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Saiba como se tornar um piloto comercial

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Na última década, a aviação comercial brasileira experimentou um grande crescimento, tornando atraentes todas as profissões relacionadas ao setor, desde o mecânico de aeronaves ao comissário, do controlador de tráfego aéreo ao piloto.
O primeiro passo para ser Piloto Comercial começa geralmente em um Aeroclube
Ser piloto de avião sempre exerceu grande fascínio sobre a maioria dos jovens. Embora voar seja hoje uma coisa absolutamente rotineira e comum, parece haver uma certa aura sobrenatural sobre os aviões e seus pilotos. Então, realmente, a profissão de piloto comercial não é uma profissão comum.

O ingresso na profissão é mais simples do que pode parecer ao leigo, mas está longe de ser fácil. Não é necessário ter habilidades excepcionais ou ter saúde de super-homem, mas, em compensação, o investimento é alto e o retorno nem sempre é garantido.  Todavia, deve-se levar em conta que o mesmo acontece com a maioria das profissões de nível superior.

Uma vez que o jovem se decidiu pela profissão, o primeiro passo é procurar um aeroclube ou escola de aviação certificada pela autoridade aeronáutica, que no Brasil é a ANAC - Agência Nacional de Aviação Civil. O ingresso na profissão também pode ser através de um dos vários cursos superiores de Ciências Aeronáuticas ou de Aviação Civil, que geralmente também são certificados pela ANAC.
Os aeroclubes são formadores de mão de obra para a aviação brasileira
Um bom aeroclube ou escola de aviação civil geralmente vai prestar todas as informações necessárias aos seus candidatos, mas nem sempre terá condições de fornecer um treinamento completo, já que muitas escolas são certificadas apenas para certos níveis, como só formação de piloto privado, só para voo visual, ou só para aviões monomotores, por exemplo. Então, a não ser que o candidato a piloto se disponha a ficar trocando de escola a toda hora, convém procurar aeroclubes ou escolas bem estruturadas e que disponham de todos os cursos necessários ao profissional. Existem muitos bons aeroclubes e escolas no Brasil, alguns com décadas de tradição no ensino aeronáutico. O Aeroclube do Brasil, o mais antigo, já é centenário, e a maioria dos grandes aeroclubes já têm mais de 60 ou 70 anos. As escolas de aviação são mais recentes, mas existem várias com mais de 50 anos, com grande tradição no mercado. Existem entidades mais recentes, mas que não deixam de oferecer ensino de alta qualidade. É só procurar.

Como escolher uma escola ou aeroclube? Buscar indicação de um amigo ou parente que já é piloto ou aluno é uma das melhores opções, mas não é suficiente. Como tratam-se de cursos caros, procurar pelo melhor preço é uma solução óbvia. Mas isso exige cautela. Desconfie de preços muito baixos na aviação. Manutenção, combustível e mão-de-obra no setor são sempre caros e uma escola não pode economizar muito nesses quesitos sem afetar necessariamente a segurança.
Aeronave de instrução básica Aero Boero, usada em muitos aeroclubes brasileiros
Algumas escolas e aeroclubes, que sequer merecem uma certificação, usam os mais criativos subterfúgios para oferecer baixo preço ao aluno: voar 45 ou 50 minutos e lançar uma hora de voo cheia para o aluno, arrendar aeronaves e não pagar ao arrendador, fazer manutenção de baixa qualidade, usar combustível automotivo, e contratar profissionais muito inexperientes, que se sujeitam a baixíssimos salários, ou até mesmo a nenhum salário. Há alguns anos, uma grande e nova escola de aviação, no Estado de São Paulo, que exibia uma frota de dezenas de aeronaves novas, propunha ensino de alta qualidade e alegava parceria com uma grande empresa aérea, fechou repentinamente, depois de vender milhares de horas, que jamais foram voadas ou reembolsadas. Os alunos ficaram no prejuízo, assim como a empresa proprietária das aeronaves, que arrendava a frota inteira à escola, e que nunca foi paga pelo uso dos aviões.

O ingresso na aviação via aeroclubes, escolas ou faculdades de Ciências Aeronáuticas é só para a aviação civil. Para ingressar na aviação militar e voar aeronaves de combate, o caminho é outro, e muito mais árduo: prestar concurso vestibular para a Academia da Força Aérea. Como é natural, nesse ramo, os requisitos de saúde são muito mais exigentes, pois a função assim os exige, e o aluno deve ter desempenho excepcional, tanto em voo quanto em sala de aula, sob pena de ser excluído sumariamente do curso, sem dó. Em compensação, esses cursos são gratuitos e custeados integralmente pelo Governo.
Aluno e instrutor retornam de um voo de instrução
Ao iniciar, o aluno deve fazer um curso teórico de Piloto Privado. Com duração de 3 a 6 meses, esse curso proporcionará ao aluno conhecimentos básicos sobre Regulamentos de Tráfego Aéreo, Conhecimentos Técnicos de Aeronaves, Navegação, Teoria do Voo e Meteorologia, além de outras. A partir de junho de 2013, a ANAC exigirá aprovação obrigatória no Curso de Piloto Privado para que o aluno possa prestar a Banca Examinadora da ANAC, essencial para obtenção de um Certificado de Conhecimentos Teóricos - CCT, que o habilite a fazer o curso prático de voo e obtenha uma Licença de Piloto Privado. Para iniciar o curso de Piloto Privado, é necessário ter Ensino Médio completo.

Até junho de 2013, o candidato autodidata ainda poderá enfrentar a Banca Examinadora sem ser aprovado em curso certificado. Historicamente, no entanto, as chances de aprovação do autodidata são mínimas, a não ser para candidatos excepcionalmente estudiosos e aplicados.

Não espere que o curso teórico de Piloto Privado seja fácil. As escolas que aprovam alunos sem condições de passar na Banca da ANAC ficam sujeitas ao cancelamento de sua certificação, por baixo desempenho, e por isso costumam ser rigorosas quanto ao desempenho e presença nos cursos.
O voo em aeronaves sem rádio, em pistas de grama, é mais adequado à aviação desportiva, mas não é muito adequado à instrução profissional de hoje.
A obtenção do Certificado Médico Aeronáutico - CMA, documento que atesta que o aluno ou piloto possui os requisitos básicos de saúda para operar uma aeronave, é um fantasma que sempre assombra o candidato a piloto. Entretanto, para se voar na aviação civil, não se exige saúde impecável. Qualquer pessoa normal, com boa saúde e sem doenças crônicas graves, consegue passar no exame sem problemas. Usar óculos, aparelhos ortodônticos, possuir alguma prótese óssea ou dentária ou ser um pouco obeso não representam obstáculos. O CMA de 2ª Classe, para Piloto Privado, vale por 5 anos, para pessoas jovens, e é renovável após esse prazo. É um documento essencial a qualquer aluno prático ou piloto de aeronaves de qualquer tipo.

Caso tenha dúvidas a respeito do CMA, consulte a legislação a respeito, o RBAC 67 (http://www2.anac.gov.br/biblioteca/rbac/RBAC67EMD00.pdf).

Uma vez concluído o curso teórico, o candidato a Piloto Privado deve prestar a Banca Examinadora da ANAC, que consiste numa prova online de 100 questões, baseadas no conteúdo programático do curso de Piloto Privado, dividida nas cinco matérias principais: Meteorologia, Navegação, Conhecimentos Técnicos, Teoria de Voo e Regulamentos de Tráfego Aéreo. O aluno deve acertar 70 por cento das questões de cada disciplina para ser aprovado. Se for reprovado em até duas disciplinas, mas conseguir acertar pelo menos 30 por cento de cada uma, pode ficar em "Segunda Época" em cada uma, mas se não for aprovado dessa vez, terá que prestar a Banca para todas as disciplinas novamente.

Ao ser aprovado na Banca e obter um CCT, o aluno pode iniciar as aulas práticas de voo. As boas escolas exigem, antes do primeiro voo, uma prova de equipamento (conhecimentos prévios da aeronave que irá operar), e algumas horas de "nacele", feitas com a aeronave no solo, e que permitem ao aluno treinar os comandos do avião e o voo mental sem ter que gastar horas de voo reais nisso. Não existe treinamento em simulador para essa fase do aprendizado.
Sessão de briefing na instrução de Piloto Privado.
As missões de voo são rigorosamente padronizadas, e seguem um Manual de Curso certificado pela ANAC, e cada missão dura aproximadamente uma hora. O aluno vai aprendendo as manobras de voo em escala de dificuldade e habilidade. Cada aula deve ser precedida de um bom estudo do que vai ser feito no voo, umbriefing com o instrutor, que vai explicar como será a missão e o que vai ser exigido do aluno. Ao final do voo, o instrutor fará um debriefing com o aluno, e irá avaliar o seu desempenho. Se estiver abaixo dos mínimos exigidos, pode ser necessária uma repetição da missão, e quantas vezes isso for necessário.

Faça o treinamento prático com calma, sem pressa. Duas a cinco horas de voo por semana é o ideal. O cérebro humano precisa de um certo tempo para processar todo o conhecimento necessário, ainda mais em situação de stress, como uma aula prática de voo. Alunos muito apressados, que voam mais de uma hora por dia, costumam ter maus hábitos e um desempenho de baixa qualidade. 

Embora a legislação permita que o aluno obtenha uma Licença de Piloto Privado (PP) com 35 horas de voo em escola certificada, geralmente são necessárias pelo menos 40 horas para que o aluno esteja apto ao exame prático de voo, chamado de voo de check. Esses exames práticos são feitos por pilotos credenciados pela ANAC.

Consulte a legislação pertinente às habilitações e licenças para pilotos, o RBAC 61 (http://www2.anac.gov.br/biblioteca/rbac/RBAC%2061.PDF) , para dirimir quaisquer dúvidas sobre os requisitos de horas de voo e experiência para pilotos de qualquer nível.

Antes mesmo de fazer o voo de check, o instrutor irá liberar o aluno para o primeiro voo solo, no qual o aluno voa sozinho a aeronave, sem instrutor a bordo. Obviamente, trata-se de um grande evento na vida de um piloto, pois será seu primeiro voo "em comando" de uma aeronave. Os aeroclubes e escolas costumam, por tradição, fazer um "batismo" simbólico no aluno, dando-lhe um banho de óleo de motor de avião usado. Sempre é uma grande festa.
Tomar um banho de óleo de motor é o "batismo" de um piloto que voa sozinho pela primeira vez
Tornar-se Piloto Privado de avião ou de helicóptero (PP-A ou PP-H) significa que a pessoa pode operar sua própria aeronave, ou de outra pessoa física, ou ainda de uma escola ou aeroclube, sem ser remunerada por isso. É vedado ao piloto privado operar aeronaves de pessoas jurídicas que não sejam escolas, ser remunerado ou registrado em carteira de trabalho como piloto. Piloto Privado não é profissão, mas sim um estágio para alcançá-la, um dia.
Aula de navegação no curso de Piloto Comercial
Para ser Piloto Comercial, o Piloto Privado deve ingressar em um curso teórico de Piloto Comercial/Voo por Instrumentos, em aeroclube ou escola certificada. A aprovação nesse curso é obrigatória para que o aluno possa prestar a Banca Examinadora da ANAC de Piloto Comercial. Poucos aeroclubes e escolas oferecem esse curso, que é bem mais exigente que o curso de Piloto Privado, embora tenha duração parecida e contenha as mesmas disciplinas básicas. No curso de Piloto Comercial, o aluno irá aprender os fundamentos de navegação por instrumentos, regulamentos de voo por instrumentos, motores a reação e teoria de voo de alta velocidade, além de rever todo o conteúdo já visto no curso de Piloto Privado.

O curso prático de voo, em si, consiste numa sequência das missões do curso prático de PP, mas terá mais missões em comando e navegações de longo curso. Caso o aluno deseje aprender a voar por instrumentos, poderá fazê-lo nesse estágio do aprendizado. Para não gastar muito dinheiro nas missões de voo por instrumentos, que são feitas em aeronaves mais bem equipadas, e de custo bem mais alto, que as aeronaves de voo visual, é altamente desejável que o aluno faça missões de voo por instrumentos em um simulador de voo certificado. 25 horas de voo em simulador abatem 20 das 40 horas de voo real, exigidas normalmente no curso prático de voo por instrumentos.
O simulador de voo é essencial ao aprendizado do voo por instrumentos
Além de ser mais barato que o avião, o simulador permite operar sistemas nem sempre disponíveis nas aeronaves ou nos aeroportos onde o curso prático é realizado. Trata-se, portanto, de um "opcional" praticamente obrigatório.

Ao fim de 150 horas de voo, já incluídas as horas voadas no curso de PP, o candidato a Piloto Comercial pode pedir seu voo de check. Caso aprovado, esse será o momento no qual o piloto se torna profissional, podendo ser remunerado e exercer todas as prerrogativas da sua profissão, para o que for habilitado.

Embora pareça ser a mesma coisa, ter Licença e ter Habilitação são coisas distintas. A Licença, de PP ou de PC, é uma autorização do governo, em caráter permanente, para que o piloto opere uma aeronave, em caráter privado ou profissional. Já a Habilitação, de caráter transitório, autoriza a operação de determinadas classes ou tipos de aeronaves, determinados tipo de operação ou em determinadas condições. As habilitações expiram-se depois de um certo tempo, geralmente dois anos, e podem ser renovadas.

Então, são exemplos de Licenças as de Piloto Privado, Piloto Comercial, Piloto de Linha Aérea ou Comissário de Voo; São Habilitações: poder voar aeronaves monomotoras terrestres, aeronaves multimotoras (que possuem mais de um motor), Boeing 737, Airbus A330, fazer pulverização agrícola por via aérea, dar instrução de voo, lançar paraquedistas ou fazer exibições acrobáticas.
Aeronave utilizada para instrução de voo por instrumentos. São mais sofisticadas e complexas que as aeronaves básicas
Ao obter a Licença de Piloto Comercial, com habilitações para voar monomotores, multimotores ou voar por instrumentos, por exemplo, o piloto geralmente se ve na situação de Licenciado, Habilitado, mas desempregado. Agora não vai poder voar porque é inexperiente, mas não é experiente porque não voa. Como resolver esse dilema?

Claro que não é simples. O mesmo acontece com o advogado que acabou de passar no Exame da OAB, com o médico e com o engenheiro recém-formado. É necessário ter equilíbrio e planejamento nessa hora.

Muitos proprietários de aeronaves pequenas, que não pilotam, contratam pilotos recem licenciados e habilitados para voar suas aeronaves. O problema é que, geralmente, pagam mal, quando pagam. Alguns chegam ao cúmulo de cobrar do piloto para que pilote pra eles. Como tem piloto novo, desesperado, que aceita, isso acaba desvalorizando a profissão, e dá a impressão que todo o dinheiro gasto na formação não valeu a pena. Então, sempre exija uma remuneração digna, ainda que não seja muito grande, pela tua atividade profissional.

Não se intimide com conversas de praça de aeroporto ou de lanchonete de aeroclube de que "o Brasil está cheio de piloto desempregado". Geralmente, esses pilotos "desempregados" sequer são habilitados, ou são tão chatos e problemáticos que ninguém os empregaria, ainda que fossem os melhores pilotos do mundo.

Na verdade, hoje o mercado está francamente favorável para os pilotos. Muitos donos de aeronaves já não estão conseguindo pilotos quase de graça como antigamente, mas chegar a ser piloto de uma empresa de transporte regular ainda não é tão fácil. Como fazer para chegar lá?

Uma opção altamente viável é dar instrução de voo. Com um curto curso teórico e um curso prático de aproximadamente 27 a 30 horas de voo, é possível obter uma habilitação de INVA ou INVH, Instrutor de Voo de Aviao ou de Helicóptero, respectivamente, e conseguir emprego em um aeroclube ou escola certificada. Num grande aeroclube, é possível voar, em comando, 500 a 1000 horas por ano, o que capacita o piloto a entrar, em, relativamente, curto prazo, em uma empresa aérea, como copiloto, ou a voar em um táxi aéreo, ou, ainda, como piloto em uma empresa aeroagrícola. Nesse último caso, é preciso que faça os cursos e obtenha a habilitação necessária, para a qual são necessárias pelo menos 400 horas de voo.

Empresa aéreas valorizam instrutores de voo mais do que qualquer outro tipo de profissional, pois são acostumados a atuar em uma tripulação e delegar funções, coisas essenciais no ambiente da aviação comercial.
Visão dos sonhos de um aluno-piloto. Está mais perto do que se imagina...
Não espere ser um bom profissional de aviação e trabalhar em uma empresa aérea sem ter conhecimentos de inglês e sem ter um bom histórico escolar. Ter curso superior,  especialmente de Ciências Aeronáuticas ou de Aviação Civil, valoriza muito o profissional, e é considerado essencial para, um dia, ascender ao comando de uma aeronave comercial ou executiva. Saber inglês, então, é praticamente essencial, pois é o idioma "oficial" da aviação. Entretanto, ter inglês ruim ou notas medíocres no histórico escolar atrapalha muito mais do que ajuda, e pode, eventualmente, forçar o candidato a mudar seus planos de fazer carreira na aviação. O setor é particularmente exigente nesses quesitos.

Tome muito cuidado com a sua vida pessoal e seu estilo de vida. A aviação é um mundo um tanto restrito e dinâmico. Dificilmente alguém contratará um piloto que vive em bares, caindo de tanto beber, que não paga suas dívidas, ou que seja mau caráter. Esses defeitos, tão intrínsecos ao ser humano, são como "fogo no mato seco", dentro do ambiente da aviação. Nunca caia na tentação de fazer atividades ilegais dentro da aviação, isso pode condenar sua carreira para sempre.
Do simulador do Aeroclube ao cockpit de um Boeing 747, em poucos anos
Ser piloto de avião comercial está longe de ser a profissão perfeita. Na verdade, nenhuma profissão é. Às vezes é mal remunerada e nem sempre é estável. O mercado de aviação sempre foi instável e sempre será. Pilotos passam muito tempo longe de casa e da família, e muitas vezes ficam com a impressão de que moram "na mala". Trabalham aos sábados, domingos e feriados, de dia e de noite, e nem sempre podem comparecer às reuniões e festas de escola de seus filhos. Mas, em compensação, é uma das poucas profissões que realmente apaixonam, que dão felicidade. Muitos pilotos exclamam: "faço o que eu mais gosto e ainda sou bem pago para isso!!!".

Não são todos os profissionais que podem pensar ou dizer isso. Bons voos, aos que podem voar!

