freios, e mais leitura de check-list. A visibilidade está muito boa e pontualmente, às 08 hs,  os motores são acelerados a uma potência aproximada de 95 por cento, e, ao atingimos 156 nós (289 km/h), deixamos a charmosa cidade para trás.


À esquerda, já contemplo a monstruosa altitude dos Andes, e após 13.000 pés (4.000 metros) de altitude, iniciamos nossa primeira curva à esquerda, na saída ALBAL UNO. Ainda em acentuada ascensão os motores fortes soam como música aos meus ouvidos, a aeronave se acelera para 250 nós (463 km/h), e posso admirar a beleza exuberante dos Andes à minha frente. E, para completar o show privilegiado de imagens, o nascer do sol, em mais alguns minutos, bem de frente à nossa cabine.

Estamos no rumo do território argentino e, nesse procedimento de subida, alguns itens extras de segurança são tomados, como manter os avisos de cintos de segurança ligados, comentar e seguir rigorosamente os procedimentos, em caso de uma despressurização ou falha em um dos motores, por exemplo, afinal estamos cruzando montanhas altíssimas, temos a segunda mais alta do mundo, o Aconcágua, 22.841 pés (6962 m), Cerro Colina 17.667 pés (5.353 m), Tupungato 21.555 pés (6.531 m), Maipo 17.270 pés (5.756 m) e, para completar a ideia, estamos ascendendo à 35.000 pés (10.606 m), mantendo velocidade de 300 nós (555 km/h).
Agora, com as montanhas à esquerda, e quinze minutos de voo, somos instruídos a chamar Mendoza, controlador que acompanhará nosso voo pela tela radar até próximo à divisa com a Argentina. Enquanto isso, os procedimentos burocráticos e técnicos são executados, a companhia é informada, via rádio, de nossa decolagem e hora prevista de chegada à São Paulo, nossos cálculos de navegação apontam que, para esse voo, estimamos 03 h 10 min até o destino, mantendo velocidade média de 540 nós (1000 km/h), em relação ao solo, o qual consumirá 8.386 kg de querosene de aviação ,aproximadamente, considerando um vento médio de cauda (nos “empurrando”) de 63 nós (117 km/h) e uma temperatura média externa de -51 graus Celsius, isso mesmo, bem gelado lá fora, já que se perde uma média de 2 graus C a cada 305 m que subimos. 

Devemos chegar a Guarulhos com aproximadamente 5.500 kg de combustível, já que, pelo regulamento, devemos ter o suficiente para chegarmos, ainda, a um aeroporto de alternativa, no nosso caso o Galeão no Rio de Janeiro, e ainda fazermos uma espera. 
Para que uma aeronave possa ser despachada, no mínimo dois aeroportos são escolhidos como alternativa, em caso de mau tempo ou fechamento do aeroporto de destino.

Atingimos nosso nível de voo de cruzeiro no horário previsto, e consumimos 2.480 kg de querosene e, no momento, estamos com pouco menos de 70.000 kg de peso total.


 Passando agora a posição TERON, 35 minutos mais tarde, passamos a nos comunicar com o controle de Córdoba, já no território Argentino. Estamos voando na aerovia UT650 até a cidade mencionada, depois com uma leve curva a direita ingressaremos na UM400, e nela permaneceremos até próximo a cidade de Santos em SP. 
Aerovias são nossas “rodovias aéreas”, com pontos e nomes definidos, as quais temos em nosso banco de dados, bem como mapas (chamadas de cartas) em papel, o qual conferimos nossa posição a todo instante.

Agora são 08 h 50 min da manha, o sol está muito brilhante à nossa frente, sobrevoamos Córdoba e ingressamos na aerovia mencionada. Nossos cálculos indicam um consumo de 3.470 kg de combustível, e temos um vento médio de 190 km/h nos ajudando (de cauda). Estamos degustando nosso café da manha, gentilmente servido pelo nosso chefe de equipe e, ao mesmo tempo recebemos informações de que temos tempo bom em Guarulhos

, temperatura de 21 graus C e ventos favoráveis para pouso na pista 09 direita.
 Ao contrário do que muitos imaginam, embora a aeronave navegue o tempo todo com o piloto automático ligado, aliás, isso não é uma opção e sim um regulamento obrigatório, trabalhamos o tempo todo e pouco se olha para fora. Estamos agora organizando nosso cockpit, guardando as cartas de subida que utilizamos em Santiago, bem como as de procedimentos de emergência. O livro de bordo é aberto, e são anotados os dados do voo, bem como os nomes de todos os tripulantes a bordo.

Durante todo o tempo, temos que ter em mente qual procedimento tomar, e qual será o aeroporto mais próximo para se pousar, em caso de necessidade, lembrando que isso pode ser um passageiro ou um tripulante passando mal por exemplo, nem sempre é uma emergência operacional da aeronave. 

Lembrando que, para a decisão de tal pouso, o aeroporto escolhido deve comportar o peso de nossa aeronave, bem como deve possuir infraestrutura mínima, como escadas para o desembarque, por exemplo.

Atingimos a posição SIKOB, e chamamos o centro Resistência, controlador que nos observará nos radares até a divisa brasileira. Estamos mais leves, com 67 toneladas, 9.500 kg nos tanques e solicitamos ascensão ao nível 370 (37.000 pés, 11.212 m), já que aeronaves jato tem melhor eficiência a altas altitudes. 

Para entenderem melhor, vamos dizer que iniciamos a jornada em níveis mais baixos de altitude, e conforme vamos queimando querosene, estaremos mais leves e vamos solicitando níveis de voo mais altos, ao longo da rota. São 11 h 18 min, e aparece mais um presentinho para as nossas vistas, um Boeing 777 cruza à 330 m acima da nossa aeronave, em sentido contrário, na mesma aerovia, deixando sua esteira de condensação desenhada nos céus. Essa esteira é comumente confundida com fumaça pelos leigos, mas na verdade é uma nuvem formada quando o gás quente do escapamento dos motores se condensa em umidade sólida, em baixíssimas temperaturas. Claro que esse belo momento foi fotografado e filmado, já que os colegas até acenderam os faróis.

Outro detalhe, curioso, é que devemos tomar muita água durante nossas jornadas, visto que temos umidade relativa a aproximadamente 10 por cento na cabine, bem como pressão reduzida a 7100 pés, ou seja,  sensação de estarmos numa montanha e, sendo assim, vamos nos hidratando.

Agora são 09 h 30 min, avisto a cidade de Reconquista, na Argentina, logo à esquerda da rota e a cidade de Monte Caseros, no Uruguai à direita. Consumimos 5.300 kg de querosene, 200 kg a mais do previsto, devido às mudanças de vento, fato considerado normal e previsto. Com esse céu maravilhoso, vejo o contorno do rio Paraná dividindo a Argentina e o Uruguai e a visão vai até próximo a tríplice fronteira com o Brasil, dezenas de quilômetros à direita da rota.

São 09 h 42 min, cruzamos a fronteira com o Brasil e contatamos o centro Curitiba, órgão que estará conosco até próximo a São Paulo. Somos instruídos a trocar o código transponder para 3430, código esse que os controladores seguem no radar. O transponder é um equipamento que emite sinais numéricos para os controles de solo, bem como para outras aeronaves, sendo assim, também vemos no nosso radar outras aeronaves voando a nossa volta.

O centro Curitiba nos informa de tráfego logo atrás, voando na mesma aerovia com destino a Campinas e não devemos reduzir nossa velocidade. Trata-se de aeronave americana da Fedex (cargueiro), que decolou de Santiago, instantes depois de nós.

Quando passamos a falar com Curitiba, não mais se torna mais necessário a comunicação em inglês, já que estamos em território nacional. Visto que é a língua oficial na aviação, todas as aeronaves do planeta em território estrangeiro são obrigadas a utilizar-se do inglês técnico.