Mil Mi-24: o mais poderoso helicóptero militar russo

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Poucas aeronaves na história se tornaram tão emblemáticas quanto o helicóptero russo Mil Mi-24. Em um certo momento, foi considerado um verdadeiro símbolo do poder militar soviético. O Mi-24, denominado pela OTAN como "Hind", quarenta anos após entrar em serviço, ainda continua em produção e é uma referência em poderio aéreo.
A concepção do Mi-24 "Hind" vem da década de 1960. Nessa época, auge de tensão na Guerra Fria, tornou-se evidente para os soviéticos, e para o designer aeronáutico Mikhail Leont'yevitch Mil, que a crescente mobilidade no campo de batalha tornaria necessário um apoio aéreo mais eficaz. Mil começava, então, a conceber o conceito de um verdadeiro "tanque voador", que acompanharia os tanques terrestres no campo de batalha e que teria poderio suficiente para destruir os tanques inimigos. Além disso, essa máquina deveria ter capacidade de transportar tropas ao campo de batalha.
Mil, a partir de um projeto anterior, o V-22, helicóptero utilitário que jamais chegou a voar, desenvolveu uma nova máquina, materializada na forma de um mock-up apresentado em 1966 em uma exposição de aeronaves experimentais para o Ministro das Aeronaves, como projeto nº 329. Esse mock-up, designado V-24, idealizava uma aeronave capaz de levar oito soldados armados a bordo, e era equipado com duas pequenas asas instaladas na parte traseira da cabine de passageiros, onde foram instalados cabides para seis mísseis ou foguetes. Um canhão de cano duplo GSh 23L, com calibre de 23 mm, instalado no esqui do trem de pouso, complementava o armamento.
Mikhail Mil, o maior de todos os projetistas de helicópteros da Rússia
Logo Mikhail Mil sentiu oposição de alguns militares soviéticos, que preferiam ver os seus recursos investidos em máquinas mais convencionais. Continuou insistindo, no entanto, e convenceu o Vice-Ministro da Defesa Andrey A. Grenchko, a convocar um conselho de especialistas para analisar seu conceito.
Nessa época, os americanos estavam empregando helicópteros de transporte de tropas e de combate na Guerra do Vietnam. O principal helicóptero americano empregado no Vietnam, o Bell 205, designado militarmente como UH-1, e apelidado Huey, foi concebido para transportar tropas ao campo de batalha, mas logo foi equipado com armamentos como canhões e lançadores de foguetes. O sucesso do Huey no Vietnam foi decisivo para convencer os militares soviéticos que o conceito do V-24 de Mil não apenas era válido, como poderia ser essencial nos campos de batalha do futuro.
Cockpit do Mi-24
Os engenheiros de Mil projetaram duas versões para o -24: o primeiro era um helicóptero monomotor de 7 toneladas, e o outro um bimotor de 10,5 toneladas. Ambas as versões seriam equipadas com motores turboeixo Isotov TV3-177A, de 1700 SHP cada.
O Escritório de Projetos Kamov ofereceu uma opção de baixo custo, uma versão para o Exército do helicóptero naval Ka-25. Todavia, tal projeto foi preterido pela versão bimotor do V-24. Mil construiu três mock-ups da cabine para definir o posicionamento dos tripulantes e passageiros. Por fim, o projeto foi aprovado em 6 de maio de 1968, e Mikhail Mil ficou como projetista-chefe até sua morte, em 1970, aos 60 anos de idade.
Mi-24 disparando suas armas
 O projeto detalhado do Mi-24 foi iniciado em agosto de 1968, sob o nome-código Amarelo 24. Em fevereiro de 1969, o mock-up em escala 1:1 da aeronave foi concluído e aprovado. O primeiro protótipo foi testado em voo pairado e cativo em 15 de setembro de 1969, seguido pelo primeiro voo livre quatro dias depois. Um segundo protótipo foi construído logo após, seguido de um lote de 10 aeronaves de pré-série, destinados à avaliação operacional.
Painel principal do Mi-24
Os testes de avaliação da aeronave começaram em junho de 1970, e prosseguiram por 18 meses. Algumas modificações foram introduzidas no decorrer desse tempo, visando principalmente a aumentar a resistência estrutural, a redução de vibração e a minimização da fadiga. A aeronave tinha tendência ao Dutch Roll em velocidades acima de 200 Km/h, e a solução encontrada foi instalar as asas com um ângulo diedro negativo de 12 graus. Essas asas deram um aspecto bastante característico e agressivo ao helicóptero. Outras modificações foram introduzidas, como reposicionar o rotor de cauda da direita para a esquerda, e inverter o sentido de rotação, para que o mesmo aproveitasse o downwash do rotor principal e tivesse sua eficiência aumentada. Os pylons dos mísseis antitanque Falanga foram reposicionados, da fuselagem para as asas.

No final de 1970, a versão de produção Mi-24A entrou na linha de montagem, atingiu seu IOC (Initial Operating Capability - Capacidade Operacional Inicial) em 1971 e foi aceita oficialmente no Arsenal das forças armadas soviéticas em 1972. A OTAN atribuiu o codinome "Hind" para a aeronave.
Vista em corte do Mi-24
Sob qualquer ponto de vista, o Mi-24A era impressionante. Os dois motores foram posicionados bem juntos, no alto da cabine, com entradas de ar duplas. O rotor principal tinha 5 pás de 17,3 metros de comprimento cada, e o rotor de cauda 3 pás. A cabine e o cockpit eram pressurizados, não tanto para aumentar o teto operacional, mas para melhor proteger os ocupantes de armas químicas ou biológicas. Toda a parte inferior e boa parte da lateral foram protegidas com uma blindagem balística de titânio, capaz de absorver até munições calibre .50. O cockpit recebeu painéis de vidro plano, a prova de balas. Até mesmo as pás do rotor, feitas em titânio, podiam resistir a projéteis calibre .50. Essa proteção valeu ao Mi-24 o apelido de Tanque de Guerra Voador. Nos meios russos, no entando, o apelido mais comum do Mi-24 era Krokodil (crocodilo), devido à sua camuflagem e ao seu aspecto agressivo.
Cabine de "passageiros" do Mi-24, para 8 soldados equipados
Mil dedicou considerável esforço no sentido de obter alta velocidade, embora isso implique em problemas para uma aeronave de asa rotativa. Para prevenir a assimetria de sustentação do rotor em alta velocidade, o mastro foi inclinado 2 graus e meio para a direita. Para manter o rotor paralelo ao solo, quando pousado, o trem de pouso era assimétrico. Dessa forma, quando a aeronave estava no chão, a fuselagem ficava inclinada ligeiramente, 2,5º, à esquerda.
Mi-35 afegãos, no deserto do Afeganistão
O trem de pouso triciclo era escamoteável. As asas fixas forneciam até um quarto da sustentação total em alta velocidade. A superfície de aerofólio da cauda era assimétrica, fornecendo um esforço lateral antitorque em alta velocidade, o que aliviava a pressão sobre o rotor de cauda.

Quando foi colocado em serviço, o Mi-24 demonstrou ser uma máquina aterrorizante, mas sua capacidade simultânea de ataque/transporte de tropas não foi tão eficaz como se pretendia. Na verdade, para se aproveitar a aeronave como transporte, muitas vezes se removia parte da blindagem para reduzir o peso, anulando as vantagens de resistência a projéteis de armas leves em campo de batalha. Tornou-se comum, assim, utilizar uma combinação de helicópteros de transporte Mi-8 e os Mi-24 como escolta. Na guerra dos soviéticos no Afeganistão, no entanto, a capacidade multifuncional ataque/transporte do Mi-24 foi muito utilizada.
Mi-24 oferecido à venda
A estréia do Mi-24 em combate ocorreu na Guerra de Ogaden, entre a Etiópia e os guerrilheiros somalis, entre 1977 e 1978, na qual a aeronave foi muito bem sucedida. Mas a Guerra do Afeganistão, entre 1979 e 1989,  é que foi a maior experiência bélica dos Mi-24. Não se sabe ao certo quanto desses helicópteros foram utilizados no Afeganistão, tanto por forças afegãs contra os guerrilheiros rebeldes Mujahedin, quanto pelos próprios soviéticos, mas algumas fontes afirmam que podem ter sido utilizados até 600 helicópteros por ano na guerra, 250 dos quais eram Mil Mi-24.

No Afeganistão, a simples presença dos Hind aterrorizava os guerrilheiros. As máquinas eram praticamente invulneráveis às metralhadoras e outras armas de baixo calibre, de modo que não adiantava muito atirar contra elas. O guerrilheiros Mujahedin apelidaram os Mi-24 de "Shaitan-Arba", a Carruagem de Satanás.

O primeiro helicóptero Mi-24 foi abatido no Afeganistão em 30 de maio de 1979, mas a máquina permaneceu como alvo extremamente difícil de ser abatido até que os americanos começaram a fornecer mísseis portáteis Stinger, guiados por infravermelho, aos Mujahedin. Os Stingers foram as únicas armas realmente perigosas para os Mi-24, e pelo menos 27 Hind foram derrubados no Afeganistão por essas armas. Os mísseis Stinger, com apenas 10,1 Kg de peso eram disparados do ombro de um soldado, dispensando instalações em solo para seu disparo. Podiam atingir velocidade de Mach 2,2 antes de atingir o alvo.

Ao todo, entre 78 e 80 Mi-24 foram perdidos na Guerra do Afeganistão, embora muitas perdas fossem creditadas ao ambiente inóspito e acidentes. Muitos Mi-24 sobreviveram ao armamento antiaéreo, incluindo mísseis, no entanto, e a máquina mostrou ser altamente resistente mesmo no hostil ambiente do deserto, com areia e calor intenso.

Os Mi-24 sobreviveram a várias guerras, além do Afeganistão, como a Guerra do Golfo, Guerra Irã-Iraque, Guerra do Iraque e vários outros conflitos, especialmente guerras civis envolvendo países e povos pertencentes à ex-União Soviética. Até hoje, os helicópteros Mi-24 estão envolvidos em conflitos regionais, como as guerra civis na Líbia e na Síria (2011-2012).
Nariz do Mi-24
 Os Hind foram uma das aeronaves soviéticas/russas mais populares no resto do mundo. Acima de 50 países operam ou já operaram esses helicópteros. Os russos desenvolveram versões de exportação, algumas ocidentalizadas, denominada Mil Mi-25 e Mi-35, a última das quais permanece em produção e continua interessando forças armadas de muitos países, devido à sua versatilidade, resistência, poder de fogo e baixo custo operacional.
Mi-35 da Força Aérea Brasileira, designado AH-2 Sabre
Os Mil Mi-35 são as primeiras aeronaves russas a serem operadas pela FAB - Força Aérea Brasileira. Tratam-se de versões atualizadas Mi-35M com aviônica israelense. Doze aeronaves são operadas pelo 2º/8º GAV, baseadas em Porto Velho, Rondônia. Na FAB, os Mi-35 foram redesignados como AH-2 Sabre.
AH-2 Sabre da FAB em Porto Velho/RO
Desde 1969, Mil desenvolveu muitas versões dos Mi-24/25/35, sendo algumas para uso policial e paramilitar. Nas figuras abaixo, pode-se ter uma idéia das variantes fabricadas. A aeronave permanece em produção, e acima de 2 mil aeronaves já foram fabricadas até hoje. Nas forças russas, sua desativação estava prevista para 2015, mas várias aeronaves foram atualizadas recentemente e devem permanecer em serviço muito além disso. A longevidade dessas aeronaves é uma prova de sua eficiência e de sua popularidade, como provavelmente o melhor helicóptero russo já fabricado.


Aeronaves muito estranhas, algumas muito feias

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Certamente a imaginação humana não conhece limites. Desde o início da história da aviação, projetistas profissionais e amadores se esmeram em conseguir melhor desempenho de suas máquinas, muitas vezes em detrimento da aparência. Diz um ditado na aviação que, se um avião é bonito, certamente voa bem. Isso certamente foi ignorado pelos projetistas das aeronaves listadas abaixo, que parecem nuito mais "Frankensteins" aeronáuticos:

Bay Super-V
Essa aeronave, a Bay Super-V, foi construída no Canadá pela empresa Bay Aviation Services, que adquiriu os direitos do projetista Dave Peterson, que modificou um Beechcraft Bonanza de monomotor para bimotor em 1955. A Bay construiu apenas 5 aeronaves, certificada na FAA e no Canadá, antes de vender os direitos para uma empresa de Savannah, na Geórgia, a Mitchel Aircraft. Cerca de 14 aeronaves foram convertidas a partir de modelos Bonanza. Sem um verdadeiro leme de direção, o comportamento da aeronave em caso de pane de um dos motores Lycoming O-360 A1A de 180 HP devia ser singular.
Givaudan 1909
Existem asas enfechadas, trapezoidais e elípticas, mas o Givaudan 1909 certamente foi o único avião a possuir asas cilíndricas. Não se sabe qual era o raciocínio que impulsionou o projetista a montar uma asa com esse formato, pois a área de sustentação era muito ineficaz para ser bem sucedido. A asa dianteira era totalmente móvel, servindo como superfície de controle. Fazer o rolamento devia ser problemático, se tivesse voado... A aeronave demonstrou ser totalmente impraticável. Tinha um motor V-8 Vermorel de 40 HP.
Junkers G-38
Certamente uma das aeronaves mais feias já produzidas na história, o Junkers G-38 foi um grande quadrimotor alemão dos anos 30. Dois protótipos foram produzidos como aeronaves comerciais, ambas operadas pel Deutsche Luft Hansa. Tinha acomodações luxuosas, e a cabine avançava para dentro das asas, podendo observar a paisagem através de janelas instaladas no bordo de ataque. As asas espessas permitiam também aos mecânicos acessar e reparar os motores Junkers, dois V-12 e dois de 6 cilindros, em voo.
Wagner Twin Tri-Pacer
O projetista americano Harold Wagner fez essa interessante, mas terrivelmente feia, conversão a partir de um Piper PA-22 Tri-Pacer. Instalou no nariz do avião dois motores Lycoming O-290 de 125 HP lado-a-lado, em 1952. Para que os discos das hélices não interferissem um com o outro, Wagner colocou um espaçador no cubo de uma delas, para que ficasse um pouco mais à frente. O desempenho não agradou, e o avião posteriormente retornou à sua configuração monomotor original.
Wagner Twin Cub
Harold Wagner foi um projetista prolífico em produzir bimotores pouco convencionais. Além do Twin Tri-Pacer citado acima, produziu outros projetos utilizando fuselagens gêmeas. O Twin Cub da foto acima é um exemplo notável, especialmente porque os dois aviões utilizados na sua montagem não eram iguais. Um era o famoso Piper J-3 Cub, e o outro era um Piper PA-11. Wagner colocou um motor Continental C-85 e uma carenagem na fuselagem do J-3 para equilibrar a potência e o arrasto. Como as duas fuselagens eram bem próximas, um espaçador foi colocado no cubo da hélice de uma das aeronaves para que uma hélice ficasse um pouco mais à frente, como no protótipo Twin Tri-Pacer. Wagner também produziu um protótipo de fuselagens duplas a partir de duas aeronaves leves Ercoupe, denominado Twin Ercoupe (foto abaixo), que foi utilizado para fazer acrobacias em shows aéreos.
Wagner Twin Ercoupe

Pinal Airpark: o cemitério dos jumbos

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Em Marana, no estado americano do Arizona, cerca de 30 milhas a noroeste de Tucson, existe um movimentado aeroporto público denominado Pinal Airpark. O aeroporto parece desproporcional a Marana, uma quente e ressequida cidade de apenas 35 mil habitantes, pois abriga uma enorme frota de aeronaves comerciais, incluindo muitos Boeing 747.
Aeronaves desativadas lotam o pátio do Pinal Airpark
Entretanto, nenhuma companhia aérea opera regularmente em Marana. Não há esteiras de bagagem, nem grandes restaurantes, nem lojas e nem guichês de companhias. Mas não há silêncio, no entanto. Existe um ruído constante, e irritante, de poderosas máquinas industriais. Sua tarefa é reduzir aeronaves a pedaços. Pinal Airpark é, na verdade, um grande cemitério de aeronaves, local do último pouso de aviões que, por anos a fio, transportaram milhões de passageiros ou milhares de toneladas de carga durante sua vida útil.
Após a remoção dos trens de pouso, as aeronaves ficam apoiadas provisoriamente em pilhas de dormentes ferroviários de madeira
A história do Pinal Airpark começa durante a Segunda Guerra Mundial. Construído para o Exército dos Estados Unidos em 1942 pelo Sundt & Del Webb Construction Companies, e inaugurado em março de 1943, essa instalação foi batizada como Marana Army Air Field. Durante a guerra, o aeroporto foi sede  da 389th Army Air Force Base Unit, vinculada à AAF West Coast Training Center, cujo objetivo principal era formar nada menos que 50 mil pilotos militares para combater na Segunda Guerra Mundial.
Dezenas de grandes aeronaves lotam o aeroporto. Muitas jamais voarão novamente
Originalmente, tinha 4 pistas, em um arranjo que lembra o número 4. Foi equipado com uma ampla infraestrutura que compreendia luz elétrica, encanamentos de água, esgoto e gás, além de hangares e outras facilidades. Um grande sistema de drenagem, em canais, foi construído para escoar a água resultante das torrenciais e repentinas tempestades que assolam constantemente o deserto do Arizona. Um ramal e uma estação ferroviária também foram construídos para servir a base.
Na linha da morte, um Boeing 747 e um 767 prestes a desaparecer por completo
 A principal unidade de treinamento baseada em Marana era a 3024th (Basic Training), que formava pilotos de aeronaves de transporte e navegação por instrumentos. Muitos pilotos chineses também foram formados em Marana. Como apoio à base principal, foram construídos no deserto cinco aeródromos auxiliares vizinhos, Picacho Aux # 1, # 2 Rillito Aux (atualmente utilizado com o nome de Marana Northwest Regional Airport), Coronado Aux # 3, Avra Aux # 4, e Sahuaro Aux # 5 (atualmente utilizado com o nome de El Tiro Gliderport).
Esse Boeing 747-400, o N185UA entregue novo à United em 1992, foi estocado em Marana em 2009
Com o fim da guerra, em 1945, o Marana Army Air Field, assim como centenas de outros campos de pouso espalhados pelos Estados Unidos, foi fechado e, praticamente, abandonado pelo governo. Simplesmente, não havia mais necessidade dele.
O N185UA, que, na verdade, nunca chegou a operar para a BlueSky, jamais voltou a voar, e foi para a linha da morte, com apenas 19 anos de uso, em 2011.
Em 1948, a USAF, sucessora do Army Air Forces, repassou o direito de propriedade do Marana Army Airfield para o Condado de Pinal, depois de demolir a maior parte das instalações e infraestruturas militares construídas durante a guerra. O aeródromo fica na divisa entre os Condados de Pima e Pinal. O Condado de Pinal alugou o aeródromo para operadores civis, entre 1948 e 1951, e para a Darr Aeronautical Technical Company, uma escola civil de pilotos terceirizada pela USAF, entre 1951 e 1956.
Esse DC-10 foi cuidadosamente protegido da areia, visando seu provável retorno à ativa
Durante a Guerra do Vietnan, Marana tornou-se a base doméstica de todas as operações aéreas da CIA - Central Inteligency Agency, que montou uma empresa aérea de fachada, a Intermontains Airlines, cujo principal objetivo, velado, era apoiar operações aéreas secretas da inteligência americana no Vietnan.
A estrutura do cockpit, ou mesmo o cockpit inteiro, são cobiçados por produtores de Hollywood
Um dos engenhos mais interessantes testados em Marana foi o Skyhook Fulton (vejam o artigo sobre esse interessante equipamento aqui nesse blog: http://culturaaeronautica.blogspot.com.br/2009/09/skyhook-um-estranho-aparelho-de-resgate.html).

Atualmente, o Pinal Airpark é utilizado por um empresa privada, a Evergreen, que instalou o Evergreen Aircraft Maintenance Facility, dedicado à manutenção de aeronaves temporariamente desativadas e desmonte de aeronaves retiradas definitivamente de serviço, além de conversão de aeronaves de passageiros para cargueiros e outras finalidades especiais. A Evergreen converteu, por exemplo, um Boeing 747-100 para avião-bombeiro, atividade que jamais deve ter sido imaginada por seus projetistas originais.
Esse Boeing 747-100 foi convertido para avião-bombeiro em Marana, sendo o maior avião desse tipo no mundo
Como resultado dessa atividade da  Evergreen, Marana recebe frequentemente aeronaves, a maioria de grande porte, para a morte. São aeronaves muito voadas, e cujo custo de manutenção e operação já não compensam. É caro manter uma aeronave comercial em condições de aeronavegabilidade, e esse custo vai aumentando com a idade da aeronave. Chega a um certo ponto que a aeronave já vale mais desmontada do que inteira, e aí o seu destino está selado.
Aeronaves desativadas aguardando o seu destino final
 Hoje, quase não existem mais aeronaves como Boeing 707 e Douglas DC-8 sendo desmontados. Esses praticamente não existem mais. Os aviões da vez são os Boeing 747-200, -300 e -400, 767, 757 e McDonnell-Douglas DC-10, além de Airbus A300 e A320.
As garras hidráulicas e as serras circulares motorizadas rapidamente convertem um antes poderoso 747 a uma pilha de metal
Existem muitos cemitérios de aviões nos Estados Unidos. Podemos citar Mojave e Victorville, na Califórnia, Goodyear e Kingman no Arizona, e Opa-Loka na Flórida. Mas Pinal Airpark se caracteriza pelo desmonte de grandes aviões, como os Boeing 747 e os McDonnell-Douglas DC-10. De certa forma, é um tanto deprimente ver um avião desses chegar voando ao aeroporto e ser desmontado sem maiores cerimônias.
A preservação e a reciclagem de aeronaves fora de serviço é um negócio que movimenta bilhões de dólares anualmente nos Estados Unidos
Hoje, o Pinal Airpark tem somente uma pista ativa, a 12-30, com 2088 metros de extensão. As demais pistas, do tempo da Segunda Guerra Mundial, são usadas como ponto de estacionamento de aeronaves. O clima seco do deserto preserva as aeronaves desativadas da famigerada corrosão intergranular do duralumínio, o maior fantasma das estruturas de avião. Embora se pense o contrário, muitas aeronaves que estão em Marana voltam a voar novamente, depois de uma preservação cuidadosa feita pela Evergreen.
Esse 747, antes operado pela Northwest, aguarda se destino final na linha da morte
Depois de algum tempo estacionada, se a decisão do seu operador for pelo desmonte, todos os equipamentos úteis e valiosos são cuidadosamente removidos e colocados à venda, como motores, instrumentos, trens de pouso, APUs, aviônicos e outras peças. O restante da estrutura é pícado por tesourões hidráulicos, montados em veículos com lagartas, depois de limpos das partes de plástico e isolamentos térmicos, cujo destino é simplesmente o lixo. O metal picado é vendido para reciclagem, e sai de Marana em grandes caminhões-pranchas. É o fim do avião.
Dois Boeing 777-200, antes operados pela Varig, aguardam novo operador ou o tesourão
Os militares ainda permanecem no Pinal Airpark. O aeroporto abriga o Silver Bell Army Heliport, base da Western Army National Guard Aviation Training - WAATS.  A base é equipada com helicópteros de ataque AH-64 Apache, e é uma excelente base de treinamento, pois possui grande áreas planas e desertas e condições meteorológicas favoráveis durante praticamente o ano inteiro, além de estar cercada por aeródromos civis e militares muito bem equipados. Trinta por cento do movimento do Pinal Airpark é militar.
Na vista de satélite, as 4 pistas antes existentes são claramente visíveis
Embora seja um aeródromo público, o Pinal Airpark e seu cemitério de aeronaves não é visitável. Os poucos turistas que se arriscam recebem um folheto de propaganda do Pima Air & Space Museum, na vizinha cidade de Tucson, e são convidados a se retirar. O Pima Museum não deixa de ser um ótimo programa, sem dúvida, mas a frustração de deixar de ver os grandes jumbos sendo desmontados é grande. Para quem vem voando, é possível pousar para abastecer no aeródromo e depois sobrevoar o cemitério a baixa altura, mas andar entre os aviões armazenados é praticamente impossível. Embora se trate de aeronaves desativadas, é um patrimônio consideravelmente valioso, e é justificável que seja cuidadosamente guardado e preservado da deterioração e de eventuais vandalismo. Definitivamente, o Pinal Airpark não é um museu. Se fosse, seria um dos mais visitados da região.

O Pinal Airpark ocupa uma área de 840 hectares no deserto. Atualmente possui uma única pista asfaltada de 2088 metros de comprimento e 46 metros de largura. Possui elevação média de 1893 pés. Sua designação ICAO é KMZJ, e na IATA  é MZJ.

Aeronaves campeãs de longevidade

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Aeronaves são máquinas que possuem uma vida útil limitada. Em alguns casos, essa vida útil é muito curta, como ocorreu com os bombardeiros americanos Consolidated B-24 Liberator. Embora 18.482 aviões do tipo tenham sido fabricados (foi o avião militar americano mais produzido da história), essas aeronaves praticamente não foram mais usadas depois da Segunda Guerra Mundial, tendo permanecido apenas 4 anos em serviço, entre 1941 e 1945. São raros até mesmo em museus.
Beech Bonanza V-35B
Em compensação, outras aeronaves, tanto civis quanto militares, sobreviveram a muitos dos seus sucessores. Alguns permanecem em serviço ativo décadas depois do último exemplar ter sido fabricado, enquanto outros ainda são produzidos e ainda são sucessos comerciais. A lista abaixo mostra os mais conhecidos "matusaléns" voadores da história:

Boeing B-52 Stratofortress: Desenvolvido como bombardeiro estratégico nuclear a partir do final da década de 1940, o Boeing B-52 é um sério candidato ao título de avião militar mais longevo da história. O primeiro protótipo voou pela primeira vez no dia 15 de abril de 1952, e o modelo entrou em serviço na USAF - United States Air Force, seu único usuário, em fevereiro de 1955. 744 exemplares foram fabricados, de vários modelos, até o último avião, o B-52H 61-0040 sair da linha de montagem, em 26 de outubro de 1962, há mais de 50 anos. 
Boeing B-52A, da década de 1950
Pouco tempo após ser introduzido em serviço, seu substituto supersônico, o Convair B-58 Hustler, já estava sendo projetado, entrando em serviço em 1960. Entretanto, o B-52 sobreviveu ao seu sucessor, desativado em 1970, e continua em serviço ativo até hoje. Está longe de ser aposentado, pois recentemente os americanos lançaram um programa de reconstrução e reequipamento das células ativas, para manter o avião em serviço até, pelo menos, 2040.  
Boeing B-52H, operando ainda hoje
Alguns exemplares deverão ficar, então, 80 anos em serviço, uma marca inigualável. Muitos dos seus pilotos atuais voam aeronaves que seus avôs voaram na juventude. 85 aeronaves, todas do modelo B-52H, estão ativas, e mais 9 estão na reserva.

Beechcraft Bonanza: Em 22 de dezembro de 1945, voou pela primeira vez o avião que, de longe, é o que está há mais tempo em produção na história, o Beechcraft Bonanza. O modelo apareceu no mercado em 1947, como Model 35, um rápido e eficiente avião de 4 lugares e uma característica cauda em V. 
Beech Bonanza A35, fabricado em 1948 e ainda voando
Vários outros modelos se sucederam ao longo de mais de 6 décadas e, embora o modelo de cauda em V não seja mais produzido, os de cauda convencional, aviônica Garmim e fuselagem alongada G-36 ainda são produzidos pela Hawker Beechcraft. Mais de 17 mil Bonanzas, de todos os modelos, foram produzidos até hoje.
Beech Bonanza G36, fabricado em 2012
Tupolev Tu-95 "Bear": Como o seu rival americano B-52, o Tu-95 começou a ser desenvolvido nos anos 40, e fez seu primeiro voo em 1952, em 12 de novembro. Apesar da idade do projeto, ainda detém o título de mais rápido avião a hélice já fabricado. Sua versatilidade e adaptabilidade tornou-o uma aeronave muito longeva, e o Tu-95 sobreviveu a vários pretensos sucessores.
Tupolev Tu-95 Bear
Produzido inicialmente como bombardeiro nuclear, hoje é uma aeronave de vigilância marítima. Os Tu-95 permaneceram em produção por mais de 40 anos, e em  2007 o presidente russo Vladimir Putin ordenou a reativação da linha da produção. Devem permanecer em serviço até 2040, pelo menos, e seu tempo em serviço pode chegar perto dos 80 anos, feito comparável apenas ao do B-52 americano. 63 aeronaves permanecem em serviço ou em reserva técnica, e existem cerca de 23 células em condições de ser reativadas.
Tupolev Tu-95M Bear, em operação na Rússia
Cessna 172 Skyhawk: O Cessna 172 é o avião leve mais produzido e mais popular da história. Mais de 43 mil exemplares já foram fabricados, e o avião continua na linha de produção, apesar da idade do seu projeto.
Primitivo Cessna 172A, da década de 1950
A história do Cessna 172 começa em 1955, quando o fabricante resolveu modificar um Cessna 170, de trem de pouso convencional, para triciclo. O primeiro avião modificado voou pela primeira vez em 12 de junho de 1955. Em 1956, foi oferecido no mercado, e foi um sucesso imediato desde o início, superando todos os modelos anteriores, de trem de pouso convencional. Deixou de ser fabricado em 1986, quando a Cessna encerrou a produção de todas as suas aeronaves leves de motor a pistão, mas a produção foi retomada dez anos depois, em 1996, e continua até hoje. Mesmo competindo com aeronaves bem mais modernas, continua vendendo muito bem.
Moderno Cessna 172S, operado pelo Aeroclube de Londrina
Boeing 737: Em 1964, a Boeing começou a desenvolver uma aeronave a jato para voos domésticos, para complementar os modelos maiores 720 e 727. Os grandes trunfos do modelo seriam a fuselagem com o mesmo diâmetro dos modelos maiores e a propulsão bimotora. Embora o avião inicial tivesse uma fuselagem bem curta, o passageiro não veria diferença entre o 737 e os grandes 707 intercontinentais.
Boeing 737-100, da Lufthansa (1968)
O 737 voou pela primeira vez em 9 de abril de 1967, e já em fevereiro de 1968 seus primeiros modelos de produção foram entregues ao operador original, a Lufthansa. O Boeing 737 é o avião comercial a jato mais bem sucedido da história, e continua em produção contínua há 45 anos. A aeronave foi modernizada com novos motores CFM-56 mais econômicos. O primeiro desses aviões, hoje denominados 737 Classic (modelos -300, -400 e -500) voou pela primeira vez em 1984. Em 1997, a aeronave recebeu novos aviônicos e motores CFM mais modernos e econômicos, sendo denominados como 737 New Generation.
Moderno Boeing 737-800, da Gol
A trajetória dos 737 parece longe de terminar, apesar da feroz concorrência oferecida pela Airbus, com seus modelos A320 e derivados. Uma nova série, denominada 737-MAX, já acumula 969 pedidos, que serão atendidos a partir de 2017.

Douglas DC-3: O DC-3, sem dúvida, foi a aeronave que mais revolucionou a aviação comercial nos anos 30. O primeiro voo dessa aeronave ocorreu em 17 de dezembro de 1935, e no ano seguinte o fabricante entregou o modelo aos seus primeiros operadores, a TWA e a American Airlines.
Antigo Douglas DC-3 da American Airlines, nos anos 30
O avião foi muito bem sucedido, mas apenas 607 DC-3 civis foram entregues até que a sua linha de produção fosse interrompida, em 1942, quando a Douglas passou a fabricar apenas versões militares do avião, denominados C-47 na Força Aérea do Exército e R4D na Marinha americana, para servir na Segunda Guerra Mundial. Durante a guerra, 10.048 aeronaves militares derivadas do DC-3 foram produzidas, até o encerramento da linha de produção, em agosto de 1945.
Douglas C-47/DC-3, restaurado e ainda voando no Brasil
Os aviões militares remanescentes foram oferecidos no mercado civil a partir do final de 1945, como "sobras de guerrra", por preços extremamente convidativos, o que fez florescer o mercado nessa época. Um dito popular corria na época, que dizia que "o único substituto para um DC-3 é outro DC-3. Em 1998, cerca de 400 aeronaves ainda voavam comercialmente, mas, desde então, esse número decaiu muito, devido a requisitos de segurança e falta de peças de reposição. Mas ainda existem operadores comerciais do avião, 76 anos após sua introdução no mercado.

Lockheed-Martin F-16 Fighting Falcon: Historicamente, aeronaves militares possuem uma vida útil curta, pois o desenvolvimento tecnológico pode torna-las rapidamente obsoletas no campo de batalha. Mas existem exceções à regra. Entre os aviões de caça, um dos aviões mais longevos é, sem dúvida, o Lockhhed Martin F-16. Originalmente projetado pela General Dynamics para a USAF, o F-16 demonstrou ser uma excelente aeronave de combate multifuncional.
Protótipo General Dynamics YF-16, 1974
O F-16 voou pela primeira vez em 20 de janeiro de 1974, e permanece na linha de produção 38 anos depois, sendo constantemente atualizado e permanecendo como um caça de primeira linha. Além de ser operado pela USAF e pela Marinha dos Estados Unidos, o avião opera em outros 25 países. É uma sobrevida notável para um avião de caça.

Bell 206 Jet Ranger/Long Ranger:Entre as aeronaves de asas rotativas,  o Bell 206 merece um destaque especial. É o helicóptero civil mais produzido e mais popular da história. Preterido inicialmente em uso militar, foi adotado posteriormente pela USAF e pela Marinha Americana com muito sucesso.
Bell 206
O primeiro Bell 206, denominado Jet Ranger, foi oferecido no mercado em 1967. Permaneceu continuamente em produção até 2010, o que lhe garante o posto de helicóptero produzido por mais tempo na história, 43 anos contínuos. Durante esse tempo, mais de 7300 exemplares foram fabricados, tornando-o o helicóptero mais popular do mundo.
Bell 206, o helicóptero mais popular do mundo

Kapustin Yar: a versão russa da Area 51

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Um dos lugares mais misteriosos da Terra encontra-se no Deserto de Nevada, nos Estados Unidos: conhecida como Area 51, e por outros nomes, essa intrigante instalação faz parte do imenso complexo de testes militares do Nevada Test and Training Range, e é oficialmente um destacamento remoto da Base Aérea de Edwards, a maior de todas as bases de testes militares da USAF.
Réplica de um foguete A-4 alemão, testado em Kapustin Yar na década de 1940
Supostamente, a Area 51 abriga todos os destroços de OVNIs - Objetos Voadores Não Identificados já coletados pelos Estados Unidos, inclusive corpos de possíveis alienígenas, embora, pelo histórico da base, e pelas declarações oficiais, seja apenas uma área de testes de aeronaves e armamentos secretos.

Entretanto, poucas pessoas conhecem uma base semelhante na Rússia, tão, ou até mais, misteriosa que a Area 51: trata-se do Cosmódromo de Kasputin Yar, no Oblast de Astrakhan, cerca de 100 Km a leste-sudeste de Volgogrado, a antiga Stalingrado.
Foto de reconhecimento de Kapustin Yar dos anos 50
A 4ª Área de Teste de Mísseis "Kapustin Yar" foi criada oficialmente em 13 de maio de 1946 pelo governo soviético, e era destinada ao estudo de armas com propulsão a jato. Sempre foi uma instalação ultra-secreta devido às suas próprias características. A missão atribuída inicialmente a Kapustin Yar foi a avaliação de material capturado das forças alemãs, no final da Segunda Guerra Mundial, que tinha terminado um ano antes. Se primeiro comandante foi Vasily Voznyuk, que permaneceria no posto de 1946 até 1973.
Intrigantes instalações em Kapustin Yar
Entre as diversas "armas secretas" de Hitler enviadas a Kapustin Yar estavam 11 foguetes A-4, também conhecidos como V-2. O primeiro lançamento de um A-4 ocorreu em 18 de outubro de 1947. Os soviéticos sofreram dois acidentes no lançamento dos foguetes A-4, e alguns outros tipos de foguetes foram destruídos antes de serem lançados, de modo bastante misterioso, mas a tecnologia dessas armas alemãs foi extremamente útil para os soviéticos, através da prática de engenharia reversa, já que praticamente todos os cientistas alemães envolvidos nos programas de foguetes se renderam aos americanos, no final da Guerra.
Instalações de radar em Kapustin Yar
Entre 1957 e 1961, os soviéticos chegaram mesmo a fazer testes atmosféricos com 11 bombas nucleares de baixa potência (10 a 40 Kilotons) nas imediações de Kapustin Yar. Em 1966, tornou-se um cosmódromo, e permanece nessa função até hoje, embora essa atividade espacial tenha ficado interrompida temporariamente entre 1988 e 1988. Para abrigar cientistas, militares e pessoal de apoio, foi criada uma cidade, Znamensk, tão secreta que sequer constava nos mapas, e cujo acesso era altamente restrito.
Foto de reconhecimento
Uma outra cidade das proximidades, chamada Zitkhur, cuja existência era muito anterior, foi simplesmente evacuada e demolida pelos soviéticos, pois o governo queria evitar "curiosos". Os subterrâneos secretos de Kapustin Yar foram apelidados depois, em homenagem a essa cidade erradicada, de Zitkhur.