Sistemas da aeronave verificados novamente, motores operando na faixa verde, sem vibração e com níveis adequados de óleo. Sistema de pressurização OK, altitude de cabine em 7100 pés (2,151 m), isso significa que seu organismo sente que está a essa altitude. Sistema elétrico perfeito, geradores 1 e 2 fornecendo 115 V a 400 Hz, sendo utilizado 28 e 20 por cento de carga respectivamente. Essa aeronave possui 2 baterias de 24 V DC e estão recebendo carga retificada e com 47 A e 39 A respectivamente. Os 3 sistemas hidráulicos, responsáveis por auxiliar as superfícies de controle e trem de pouso (e outros), se comportam muito bem e estão pressurizados a 3000 psi cada. 
Os 5 tanques de combustível estão devidamente balanceados, com 710 kg de querosene nas pontas das asas, 2800 kg nas sessões intermediárias e, no momento, o tanque central está vazio. O sistema de ar condicionado está calibrado para fornecer confortáveis 22 graus Celsius nas 3 sessões na aeronave, e temos 1200 psi de pressão nas garrafas de oxigênio, aquelas que suprem as máscaras utilizadas em caso de despressurização. Isso dá um estimado de 15 min de utilização, o suficiente para a aeronave atingir uma altitude segura, onde se possa respirar sem as mesmas (geralmente 10.000 pés, 3.000 m).

Embora qualquer divergência venha a ocorrer, nós receberemos um alerta imediato, todos os parâmetros são observados, a fim de detectarmos algo fora dos padrões com antecedência.


São 10 h 40 min, consumimos 7.800 kg e temos ainda 6.100 kg. Estamos a 80 milhas (148 km) para iniciarmos a descida, 150 milhas (278 km) para o destino, quando ouço pelo rádio as informações meteorológicas, atualizadas, do aeroporto de Guarulhos. Temos tempo bom, 24 graus C e ventos favoráveis para pouso na 09 direita. 
Preencho nossa “landing computation”, no papel e em nossos computadores (dados meteorológicos e procedimentos que serão utilizados na aproximação e pouso). Nosso peso de pouso será de 62.900 kg, e nossa alternativa permanece o aeroporto do Galeão, no RJ, onde também temos tempo bom. Mais um briefing completo é feito, procedimentos utilizados na descida, aproximação e pouso, pista seca, frenagem, contingências em caso de emergência, e o que fazer em caso de arremetida (aproximação perdida) são comentados. 

Como observado, tudo planejado com antecedência, e temos agora em mente tudo que irá acontecer até o estacionamento nos portões. Iniciamos a descida as 10 h 47 min, 110 milhas (203 km) para o destino, vamos ingressar no procedimento STAR RONUT 1 para o ILS C2 da pista 09 direita (segue-se pelas cartas e computadores), o controle São Paulo nos instrui a reduzirmos nossa velocidade para 250 nós (463 km/h), descendo até 21.000 pés (6.363 m), devido ao grande congestionamento na chegada a São Paulo. 

O chefe de equipe nos informa que a cabine de passageiros está pronta, todos estão bem alimentados, alguns dormem, as vendas dos produtos do Duty Free estão encerradas e os procedimentos de segurança checados. Uma despedida formal via rádio é feita aos nossos passageiros, agradecendo por estarmos juntos nessa manhã. 

Avisto agora um grande congestionamento de navios para atracar no porto de Santos, já que temos boa visibilidade no litoral paulistano, embora a região do Grande ABC esteja encoberta. Contato a empresa via rádio, informando nosso horário de pouso, e solicitando duas cadeiras de roda para desembarque de 2 de nossos convidados. A empresa nos informa que a próxima programação dessa aeronave será um voo para Montevideo, e nós vamos aguardar 2 horas para então prosseguirmos em outra aeronave até Porto Alegre-RS. 
Agora cruzando a 10.000 pés (3.000 m), aviso de atar cintos ligados, faróis externos também ligados e entramos na fase de voo chamada cockpit sterile, onde é proibida qualquer conversa que não seja sobre nosso procedimento. Tal procedimento termina somente quando a aeronave estiver estacionada no portão. Somos o oitavo na fila para pouso, e a velocidade bem reduzida agora para o sequenciamento, 180 nós (330 km/h), 7.000 pés (2.121 m) de acordo com a controladora do controle final de Guarulhos. Sobrevoamos a Serra da Cantareira, e estamos cumprindo o “approach check list”, quando somos instruídos a curvar a esquerda, proa 140 graus, último vetor para alinharmos com a reta final para a pista 09 direita.
Temos a pista à vista, rodovia Ayrton Sena com tráfego intenso e, às 11 h 28 min, o pouso macio e seguro, seguido da desaceleração da aeronave. Onze minutos depois estamos estacionados, cumprindo os cheques para abandono, como é conhecido em nossa linguagem. Tudo deve estar em ordem, limpo e dentro das normas de segurança para que a próxima tripulação assuma a nave. 

Ao desembarcarmos, assim como os passageiros que chegam de um voo internacional, cumprimos as regras alfandegárias e de imigração. Após os trâmites, vou almoçar, me dirigir ao escritório da empresa e me preparar para, mais tarde, às 14 h 35min, cumprir outro voo, agora para Porto Alegre-RS. Como relatado, uma hora antes da decolagem, vamos consultar os dados meteorológicos, dados gerais do voo e da aeronave, e tudo se repetirá até a parada nos portões do aeroporto gaúcho, por volta das 16 h 30min. 

Com sorte, ainda vou curtir a vista das Serras Gaúchas e avistar as cidades de Canela e Gramado, que gosto muito, e aproveitando o horário de verão, fazer uma corrida no parque Farroupilha. Amanhã, ainda na madrugada, tudo recomeçará, teremos Porto Alegre-Guarulhos, Guarulhos-Porto Seguro-BA, retornando a São Paulo às 17 h 00 min. 
Posso imaginar o trânsito no final da tarde na capital paulistana, afinal vamos retornar a Congonhas, nossa base. Até que nossa missão de seis dias termine, ainda teremos Congonhas-Brasilia, Brasilia-São Paulo, São Paulo-Campo Grande (dormiremos nessa cidade), chegando a meia noite. Na tarde de sexta-feira, Campo Grande-São Paulo, São Paulo São José do Rio Preto, São José do Rio Preto- São Paulo finalizando às 22 h 30 min.

Quando em São Paulo, dividimos apartamento com outros pilotos bem próximos ao Aeroporto, já que nossas residências ficam em outros estados, Brasil afora. 

Sábado, vou frequentar sala de aula o dia todo, e, finalmente, à noite, volto ao meu lar no Paraná. E os leitores devem estar se perguntando, quantos dias de folga? A resposta é: apenas um dia, isso mesmo, um dia apenas, e segunda-feira saio para mais uma missão de quatro dias.

Espero que tenham gostado do artigo.


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O autor do artigo, RICHARD FERNANDES, é comandante de Airbus A320

Os Boeing 757-200 da Varig: uma história de sucesso

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 O 757 foi um projeto criado pela Boeing para substituir o seu já veterano Boeing 727,   que já dava sinais de cansaço, e consumia muito combustível, apesar das sua excelentes qualidades.


Ao mesmo tempo em que desenvolvia o 757, a Boeing projetava uma "resposta" ao Airbus A300, o primeiro avião de fuselagem larga bimotor, inicialmente desdenhado, mas que se provou ser um grande sucesso de mercado. Esse avião foi denominado como Boeing 767.

Interior do PP-VTQ

As duas aeronaves acabaram sendo desenvolvidas em conjunto, com vários pontos em comum, como a configuração geral e os cockpits tão parecidos que a qualificação era comum para os dois tipos.

Cockpit do PP-VTQ

O Boeing 757, depois de um início de carreira meio lento, acabou obtendo boas encomendas e foi um sucesso. o 757 não é um 737 melhorado, e sim um avião de desempenho muito melhor, ainda que usasse a mesma seção de fuselagem do 737. Tem alcance muito maior que o 737, e capacidade de fazer voos internacionais sem escala, além de ter um custo operacional 9 por cento mais baixo que o 737. Oura vantagem é poder operar tranquilamente em aeroportos quentes e/ou altos demais para os 737.

O PP-VTR na Cidade do México

Apesar do interesse que despertou na Transbrasil, o 757 demorou muito a operar em empresas aéreas brasileiras, e foi somente em 2004 que a Varig resolveu arrendar da ILFC 4 aeronaves usadas, anteriormente operados pela empresa espanhola Ibéria.

O PP-VTS em Curitiba

As aeronaves eram relativamente novas, apenas 5 anos de uso, e estavam em ótimas condições. Eram equipadas com motores Rolls-Royce RB-211-535E4 e foram configuradas para operação em linhas da América Latina e domésticas, com 20 poltronas de classe Executiva e 156 poltronas de classe Econômica, com um pitch confortável que tornou tais aeronaves as mais confortáveis em operação na Varig.