Ao longo dos anos, Kapustin Yar foi palco de testes de mísseis baseados em submarinos, mísseis de cruzeiro e mísseis balísticos intercontinentais. Foi lá que foi testado o primeiro míssil lançado de um silo subterrâneo na história. O impressionante número de 24 mil mísseis, dos mais diversos tipos, foi testado em Kapustin Yar. Muitos, senão todos, os satélites da série Cosmos, foram de lá lançados.
Foguete do programa Cosmos no cosmódromo de Kapustin Yar
Kapustin Yar era, obviamente, uma instalação prioritária para os serviços de inteligência ocidentais. Além de informantes mantidos pelos serviços de inteligência americanos e britânicos, tanto a RAF quanto a CIA e a USAF fizeram voos de reconhecimento sobre a base a partir de 1953, utilizando principalmente aeronaves Canberra e Lockheed U-2. O primeiro desses voos, com um English Eletric Canberra, partiu de Giebelstadt, na Alemanha Ocidental, sobrevoou o vale do Rio Volga e Kapustin Yar e pousou em Tabriz, no Irã. O governo britânico, entretanto, jamais admitiu oficialmente que tal voo tenha ocorrido, embora existam claras evidências de que a missão realmente aconteceu, como fotos e documentos posteriormente liberados.
Canberra da RAF
Os serviços de inteligência ocidentais recolheram muita informação, fotos e documentos sobre Kapustin Yar,  ao longo dos anos, mas tal material sempre foi considerado altamente secreto e até hoje não foi liberado totalmente ao público. Entre as mais intrigantes histórias envolvendo Kapustin Yar estão os relatos de incidentes envolvendo OVNIs sobre a base, a partir de 1948.
Lockheed U-2
O mais interessantes desses incidentes, e o mais conhecido hoje, foi o combate aéreo entre uma aeronave de caça Mig-15 e um OVNI em formato de cilindro, que resultou na destruição do Mig e do pouso forçado do OVNI, que foi então, capturado e levado para as sombrias instalações subterrâneas de Kapustin Yar.
Concepção artística do OVNI de 1948
No entardecer do dia 19 de junho de 1948, menos de um ano após o incidente de Roswell, a suposta queda de um OVNI no deserto do Novo México, os radares de Kasputin Yar captaram um eco potencialmente hostil no radar, e logo um piloto de um caça Mig-15 soviético avistou um objeto cilíndrico, de aspecto prateado, sobrevoando a base.  Obedecendo às ordens prévias superiores de eliminar qualquer aeronave que tentasse sobrevoar Kapustin Yar, o piloto aproximou-se do objeto, semelhante a um charuto e de porte não muito grande, e iniciou um "dog fight" durante aproximadamente três minutos, antes de disparar um míssil ar-ar contra o alvo. O piloto do Mig relatou, durante o combate, que o objeto misterioso focou sobre ele uma luz muito forte, que o desorientou, mas não impediu o lançamento do míssil.
Mig 15, similar ao usado no combate ao OVNI em Kapustin Yar
O fato é que o míssil surtiu resultado, e o objeto acabou fazendo um pouso forçado dentro da base. O Mig também não sobreviveu ao combate, pois caiu e matou seu piloto. O modo como foi derrubado é controverso, pois alguns afirmam ter visto o OVNI contra-atacar, enquanto outros afirmam que o piloto desorientado simplesmente perdeu o controle do avião após ter sido cegado pela forte luz.
Suposta foto do OVNI de Kapustin Yar, em 1948
Os destroços do OVNI e do avião foram recolhidos cuidadosamente e encaminhados aos subterrâneos da base, o Zitkhur, supostamente um grande e profundo complexo de 40 metros de profundidade destinado às atividades mais secretas de Kapustin Yar. Extensa documentação teria sido produzida sobre o incidente, mas nada saiu na imprensa, ao contrário do que aconteceu em Roswell, e toda a história permaneceu totalmente ignorada pelo público durante os 50 anos seguintes. Afinal, eram os primeiros e tensos anos da Guerra Fria, com a União Soviética sob o jugo de Joseph Stalin, e qualquer indiscrição de uma testemunha podia custar anos de cativeiro na Sibéria.

O engenheiro russo  Sergei Korolev, projetista dos primeiros foguetes soviéticos e chefe do programa espacial soviético até 1966, quanto faleceu, fez uma expedição privada ao local do evento Tunguska, onde um meteorito gigante explodiu em 1908. Korolev constatou que ainda havia muitos vestígios do evento, mas nenhuma cratera. Na verdade, Korolev verificou que o local parecia ter sido atingido por uma bomba nuclear, de uns 40 Megatons. Ninguém na Terra em 1908 dominava tal tecnologia. Seria uma nave ou uma arma alienígena? Korolev encontrou diversos resíduos metálicos radioativos, e mapeou os locais onde esses foram encontrados. Onde foram parar tais resíduos?? Em Kapustin Yar... claro.
Local da explosão de Tunguska, em 1908
Todas as atividades e incidentes relativos aos OVNIs na União Soviética foram mantidos por décadas no mais absoluto segredo.

Mas, um dia, a União Soviética e a Guerra Fria acabaram. O governo de Bóris Yeltsin acabou liberando vários documentos,  antes secretos, da era soviética, e entre esses documentos, estavam os relatos sobre as atividades de Kapustin Yar e os incidentes com os OVNIs. Dessa forma, o incidente de 1948 foi conhecido pelo público através de fontes oficiais, ao contrário do que ocorreu em Roswell.

Outros incidentes envolvendo OVNIs foram registrados em Kapustin Yar, depois do incidente de 1948. Um piloto russo, o Coronel Vyatkin Lev Mikhailovitch declarou, em uma entrevista ao canal de TV a cabo History Channel que, às 18 horas e 30 minutos do dia 7 de agosto de 1967, ele foi atingido por um "facho de luz" vindo de um OVNI em forma de disco. Ele manobrou rapidamente seu Mig e se evadiu, mas o misterioso facho atingiu uma das asas, que ficou um estranho brilho luminescente ao longo de uma semana.

Em 1990, moradores de várias cidades situadas no entorno de Kapustin Yar relataram ter avistado um ou dois OVNIs, entre as 22 e 23 horas e 30 minutos acima dos portões principais da base. Ninguém sabe se eram realmente OVNIs ou se eram um teste de equipamento militar lançado de lá mesmo.

O fato é que a KGB, a polícia secreta soviética, produziu um relatório de 124 páginas denominado "Arquivo Azul", sobre todos os incidentes soviéticos com OVNIs, especialmente os de Kapustin Yar. O ex-agente da KGB Vladimir Semenov afirmou ao History Channel que tal documento foi produzido através de diversos outros documentos secretos, entre 1960 e 1980.

Os bons tempos de arquivos secretos divulgados livremente no tempo de Yeltsin, no entanto, já chegaram ao fim. O Presidente Vladimir Putin conteve essa liberação indiscriminada de arquivos, e hoje já é dificil conseguir informações de OVNIs russos por fontes oficiais, enquanto aumenta drasticamente a informação extraoficial, muitas vezes altamente deturpada, e mesmo mentirosa, mero fruto da imaginação de mentes turbulentas e inventivas.
Sistemas de mísseis atuais, em Kapustin Yar
Kapustin Yar é, ainda hoje, uma base e um cosmódromo altamente protegido da Rússia. Mantém-se em plena atividade, depois de passar 10 anos num relativo ostracismo, entre 1988 e 1998. Se é verdade que seus subterrâneos abrigam destroços de OVNIs e até corpos de alienígenas, ninguém sabe com certeza. Mas é fato que, depois do incidente de 1948, os soviéticos tiveram um salto tecnológico impressionante em relação às pesquisas com foguetes e naves espaciais, e este salto nunca pode ser satisfatoriamente aplicado. Teria sido resultado de engenharia reversa em naves alienígenas?

St. Cloud: o primeiro hangar do mundo

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Na virada do Século XIX para o Século XX, o Aeroclube da França mantinha uma aeroestação no bairro de St. Cloud, em Paris. Essa aeroestação ficava na hoje denominada Avenue du Maréchal Jean de Lattre de Tassigny, entre as avenidas Clodoald e Longchamps. Esse local era a base de lançamento de balões dos sócios do Aeroclube, e era sempre muito movimentado, exceto durante os meses do inverno.
O primeiro hangar do mundo em St. Cloud
 O Aeroclube da França foi fundado em 1898 e já contava com cerca de 400 membros  em 1900. Santos-Dumont foi um dos seus fundadores e fazia parte do primeiro Comitê de Direção, integrado também por  Henry de La Valx, Gustave Eiffel, Ernest Archdeacon e Paul Tissandier, entre vários outros. O Aeroclube era presidido pelo Conde Albert de Dion, que também havia fundado o Automóvel Clube da França alguns anos antes.
Aeroestação de St. Cloud 1899
O Aeroclube da França comprou o terreno em St. Cloud, o que permitiu aos seus sócios dispor de um espaço exclusivo para o lançamento dos balões, até então lançados de parques públicos de Paris, como o Jardim de Aclimação.
Localização do hangar e da Aeroestação de St. Cloud (foto: Luiz Pagano)
A personalidade prática e irrequieta de Santos-Dumont, no entanto, logo se fartou dos complicados e procedimentos de lançamento de balões. A cada voo, era necessário produzir o gás hidrogênio, estender cuidadosamente o invólucro do balão e enchê-lo para voar. Depois, era preciso esvaziar o balão e dobrá-lo novamente, já que não havia como mantê-lo cheio para outros voos, pois ficava exposto às intempéries. O hidrogênio era desperdiçado.

Santos-Dumont logo pensou, então, em construir um abrigo para os balões já inflados para evitar todo esse trabalho e desperdício de gás. Obteve autorização do Aeroclube para construir um grande galpão em madeira na Aeroestação de St. Cloud. Estava nascendo o primeiro hangar de aeronaves da história.
O hangar de St. Cloud (foto: Luiz Pagano)
O termo "hangar" veio do inglês hangar, que originalmente significava"depósito de veículos de tração animal", e a palavra tem provável origem holandesa, uma modificação de ham-gaerd, que significa "galpão ao lado da casa".

Santos-Dumont concluiu a construção do seu hangar em junho de 1900. Era um grande galpão de madeira, de 30 metros de comprimento, 11 metros de altura e 7 metros de largura na base, excluindo os suportes das duas portas corrediças, uma grande novidade criada pelo inventor brasileiro.
Interior do hangar de St. Cloud (foto: Luiz Pagano)
Portas corrediças eram inexistentes à época. Os construtores do hangar de Santos-Dumont consideravam tal idéia impraticável, e duvidavam que funcionasse, mas o inventor apoiou a porta em grandes rolamentos, que corriam sobre trilhos acima e abaixo, e seu funcionamento era tão suave que até uma criança conseguia abri-la sem fazer grande esforço. A porta era voltada para o lado sul do hangar. O terreno em frente não era plano, tinha um forte declive para o lado leste, em direção ao vale do Rio Sena.
O dirigível nº 6 no hangar de St. Cloud
Um pequeno anexo do hangar continha barris de ácido sulfúrico e uma caixa de limalha de ferro. O ferro reagia com o ácido, produzindo o hidrogênio, que era canalizado para o interior do hangar e para os balões por uma mangueira.

O primeiro dirigível de Santos-Dumont a ser montado e experimentado no hangar foi o nº 4. Os dirigíveis nº 5, nº 6 e nº 7 também foram construídos lá, mas Santos-Dumont logo concluiu que o hangar de St. Cloud não era mais adequado. Novas construções foram feitas nas proximidades, inclusive uma fábrica de balões do empresário Henri Deutsch de La Meurthe, tornando o lugar um tanto perigoso para manobrar dirigíveis.
O hangar de Neuilly, que substituiu o pioneiro de St. Cloud
Santos-Dumont construiu um novo hangar em Neuilly, relativamente próximo dali, e que foi inaugurado na primavera de 1903. O dirigível nº 7, embora tivesse sido construído em St. Cloud, foi montado já em Neuilly, e Santos-Dumont não usou mais seu hangar pioneiro, que teve, então, vida muito curta. Não se sabe qual foi o destino que o Aeroclube da França deu ao hangar, pois a Aeroestação de St. Cloud também logo deixou de existir.

Monumento a Santos-Dumont em St. Cloud
Em St. Cloud, o Aeroclube da França mandou fundir uma estátua em bronze, representando o Ícaro da mitologia grega, em homenagem a Santos-Dumont.Tal monumento foi colocado em uma pequena praça redonda, próxima à antiga Aeroestação de St. Cloud, e foi inaugurada em 19 de outubro de 1913. Em sua base, está escrito: "Ce monument a eté éleve par L' Aero Club de France pour commemorer le experiénces de Santos-Dumont, pionnier de la locomotion aérienne." (Este monumento foi erigido pelo Aeroclube da França para comemorar as experiências de Santos-Dumont, pioneiro da locomoção aérea.
Santos-Dumont posando junto ao monumento original em St. Cloud
Infelizmente, durante a ocupação nazista de Paris, durante a Segunda Guerra Mundial, a estátua original foi removida pelos alemães e destruída para reciclar o bronze, para finalidades militares.
Na década de 1920, o local antes ocupado pela Aeroestação de St. Cloud e pelo hangar pioneiro de Santos-Dumont (à esquerda da foto) já estava ocupado por casas
Uma réplica, aproximadamente igual à original, foi recolocada no local, por brasileiros, em 1952 e está lá até hoje. A simples praça que a envolve é denominada Praça Santos Dumont, e está na confluência das Avenue de Longchamp, Avenue du Maréchal Jean de Lattre de Tassigny, Avenue Duval Le Camus, Avenue Romand e Avenue de Suresnes. Nada mais resta da Aeroestação de St. Cloud além dessa praça e de seu monumento. No lugar onde existiu o pioneiro hangar de Santos-Dumont, foram construídas casas elegantes.
Nesse endereço, na Avenue du Maréchal De Lattre de Tassigny, ficava o primeiro hangar de aeronaves da história.

Os Electras da Ponte Aérea Rio-São Paulo

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Entre os meses de maio e agosto de 1961, a Varig, pressionada pelo Governo Federal, adquiriu o consórcio Real-Aerovias, então repleto de dívidas e operando uma heterogênea frota de aeronaves.
O PP-VJW em voo acima de Porto Alegre, em voo de testes após revisão
Ruben Berta, o todo-poderoso presidente da Varig, teve o grande dissabor de saber que a Real-Aerovias tinha adquirido cinco aeronaves Lockheed L-188 Electra, de segunda-mão, da American Airlines. Os Electras tinham, então, má fama no mercado, apesar da bom desempenho operacional, pois o modelo tinha sofrido dois pavorosos desastres por falha estrutural, em 1959 e 1960. De fato, a fabricação do Electra foi encerrada em janeiro de 1961, com apenas 170 aeronaves fabricadas.
Electra estacionado no Aeroporto Santos-Dumont
Ruben Berta tentou cancelar o negócio a todo custo, mas sem sucesso. A contragosto, a diretoria recebeu a primeira aeronave, matriculada PP-VJM, no dia 31 de agosto de 1962. Em 10 de setembro chegaram outros dois aviões, matriculados PP-VJL e PP-VJN. As aeronaves vieram do Aeroporto de Tulsa, Oklahoma, até Congonhas, em São Paulo, fazendo escalas em Miami e Belém, ainda com o esquema de cores da American, e foram rapidamente repintados e reconfigurados para voos internacionais.
Electras da Ponte Aérea, em Congonhas
Em 30 de setembro, a Varig recebeu outra aeronave, o PP-VJO, e em 11 de outubro, o quinto e último dessa encomenda, matriculado PP-VJP.

A primeira linha a usar os Electra foi a de Nova York, em complemento aos Boeing 707 e Caravelle III e em substituição aos Constellations. Foi uma solução temporária, até a chegada dos jatos Convair 990, em 1963, quando a linha de Nova York passou a ser operada apenas com jatos. O primeiro voo do Electra para Nova York foi realizado em 25 de setembro de 1962.
Electras da Ponte Aérea no Aeroporto Santos-Dumont
Os Electras passaram então a operar, principalmente, voos internacionais da Varig na América Latina.

A próxima tarefa dos Electras foi operar os chamados Voos da Amizade, entre Brasil e Portugal. Os Voos da Amizade eram feitos através de um acordo entre as empresas TAP e Panair do Brasil (depois, Varig), que vendiam passagens de baixo preço  nos dois sentidos exclusivamente para cidadãos brasileiros e portugueses. O acordo previa a utilização exclusiva de aviões a hélice, sendo que a TAP utilizou na rota os Lockheed Super Constellation e a Varig utilizou os Electras. Inicialmente, a empresa brasileira que operava os Voos da Amizade era a Panair do Brasil, com os Douglas DC-7, mas com a falência da Panair, em fevereiro de 1965, a Varig assumiu todas as rotas internacionais daquela empresa, incluindo os Voos da Amizade, que tinham frequência semanal. O primeiro Electra a voar para a Europa foi o PP-VJO, em 22 de novembro de 1965.
O PP-VJO visto da janela de outro Electra, em São Paulo
Os Electras faziam a travessia do Atlântico saindo do Aeroporto do Galeão, no Rio de Janeiro, passando por duas escalas, em Recife e na Ilha do Sal, em Cabo Verde, até Lisboa. Sem dispor de equipamentos eletrônicos de navegação para a travessia, os Electras necessitavam de um navegador para fazer a navegação astronômica no voo sobre o oceano.

Os Voos da Amizade foram encerrados em 1967, mas, por essa época, a Varig já estava tão satisfeita com a operação dos Electras, e os aviões já eram tão populares entre os passageiros, que resolveu comprar mais três aeronaves da American, os quais foram matriculados PP-VJU, que chegou ao Brasil em 22 de novembro de 1967, PP-VJV, chegado em 30 de novembro, e PP-VJW, chegado em 15 de março de 1968. Nessa época, os Electras atendiam 16 destinos domésticos, e a Varig oferecia a passagem com 10 por cento de desconto em relação à tarifa dos jatos. As aeronaves tinham 82 lugares normais e mais 7 no lounge.
O PP-VJN, no Aeroporto Santos-Dumont
Em 1970, a Varig comprou dois Electras da Northwest Orient Airlines, convertidos em cargueiro. Os dois aviões começaram a operar na Varig transportando carga, mas pouco tempo depois os dois foram reconvertidos para operação de passageiros. Eram diferentes dos demais aviões, pois não tinham o lounge de 7 lugares presente na parte traseira dos demais aviões da frota. Foram matriculados PP-VLA e PP-VLB, e ambos chegaram ao Brasil em 3 de junho de 1970.
Bela foto dos Electras no Aeroporto Santos-Dumont
Também em 1970, a Varig comprou mais um Electra da American, o qual foi matriculado PP-VLC, o qual foi entregue no dia 6 de abril de 1970.

O início dos anos 70 foi marcado por uma série de acidentes na Ponte Aérea Rio-São Paulo, um serviço operado sob a forma de consórcio então operado entre as empresas Varig, Cruzeiro, Sadia e Vasp. Para garantir maior segurança, o Departamento de Aviação Civil determinou, em 1974, que somente aviões quadrimotores poderiam operar na Ponte Aérea. A Varig já operava seus Electras na rota, e Vasp operava seus últimos Vickers Viscount Mk 827. Como a Cruzeiro e a Sadia não possuiam quadrimotores, passaram a arrendar os Electras da Varig, para se manterem no consórcio. Em 1975, a Vasp vendeu os Viscount, e a Ponte Aérea passou a operar exclusivamente os Electras, alugando o equipamento para os outros operadores, já então reduzidos a Transbrasil, sucessora da Sadia, e Vasp, uma vez que a Varig passou a controlar a Cruzeiro em 1975.
O PP-VLA era um dos dois Electras que não tinham o lounge na traseira
Em 1975, a Varig, já operando jatos domésticos Boeing 727-100 e 737-200, retirou definitivamente os Electras das outras linhas e passou a operá-los com exclusividade na Ponte Aérea.
Orla marítima do Rio de Janeiro, visto da janela de um Electra
Como a Varig passou a operar o equipamento exclusivo da Ponte Aérea, passou a buscar no mercado outras aeronaves para suprir a rota e arrendá-la para os outros operadores. Acabou adquirindo duas aeronaves da Aerocondor, da Colômbia, os quais passaram a operar na Varig a partir de novembro de 1976, como PP-VLX e PP-VLY. A essa altura, a Varig operava 12 Electras: PP-VJL, PP-VJM, PP-VJN, PP-VJO, PP-VJU, PP-VJV, PP-VJW, PP-VLA, PP-VLB, PP-VLC, PP-VLX e PP-VLY. O PP-VJP acidentou-se em Porto Alegre, no dia 5 de fevereiro de 1970, durante um voo de treinamento. O acidente não deixou vítimas, mas a aeronave, que fez um pouso muito duro, perdendo um dos trens de pouso principais, foi considerada como de recuperação economicamente inviável, e acabou servindo de fonte de peças de reposição para os demais aviões da frota. Foi o único acidente de Electra registrado no Brasil.
O PP-VLB: notem a ausência das janelas do lounge, que não era existente nessa aeronave
A despeito da idade e da operação incessante, os Electras se deram bem na Ponte Aérea, mantendo uma pontualidade e uma regularidade inigualáveis. Atendendo a pedidos da Vasp e da Transbrasil, a Varig retirou seus logotipos e sua marca de quatro aeronaves, PP-VLC, PP-VJW, PP-VJU e PP-VJN, mantendo, todavia, seu esquema básico de pintura da época. Em 1979, no entanto, todos os quatro aviões voltaram a exibir suas logomarcas. Até o fim de suas carreiras, todos os Electras mantiveram um único esquema básico de pintura.
O PP-VNJ operou tardiamente na Varig, a partir de 1986
Na Ponte Aérea, todos os Electras eram operados por tripulações técnicas da Varig e por tripulantes de cabine da empresa operadora do voo, Varig, Vasp ou Transbrasil.

Em 1986, a Varig adquiriu mais dois Electras, os quais foram matriculados PP-VNJ e PP-VNK. Essas aeronaves vieram da TAME - Transportes Aéreos Militares Ecuatorianos. A TAME tinha 4 Electras em pobres condições, parados, e entregou dois aviões em troca da recuperação dos outros dois.

Com 14 Electras em operação, a Ponte Aérea atingiu seu auge entre os final dos anos 80 e o começo dos anos 90, com 88 operações diárias em ambos os sentidos.
O PP-VLY, no Santos-Dumont
Na Ponte Aérea, os Electras eram o transporte diário de centenas de executivos, artistas, celebridades diversas e gente comum das 6 até as 23 horas. Os voos saiam de 15 em 15 minutos, na maior parte do dia, e duravam cerca de 50 minutos, pouca coisa a mais que os jatos que os substituíram. A frequência era reduzida aos finais de semana para um voo a cada 30 minutos, nos horários de pico. Quando o tempo estava claro, sem nebulosidade, os voos que partiam do Rio de Janeiro sobrevoavam a orla marítima do Rio a uma altitude relativamente baixa, para os passageiros aproveitarem a paisagem.
O PP-VLC, no Santos-Dumont
Em 1991, os tempos de glória do Electra na Ponte Aérea chegavam rapidamente ao fim. A Boeing já havia experimentado o Boeing 737-300 no Aeroporto Santos-Dumont, comprovando que sua operação poderia ser tão segura quanto a dos velhos turboélices, e as três empresas participantes da Ponte já operavam, então, o equipamento da Boeing.
Electra pousando no Aeroporto Santos Dumont
O fim dos Electras na Ponte foi quase abrupto. No dia 10 de novembro de 1991, o PP-VJO fez seu último voo na linha, e no dia seguinte, 11 de novembro, dois novos Boeing 737-300, matriculados PP-VOS e PP-VOT, fizeram companhia aos veteranos turboélices pela primeira vez na Ponte Aérea Rio-São Paulo.
Electra ao lado de um Boeing 737-300 no Santos-Dumont: o fim estava próximo
Em seguida, foram paralisados as aeronaves PP-VLA, em 17 de novembro de 1991, PP-VJV, em 28 de novembro, PP-VLB, em 9 de dezembro, PP-VLY, em 12 de dezembro, PP-VJU, em 23 de dezembro, PP-VNK, em 24 de dezembro, PP-VJM e PP-VLC, em 28 de dezembro, PP-VJW, em 29 de dezembro, PP-VJL, em 30 de dezembro, PP-VLX e PP-VJN, em 5 de janeiro de 1992. O último voo regular dos Electras na Ponte Aérea (SDU-CGH) foi cumprido pelo PP-VJN, em 5 de janeiro, seguido de um voo especial que conduziu passageiros VIP no dia seguinte de Congonhas até o Aeroporto Santos-Dumont, no Rio de Janeiro.
PP-VNJ
Das aeronaves retiradas de serviço, a Varig colocou todas à venda, revisadas e em condição de aeronavegabilidade, exceto o PP-VJM, o primeiro dos Electras a chegar ao Brasil, em 1962, o qual foi doado ao Museu Aeroespacial no dia 27 de maio de 1992. Esse avião permaneceu em Congonhas até o dia 26 de maio, quando decolou em direção ao Aeroporto Internacional do Galeão, dando, antes de pousar, 4 toques e arremetidas no Aeroporto Santos-Dumont, além de um espetacular voo rasante sobre a pista. No dia 27, decolou do Galeão e deu um novo rasante no Santos-Dumont, antes de pousar no Campo dos Afonsos, tripulado pelos Buchrieser e Lott, e pelo Engenheiro José Aparecido. O avião foi colocado dentro do hangar do Musal, tendo os seus pneus esvaziados para que a cauda ficasse abaixo do batente da porta, até que estivesse no seu lugar, onde está até hoje. É o único Electra sobrevivente de todos os 15 que operaram na Varig, durante 30 anos.
O PP-VJM preservado no MUSAL: é, provavelmente, o último existente dos 15
Passados 22 anos, os Electras já fazem parte da história. 14, dos 15 operados, já foram destruídos. Mas esse avião ficará, para sempre, ligado à história da Ponte Aérea Rio-São Paulo, mais do que qualquer outro tipo de aeronave.

Abaixo, temos o histórico resumido de cada aeronave, em ordem de matrícula no Registro Aeronáutico Brasileiro - RAB:

PP-VJL: c/n: 1024, primeiro voo em 28 de dezembro de 1958. Operou na American Airlines como N6103A "Flagship Detroit", PP-VJL na Varig entre 10 de setembro de 1962 e 29 de julho de 1993; Foi para a Blue Airlines, do Zaire (atual Congo), onde voou como 9Q-CDK "Lodja Putu" até ser desativado em 1995, e canibalizado. Desmontado completamente em 1999.
Interior do PP-VJM, em configuração 2-3
PP-VJM: c/n: 1025, primeiro voo em 31 de dezembro de 1958. Operou na American Airlines como N6104A "Flagship Washington", PP-VJM na Varig entre 30 de agosto  de 1962 e 27 de maio de 1992; Foi doado para o Museu Aeroespacial - MUSAL, onde se encontra preservado e visitável até hoje.
Entrega do PP-VJN ao Musal, em 1992
PP-VJN: c/n: 1037, primeiro voo em 27 de janeiro de 1959. Operou na American Airlines como N6108A "Flagship Buffalo", PP-VJN na Varig entre 10 de setembro de 1962 e junho de 1993; Foi para a Blue Airlines, do Zaire (atual Congo), onde voou como 9Q-CDI "Dominique Misenga" até se acidentar, com perda total e sete mortos em 8 de fevereiro de 1999, no aeroporto de N' Dijili, Congo.

PP-VJO: c/n: 1041, primeiro voo em 2 de janeiro de 1959. Operou na American Airlines como N6109A "Flagship Toronto", PP-VJO na Varig entre 30 de setembro de 1962 e novembro de 1993; Foi para a Filair Congo, do Zaire (atual Congo), onde voou como 9Q-CXU de 1994 até ser desativado em 1997 e canibalizado.

PP-VJU: c/n: 1119, primeiro voo em 13 de janeiro de 1960. Operou na American Airlines como N6128A "Flagship San Diego", PP-VJU na Varig entre 22 de novembro de 1967 e julho de 1993; Foi para a Blue Airlines, do Zaire (atual Congo), onde voou como 9Q-CDG até ter uma pane hidráulica e pousar de barriga em N' Dijili, Congo, em 13 de março de 1995. Irrecuperável, foi desmontado.
O 9Q-CDG, ex-PP-VJU da Varig, voou na Blue Airlines com o mesmo esquema básico de pintura da Varig
PP-VJV: c/n: 1126, primeiro voo em 4 de março de 1960. Operou na American Airlines como N6135A "Flagship San Antonio", PP-VJV na Varig entre 30 de dezembro de 1967 e julho de 1993; Foi para a New ACS do Zaire (atual Congo), onde voou como 9Q-CRS e depois foi 5H-CRM na Trans Service Airlift. Rematriculado 9Q-CCV. Depois de um incidente com o trem de pouso do nariz, em 21 de janeiro de 1994, foi desativado, canibalizado e sucateado.

PP-VJW: c/n: 1124, primeiro voo em 19 de fevereiro de 1960. Operou na American Airlines como N6133A "Flagship Baltimore", PP-VJW na Varig entre 15 de março de 1968 e outubro de 1993; Foi para a África, mas registrado em Honduras como HR-AMM. Voou pela Interlink Congo até agosto de 1995, quando foi levado para Lanseria, África do Sul, para venda. Foi adquirido pela Air Spray, do Canadá, e entregue em 25 de outubro de 2002. Foi avião bombeiro, como C-GZYH, na Air Spray, e utilizado até 22 de junho de 2003, quando foi encostado e canibalizado.
O C-GZYH, canibalizado em Red Deer, Canada. Outrora, foi o PP-VJW
PP-VJP: c/n: 1049, primeiro voo em 25 de março de 1959. Operou na American Airlines como N6110A "Flagship Detroit", PP-VJP na Varig entre 11 de outubro de 1962 e 5 de fevereiro de 1970; Acidentou-se no Aeroporto Salgado Filho, em Porto Alegre, e foi desmontado.
Incomum disposição de assentos do Electra, em "club seat"
PP-VLA: c/n: 1139, primeiro voo em 31 de janeiro de 1961. Operou na Northwest Orient Airlines como N134US, convertido para cargueiro em 1969, PP-VLA na Varig entre 3 de junho de 1970 e novembro de 1993. Foi vendido para a Filair Congo, onde voou como  9Q-CVK e 9Q-CGD. Acidentou-se, com perda total, em julho de 1994, em Angola.
Electra da Filair, ex-Varig PP-VNK
PP-VLB: c/n: 1137, primeiro voo em 18 de janeiro de 1961. Operou na Northwest Orient Airlines como N133US, convertido para cargueiro em 1969, PP-VLB na Varig entre 3 de junho de 1970 e julho de 1993. Foi vendido para a Filair Congo, onde voou como 9Q-CUU. Deixou de voar em julho de 1997 e foi encostado no Aeroporto de Kinshasa, Congo, onde foi visto pela última vez em 11 de setembro de 2003.
Painel do PP-VLA
PP-VLC: c/n: 1093, primeiro voo em 1º de setembro de 1959. Operou na American Airlines como N6122A "Flagship Albany". PP-VLC na Varig de 6 de abril de 1970 até 10 de agosto de 1993. Vendido para a Blue Airlines como 9Q-CDL, voou até janeiro de 1995 e sucateado em março do mesmo ano.


PP-VLX: c/n: 1063, primeiro voo em 27 de maio de 1959. Operou na American Airlines como N116A "Flagship Cincinnati", foi para a Aerocondor, da Colômbia, em 12 de janeiro de 1971, como HK-1416. Foi PP-VLX na Varig entre novembro de 1976 até abril de 1994; Vendido para a Aero Spray, do Canadá, onde foi C-FQYB, voou até 16/10/2000. Destruído em um incêndio no hangar, quando estava em mantenção.

PP-VLY: c/n: 1073, primeiro voo em 28 de julho de 1959. Operou na American Airlines como N119A "Flagship Cleveland", foi para a Aerocondor, da Colômbia, em 18 de setembro de 1969, como HK-775. Foi para a New Air Charter Service (ACS) com a matrícula 9Q-CRM. Em outubro de 1993, foi vendido à Trans Service Airlift, mantendo a mesma matrícula. Em 2000, foi para a Air Transport Office, onde foi re-matriculado como 9Q-CTO. Em 2001 foi encostado em Kinshasa, onde, segundo alguns relatos, permanece quase intacto.
Lounge do ex-PP-VNK, aqui na operando no Canadá na Air Spray
PP-VNK: c/n: 1040, primeiro voo em 4 de agosto de 1959. foi o primeiro Electra da Braniff, matriculado N9701C. Voou até 1970 para a Braniff, sendo dado como parte de pagamento na compra do Boeing 727 que o substituiu. Por sua vez, a Boeing vendeu-o à FB Ayer que o arrendou à Universal Airlines em abril de 1972. Ficou parado até fevereiro de 1975, quando foi vendido aos Transportes Aéreos Militares Ecuatorianos (TAME) para quem voou até 1986 como FAE 1040/HC-AZT. Desativado por falta de peças de reposição, foi novamente encostado no aeroporto Mariscal Sucre em Quito, Equador, até novembro de 1993. Foi vendido para a Varig em 1986, onde ficou até novembro de 1993. Foi para a Filair, baseada na República Democrática do Congo, como 9Q-CDU. Detido por problemas de documentação em Calgary, no Canadá, em 4 de março de 1994, foi comprado pela Air Spray, de Red Deer, Canadá, em 22 de outubro de 1994, onde voou como C-GFQA "Tanker 86". Acidentado com perda total em Cranbrook, em 16 de julho de 2003, com 3 vítimas fatais.
PP-VNK no Santos-Dumont
PP-VNJ: c/n: 1050, primeiro vôo em 8 de abril de 1959, voou na American Airlines como N6111A "Flagship Tulsa". Vendido em 30 de novembro de 1966 para a Air California com o prefixo N278AC. Vendido à GATX em 18/12/68 e repassado à F.B Ayer, que o arrendou a Universal e à Ecuatoriana de Aviación. Comprado pela TAME do Equador em 17 de outubro de 1974, onde voou com a matrícula FAE1051/HC-AZL até ser negociado com a Varig, em 1986, a exemplo do que ocorreu com o PP-VNK. Ficou na Varig até outubro de 1993, quando partiu com a matrícula HR-AML, vendido para a Interlink, também da República Democrática do Congo - apesar de receber uma matrícula hondurenha. Ficou na Interlink até ser levado Victoria Falls, sendo posteriormente trasladado para Lanseria, próximo a Johannesburg, África do Sul. Em 11 de dezembro de 1997, partiu para Linz, na Áustria. comprado pela Amerer Air, como EL-WSS, nunca mais voou, tendo sido canibalizado.
O ex-PP-VNK, operando como avião bombeiro no Canadá
 

Resgate aéreo dramático: o incêndio do Edifício Andraus

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O fogo destruiu o edifício inteiro em poucas horas
A tarde da quinta-feira, dia 24 de fevereiro de 1972, foi quente e abafada em São Paulo.  Centenas de pessoas trabalhavam nos escritórios do Edifício Andraus, um grande e imponente edifício na Avenida São João, quando uma dramática notícia se espalhou rapidamente por seus 32 andares: o prédio estava pegando fogo.
Um turbilhão de chamas destroi o Edifício Andraus
Aconteceu por volta das 16 horas e 20 minutos, entre a primeira e a segunda sobreloja das Casas Pirani, uma grande e já extinta loja de departamentos que ocupava o subsolo, o térreo e as sobrelojas do edifício. Há controvérsias sobre a origem do incêndio, mas é provável que tenha sido causado por uma sobrecarga na rede elétrica.
Helicóptero Enstrom no teto do Andraus
Construído em 1962, com 115 metros de altura e 32 andares, o Edifício Andraus tinha grande beleza arquitetônica, mas, assim como todos os prédios altos de São Paulo, na época, não possuia sistema de combate ao fogo, nem hidrantes, nem escadas de incêndio, e nem sequer extintores nos corredores. Como resultado, o fogo começou a subir para os andares superiores, e as pessoas que lá trabalhavam subitamente se viram encurraladas: não era possível descer, e o fogo subia rapidamente. Muitos se viram cercados pelo fogo nos andares, enquanto a maioria subia as escadas para atingir o terraço do prédio, onde havia um heliponto, raro naquela época.