O primeiro avião, matriculado no RAB como PP-VTQ, foi entregue no dia 4 de agosto de 2004, e começou a operar no dia 22 de setembro no voo RG8631, que saía de Buenos Aires às 06 horas e 30 minutos, chegava em São Paulo às 09 horas e 5 minutos, e de lá seguia para Lima às 10 horas, como voo RG8936, onde chegava às 13 horas e 5 minutos. O voo de retorno saía de Lima às 13 horas e 55 minutos, como RG8937, chegava em São Paulo às 17 horas e 55 minutos, e às 21 horas e 15 minutos estava de volta em Buenos Aires.

O avião foi bem recebido pelos passageiros, já que era bem confortável e com pitch generoso entre as poltronas.

O PP-VTT em voo

O segundo avião, matriculado no RAB como PP-VTR, foi entregue em 25 de setembro de 2004, e foi colocado em serviço em outubro, sendo colocado no voo RG8942 para Caracas, às terças, quartas, sextas, sábados e domingos, e no voo RG8946 para Caracas e Aruba, às quintas e segundas.

Nariz do PP-VTT

O dois aviões restantes, matriculados no RAB como PP-VTS e PP-VTT, chegaram em dezembro de 2004, e passaram a operar outras rotas na América Latina, como Assuncion, no Paraguai, e em rotas domésticas, como, por exemplo, os voos RG8614/8615, que ligava Manaus a Buenos Aires, passando em Belém, Fortaleza, Recife, Salvador e Galeão.

Os Boeing 757 também substituíram aeronaves maiores em outras rotas internacionais, como Cidade do México, quando a empresa começou a ficar com problemas mais sérios. 

Decolagem do PP-VTR


A ILFC  arrendou as aeronaves por quatro anos, mas, à época, a Varig já enfrentava sérios problemas financeiros e operacionais e encerrou suas operações em 20 de julho de 2006. As aeronaves foram retomadas pela ILFC em 24 de agosto de 2006,

A Varig não foi a única operadora de Boeing 757 de passageiros no Brasil, pois a OceanAir operou uma aeronave, o PR-ONF, um pouco mais antigo, por algum tempo, Alguns 757 cargueiros permaneceram em uso no Brasil em outras empresas aéreas.

Embora tenha operado por pouco tempo, menos de dois anos, o avião é lembrado atá hoje como sendo muito confortável e confiável pelos tripulantes e passageiros.

AERONAVES BOEING 757-200 OPERADOS PELA VARIG (2004/2006):

PP-VTQ: Boeing 757-256 - c/n 26247/860. Primeiro voo em 06/04/1999. Entregue à Ibéria em 20/04/1999 como EC-GZY. Devolvido à ILFC, Em 04/08/2004 foi para a Varig como PP-VTQ. Retomado pela ILFC em 08/2006 como N241LF. Arrendado em 11/2006 para a Kras Air como EI-DUA, e em 14/12/2009 para a I Fly Airlines. Em 30/09/2015 foi para a Icelandair, estando em processo de conversão em cargueiro, como TF-ISV.

PP-VTR: Boeing 757-256 - c/n 26248/863.Primeiro voo em 06/04/1999. Entregue à Ibéria em 30/04/1999 como EC-GZZ. Devolvido à ILFC, Em 25/09/2004 foi arrendado à Varig, como PP-VTR. Retomado em 08/2006 pela ILFC como N263LF, foi arrendado em 12/2006 para a Kras Air, como EI-DUC, e em 10/2009 para a I Fly Airlines. Em 01/04/2016 foi para a Icelandair como TF-ISR. Em operação.

PP-VTS: Boeing 757-256 - c/n 26249/881. Primeiro voo em 19/07/1999. Entregue à Ibéria em 16/08/1999. Devolvido à ILFC e arrendado à Varig como PP-VTS em 20/11/2004. Retomado pela ILFC, como N271LF, foi arrendado em 20/12/2006 para a Kras Air, e em 11/10/2009 para a I Fly Airlines, como EI-DUD. Foi para a Icelandair em 08/12/2015 como TF-ISJ. Estocado em Roswell, EUA, desde 19/11/2020.

PP-VTT: Boeing 757-256 - c/n 26250/889. Primeiro voo em 10/09/1999. Entregue à Ibéria em 02/09/1999. Devolvido à ILFC, foi em 04/06-/2004 para a Varig, como PP-VTT. Retomado em 08/2006 pela ILFC, como N272LF. Arrendado para a Kras Air em 04/02/2007 como EI-DUE. Estocado em 31/10/2008 em Domodedovo, Mos


Antonov An-22 Antei: o maior avião turboélice da história

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Durante o período da Guerra Fria, os soviéticos produziram dezenas de aeronaves muito interessantes sob qualquer ponto de vista, usando tecnologia diferente da usada no Ocidente, embora fossem frequentemente acusados de copiar tecnologia aeronáutica estrangeira.
Antonov An-22

O Antonov An-22 Antei, no entanto, não foi copiado de nenhum modelo ocidental, sendo, ao contrário, muito inovador em muitos aspectos, já que foi o primeiro avião de carga de fuselagem larga, e que ainda mantem o titulo de maior avião turboélice da história.

No período entre o final da década de 1950 e o início da de 1960, os soviéticos operavam os cargueiros turboélices Antonov An-8 e An-12, aeronaves muito eficientes, mas havia a necessidade de uma aeronave ainda maior. Nessa época, motores a jato ainda não dispunham de muito empuxo, além de consumir combustível demais, o que limitava tanto o peso quanto a autonomia. Motores turbofans, mais eficientes, ainda eram incipientes. Felizmente, os soviéticos tinham à disposição os poderosos motores turboélices Kuznetsov NK-12, de 15 mil SHP, que equipavam os bombardeiros Tupolev Tu-95.
Um Antonov An-22 na aproximação

Os motores NK-12 eram máquinas equilibradas, econômicas e muito eficientes, sendo considerados até hoje como sendo os motores turboélices de melhor relação potência/consumo, embora sua tecnologia remonte aos anos 1950. Confira aqui no blog o artigo publicado sobre o motor Kuznetsov NK-12.

O An-22 consome cerca de 6 toneladas de combustível por hora, bem menos que qualquer jato de porte equivalente.
O painel principal de instrumentos do AN-22

A concepção de um novo cargueiro foi simplificada ao máximo, e a estrutura era bastante convencional, baseada no modelo An-12, mas muito ampliada. Uma diferença importante em relação ao An-12 era a cauda dupla
Vista frontal do An-22

A missão militar prevista para o novo avião era o transporte estratégico, o que incluía lançamento ou transporte de tropas, transporte de veículos militares ou até mesmo de mísseis.

O projeto, então denominado An-20 começou com a montagem de um mock-up em madeira nas instalações da Antonov em Kiev, na Ucrânia. Era, assim como os modelos An-8 e An-12, uma aeronave de asa alta, quadrimotora, com capacidade de operar em pistas não pavimentadas e não preparadas, uma condição essencial para as condições então existentes na União Soviética. 
O enorme compartimento de carga do An-22

Nos primeiros aviões, a pressão dos pneus podia ser ajustada em voo para atender aos imediatos requisitos de pista e peso do avião, mas tal recurso foi abandonado depois. A aeronave precisava de apenas 1300 metros de pista para operar, apesar do seu grande tamanho e potência.
Vista lateral do An-22

Os quatro motores Kuznetsov NK-12, de 15 mil SHP, giravam hélices de 8 pás contra rotativas, sendo o conjunto de hélice instalado coaxialmente. As caixas de redução permitiam às hélices girar no máximo à 750 RPM. Essa combinação de motores potentes e hélices de baixa rotação conferiram ao avião um espetacular desempenho de cruzeiro, velocidade de 740 Km/h (400 Knots), alcance de 5 mil Km com carga útil máxima, e de até 10950 Km com combustível máximo e até 45 mil Kg de carga.
Pouso de um An-22 na Ucrânia

A fuselagem tinha seção circular, sendo o compartimento dianteiro totalmente pressurizado, e a seção de carga, de 33 metros de extensão e 639 metros cúbicos de capacidade com pressão diferencial mais baixa. Isso permitiu a redução do peso estrutural. A seção de carga tinha um sistema de pressurização próprio, com pressão diferencial máxima de apenas 3,55 PSI. Uma antepara de pressão instalada na caverna 14 da fuselagem tinha uma porta que dava acesso ao compartimento de carga pelo compartimento do loadmaster.
Posto do navegador do An-22, logo abaixo do cockpit principal

O avião, redenominado An-22 Antei (referente a Anteu, gigante da mitologia grega), era operado por uma tripulação de 5 pessoas, piloto, copiloto, mecânico de voo, operador de rádio e loadmaster. Podia levar até 29 passageiros na seção pressurizada dianteira.