O fato do prédio possuir um heliponto foi essencial para que aquelas pessoas fossem salvas, mas isso não quer dizer que uma operação de resgate fosse fácil. Um vento quente soprava no centro de São Paulo naquela tarde, atiçando as chamas em direção à Avenida São João, uma das mais movimentadas de São Paulo. O incêndio logo atingiu proporções devastadoras, tomando conta do prédio inteiro.
Resgate de uma criança, vítima do incêndio no Andraus
O Comandante Olendino Francisco de Souza, que comandava o SSA - Serviço de Salvamento Aéreo de São Paulo, foi convocado para levar o seu helicóptero, um Bell 204B, matriculado PP-ENC, para o Edifício Andraus, acompanhado do Coronel Gilson Rosemberg, da 4ª Zona Aérea da FAB. Souza foi, segundo ele, o primeiro a chegar no local, e manobrou o pesado helicóptero, uma versão civil do famoso "sapão", o Bell UH-1 Huey, no meio da fumaça e da grande turbulência criada pelo vento e pelo próprio incêndio. Cerca de 40 minutos já se haviam passado desde o início do incêndio, e nos andares abaixo, vítimas encurraladas se atiravam do prédio para não morrerem queimadas.
O Bel 204B pilotado pelo Cmte. Souza, resgatando sobreviventes do Edifício Andraus
Souza teve receio de apoiar o peso do helicóptero no pequeno heliponto, feito para aeronaves bem menores, e então manteve potência suficiente para que a máquina apenas tocasse o piso. Com o auxílio do Coronel Gibson, embarcou as pessoas que conseguiu e voltou ao Aeroporto de Congonhas para desembarcá-las. Muitos estavam feridos, queimados ou intoxicados pela fumaça. O DAC achou por bem fechar o aeroporto para as demais aeronaves, permitindo mais agilidade nas operações de resgate. Só reabriu após o último pouso dos helicópteros de resgate.
Após o PP-ENC levantar voo do terraço do Andraus, outros helicópteros da cidade logo manobravam em volta do edifício, agora totalmente tomado pelo fogo. O Comandante Walmir Fonseca Sayão, a bordo do PP-EES, um Hiller FH-1100, já tinha conseguido sobrevoar o terraço antes de Souza, e pediu para as cerca de 50 pessoas que estavam lá, que derrubassem as antenas e outros obstáculos que poderiam atrapalhar o pouso dos helicópteros. logo a área estava limpa, mas, ao tentar resgatar as vítimas, verificou que quase atingiu-as com o rotor de cauda. Verificou ainda que a temperatura do motor subiu rapidamente, e que o helicóptero perdeu potência. Abortou o resgate, desceu até um ponto logo acima da Praça da República, para esfriar o motor e recuperar potência, e depois, com pouco combustível, foi até Congonhas reabastecer.
O caos na Avenida São João
As 50 pessoas avistadas por Sayão subitamente se transformaram em uma multidão de mais de 300 pessoas. Muitas vítimas não estavam conseguindo acessar o terraço devido a um portão de ferro trancado, mas logo conseguiram arrombá-lo e chegar ao heliponto para esperar o resgate.

Logo muitos outros helicópteros, do poder público ou privados, estavam sobrevoando o local: PT-HCP, da Anhembi Aviação, pilotado por Judimar Piccoli; PT-HDH, um Bell 206 da Audi, pilotado pelo Capitão Portugal Motta; PP-HBN, um Bell 206 da Pirelli, pilotado por Carlos Zanini, PP-HBM, um Hughes 300 da Votec, pilotado por Leo Waddington Rosa; PT-HCM, um Hughes 300 pilotado por Silvio Monteiro; PT-HCB, um Enstrom F28 da Anhembi Aviação, pilotado por Cláudio Finatti; PT-HCQ, um Enstron F-28, particular, pilotado por Sérgio Bering; PP-MAB, da Prefeitura Municipal de São Paulo, pilotado pelo Coronel Fonseca; PP-HDC, um Bell 206 da Papel Simão, pilotado pelo Coronel Telmo Torres Ayres.

O espaço aéreo ao redor do Edifício Andraus ficou simplesmente caótico, com tantas aeronaves em meio à fumaça e à turbulência do incêndio. Os coronéis da FAB que estavam, então, coordenando as atividades aéreas, temeram pela segurança dos helicópteros, e resolveram ordenar que os helicópteros pequenos, os Hughes e os Enstrom, equipados com motores a pistão, se retirassem do local.
O edifício Andraus destruído. Seria restaurado posteriormente
A decisão foi acertada. Os pequenos helicópteros conseguiam tirar apenas um ou dois sobreviventes de cima do prédio de cada vez, atrasando o pouso das aeronaves maiores,, e o incêndio poderia ser muito perigoso para essas aeronaves, equipadas com motores que consumiam a volátil gasolina de aviação. Dessa forma, permaneceram na missão os Bell 206 PT-HDH, PP-HBN e PP-HDC, o Bell 204 PP-ENC e o Hiller FH-1100 PP-EES.

Apesar disso, os helicópteros menores fizeram um esforço heróico, e o piloto Leo Waddington Rosa foi o que mais resgatou sobreviventes entre os pilotos dessas aeronaves, cinco no total.

O fogo começou a esmorecer em torno das 19 horas, mas o resgate continuou até a retirada do último sobrevivente do terraço do Andraus, pouco antes das 22 horas.

O comandante Olendino Souza, que operou a maior aeronave envolvida no resgate das vítimas do incêndio do Edifício Andraus, foi a grande estrela da operação, pois resgatou 307, dos mais de 400 sobreviventes resgatados do topo do prédio. Souza percorreu 32 vezes o percurso de ida e volta entre o Andraus e o Aeroporto de Congonhas. Completamente exausto, deitou-se na pista, ao lado do helicóptero, e adormeceu profundamente. Acordou horas depois, cercado de enfermeiros e médicos, no ambulatório do aeroporto. Souza receberia diversas homenagens e condecorações das autoridades, depois do incêndio.
A tragédia do Edifício Joelma, em 1974, matou 187 pessoas
Embora trágico, o incêndio do Edifício Andraus teve um relativamente pequeno número de vítimas fatais, 16, muitas das quais se atiraram do alto do prédio. Cerca de 330 pessoas ficaram feridas. Dois anos depois, um incêndio de grandes proporções atingiu outro prédio de São Paulo, o Joelma. O número de vítimas, dessa vez, foi muito maior, 187 mortos. No Edifício Joelma, os helicópteros não puderam fazer praticamente nada, pois o prédio não possuía um heliponto, e nem mesmo um terraço adequado.

Sem a operação aérea de resgate, o número de vítimas fatais do incêndio do Edifício Andraus poderia superior a 400. Com grande risco de perder a vida em um acidente, os pilotos dos helicópteros foram os grandes heróis do ano de 1972, em São Paulo e no Brasil inteiro.
O edifício Andraus em 2010: sem cicatrizes
Com uma sólida estrutura em concreto armado, o Edifício Andraus sobreviveu ao incêndio. Sua estrutura pode ser restaurada, e o prédio voltou a ser ocupado por escritórios e repartições públicas alguns anos depois. É um dos prédios mais seguros de São Paulo. Se a sua estrutura fosse de aço, como a das torres gêmeas do World Trade Center de Nova York, teria, sem dúvida alguma, desabado. No inquérito policial feito em 1972, ninguém jamais foi responsabilizado pela tragédia.

Curiosidades Aeronáuticas - X

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Nessa décima edição, listamos mais algumas curiosidades sobre aviação em geral.
Gravura francesa que ilustra o primeiro desastre aéreo da história
O primeiro desastre aéreo fatal ocorreu com um balão, pilotado pelo aeronauta francês Jean-Francois Pilâtre de Rozier. Rozier tentava uma travessia do Canal da Mancha, entre a cidade francesa de Calais, e o litoral da Gra-Gretanha, nas imediações do porto de Dover. O balão de ar quente não era adequado para a tarefa, e Rozier construiu um balão misto de ar quente e hidrogênio. Atingido por fortes ventos, que o empurraram de volta à terra, o balão caiu em 15 de junho de 1785, na localidade de Wimereux, perto de Calais. No acidente, também pereceu o aeronauta Pierre Romain. Apesar da temerária combinação de ar quente com hidrogênio, não houve incêndio no acidente. Pilâtre de Rozier foi o primeiro aeronauta bem sucedido da história, ao pilotar um balão Montgolfier, em 21 de novembro de 1783.
Orville Wright e seu passageiro, o tenente Thomas Selfridge, antes da decolagem
O primeiro desastre fatal de um avião ocorreu em Fort Myers, Virginia, com uma aeronave Wright Flyer, que estava sendo demonstrada pelos irmãos Wilbur e Orville Wright ao U.S. Army, em 17 de setembro de 1908. Orville Wright pilotava a aeronave, que levava um militar do exército como passageiro, o Primeiro Tenente Thomas Etholen Selfridge. Após circular quatro vezes Fort Myers, a hélice direita da aeronave se partiu, e um dos seus pedaços quebrou um dos cabos de aço que apoiavam a estrutura do leme. Apesar dos esforços de Orville, que chegou a cortar o motor para tentar pousar em frente, o avião bateu violentamente no solo, de nariz. O tenente Selfridge bateu a cabeça contra um dos montantes da asa e ficou desacordado, com grave traumatismo no crânio. Não mais acordou, e morreu naquela noite. Orville ficou gravemente ferido, com um femur quebrado, algumas costelas igualmente fraturadas e uma lesão no quadril, e foi hospitalizado por sete semanas. Nenhum dos dois usava capacete, que muito provavelmente teria salvado a vida de Selfridge, que faleceu com apenas 26 anos de idade. O exército obrigou todos os pilotos, a partir desse acidente, a usar capacetes durante o voo, um modelo grande e pesado parecido com os utilizados por jogadores de futebol americano, posteriormente abandonado.
O acidente que vitimou Selfridge, em 17 de setembro de 1908
Um tripulante de bombardeiro Boeing B-17 sobreviveu a um salto sem paraquedas, de uma altitude de 22 mil pés, quando a aeronave em que voava foi abatida sobre a cidade de St. Nazaire, na França ocupada pelos alemães, no dia 3 de janeiro de 1943. O sargento Allan Eugene Magee era um dos artilheiros do B-17F #41-2462, e ocupava a famigerada "torre bola", na barriga do avião. Quando o avião foi atingido por um caça alemão, seu paraquedas foi destruído. Magee não teve outra opção senão saltar, sem paraquedas, do avião em chamas. Depois de mergulhar em queda livre por quase 7 mil metros, Magee caiu em cima da gare da estação ferroviária de Saint Nazaire, em uma clarabóia de vidro. Apesar dos 28 ferimentos lacerantes provocados pelo vidro, isso amorteceu a queda, e Magee foi resgatado do meio dos trilhos e enviado a um hospital militar alemão, onde foi tratado. Ficou gravemente ferido, com muitos ossos quebrados, olhos e nariz feridos, mas se recuperou e foi feito prisioneiro de guerra, sendo libertado em maio de 1945 pelos soldados aliados. Faleceu em 2003, aos 84 anos de idade, em San Angelo, Texas.
Um B-17F preservado. O sargento Magee ocupava a "torre bola", na barriga do avião, quando foi abatido
A maior carga já suspensa por um helicóptero foi um cadáver de mamute congelado, encontrado no permafrost (solo permanentemente congelado) da Sibéria. O resgate foi feito por um helicóptero Mil Mi-26, o maior e mais poderoso helicóptero do mundo, com capacidade de sustentar 20 toneladas de carga, em outubro de 1999, para um laboratório russo em Khatanga, Sibéria. O mamute, no entanto, pesava 25 toneladas, o que excedia em 5 toneladas a capacidade da aeronave. Depois da missão, o helicóptero foi enviado de volta ao fabricante, para pesados reparos no rotor e na estrutura.
Um helicóptero Mil Mi-26, o maior helicóptero atualmente em serviço
O primeiro serviço comercial regular a utilizar aviões foi estabelecido pelo piloto Antony Habersack Jannus, mais conhecido como Tony Jannus, em janeiro de 1914. O curto percurso entre as cidades de St. Petersburg e Tampa, na Flórida, era percorrido em várias horas de barco ou através de uma sinuosa e problemática via férrea. Jannus avaliou que havia demanda para um serviço de transporte rápido, por via aérea, entre as duas cidades. Estabeleceu uma empresa, a St. Petersburg-Tampa Airboat Line, que foi a primeira empresa aérea da história a usar aviões (as primeiras usaram dirigíveis). O avião utilizado foi um aerobote Benoist XIV, equipado com um motor de 75 HP, e capacidade para apenas um piloto e um passageiro. O primeiro voo partiu de Tampa às 10 horas do dia 1º de janeiro de 1914, levando a bordo o primeiro passageiro pagante de um avião em voo regular, na história, o ex-prefeito de St. Petersburg, Abram C. Pheil. Pheil comprou a passagem em um leilão por 400 dólares. O preço normal era de apenas 5 dólares. Tony Jannus abandonou sua empresa aérea quando foi contratado, como pilotos de provas, pela Curtiss Aeroplane Company, e o último voo da linha foi feito em 5 de maio de 1914, cinco semanas após o encerramento da concessão da linha.
A decolagem do primeiro avião comercial da história, em 1914.

Os Douglas DC-7 na Panair do Brasil

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No início da década de 1950, a Panair do Brasil, então a maior empresa aérea internacional do Brasil, encomendou quatro aeronaves a jato De Havilland Comet II, com opção para dois Comet III. Jatos comerciais eram novidade absoluta nessa época, e a Panair se esforçava por se manter a vanguarda da aviação comercial brasileira.
O PP-PDL em voo de provas, na Califórnia, 1957.
A introdução dos jatos na aviação comercial sofreu grave revés, no entanto, em 1954. Dois graves acidentes, resultados de graves falhas estruturais, interromperam subitamente a carreira do Comet. As aeronaves existentes foram condenadas para o voo, e a linha de produção foi paralisada, até que as falhas detectadas fossem sanadas.
O painel principal de instrumentos do DC-7: era uma aeronave de alta complexidade
O então presidente da Panair, Paulo Sampaio, manteve as encomendas dos Comet, acreditando que o problema seria rapidamente resolvido, mas outros diretores da empresa não pensavam da mesma forma. Na verdade, os problemas do Comet somente foram resolvidos em 1958, com o modelo IV, que entrou em serviço pouco antes do Boeing 707.
Em 1955, houve uma crise na Panair, com uma greve geral dos trabalhadores. O desenrolar da crise acabou resultando na demissão de Paulo Sampaio da empresa, praticamente o único defensor do Comet na diretoria. A nova diretoria cancelou o pedido dos jatos e encomendou quatro Douglas DC-7C diretamente ao fabricante.
O PP-PDL, em voo de testes de fábrica, em 1957
Os Douglas DC-7C eram, à época, as aeronaves a pistão de maior alcance, com capacidade de atravessar o Atlântico Norte sem escalas. A Panair queria empregar tais aeronaves nos seus voos para a Europa, em complemento aos Lockheed Constellation. A Douglas batizou a aeronave, orgulhosamente, de "Seven Seas", uma referência à sua capacidade de atravessar os oceanos.
O PP-PDM no Aeroporto de Congonhas, em São Paulo
O primeiro DC-7C foi recebido pela Panair no dia 5 de abril de 1957, e foi batizado com o nome de "Bandeirante Fernão Dias Paes". Recebeu a matrícula PP-PDL. Em 11 de maio, chegou a segunda aeronave, batizada de "Bandeirante Antônio Raposo Tavares", e matriculada PP-PDM. Poucos dias depois, em 23 de maio, chegou o terceiro, batizado como "Bandeirante Nicolau Barreto", e matriculado no Registro Aeronáutico Brasileiro como PP-PDN.

Antes mesmo que chegasse o último avião, a Panair colocou o DC-7C na linha para a Europa, e o PP-PDN pousou no Aeroporto de Heathrow no dia 11 de julho de 1957. No dia seguinte, a empresa recebeu seu último avião da encomenda original, o PP-PDO, batizado como "Bandeirante Bartolomeu Bueno da Silva". O PP-PDO foi um protótipo do DC-7C, operado pela Douglas, e havia sido utilizado nos testes de fábrica e como demonstrador para clientes, antes de ser entregue à Panair.
O PP-PDL em manutenção
Os DC-7C eram bastante luxuosos, possuindo acabamento superior ao dos Constellation da Panair. A primeira classe dispunha de camas. O desempenho dos DC-7C também era muito superior ao dos Constellation, pois voavam 40 Knots mais rápido em cruzeiro e tinham um alcance de 1.500 milhas náuticas a mais que o avião da Lockheed, o que permitia redução do número de escalas.
Um DC-7C da Panair. O aeroporto provavelmente é Heathrow. Reparem no Tupolev Tu-114 Rossiya, ao fundo
O maior defeito dos DC-7C era a baixa confiabilidade dos seus motores Wright Cyclone R-3350 988TC18EA1-2. Equipados com um novo recurso tecnológico para aumentar sua potência, o Turbo Compound, podiam desenvolver até 3400 HP na decolagem, mas tal desenvolvimento estava além da tecnologia de materiais da época, o que resultava num motor relativamente frágil e pouco confiável em serviço. As hélices reversíveis também tinham problemas de baixa confiabilidade. Como resultado, os DC-7 acabaram, em sua maioria, substituídos pelos novos jatos antes que seu modelo antecessor, o DC-6, menor e menos potente, mas bem mais confiável e seguro.
O potente, mas problemático motor Wright TC-18 do DC-7C e sua característica hélice quadripá
De fato, a Douglas produziu o DC-7 durante apenas 5 anos, entre 1953 e 1958, e apenas 338 aeronaves do tipo foram produzidas, em contraste com os 704 exemplares de DC-6 fabricados.
Um DC-6A e um DC-7C da Panair em Heathrow, 1959
Entre 1957 e 1959, os DC-7C complementavam os Constellations, nos voos para a Europa. Todavia, os Constellation já revelavam sinais de cansaço, depois de 12 anos voando através do Atlantico Sul. Problemas estruturais forçaram a Panair a desativar o sistema de pressurização dos velhos aviões, e relegá-los a voos domésticos de longa duração. Para complementar os DC-7C, a Panair arrendou quatro Douglas DC-6A (posteriormente denominados DC-6C) do Lóide Aéreo, em 1959. O Lóide tinha adquirido as aeronaves novas do fabricante, mas não tinham linhas com demanda suficiente para operá-las, e os seus DC-6 foram utilizados, inicialmente, pela Panair.

Entre 1957 e 1961, as rotas da Panair servidas pelos Douglas DC-7C atingiram os aeroportos de Buenos Aires, Montevideo, Porto Alegre, São Paulo (Congonhas), Rio de Janeiro (Galeão), Recife, Dakar, Lisboa, Roma, Paris, Londres, Zurich, Dusseldorf, Hamburg e, possivelmente, Beirute.
Um DC-7C da Panair sobrevoando a cidade do Rio de Janeiro
A Panair teve a mais longa linha internacional já operada por aeronaves DC-7. O voo PB 278 tinha início em Buenos Aires, todas as quartas-feiras, às 9 horas da manhã. Fazia escalas em Montevideo, Porto Alegre e São Paulo, até chegar ao Rio de Janeiro, de onde partia para a travessia noturna do Atlântico direto para Dakar, onde chegava às 6 horas e 35 minutos da quinta-feira, horário local. De Dakar, o avião seguia para o aeroporto de Ciampino, em Roma, prosseguindo depois para Zurich, Frankfurt, Dusseldorf até pousar no seu destino final, em Hamburgo, onde pousava à 1 hora e 45 minutos da sexta-feira, hora local. Depois de um breve pernoite, decolava de Hamburgo na manhã da sexta-feira e iniciava o retorno, como vôo PB 279. Ao todo, o voo percorria quase 14 mil Km, com pelo menos 10 horas de escalas.
DC-7 da Panair no Aeroporto de Dusseldorf
As travessias diretas do Atlântico Sul, entre o Rio de Janeiro e Dakar, e entre Recife e Lisboa, foram pioneiras para aeronaves de motor a pistão, e nenhuma outra aeronave comercial a pistão jamais teve alcance suficiente para isso.

Em 1961, a Panair recebeu seus primeiro jatos Douglas DC-8. As principais linhas européias passaram a operar a jato, e os DC-7 foram deslocados para "serviços especiais" da empresa. O principal desses "serviços especiais" foi o serviço denominado "Voos da Amizade". Os Voos da Amizade resultaram de um acordo entre a Panair do Brasil e a TAP - Trasnportes Aéreos Portugueses, em 1960. Foi o primeiro acordo de code-share internacional firmado por uma empresa aérea brasileira. Consistia de um voo low-cost & low-fare, exclusivo para cidadãos brasileiros ou portugueses. O acordo previa utilização exclusiva de aeronaves a hélice, e os voos foram operados por aeronaves DC-7C da Panair e Lockheed L-1049G Super Constellation da TAP. Os DC-7 da Panair foram utilizados até o fechamento da empresa, em fevereiro de 1965, e foram substituídos pelos Lockheed L-188 Electra da Varig até o fim dos Voos da Amizade, em 1967. Os voos do DC-7C da Panair voavam com comissárias de voo da TAP, e tripulantes técnicos da Panair.
O PP-PDO com a pintura especial dos Voos da Amizade (Panair-TAP)
O registro de segurança dos DC-7C da Panair foi, no entanto, bastante ruim. Dos quatro aviões iniciais, três se perderam em acidentes. O primeiro DC-7C a ser perdido foi o PP-PDL. O avião reportou problemas hidráulicos, vazamento de fluido, uma hora depois de decolar do aeroporto de Ponta Pelada, em Manaus, em 14 de outubro de 1961. Com os freios comprometidos, solicitou um pouso de emergência no aeroporto de Belém. Pousou, mas quando os pilotos aplicaram os reversores da hélices, a aeronave derivou para fora da pista, parando em uma vala de drenagem, e teve os trens de pouso severamente danificados. Não houve vítimas, mas o avião foi considerado financeiramente irrecuperável, sendo sucateado pouco tempo depois.
O PP-PDO, em Heathrow, 1958
Duas semanas depois, em 1º de novembro de 1961, o PP-PDO, cumprindo um dos Voos da Amizade, sofreu o pior desastre da história da Panair do Brasil. O avião vinha de Lisboa, de onde decolara às 16 horas de 31 de outubro, e tinha cumprido uma escala de reabastecimento na Ilha do Sal, em Cabo Verde, necessária nos voos entre a Europa e o Brasil devido aos ventos predominantes de oeste. A aeronave era comandada por Pery Moacir Huber, que tinha como copiloto, no trecho, Hugo Tenan.
O PP-PDO foi perdido em 1961, em Recife
O PP-PDO executou um procedimento para a pista 15 de Recife, que tinha 2300 metros de extensão. Na época, a pista mais extensa, a 18-36, estava interditada para obras. Na aproximação, as condiçoes meteorológicas eram um extensa camada baixa de nuvens, a 2000 pés de altura, e visibilidade horizontal praticamente ilimitada. No entanto, o avião fez uma aproximação muito baixa, entrou na camada e acabou batendo no solo antes da pista. Das 88 pessoas a bordo, 45 pereceram no local do acidente, e 43 foram removidas para os hospitais de Recife. Alguns sobreviventes pereceram depois nos hospitais, elevando o total de mortos para 52. A causa do acidente foi falha humana, do tipo hoje conhecido como CFIT (Controlled Flight Into Terrain).
O PP-PDM no Aeroporto de Orly, em Paris
Em 8 de abril de 1963, o PP-PDM, durante um voo de treinamento, no Aeroporto do Galeão, no Rio de Janeiro, teve o trem do nariz recolhido acidentalmente, por um problema mecânico na decolagem, pouco depois da V-1. A decolagem foi abortada, mas o avião sofreu danos que inviabilizaram sua recuperação, e foi removido para as instalações da Panair, onde foi sendo progressivamente canibalizado.
O PP-PEG chegou em 1964, para substituir as aeronaves acidentadas
Com um único DC-7C voando, o PP-PDN, a Panair se viu obrigada a arrendar dois outros aviões da Pan Am, que receberam as matrículas PP-PEG e PP-PEH. O PP-PEG deveria vir primeiro, mas parece que sua entrega foi retardada, e o PP-PEH teria vindo no seu lugar, ainda em 1963. Há sérias dúvidas se o PP-PEH teria realmente operado na Panair, pois não existem sequer registros fotográficos de sua passagem pela empresa. O fato é que o PP-PEG foi entregue à Panair em 20 de janeiro de 1964, e voou na empresa até o seu fechamento. Foi retomado pela Pan Am em 9 de setembro de 1965. O PP-PEG recebeu na Panair o nome de batismo "Bandeirante Brás Esteves Leme". Aparentemente, o PP-PEH jamais operou na Panair e sequer recebeu nome de batismo. Foi oficialmente devolvido em 1965, antes da falência da empresa, e não existe um registro confiável de sua operação em território brasileiro.
O PP-PDM entre outras aeronaves típicas dos anos 50. O aeroporto é Heathrow
Em 7 de fevereiro de 1965, um dos DC-7C retornou de Lisboa para o Rio de Janeiro, via São Paulo. Foi o último voo comercial dessa aeronaves no Brasil. Três dias depois, o governo cassava as linhas da empresa, sem qualquer explicação razoável. Em 16 de fevereiro, era decretada a falência da Panair do Brasil.
O PP-PEG, que foi retomado pela Pan Am em setembro de 1965.
Restavam, no Galeão três aeronaves DC-7C remanescentes: os restos canibalizados do PP-PDM, o PP-PEG e o PP-PDN. Em setembro de 1965, a Pan Am veio buscar o PP-PEG, que ainda teria uma longa sobrevida no exterior, tendo voado até 1980. Os restos do PP-PDM foram leiloados como sucata, junto com os restos do Caravelle PP-PDU, acidentado, e os Constellation restantes. Foram desmanchados a machado. O PP-PDN, ainda intacto e oferecido à venda em leilão como aeronave operacional, não teve compradores. Aviões DC-7 já eram impopulares no mercado por conta dos motores problemáticos. Restou intacto nas antigas instalações da Panair, até ser rebocado para o Parque de Material Aeronáutico do Galeão - PAMA-GL, onde foi provavelmente desmontado para servir de fonte de peças de reposição para os Douglas C-118 (DC-6B) da FAB.

Histórico da frota de Douglas DC-7 da Panair do Brasil:

PP-PDL: c/n 45122/790, "Bandeirante Fernão Dias Paes"; Comprado novo e entregue em 5 de abril de 1957. Acidentado com perda total em Belém, em 14 de outubro de 1961.

PP-PDM: c/n 45124/808, "Bandeirante Antônio Raposo Tavares"; Deveria ter ido para a Pan Am, como N757PA, mas não entregue; Comprado novo e entregue em 11 de maio de 1957. Acidentado em voo de treinamento no Aeroporto do Galeão, Rio de Janeiro, em 8 de abril de 1963. Considerado irrecuperável, foi canibalizado. Seus remanescentes foram vendidos como sucata no final da década de 1960.
O PP-PDN no cemitério da Panair, no Aeroporto do Galeão
PP-PDN: c/n 45125/814, "Bandeirante Nicolau Barreto"; Comprado novo e entregue em 23 de maio de 1957. Voou até o fechamento da Panair, em fevereiro de 1965. Foi armazenado no Aeroporto do Galeão, intacto. Oferecido à venda em leilão como aeronave operacional, em 1969, não obteve compradores. Rebocado posteriormente para o PAMA-GL, foi provavelmente desmontado pela Força Aérea Brasileira para servir de fonte de peças de reposição para aeronaves Douglas C-118.
O PP-PDN, parado no Galeão depois da falência da Panair. Jamais voltou a voar
PP-PDO: c/n 44872/643, "Bandeirante Bartolomeu Bueno da Silva"; Operado pela Douglas Aircraft Co. como protótipo do modelo DC-7C, de longo alcance, e matriculado como N70C. Vendido à Panair e entregue em 12 dse junho de 1957. Acidentado com perda total em Recife, em acidente do tipo CFIT, em 1º de novembro de 1961. Das 88 pessoas a bordo, 52 faleceram.
O N75000, ex Panair do Brasil PP-PEG
PP-PEG: c/n 45094/769, "Bandeirante Brás Esteves Leme"; Entregue em 21 de fevereiro de 1957 à Pan American Wordl Airways, como N750PA, batizado como "Clipper Matchless". Arrendado à Panair e entregue em 29 de janeiro de 1964. Operou até a falência da Panair, sendo retomado pela Pan Am em 9 de setembro de 1965, e rematriculado como N75000. Operou depois em diversas empresas, como Hammong Leasing Corporation, Waterman Industries Corp (1968), Global AL (09/1972), Yankee Traders (1975), Fischer Aviation (01/1978), Jenneth L. Meek (03/1980). Perdido num incêndio em 1980.
Esse DC-7C teria voado na Panair como PP-PEH
PP-PEH: c/n 45092/759; Entregue em 26 de janeiro de 1957 à Pan American Wordl Airways, como N748PA, batizado como "Clipper Georgia". Arrendado à Panair, mas é improvável que tenha realmente operado pela empresa, devido à inexistência de fotografias e outros registros de sua presença no Brasil. Provavelmente, foi uma alternativa ao PP-PEG. Retomado pela Pan Am e rematriculado em fevereiro de 1965 como N7481. Operou depois pela Intercontinental Air, a partir de janeiro de 1966, e pela Trans Europa como EC-BCH, a partir de junho de 1966. Retirado definitivamente de serviço, foi desmontado em Palma de Mayorca em março de 1970.

Fontes: Aeroforum, Vito Cedrini, Revista Flap, Emerson Daniel, Daniel Carneiro, Carlos Ary César Germano da Cunha.

Simulando o voo BA0247: de Heathrow a Guarulhos no Boeing 747

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Esse voo, especificamente, é uma ficção, jamais ocorreu na realidade, mas está sendo descrito para dar a ideia aproximada do que se passa no cockpit de um Boeing 747-400 de uma companhia aérea real, a British Airways, no caso, entre os aeroportos de Heathrow, em Londres, e Guarulhos – São Paulo. Tentamos incluir o máximo de realismo possível nesse voo, mas trata-se, no caso de uma simulação, executada nos software MS Flight Simulator e PSS Boeing 747-400 criado para o FS2000, mas “rodando” em um FS2002.
Boeing 747-436 da British Airways, matriculado G-CIVW
Embora sejam relativamente antigos, esses softwares são completos o suficiente para reproduzir a maioria dos sistemas da aeronave, e permitem, inclusive, “pilotar” o avião com o uso do Flight Operation Manual do Boeing 747-400 real. O desempenho final não deixa a desejar, mesmo se comparado a softwares bem mais atuais, e permite reproduzir o voo com perfeição, inclusive quanto à meteorologia e aos regulamentos de tráfego aéreo. Alguns dados aqui relatados não podem ser realmente executados no computador, mas são elementos constituintes do voo real. Deve ser levado em conta que um simulador, mesmo o mais completo deles, jamais funcionará como um avião real. Esperamos que esse relato sirva como um guia para os fãs do Flight Simulator em seus voos virtuais. A data do voo foi fixada em uma data passada, por dificuldades encontradas em atualizar os bancos de dados do software de simulação.
O Manual do B747-441 foi utilizado como guia para a elaboração desse artigo, embora esse modelo -441 tenha motores GE CF-6, ao contrário do avião descrito no artigo, que é equipado com motores Rolls-Royce RB-211
Nosso voo, o BA0247, começa no aeroporto de Heathrow, em Londres, no Terminal 4, em um dia qualquer de abril de 2001. A aeronave é um Boeing 747-436, matriculado G-CIVW, e equipado com motores turbofans Rolls-Royce RB-211-524H, de 60 mil libras de empuxo cada um. Dois Comandantes e dois FO (First Officers– Primeiros-Oficiais) estão a bordo para o voo até São Paulo. São 21 horas e 10 minutos, horário local, e todos os tripulantes já estão há bordo.
O painel do Boeing 747-400, antes da partida dos motores
O Comandante “master”, o mais antigo a bordo, estará operando a aeronave, como PF – Pilot Flying, na fase inicial do voo, assistido por um SFO – Senior First Officer, como PNF – Pilot Not Flying, nessa fase do voo. Os dois outros tripulantes técnicos, outro Comandante e outro Primeiro Oficial Senior, estão no cockpit nesse momento, mas logo irão se retirar para descansar a bordo, para aguardar a hora de troca de tripulação, durante o voo.

Um Boeing 747-436, da British Airways
O SFO está programando o FMS – Flight Management System, para o voo até Guarulhos. O plano de voo prevê nível de voo inicial 310 (31 mil pés), fazendo um Step Climb para os FL 350 e 390 depois. Deve-se lembrar de que, em 2001, ainda não havia RVSM, e os níveis de voo acima de 29000 pés ainda eram separados de 2 em 2 mil pés.
CDU do FMS do Boeing 747-400
Para quem não está totalmente familiarizado com os termos técnicos e siglas da aviação, acrescentaremos um glossário nos comentários, ao final desse artigo.

Os três sistemas inerciais de navegação da aeronave já estão alinhados. Esse procedimento leva 15 minutos, desde o acionamento do equipamento e a seleção das chaves na posição “ALIGN”. Depois disso, com as chaves na posição NAV, os CDU (Control Displays Units) do FMS já podem ser programados. As chaves dos inerciais estão localizadas do lado esquerdo do Overhead Panel, painel localizado no teto do cockpit, logo acima da cabeça dos pilotos. Também são nesse painel que estão localizados os controles dos sistemas elétricos, hidráulicos, pneumáticos, de partida dos motores, de pressurização, de combate ao gelo e fogo, além de outros comandos.

Overhead Panel do B747-400
O SFO confere a planilha fornecida pelo Despacho. 389passageiros já estão a bordo, mais 20,1 mil libras de bagagem e 15,9 mil libras de carga. O SFO sintoniza o rádio VHF no ATIS de Heathrow, e copia a mensagem, que informa vento de 175 graus com 4 knots, temperatura do ar de 9ºC, ajuste do altímetro de 1019 hPa, e pista em uso para decolagem 27L. O céu está claro e a visibilidade é, praticamente, ilimitada. Embora exista um pequeno componente de vento de cauda, em Heathrow se dá preferência para operações nas pistas 27R e 27L, desde que o componente de vento de cauda não ultrapasse 5 Knots e o componente de vento cruzado não ultrapasse 12 Knots.
Terminal 4 de Heathrow, local de partida do voo simulado
O Boeing 747-400 pode carregar combustível no tanque do estabilizador horizontal, no tanque central e em dois tanques principais, e um reserva em cada asa. Para o voo até Guarulhos, 54,2 mil libras de querosene foram carregadas no tanque central, 85,3 mil libras em cada um dos tanques principais internos 2 e 3, e 30,7 mil libras em cada um dos tanques principais 1 e 4. Cada tanque reserva contém 9 mil libras de combustível adicional. O combustível dos dois tanques de reserva será transferido automaticamente para os tanques principais quando atingirem um determinado nível durante o voo. Não sendo necessários para esse voo específico, os tanques do estabilizador horizontal estão vazios. Como o peso Zero Combustível do avião é 507,5 mil libras, com o combustível, o peso final, pronto para o táxi, é 811.700 libras, aproximadamente, 368,2 mil Kg.

Ambos os pilotos cumprem os check-listsBefore Start”, feitos antes da partida dos motores. No momento, a aeronave está sendo suprida de energia elétrica pelas fontes externas. A APU – Auxiliary Power Unit, somente será acionada pouco antes do push-back, quando tratores empurrarão a aeronave para trás, até o ponto onde a aeronave pode se movimentar com seus próprios motores.

O comandante recebe a informação das comissárias que o check de cabine está completo, e ordena o fechamento de todas as portas e o acionamento dos escape slides em cada um delas. O comandante aciona o botão que dá partida na APU, e monitora a partida no MFD – Multifunctional Display, um monitor que fica entre o pedestal das manetes e o painel principal do avião. A APU tem sua própria bomba de combustível e seu acionamento é todo automatizado. Estabilizada a APU, os geradores da unidade são colocados na barra e o comandante ordena aos mecânicos em terra que removam as fontes externas da aeronave. Uma vez fechadas as portas, o operador dos fingers os afastam das portas e a aeronave está livre para fazer o push back.
O Primeiro Oficial programa o CDU do FMS. A tela do MFD mostra o sistema de combustível
O SFO já obteve a autorização de voo do CLRD de Heathrow e a liberação de movimentação da aeronave pelo Ground Control, e o Comandante libera os mecânicos para fazerem o push-back, liberando, ao mesmo tempo, os freios de estacionamento da aeronave. As luzes anticolisão vermelhas são acionadas no Overhead Panel.