O protótipo voou pela primeira vez em 27 de fevereiro de 1965, e foi apresentado ao público no Paris Airshow do mesmo ano, após fazer testes durante quatro meses, nos quais foram usados três protótipos. 68 aeronaves do tipo foram construídas na fábrica da Antonov em Tashkent, no Uzbequistão, com exceção dos protótipos, construídos em Kiev, na Ucrânia.

A primeira entrega militar, para a Força Aérea da União Soviética, foi em 1969. A Aeroflot também usou o tipo.

O primeiro uso do An-22 foi o envio de ajuda humanitária para o Peru, após um terremoto, em 1970, e uma das aeronaves, operada pela Aeroflot, acabou perdida durante essa missão.

A URSS também usou os AN-22 para levar material bélico para o Egito e para a Síria, durante a Guerra do Yom Kippur, em 1973, mas a aeronave também foi usada para outras missões humanitárias, como na Etiópia em 1984, quando uma grande seca assolou esse país. Outra missão importante do An-22 foi levar material para a Usina Nuclear de Chernobyl, em 1986, quando um dos reatores explodiu.

Durante os anos 1990, quarenta e cinco aeronaves ainda estavam em uso, principalmente na Força Aérea da Rússia,  mas já estavam bem usados e sendo substituídos pelos An-124 Ruslan.
Esse é o último An-22 ainda operacional
Atualmente, existem apenas 4 aeronaves An-22 ainda operacionais, sendo 3 da Força Aérea da Rússia e uma civil, operada pela Antonov Airlines a partir da sua base na Ucrânia, e matriculada UR-09307. A Força Aérea da Rússia ainda possui mais 3 aeronaves, mas atualmente não estão operacionais.

O An-22 tem o porte semelhante ao de um Boeing 767-200, mas é mais leve que essa aeronave, o que o torna o maior avião turboélice já fabricado. 


OS CASOS DOS “DE HAVILLAND COMET” E DO “BOEING 737 MAX” E OS PERIGOS E DESAFIOS DAS INOVAÇÕES NA AVIAÇÃO COMERCIAL

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  Autor: Luiz Reis


Nos últimos meses, dois graves acidentes, um na Indonésia no dia 29 de outubro de 2018, com 189 mortos, e outro na Etiópia no dia 10 de março de 2019, com 157 mortos, chocaram o mundo e arranharam profundamente a imagem de um dos ícones da aviação comercial mundial, o Boeing 737. 


Considerada uma aeronave extremamente segura, os dois acidentes ainda estão sendo investigados e suas causas, apesar das muitas coincidências que envolvem as duas fatalidades, ainda continua um mistério.

Tais acidentes puseram em xeque tanto o futuro do atual modelo fabricado, o 737 MAX, que foi “groundeado” (retido no solo e proibido de voar) poucos dias depois do acidente na Etiópia, quanto também a própria reputação da Boeing Airplane Company, que suspendeu a venda do modelo e está até sendo investigada pelo FBI (Federal Bureau of Investigation; Bureau Federal de Investigações, em tradução livre) norte-americano pela precipitação em se lançar e certificar um modelo com falhas tão graves como as ocorridas.


Apesar de chocante e inaceitável pelo público geral, acidentes de aeronaves comerciais e militares recém-lançadas ou em início de vida operacional não é algo novo na História da Aviação Comercial, aonde, ao longo das décadas desde o surgimento dos primeiros voos comerciais, muitos incidentes e acidentes mancharam a reputação de muitos bons modelos criados, mas seus acidentes e os resultados das investigações levaram a melhorar a qualidade das aeronaves modernas e da segurança de voo.

Esse texto vai ressaltar dois casos em particular: o caso do de Havilland Comet, a primeira aeronave comercial a jato construída e do próprio Boeing 737. Ambas as aeronaves apresentaram grandes inovações aeronáuticas e uma, pelos acidentes ocorridos, resultou em um grande fracasso comercial, mas que auxiliou muito o aprendizado sobre a produção e a operação de aeronaves a reação. A outra, um grande sucesso comercial, na sua quarta geração enfrenta problemas sérios que podem custar inclusive o fim de sua produção.

DE HAVILLAND COMET

Após a II Guerra Mundial, os Aliados, incluindo a Inglaterra, tiveram acesso a diversos dados sobre estudos aerodinâmicos realizados pela Alemanha, vários deles estavam voltados para o uso de asas em enflechamento positivo e uso de motores a reação em aviões, estudos esses que influenciariam a construção de várias aeronaves comerciais e militares na segunda metade dos anos 1940 e na década de 1950.

O “Comitê Brabazon” (Brabazon Committe), que iniciou os estudos de novas aeronaves (comerciais e militares) para a Inglaterra ainda durante a guerra, coordenou esse processo, solicitando aos fabricantes aeronáuticos ingleses, novos desenhos e propostas de aeronaves, de preferência pressurizadas e a jato, para se obterem as vantagens do uso desse tipo de aeronave, como o voo em grandes altitudes e a velocidades próximas da supersônica.


Uma das primeiras propostas foi apresentada pelo membro do comitê Sir Geoffrey de Havilland, fundador da “de Havilland Company”, que usou sua grande influência perante o governo britânico e sua experiência em desenvolver aeronaves de sucesso (como o caça-bombardeiro de Havilland Mosquito, feito quase inteiramente de madeira), tendo sua proposta adotada, com o modelo sendo chamado inicialmente de “Type 106”, em fevereiro de 1945, posteriormente sendo chamada de “DH 106 Comet” (Cometa).

A proposta era tão avançada que os motores a jato propostos nem haviam sido produzidos, seriam desenvolvidos paralelamente ao desenvolvimento da fuselagem. As especificações, segundo o próprio de Havilland, seriam atingidas, que voaria a uma altitude de 40 mil pés (cerca de 12.192 metros) numa velocidade de cruzeiro de cerca de 460 milhas por hora (740 km/h), além da possibilidade de se fazer a travessia transatlântica entre Londres e Nova York com poucas escalas (distância de 5.567 km, usando a ilha dos Açores, em Portugal e o aeroporto de Gander, no Canadá, como prováveis escalas para reabastecimento).


O desenho final da aeronave foi escolhido em 1947, com uma célula com capacidade para 36 passageiros, com asas de enflechamento de 20 graus e com quatro motores embutidos, dois em cada asa (inicialmente o Hatford H.1 Goblin nos protótipos e posteriormente o mais potente Hatford H.2 Ghost nos modelos de produção). A BOAC (British Overseas Airways Corporation) principal empresa britânica (antecessora da atual British Airways) e a antiga British South American Airways (uma subsidiária da BOAC para a América do Sul e Caribe) encomendaram um total de 14 aeronaves, com entregas previstas para 1952.

O primeiro protótipo do Comet (Comet 1 registro G-ALVG) foi completado no início de 1949 e teve o seu primeiro voo no dia 27 de junho de 1949. Após exaustivos testes devido as novas tecnologias existentes, acumulando cerca de 500 horas de voos experimentais, a primeira unidade de produção foi entregue em janeiro de 1951 a BOAC para treinamento das tripulações. A certificação de aeronavegabilidade da aeronave foi recebida cerca de um ano depois, em janeiro de 1952, com as operações iniciando em 02 de maio de 1952, numa rota cobrindo Londres a Johanesburgo, na África do Sul (com cinco escalas, duração total de 21 horas e 20 minutos!).


Mesmo com todo esse tempo o Comet era 50% mais rápido do que as antigas aeronaves a pistão, cruzando os céus sem turbulência por voarem a grande altitude, propiciando grande conforto aos passageiros, graças a cabine pressurizada. A pouca manutenção e o baixo consumo de combustível após 30 mil pés de altitude (9.144 metros de altura) surpreenderam a BOAC. As principais rotas servidas pelos oito Comet da BOAC em 1953 eram Londres – Johanesburgo, Londres – Tóquio, Londres – Nova York, Londres – Cingapura e Londres – Colombo.

No primeiro ano de operação, o Comet transportou cerca de 30.000 passageiros, se tornando a viagem dos sonhos para as pessoas que pudessem adquirir uma cara passagem dessas aeronaves, com um serviço de bordo 100% primeira classe, com muito glamour e conforto propiciado no início da era do jato. A então jovem rainha Elizabeth II, acompanhada da Rainha-Mãe Elizabeth e sua irmã, a Princesa Margaret, voaram num Comet 1 no dia 30 de junho de 1953 e se tornaram os primeiros membros da família real a voarem numa aeronave a jato.

Em 1953, o Comet 1 era um grande sucesso, com várias encomendas recebidas de empresas da França, Japão, Venezuela, Índia, Estados Unidos e inclusive do Brasil (a Panair do Brasil). Versões mais modernas, alongadas e com maior capacidade de combustível (Comet 1A e Comet 2, esse último equipado com os motores mais poderosos Rolls-Royce Avon) estavam sendo projetadas e oferecidas no mercado. 


Tudo indicaria que o Comet seria um grande sucesso, mas terríveis fatos surgiriam nos próximos anos para derrubar essa projeção. No dia 26 de outubro de 1952, o Comet sofreu o seu primeiro acidente com perda total da aeronave, o G-ALYZ da BOAC, que não conseguiu decolar e varou o final da pista do Aeroporto de Ciampino, Roma. 

Não houve vítimas fatais, mas a aeronave foi destruída. No dia 03 de março de 1953 um Comet 1A, que seria entregue a empresa Canadian Pacific Airlines, caiu durante o seu voo de translado, quando tentou decolar sem sucesso na Austrália e também varou a pista. A aeronave foi destruída e todos os 11 passageiros e tripulantes morreram no acidente. Ambos os acidentes foram provocados por falha humana, segundo as investigações.

No dia 02 de maio de 1953 ocorreu o terceiro acidente do Comet (e o segundo fatal) quando o G-ALVY da BOAC, cumprindo o voo 783, caiu seis minutos após decolar de Calcutá, na Índia, durante uma tempestade, morrendo todos as 43 pessoas a bordo. A investigação indiana concluiu que as forças que atuaram na aeronave durante a tempestade (provavelmente uma forte ventania) foram as causas do acidente, sem levar em consideração fatores estruturais ou de fadiga de material. Como consequência desse acidente, todos os Comet foram equipados com radar meteorológico.

Em 1954 ocorreram dois graves acidentes fatais, em um curto espaço de tempo e praticamente da mesma forma, que praticamente criou uma má fama ao aparelho e sepultou suas vendas e reputação. No dia 10 de janeiro de 1954, 20 minutos depois de decolar do Aeroporto de Ciampino, em Roma (o mesmo local do primeiro acidente do Comet), o Comet 1 matrícula G-ALYP da BOAC, cumprindo o voo 781, se despedaçou no ar e caiu próximo a Ilha de Elba, matando todos as 35 pessoas a bordo. 

Após o acidente, a BOAC suspendeu os voos do modelo e manteve voluntariamente a frota em solo, aguardando o resultado das investigações.


Cerca de três meses depois do acidente do G-ALYP, no dia 08 de abril, o Comet 1 G-ALYY ,da South African Airways, no voo 201, entre Londres e Johanesburgo, caiu também poucos minutos após decolar de Roma, no Mar Mediterrâneo, próximo a Nápoles, matando todas as 21 pessoas a bordo. 

A aeronave também se despedaçou no ar e os corpos e destroços se espalharam por uma grande área. Após esse acidente o certificado de aeronavegabilidade da aeronave foi cassado e o Primeiro-Ministro inglês Winston Churchill pessoalmente ordenou que se fizesse o possível para encontrar as causas do acidente.

Para isso foi realizada uma grande investigação liderada pelo Comitê Cohen (Cohen Committee), liderado pelo Lord Cohen, que iniciou uma profunda investigação dos dois acidentes, além de investigar outros acidentes e incidentes que o Comet sofreu ao longo de sua curta vida operacional. 

Um Comet 1 da BOAC, matrícula G-ALYU foi doada pela empresa para análise e colocada num tanque de água para simular pressurização e despressurização da aeronave (os chamados ciclos). No dia 24 de junho, após 3.057 ciclos (1.221 reais e 1.836 simulados), a célula do G-ALYU se rompeu, praticamente no mesmo tempo do que as aeronaves acidentadas.

Estudos realizados pelos engenheiros ingleses determinaram que a causa do rompimento foi um acúmulo anormal de fadiga nas laterais das grandes janelas quadradas da aeronave, que não aguentavam a pressão e se rompiam. A análise do que aconteceu com o G-ALYP (dois terços da aeronave foram retirados do fundo do mar e reconstruídos para análise) comprovou o que realmente aconteceu e as causa dos dois acidentes foi finalmente descoberta. Para evitar tais acidentes, as aeronaves passaram a arredondar mais os cantos das janelas, tornando-se ovais, além de reforçar mais a sua estrutura.

Não houve responsáveis pelas tragédias, até porque não havia como prever nem evitar tais desastres, já que a tecnologia era extremamente revolucionária e praticamente inédita. Mesmo com as descobertas da causa do acidente e a posterior aplicação das medidas necessárias, o Comet tornou-se uma aeronave “marcada” e não mais fez o sucesso que fazia antes dos acidentes. 

Os remanescentes Comet 1 e 1A foram desativados ou modificados com as janelas ovais e os posteriores Comet 2, 3 e 4 voaram por muitos anos com poucos incidentes ou acidentes, geralmente causados por erros dos pilotos, mas por causa dos graves problemas iniciais, apenas 114 aparelhos foram construídos.

A RAF (Força Aérea Real) da Inglaterra operou tanto alguns Comet para transporte até a década de 1970, quanto operou o Hawker Siddeley Nimrod, uma aeronave de patrulha marítima que foi baseada amplamente no Comet, construída pela Hawker Siddeley, que comprou a de Havilland Company em 1963. O Nimrod operou com a RAF até 2011, com grande sucesso.

BOEING 737

Lançado em 1964 com o objetivo de ser uma aeronave de baixo custo operacional para rotas curtas, de fuselagem estreita (narrowbody), o Boeing 737 tornou-se uma grande família de aeronaves, com dez variantes de quatro gerações diferentes. 


É a aeronave comercial mais vendida da História, com 10.478 unidades entregues (até janeiro de 2019), e a menor aeronave hoje em produção pela Boeing. Essa aeronave substituiu diversos modelos ao longo dos anos, incluindo o Boeing 707, Boeing 717, Boeing 727, Boeing 757 e McDonnell Douglas DC-9. Compete principalmente com a família do Airbus A320.

O primeiro voo da versão inicial do 737, o 737-100 (a mais curta versão do 737 já fabricada) foi no dia 09 de abril de 1967. Entrou em serviço no dia 10 de fevereiro de 1968, com a companhia alemã Lufthansa. 

A segunda versão fabricada, a 737-200, alongada e com motores mais potentes, entrou em operação no dia 28 de abril de 1968. Essa última versão foi a preferida das companhias aéreas e foi produzida em quantidade muito maior do que a versão original -100 (foram produzidos 30 737-100 e 1.095 737-200).
A versão 737-200 foi operada pela Força Aérea dos Estados Unidos (USAF), para treinamento de navegadores e transporte (Boeing T/CT-43 Gator). 


A Força Aérea da Indonésia operou uma versão do 737-200 modificada para patrulha marítima e transporte (designada de 737-2x9 Surveiller). A nossa Força Aérea Brasileira (FAB) operou por muitos
anos dois 737-200 na versão VIP (transporte de autoridades), sendo designados de VC-96 e infamemente apelidados de “sucatinhas” (devido ao também utilizado Boeing 707 KC-137, chamado de “sucatão”). Outros países também operaram a versão -200, principalmente como transporte.

Na década de 1980 foi lançada uma nova versão do 737. Essa versão seria equipada com motores mais modernos (os turbofans da CFM International), além de um aumento no comprimento da aeronave, uma asa e derivas redesenhadas e a instalação de instrumentos de navegação mais modernos. 

Essa versão seria conhecida como 737-300 e teve o seu primeiro voo no dia 24 de fevereiro de 1984, entrando em serviço em 28 de novembro de 1984. Foram produzidos 1.113 Boeing 737-300.

Outras versões do 737 foram desenvolvidas, formando a chamada família “737 Classic”, configurando a segunda geração do modelo.


O 737-400, uma versão mais alongada do que o -300, teve seu voo inicial no dia 19 de fevereiro de 1988 e entrou em serviço em outubro do mesmo ano. A versão 737-500, considerada uma substituição moderna da versão -200, com um comprimento semelhante, mas com um consumo 25% menor, devido aos modernos turbofans.

Essa versão voou no dia 30 de junho de 1989 e entrou em serviço no dia 28 de fevereiro de 1990. Foram produzidos, respectivamente, 486 737-400 e 389 737-500. Muitos dos -400 hoje operam convertidos para cargueiros, mas ainda há muitos modelos dessa família ainda operando com voos de
passageiros. 

Após o lançamento do seu principal concorrente, o Airbus A320, a Boeing iniciou o desenvolvimento de uma versão melhorada em 1991. Após consultar clientes em potencial, a versão “Next Generation” (NG) foi anunciada no dia 17 de novembro de 1993. Essa versão engloba as versões -600, -700, -800 e -900, formando a terceira geração do modelo. O desempenho dessa nova família é semelhante ao de uma nova aeronave, porém foram conservadas características das outras versões anteriores.

A asa foi redesenhada, com um novo perfil aerodinâmico (aumento da envergadura em quase cinco metros), tornando-a mais comprida (aumentando a quantidade de combustível) e também equipada com “winglets” (pequenas derivas verticais). 


Novos motores da CFM International, mais eficientes e econômicos, aliados às melhorias aerodinâmicas, elevou o alcance da aeronave para quase seis mil quilômetros, podendo inclusive realizar viagens transatlânticas, já que também recebeu a certificação ETOPS (que homologa a aeronave para voo monomotor) de até 120 minutos. Também recebeu modernos instrumentos de navegação e um cockpit com cinco grandes telas multifunções de LCD (o chamado “glass cockpit”).

O primeiro protótipo da família 737 NG foi apresentado em fins de 1996 e voou em fevereiro de 1997, um 737-700 (substituto do 737-300). A versão 737-800, que substituiu a versão 737-400, voou pela primeira vez em julho de 1997. Já a versão 737-600, que substituiu a 737-500, voou em fins de 1997. Além dessas versões, a Boeing lançou as versões 737-900 (primeiro voo em 2001) e 737-900ER (Extended Range, ou “Alcance Aumentado”, que voou pela primeira vez em 2007), as versões mais compridas e com maior capacidade de passageiros da família, podendo acomodar até 215 passageiros em classe única.

Em 2004, após solicitação da companhia aérea brasileira Gol Linhas Aéreas Inteligentes, a Boeing passou a oferecer o pacote SFP (Short Field Performance, ou “Performance em Pistas Curtas, em tradução livre), que melhora o desempenho da aeronave em pousos e decolagens em pistas curtas, sendo esse pacote posteriormente oferecido aos demais clientes da Boeing, como opcional nas versões -800 e -900 e já equipado automaticamente na versão -900ER. Foram entregues, até o momento (fevereiro de 2019) 6.938 aeronaves comerciais dos quatro modelos da família 737 NG, estando os modelos ainda em produção. 


Além dos modelos comerciais, a Boeing também comercializa modelos militares baseados no 737 NG: o 737 AEWC (uma versão de Alerta Aéreo Antecipado e Controle, baseado no 737-700ER, também conhecido como Boeing E-7A Wedgetail), o C-40 Clipper (uma versão do 737-700 Combi operada pela Marinha dos Estados Unidos – USN e pela Força Aérea dos EUA – USAF) e o P-8 Poseidon ou P-8I Neptune (uma versão de patrulha marítima do 737-800ER com as pontas das asas do Boeing 767-400ER).

A Boeing também oferece uma versão do Boeing 737 como aeronave de transporte executivo e de autoridades, o Boeing Business Jet (BBJ). O BBJ1 é baseado no 737-700, o BBJ2 é baseado no 737-800 e o BBJ3 é baseado no 737-900ER. Alguns países usam o BBJ em suas forças aéreas para transporte VIP ou presidencial. No total foram 151 unidades das três versões do BBJ entregues até o presente momento.

Em agosto de 2011, logo após a concorrente Airbus lançar a versão A320neo, com novos motores e sistemas mais econômicos e eficientes, é lançada a quarta geração do 737, o “Boeing 737 MAX”, que sucedeu o 737 NG. As principais modificações da família MAX foram motores mais eficientes e modificações na estrutura das aeronaves. Equipadas com as novas turbinas CFM International LEAP, capazes de redução de consumo de combustível em média de 15% em relação a família 737 NG.

O primeiro 737 MAX apresentado (um 737 MAX 8, substituto de 737-800) foi apresentado em dezembro de 2015, com o primeiro voo no dia 29 de janeiro de 2016 (quase 49 anos depois do primeiro voo de um 737, um 737-100 no dia 09 de abril de 1967). A versão 737 MAX 9 voou pela primeira vez em 29 de abril de 2017 e entrou em operação em 21 de março de 2018. As outras versões (737 MAX 7, 10 e 200) estavam previstas para voar ainda em 2019, com entrada em serviço em 2020. A Boeing tem o total de 5.012 encomendas da versão MAX até o momento (março de 2019), com 376 aeronaves dos modelos MAX 8 e MAX 9 entregues.

Era uma aeronave que estava tendo grande sucesso, assim como as versões anteriores da família 737, mas começaram a acontecer alguns incidentes e acidentes que arranharam a imagem da fabricante e colocou em xeque o futuro da aeronave.

Em 29 de outubro de 2018, um Boeing 737 MAX 8, matrícula PK-LQP, da empresa “low-cost” (baixo custo) da Indonésia Lion Air caiu no Mar de Java minutos depois de ter decoladodo Aeroporto Internacional Soekarno–Hatta, Jacarta, Indonésia em direção ao Aeroporto Depati Amir na cidade de Pangkal Pinang, Indonésia. O acidente vitimou as 189 pessoas que seguiam a bordo, incluindo passageiros e tripulação. Segundo comunicado oficial da empresa, o avião era novo, estando em operação há apenas três meses, sendo que o piloto e copiloto que seguiam a bordo somavam no total mais de onze mil horas de voo. Informações preliminares apontaram que poderia ter havido uma falha no medidor de velocidade da aeronave, o que pode ter contribuído para a queda.

Em 14 de dezembro de 2018, um Boeing 737 MAX 8 registrado com a matrícula LN-BKE, que fazia o voo 1933 da Norwegian Air Shuttle em um voo de Dubai, Emirados Árabes Unidos para Oslo, Noruega, foi forçado a fazer um pouso de emergência em Shiraz, Irã depois de um defeito no motor esquerdo. Alguns dias depois, no dia 06 de janeiro de 2019, um 737 MAX da SpiceJet, cumprindo o voo 32 de Hong Kong para Nova Delhi sofreu uma falha de motor, tendo que fazer um pouso de emergência.

Em 10 de março de 2019, um Boeing 737 MAX 8 registado com a matrícula ET-AVJ, que fazia o voo 302 da Ethiopian Airlines, uma ligação regular entre Addis Abeba e Nairóbi no Quénia, caiu pouco depois de decolar. O avião tinha entrado ao serviço em dezembro de 2018. Todos os 149 passageiros e oito tripulantes a bordo morreram. Segundo testemunhas e informações preliminares, a aeronave mergulhou de bico para o solo, praticamente desintegrando-se, em grande velocidade.

No dia 12 de março, depois de dois acidentes com a aeronave, que mataram 346 pessoas, o novo avião de passageiros Boeing 737 MAX 8 foi classificado pelas autoridades de aviação e companhias aéreas em todo o mundo com “falta de aeronavegabilidade”, ou seja, a aeronave não está mais pronta para voar por razões técnicas e deve permanecer no solo, groundeado, até que o fabricante descubra o problema. Na arena militar não houve mudanças nem alertas, pois não há nenhum Boeing 737 miliar baseado na família MAX, e sim na anterior, a NG, portanto, sem alterações significativas.

Agora a pergunta: Por que tantos problemas, incluindo dois acidentes fatais, numa aeronave novíssima em folha, com apenas poucos meses de operação? A resposta está nesse texto abaixo, retirado da revista Superinteressante: “Quando a Boeing desenvolveu a última geração do avião (batizada de “MAX”), os motores cresceram tanto que remanejar os equipamentos em torno deles não era mais suficiente. Então, a empresa resolveu colocá-los alguns centímetros para frente da asa e, com isso, deixá-los levemente mais altos. O truque funcionou, mas engenheiros detectaram que isso fazia com que avião tivesse uma pequena tendência de elevar o nariz sem que os pilotos precisassem tocar nos comandos. Em certos casos – sobretudo durante as decolagens –, essa situação poderia fazer com que o 737 perdesse sustentação (estol) e caísse. 

Por causa disso, a Boeing incluiu no 737 MAX um software chamado MCAS (sigla para sistema de ampliação de característica de manobra, em inglês). Ao detectar o risco de estol, o MCAS altera o ajuste de uma peça chamada trim para abaixar o nariz do avião e manter a sustentação. Foi aí que começou a sequência de erros da Boeing. O primeiro é que o MCAS não dá nenhum alerta na cabine de que entrou em ação. E o ato dos pilotos puxarem o manche (o que faz com que o avião volte a subir) não inibe o funcionamento do software de correção. A cereja do bolo: a Boeing não avisou aos seus clientes da existência do MCAS, e não incluiu os procedimentos de inibição do software no manual de operação do 737 MAX.” (Revista Super Interessante. Como 50 anos de remendos tornaram o Boeing 737 perigoso. Editora Abril, 2019).

Ou seja, o MCAS provavelmente pode ter derrubado as duas aeronaves, pois com ele acionado inadvertidamente e sem o conhecimento dos pilotos, eles nada podiam fazer para evitá-los. E para piorar a situação, durante o processo de certificação da aeronave, autoridades aeronáuticas dos Estados Unidos e da Europa não consideraram a presença do MCAS e consideraram que um piloto que voava o 737 NG, a geração anterior, poderia voar tranquilamente o 737 MAX sem um treinamento específico.


No Brasil, a ANAC (Agência Nacional de Aviação Civil) reconheceu a presença do MCAS no 737 MAX como uma diferença na pilotagem em relação ao 737 NG, e exigiu do fabricante treinamento específico para o MAX. Com isso os pilotos brasileiros saberiam o que fazer caso o MCAS fosse acionado inadvertidamente e poderiam tranquilamente evitar a queda do aparelho.

Segundo relatos, o piloto e o copiloto do 737 MAX da Lion Air que caiu na Indonésia estavam consultando o manual da aeronave para saber como proceder naquela situação, no momento da queda da aeronave, portanto, não tinham treinamento necessário para lidar com a situação e comprova que era realmente necessário um treinamento específico para operar a mesma.

Portanto a situação está sendo investigada, com a Boeing prometendo novas atualizações no software da aeronave. Como já foi dito, o FBI norte-americano entrou na investigação e quer saber se houve precipitação no processo de certificação da aeronave pelas autoridades dos EUA e Europa. Enquanto isso, centenas de aeronaves 737 MAX estão paradas em diversos aeroportos espalhados pelo mundo, gerando milhões de dólares de prejuízos e fazendo com que a Boeing cada dia mais perca valor de mercado.

Em meados de 2019, a Boeing praticamente suspendeu a fabricação do 737 MAX devido a falta de entregas e o grande número de aeronaves prontas acumuladas em suas fábricas. Essa situação continuou até meados de 2020, também como consequência da Pandemia do Novo Coronavírus (COVID-19). Entre 29 de junho e 1º de julho de 2020, a FAA e a Boeing realizaram uma série de voos de teste de recertificação. Transport Canada e EASA concluíram seus próprios voos independentes de recertificação no final de agosto e início de setembro de 2020.

Em 19 de agosto de 2020, a Boeing anunciou que havia recebido novos pedidos para o 737 MAX pela primeira vez em 2020. De acordo com um comunicado da empresa, a polonesa Enter Air SA celebrou um acordo para comprar até quatro 737. A Boeing se referiu ao aviãocomo um “Boeing 737-8” em uma mudança da marca Boeing 737 MAX, para apagar a marca antiga com os acidentes e incidentes ocorridos.

Em 18 de novembro de 2020, a FAA anunciou que o 737 MAX havia sido liberado para retornar ao serviço. Antes que a aeronave possa retomar o serviço, os reparos devem ser implementados de acordo com uma diretiva de aeronavegabilidade futura da FAA. 

Os programas de treinamento de companhias aéreas também exigem aprovação. Espera-se que os voos de passageiros sejam retomados nos EUA até o final do ano; as entregas podem ser retomadas e a produção deve aumentar lentamente. A Boeing viu mais de mil cancelamentos de pedidos desde o encerramento em março de 2019. Algumas dessas aeronaves já construídas tiveram seus pedidos cancelados e a Boeing está trabalhando para encontrar novos clientes para receber a entrega. 

A primeira companhia aérea a retomar o serviço regular de passageiros foi a brasileira GOL, em 9 de dezembro de 2020. A primeira nos Estados Unidos foi a American Airlines em 29 de dezembro. Em 2021 é esperado que outras empresas coloquem os seus 737 MAX em voo ou recebam da Boeing.

Mesmo com essa retomada dos voos do 737 MAX é importante as autoridades aeronáuticas manter a fiscalização e o rígido cumprimento dos processos de certificação aeronáuticos do 737 MAX e também de futuras aeronaves. 

O que aconteceu com os Comet nos anos 1950 e com os 737 MAX no final de 2018 e no início de 2019 são alertas de que inovações são perigosas e tem que se profundamente estudadas com a pena de acontecerem tragédias como as ocorridas há mais de 50 anos atrás e as que aconteceram dias atrás.

Choque de aviões em Charkhi Dadri: a mais trágica colisão aérea

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No final da tarde do dia 12 de novembro de 1996, o Boeing 747-168B, matriculado HZ-AIH e operado pela empresa saudita Saudi Arabian Airlines, faria o voo regular SVA763, partindo do Aeroporto Internacional Indira Gandhi, em Nova Delhi, na Índia, em direção a Dhahran, na Arábia Saudita.
O Ilyushin Il-76 UN-76435, envolvido no acidente de Charkhi Dadri

A grande maioria dos passageiros era de indianos que procuravam trabalho ou já trabalhavam na Arábia Saudita, que então necessitava muito de mão de obra. O voo SVA763 tinha 312 pessoas a bordo, 289 passageiros e 23 tripulantes, e o avião era pilotado pelo experiente comandante Al Shbaly, que tinha 45 anos de idade e aproximadamente 9800 horas de voo totais.

A primeira aeronave envolvida, um Boeing 747-168B, matriculado HZ-AIH, que fez seu primeiro voo no dia 03 de fevereiro de 1982, tinha número de série 22748/555, e foi entregue novo para a Saudi Arabian em 17 de março de 1982, sendo um modelo exclusivo de passageiros. Tinha 14 anos de uso quando se acidentou.

A segunda aeronave envolvida foi o Ilyushin Il-76TD, matriculado UN-76435, fabricado em 1992, destinado à Aeroflot, da Rússia, como CCCP-76435, mas que acabou sendo entregue, novo, à Kazakhstan Airlines. Tinha número de série  1023413428. Era 10 anos mais novo que o Boeing 747 da Saudi Arabian e tinha apenas 4 anos de uso..

A decolagem do 747 aconteceu às 18:32, hora local., e foi autorizado a subir para 15 mil pés, informando ao controle de Nova Delhi que estava passando por 10 mil pés. Aos 14 mil pés, a tripulação do 747 solicitou subir além de 14 mil pés, mas o controlador Dutta negou, e solicitou à tripulação do 747 que se mantivesse a 14 mil pés, já que havia tráfego em aproximação logo acima. Efetivamente, o 747 nivelou a 14 mil pés e lá permaneceu.
Concepção artística da posição de ambos os aviões na colisão

Um outro voo se aproximava de Nova Delhi. Era o voo KZA1907, operado por um Ilyushin IL-76 da Kazakhstan Airlines. Era um voo fretado, não regular, e levava 27 passageiros e 10 tripulantes, 37 pessoas ao todo. Os fretadores eram comerciantes russos e quirquizes, que estavam indo à Índia para fazer compras. Tal voo vinha do aeroporto de Chimkent, no Casaquistão.

O comandante do voo KZA 1907 era Gennady Cherapanov. Como o Il-76 era uma aeronave militar adaptada para voos civis, tinha piloto, co-piloto, engenheiro de voo, navegador e operador de rádio, tripulação incomum para aviões comerciais nessa época. A tripulação do KZA 1907 voava, então, a 23 mil pés, e solicitou descida para 18 mil pés. Quem falava com o controle era o operador de rádio.

O controlador Dutta autorizou o KZA1907 a descer até 15 mil pés. Devemos lembrar que aeronaves de fabricação russa, como o Il-76, possuem altímetros em metros, e não em pés, obrigando a tripulação a fazer a conversão de unidades.
O Boeing 747 da Saudi Arabian envolvido no acidente

O controlador Dutta supunha, portanto, que os dois aviões estariam separados por mil pés de altitude, estando o 747 da Saudi abaixo. Pelas informações da tripulação do Il-76 da Kazakhstan, o avião deveria estar a 15 mil pés, mas ele estava enganado. O avião desceu muito além, e estava perto dos 14 mil pés, altitude não autorizada. Todavia, Dutta não tinha condições de saber disso naquele momento. O aeroporto de Nova Delhi era equipado apenas com um radar primário, que não informa a altitude na qual os aviões estão voando. Mas, tendo autorizado o KZA1907 para 15 mil pés, e o SVA763 para 14 mil pés, não estava preocupado. A tripulação do KZA1907 reportou ter atingido os 15 mil pés autorizados às 18:40, mas continuou descendo, e isso não foi informado ao controle.

O controlador Dutta observou no radar os ecos dos dois voos se aproximando, com o Il-76 se aproximando ligeiramente para o lado esquerdo do 747. Dutta solicitou à tripulação do Il-76 para se atentar ao tráfego, e pediu para que o tentasse avistar. Como supunha que estavam separados por 1000 pés, não ficou preocupado, mas os dois ecos simplesmente sumiram do radar nesse momento.

Não voltaram a aparecer. O 747 dispunha de transponder modo C, de modo que podia transmitir sua altitude, mas como os controladores no aeroporto não podiam receber, tal informação era simplesmente inútil.
Destroços do Boeing 747 da Saudi Arabian

O vácuo de informações foi interrompido pelo Capitão Thimoty J. Place, que pilotava um Lockheed C-141B Starlifter da Força Aérea dos Estados Unidos. que informou ter visto uma grande explosão numa nuvem,  que ficou com um brilho alaranjado, a cerca de 100 Km do aeroporto de Nova Delhi.

Place foi provavelmente a única testemunha ocular da colisão, que aconteceu dentro de uma turbulenta nuvem cúmulus-nimbus.

Informações recebidas a seguir informaram ao controle que um grande avião tinha caído nos arredores de Charkhi Dadri, perto da vila de Dhani. Outro avião, que era o Il-76, caiu perto de Birohar.

Devido à violência do impacto, não houve sobreviventes. As 349 pessoas mortas fizeram com que o acidente de Charkhi Dadri fosse o terceiro pior desastre da história da aviação, atrás apenas dos desastres de Tenerife e do  voo JAL123, no Japão, e o pior evento de colisão no ar da história.

Testemunhas relataram que pedaços de avião caíram do ar, assim como sangue e restos humanos. Isso se refere ao Boeing 747 da Saudi, já que o avião da Kazakhstan chegou ao solo praticamente inteiro, enquanto o 747 se desfez no ar. Dois motores do 747 foram encontrados distantes dos destroços principais, e eram os motores do lado esquerdo.
Destroços do Il-76 do KZA1907


As comissões de investigação chegaram à conclusão que o Il-76 bateu quase de frente com o 747, atingindo a sua asa esquerda com a empenagem, um pouco abaixo.

Quatro passageiros da Kazakhstan ainda estavam vivos nos destroços, assim como dois passageiros da Saudi, mas, infelizmente, nenhum deles conseguiu se recuperar e morreram logo em seguida.

A comissão de investigação recolheu os gravadores de voo de ambas as aeronaves, que foram enviados para o Reino Unido (747) e Moscou (Il-76). Enquanto aguardava os resultados, a comissão se concentrou inicialmente no controlador Dutta e na gravação das conversas entre o controlador e as duas aeronaves.

Não havia indícios de falha por parte do controlador, as instruções eram claras e corretas. Mas ficou evidenciada a precariedade dos equipamentos de controle de tráfego. Existia radar, mas do tipo radar primário, que permite apenas uma visualização das aeronaves em duas dimensões, e não tem identificação nem indicação de altitude das aeronaves. A despeito do tamanho e do movimento do aeroporto, não havia nenhum sistema de radar secundário naquela época.
Painel de Instrumentos do Il-76: indicações no Sistema Métrico

Isso era uma condição normal na Índia naquela época. Praticamente a tecnologia disponível para o controle de tráfego aéreo era do tempo da Segunda Guerra Mundial.

Nenhuma das aeronaves estava equipada com TCAS II, embora tal equipamento já estivesse disponível desde 1988. De qualquer forma, para que o TCAS II seja usado, é preciso que todas as aeronaves voando ao redor disponham de transponder modo C.

A investigação acabou chegando à conclusão que o erro foi do comandante do Il-76 da Kazakhstan, que tinha autorização para nivelar a 15 mil pés e aguardar autorização do controle para continuar a descida, mas que continuou a descida sem reportar ao controle.

O que levou a esse erro extraordinário? Muitos fatores foram envolvidos: os instrumentos dos aviões fabricados na antiga União Soviética eram calibrados em unidades do Sistema Métrico Decimal, e os altímetros estavam em metros, de forma que os pilotos não visualizavam as altitudes autorizadas em pés diretamente, necessitando fazer cálculos mentais para isso.
Altímetro russo: em metros

O único tripulante do KZA 1907 fluente em inglês era o Operador de Rádio. Os demais tinham pouco ou quase nenhum domínio do idioma.

O Operador de Rádio não tinha os instrumentos de voo no seu painel, e para se certificar de que os pilotos estavam cumprindo as autorizações do CTA, precisava olhar para o painel principal do avião, por cima dos ombros dos tripulantes.

A um certo momento, o Operador de Rádio fez uma observação rápida nos instrumentos e percebeu que o avião estava abaixo dos 15 mil pés autorizados, e alertou o Comandante imediatamente. O Comandante rapidamente empurrou as manetes e iniciou uma subida para corrigir o erro, mas foi justamente nesse momento que o Il-76 bateu na asa esquerda do Boeing 747 da Saudi, e caiu. Provavelmente, se não tivesse sido alertado, o Il-76 teria provavelmente passado mais abaixo e o acidente não teria ocorrido.

Embora as autoridades indianas negassem, havia considerável turbulência para ambas as aeronaves, já que voavam dentro de uma nuvem do tipo cumulus-nimbus, caracterizadas por fortes correntes ascendentes e descendentes. São turbulências localizadas, e era bem provável que, fora da nuvem, houvesse pouca ou nenhuma turbulência. A observação do piloto do C-141 americano que avistou o acidente confirmou que a colisão ocorreu dentro da nuvem.

Normalmente, é normal que aeronaves subindo ou descendo para um aeroporto que opera voos por instrumentos tenha corredores específicos para os tráfegos que sobem e para o que descem, mas o Aeroporto de Nova Delhi é compartilhado com uma base aérea da Força Aérea da Índia, o que impediu que houve tal esquema, havendo um único corredor de uso civil e sobreposição dos tráfegos que subiam e desciam. As duas aeronaves se chocaram quase de frente, e uma subia, enquanto a outra descia.

A separação mínima de mil pés que deveria haver entre os dois tráfegos foi ordenada pelo controle, mas o controle, por sua vez, tinha que acreditar nas informações prestadas pelas tripulações do aviões, já que não havia radar secundário, apenas um radar primário do tempo da Segunda Guerra Mundial, que fornece apenas uma visão em duas dimensões do tráfego.

As recomendações de segurança decorrentes da investigação estabeleceram que houvesse:
  • Separação do tráfego descendente do ascendente por corredores aéreos exclusivos
  • Instalação de um sistema de radar secundário nos aeroportos da Índia, que possibilita incluir dados de altitude das aeronaves
  • Instalação obrigatória de sistema TCAS II nos aviões comerciais, para evitar colisões com o tráfego
  • Providências no sentido de exigir melhor proficiência no domínio do idioma Inglês por todos os operadores, assim como do controle de tráfego aéreo
O acidente de Charkhi Dadri foi a pior colisão aérea de todos os tempos. Em vista da instalação maciça de TCAS II no mundo, há pouca possibilidade que se repita tamanha tragédia, mas houve colisões aéreas posteriores, como acidente de Überlingen e a colisão dentre um jato executivo e um Boeing 737-800 da Gol, no Brasil, os dois envolvendo aeronaves equipadas com TCAS e voando em espaço aéreo controlado. Curiosamente, o número do voo do Boeing da Gol era o mesmo número do voo da Kazakhistan, 1907, uma coincidência realmente macabra.
























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