Enquanto a aeronave é empurrada para trás, toda a responsabilidade por essa movimentação é do pessoal de terra, e os pilotos cumprem os últimos itens do check-list “Before start”, colocando o estabilizador na posição correta, em +3.2, 9% da CMA – Corda Média Aerodinâmica, e ligando todas as bombas dos tanques que contém combustível, situadas no centro do Overhead Panel.
O SFO solicita e obtém autorização de acionamento dos motores, pouco antes de terminar o push-back, e informa o Comandante, que autoriza o acionamento dos motores 3 e 4. A APU do Boeing 747-400 tem 1.450 HP de potência, e suas bleed valves (válvulas de sangria de ar) conseguem suprir ar comprimido ao sistema de baixa pressão suficiente para acionar dois motores simultaneamente.
Boeing 747-436
A partida dos motores Rolls-Royce RB-211 é monitorada no MFD pelo parâmetro de N3, rotação do compressor de alta pressão. Motores Rolls-Royce possuem 3 eixos, do fan (N1), do compressor intermediário (N2) e do compressor de alta pressão (N3). Com 23 por cento de N3, indicados por uma linha magenta no indicador, as manetes de combustível são abertas, e os motores entram em funcionamento. A essa altura, o push-backjá colocou o avião na posição, e o mecânico responsável monitora, pelo lado de fora, os motores, para informar qualquer anormalidade durante a partida. O SFO dá a partida nos motores 1 e 2 e, após a estabilização de todos os 4 motores, o sistema de Auto-Throttleé armado. O Flight Director também é acionado, o táxi é autorizado, e as luzes de táxi são acesas. Sendo uma aeronave pesada e com muita inércia, é necessário aplicar uma boa dose de potência para tirar a aeronave da imobilidade. Uma vez em movimento, o comandante recua as manetes para manter uma velocidade aceitável de táxi na congestionada área da rampa.
Motor Rolls-Royce RB-211-524H
Uma vez na taxiway que leva à cabeceira de decolagem, a velocidade poderia ser aumentada até 25 Knots, mas, ao invés, é reduzida para acompanhar o pesado tráfego à frente, cinco aeronaves que também aguardam a vez para decolar. Os flaps são acionados na posição 20, e o autobrakeé colocado na posição RTO (Reject Take-off). Nessa posição, se durante a decolagem a aeronave sofrer uma pane, entre a velocidade de 85 Knots e a V1 (Velocidade de decisão), e as manetes forem recuadas até Idle(marcha lenta dos motores), o autobrakeacionará os freios na máxima intensidade possível, para parar o avião com segurança, dentro do comprimento de pista disponível, rejeitando a decolagem sem necessidade de acionar os reversores de empuxo.
Pedestal das manetes do Boing 747-400, com o MFD e os CDUs
No EICAS – Engine Indicators and Crew Alert System, monitor que fica bem no meio do painel principal, os pilotos monitoram qualquer aviso de alerta (em amarelo) ou de perigo (em vermelho), além da posição correta dos trens de pouso e dos flaps. Os parâmetros principais dos motores, EPR (Engine Pressure Ratio: Razão de Pressão do Motor), N1 (Rotação do fan) e EGT (Exhaust Gas Temperature: Temperatura dos gases de escapamento) também são exibidos nessa tela. Os avisos ativos no momento são todos brancos, indicando que os avisos de cabine para não fumar e colocar os cintos estão ligados, os ignitores dos motores estão ligados em contínuo, e que as packs do sistema pneumático estão desligadas, a exceção da pack 2, que está sendo mantida pela APU.

No CDU (Control Display Unit) do FMS, a tela de decolagem está aberta, mostrando as velocidades V1 de 149 Knots, VR de 164 Knots e V2 de 176 Knots. Todas essas velocidades também são mostradas em verde no Speed Tape do velocímetro, no lado esquerdo dos PFD – Primary Flight Displays.
O G-CIVW, em Heathrow
No MCP – Mode Control Panel, os pilotos já deixaram os modos VNAV – Vertical Navigation e LNAV – Vertical Navigation armados. O MCP é o painel onde os modos do sistema de piloto automático são selecionados. Com um atraso de 20 minutos devido ao tráfego pesado, o Ground Control manda o SFO mudar a frequência para a TWR (Torre de Controle), que autoriza a decolagem da pista 27L. A Carta de Saída (SID – Standard Instrument Departure) a ser utilizada é a MID3G, balizada pelo VOR Midhurst, ao sul de Heathrow. O SFO comunica a tripulação de cabine que a decolagem será iniciada, e ajusta no MCP a altitude autorizada, 6.000 pés.

O Comandante alinha a aeronave cuidadosamente na pista 27L, usando o steering e acelerando levemente o motor 4 para fazer a apertada curva entre a interseção e a cabeceira. Uma vez alinhado na pista, os faróis são todos acesos, e as luzes da cabine de passageiros são reduzidas.
Recebida a autorização para a decolagem, o Comandante (no momento, o PF) avança as quatro manetes do motor até atingir EPR – Engine Pressure Ratio entre 1,00 e 1,20, e espera até que os quatros motores estejam estabilizados. Uma vez que isso acontece, o SFO (PNF – Pilot Not Flying) canta: “Engines Stabilized” (motores estabilizados), e o PF responde: “Setting Power” (Selecionando Potência), pressionando o TO/GA – Take-off/Go Around (botão situado nas manetes e acionado com o dedo polegar do piloto, quando suas mãos estão posicionadas sobres as mesmas).
Painel principal do B747-400. O MCP está logo acima. O ND do Primeiro Oficial está com o radar no modo MAP, mostrando elevaçõesdo terreno.
O anunciador de modos no PFD – Primary Flight Display (tela do painel imediatamente à frente de cada piloto, que mostra os instrumentos primários de voo, como altímetro, velocímetro, variômetro, indicador de atitude, diretor de voo e outros) mostra THR REF / TO/GA / TO/GA, significando que o Auto-Throttle(sistema de controle automático das manetes do motor) está seguindo os parâmetros de Thrust Reference(ajuste de tração selecionado), e que os modos de arfagem e rolamento do Piloto Automático estão ambos em Take-Off/Go Around.

Uma vez que os modos LNAV – Lateral Navigation e VNAV – Vertical Navigation estão armados no MCP – Mode Control Panel, os anunciadores desses modos aparecem em letras brancas e pequenas no PFD. O PNF vigia atentamente o EICAS, e canta “Power Set” quando a tração atinge o nível selecionado. Quando a aeronave atinge a velocidade de 65 Knots, o sistema de Auto Throttle se desacopla dos servos dos manetes, e o anunciador de modos no PFD passa de THR REF para HOLD, permitindo atuação manual nos manetes e aplicação de tração adicional, caso isso seja necessário.
O Overhead panel em modo noturno
Como o componente de vento lateral é muito pequeno, é desnecessário ajustar o compensador de aileron da asa do lado do vento. Com um vento lateral mais forte, tal ajuste seria necessário, para evitar a tendência que o Boeing 747 tem de levantar a asa do lado do vento, devido ao grande enflechamento.

Aproxima-se agora a importante velocidade de 80 knots, e o PNF checa a mesma em ambos os PFD e no velocímetro convencional stand-by. Uma vez confirmada a velocidade, canta: “eighty knots”. Abortar a decolagem a partir de 80 Knots é bastante perigoso, embora viável.

Enquanto a aeronave acelera na pista, a V1 (velocidade de decisão), de 149 knots, é mostrada em verde no speed tapedo velocímetro, do lado esquerdo do PFD. Ao chegar a V1, velocidade na qual o piloto, a partir da mesma, não pode mais abortar, e deve obrigatoriamente prosseguir na decolagem, o PNF canta: “V one”. Nesse ponto, o piloto tira as mãos das manetes, colocando ambas no manche para rodar o avião. Logo a seguir, aparece na speed tape a VR – Velocity of Rotate, de 164 knots, o PNF canta: “rotate”, e o PF puxa suavemente o manche até o nariz subir 12,5º acima do horizonte, no indicador de atitude à sua frente.
Recolhimento dos trens de pouso
Uma vez no ar, o PNF liga o radioaltímetro e canta: “positive climb”, e o PF responde logo a seguir: “gear up”. O PNF também canta “gear up” e leva a mão à alavanca que recolhe o trem de pouso, movendo-a para a posição UP. A indicação dos trens de pouso no EICAS é um box verde, logo acima da indicação da posição dos flaps. Logo que as dezoito rodas do Boeing 747 estejam recolhidas e travadas, e as portas dos compartimentos estejam fechadas, o display mostra GEAR UP, e em seguida se apaga. 

Passando 500 pés, o modo LNAV engaja automaticamente, substituindo o TO/GA no indicador de centre mode roll(modo de rolamento) no PFD. A 400 pés, o modo VNAV engaja novamente o Auto-Throttle no modo THR REF. O pitch mode (modo de arfagem) passa para VNAV Speed, ligando o aviso de VNAV SPD no PFD. Esse modo gerencia a velocidade do modo como foi programado no sistema VNAV do FMS - Flight Management System (Sistema de Gerenciamento de Vôo). O sistema de Auto-Throttle simplesmente aciona as manetes de empuxo de acordo com a programação feita no sistema VNAV do FMS.
Carta SID atual de Heathrow, mostrando o procedimento MID 3G
A 500 pés AGL (Above Ground Level), o AP – Auto Pilot (piloto automático) central, um dos três, é engajado. Com um componente de vento e a SID – Standard Instrument Departure (Carta de Saída Padrão por Instrumentos) Midhurst 3G orientando uma apertada curva de poucas milhas de raio depois da decolagem, é melhor deixar a tarefa para o piloto automático, programando-o para seguir a rota da SID já inserida no computador. O trajeto programado na SID coincide com os procedimentos de abatimento de ruído que a British Airways e todas as demais empresas aéreas devem seguir, para não incomodar em demasia os bairros residenciais que circundam os aeroportos de Heathrow e Gatwick

Com o VNAV agora engajado, a aeronave seleciona automaticamente CLIMB Power (potência de subida) ao passar 1000 pés. Isso é indicado pelo anunciador CLB no topo do EICAS. O Comandante anuncia: “speed intervene”, alertando o Primeiro Oficial para abrir a janela do bugde velocidade (no MCP) e girar para “Flap 10 Retraction Speed” (velocidade de retração do Flap em 10º) mais 10 knots. A indicação “-10” aparece na speed tape, próximo da velocidade de 198 knots. Essa é a velocidade de retração do flap 10. Pela adição de 10 knots a essa velocidade, 208 knots é a velocidade lida no bug de velocidade. Esse procedimento tira temporariamente a aeronave do modo VNAV, e a aeronave é controlada manualmente, com o PF se orientando pelo speed bug.
Painel do 747 e seus detalhes. Notem a posição avançada do MCP, acima
Uma vez que a aeronave atinge a velocidade de retração do flap 10, o comandante canta: “Flap Ten”. O SFO seleciona flap 10 na alavanca de seleção do flap, e canta de volta “Flap ten selected”. A alavanca do trem de pouso é levada então à posição OFF, e tão logo a barra indicadora da posição do flap no EICAS atinja a linha verde que indica 10 graus, o Primeiro Oficial canta: “Flap 10 green”.

Passando 2.500 pés, as packs(unidades de aquecimento, condicionamento e pressurização de ar) 1 e 3 são ligadas, e tão logo estejam estabilizadas, as válvulas de isolação entre as packs são abertas. Até esse ponto, tais válvulas eram mantidas fechadas. Os procedimentos de abatimento de ruído usados no Boeing 747-400 da BA exigem que a aeronave mantenha essa configuração até 4.000 pés. Acima de 4.000 pés, uma simples pressão no bug de seleção de velocidade fecha a janela e faz a aeronave voltar ao controle no modo VNAV.
Visão noturna do painel
Vendo os numerosos alertas de tráfego e os sinais no TCAS do ND – Navigation Display (tela de navegação, que também agrega o radar meteorológico e o TCAS, sistema que evita colisões com outras aeronaves no ar), fica evidente para a tripulação que o controle de tráfego aéreo deve segurar a aeronave em 6.000 pés até Midhurst, para evitar os numerosos tráfegos em procedimento de aproximação vindos do sul. 

Para que essa transição (de nivelamento temporário) seja feita de modo mais suave possível para os passageiros, a aeronave é tirada do modo CLB da página Thrust Reference do FMS e mudada para potência de CLIMB 1. O modo CLIMB 1 prove uma redução de empuxo dos motores e é usada preferencialmente depois que a aeronave está limpa (flaps e trens totalmente recolhidos), para aumentar a vida útil dos motores. Usando CLIMB 1, a aeronave terá uma aceleração e redução de empuxo mais suave quando a aeronave nivelar a 6.000 pés de altitude, que também é a Altitude de Transição. Nessa altitude, o botãoStandard (STD), no MCP, é pressionado, e os altímetros dos PFD são ajustados imediatamente para a pressão padrão de 1013 hPa. O altímetro stand-by também é ajustado, manualmente, para essa pressão.
Boeing 747 da BA em LHR
Com uma velocidade mínima de manobra de 276 knots (V2 + 100 knots), o ATC autoriza a aeronave a acelerar até a velocidade de 280 knots. Para acelerar, a restrição de velocidade de 250 knots abaixo de 10.000 pés é deletada da página “CLIMB” do FMS. A um certo ponto, durante a subida, a APU – Auxiliary Power Unit (Unidade Auxiliar de Potência) deve ser desligada. Novamente, ambos os pilotos devem checar a posição do botão quando tal procedimento é feito. Os sinais de “Apertar os Cintos” são colocados em AUTO, e, ao passar 10.000 pés, os sinais serão desligados automaticamente. Os avisos de não fumar ficam em ON e nunca são desligados.
Painel de controles de rádios e outros equipamentos, no pedestal
Depois de sobrevoar o VOR Midhurst a 6000 pés, a aeronave volta a subir e finalmente nivela no FL inicial 310, 31 mil pés com ajuste padrão do altímetro, sendo liberada para voar diretamente ao waypoint ORTAC, no curso (rumo magnético) 225. O Primeiro Oficial abre a tela do sistema de combustível no MFD, para fazer a verificação do combustível. As verificações de combustível são realizadas começando no primeiro fixo após o nivelamento, e prossegue durante todo o restante do voo, com pelo menos uma verificação de combustível por hora. Para fazer o cross-check do combustível, o piloto simplesmente pega o total de combustível mostrado no EICAS e escreve esse total na planilha correspondente do SWORD – System World-Wide Operational Route Data. A partir daí, o combustível remanescente no destino pode ser calculado com segurança.

Apesar do atraso causado pelo congestionamento das pistas em Heathrow, o 747-400 demonstra notável flexibilidade em aproveitar tempo, em um longo voo transatlântico. Um Cost Index Number (número de índice de custo) faz um balanço entre o combustível levado a bordo e o tempo de voo que pode ser economizado, e é inserido no FMS - Flight Manager System, num esforço para recuperar o tempo perdido no solo. Depois de buscar os dados sobre o vento no restante do voo, um Cost Index de 400 é selecionado. Isso permite que a aeronave ganhe pelo menos dois minutos por hora de voo. Embora isso não pareça muito, em um voo de 11 a 12 horas de duração resulta em um tempo considerável. No fim, isso permite algumas órbitas de espera sobre o destino e ainda alternar o Aeroporto do Galeão, no Rio de Janeiro, caso necessário. Em voos que estão dentro do horário previsto, é normalmente usado um Cost Index 90. Com o Cost Index 400, a aeronave irá manter a impressionante velocidade de Mach .88, 88 por cento da velocidade do som, 10 por cento mais alta que a dos demais jatos comerciais atuais.
Painel de um Boeing 747-400
Na Posição NASAS, os dois pilotos serão substituídos pela segunda tripulação, que será responsável por voar a aeronave a partir dessa posição, por aproximadamente 7 horas, até a posição RIVER, quando a aeronave estará a voando sobre o Brasil. As condições meteorológicas são boas, mesmo sobre a Zona de Convergência Intertropical, nas imediações da Linha do Equador, segundo os informes meteorológicos mais recentes.

Voando sobre o Atlântico Norte, o piloto deve pensar antecipadamente sobre os problemas de ter que desviar o trajeto para um possível pouso de emergência. O Aeroporto de Porto Santo, no Arquipélago da Madeira, território português, é um estratégico ponto de apoio na travessia, assim como os aeroportos da Ilha do Sal, no Arquipélago de Cabo Verde, também um território português, e de Las Palmas, nas Ilhas Canárias. Já sobre o território brasileiro, uma das melhores opções é o Aeroporto de Recife. A tripulação deve considerar vários fatores ao escolher um aeroporto para pouso de emergência, como o ACN (Aircraft Classification Number) da aeronave e o PCN (Pavement Classification Number) da pista de alternativa. O ACN sempre deve ser menor, ou igual, pelo menos, que o PCN. Isso determinará se serão necessários procedimentos especiais, como alijamento de combustível, por exemplo, ou outros cuidados, inclusive com a decolagem posterior ao pouso de emergência.
B747 em procedimento de subida
Na posição NASAS, há troca da tripulação, e ambos os tripulantes, que até agora voavam o Speedbird 247 Heavyvão agora descansar por algumas horas. Na posição BIMBO, a aeronave faz um Step Climb para o FL 350, já previsto no plano de voo e autorizado pelo ACC Atlântico. Já não há combustível no tanque central, desde as 00:21 UTC. 
O ND e o PFD do Boeing 747-400
Entre BIMBO e o VOR Natal, o radar meteorológico acusa pesadas formações de cumulus-nimbus, com topos a 50 mil pés, à frente, e o Comandante, voando como PNF, ordena ao Primeiro-Oficial que está voando a aeronave que desvie para o lado esquerdo, tomando a proa magnética 195. Isso tira a aeronave temporariamente do modo VNAV do Piloto Automático, que passa então para o modo HDG (Heading: Proa). A aeronave está a 1080 NM de Natal quando o Comandante ordena nova mudança de proa, dessa vez para a Proa Magnética 230, o que levará a aeronave, ao cabo de mais algumas dezenas de milhas náuticas, ao curso original.

O VOR Natal é bloqueado às 05:12 UTC, e um novo Step Climbé autorizado pelo ACC Recife, dessa vez para o FL 390, 39 mil pés. O Oceano Atlântico já ficou para trás, e agora a aeronave passa a voar sobre o continente. Voando de Leste para Oeste, os ventos quase sempre são de proa, e o desafio do planejamento desses voos consiste justamente em planejar o nível onde há o menor vento de proa possível. O voo 247 está no horário, no entanto, apesar do atraso inicial da decolagem e dos desvios para evitar as formações sobre o oceano. Os ventos estão bem mais fracos que os previstos nas cartas.
PFD - Primary Flight Display
Sobre a posição RIVER, a primeira tripulação retorna aos comandos da aeronave, mas o Comandante agora volta como Pilot Not Flying– PNF, e o Primeiro Oficial opera os comandos do 747. Às 05:42 UTC, o nível de combustível nos tanques internos se igualou ao nível dos tanques externos, e o comandante fecha duas válvulas Crossfeed, e desliga as 4 bombas OVRD. Agora, cada tanque de asa alimenta apenas seu motor mais próximo.

O VOR CNF - Confins, acima da cidade de Belo Horizonte, é bloqueado às 07:17 UTC, e a aeronave voa agora em direção ao VOR BGC - Bragança, já nas proximidades de São Paulo. 80 NM antes de BGC, a aeronave atinge o ponto ideal de descida, e o ACC Brasília autoriza a aeronave descer para o FL 250. O Primeiro Oficial libera 25 mil pés no MCP, e logo o AP reduz os motores e inicia uma descida, pelo modo VNAV do Piloto Automático, com razão de 2500 pés por minuto. O FL 200 é logo autorizado também. Há pouco tráfego aéreo nessa hora da manhã na região, e as condições meteorológicas são boas. A velocidade indicada é reduzida para 280 Knots.
17 NM antes de BGC, o controle autoriza o nível 100, e a velocidade é novamente reduzida, agora para 250 Knots indicados. Sendo uma aeronave pesada e com muita inércia, 0 747 demora para desacelerar, e o acionamento dos spoilers de voo é necessário. O ATIS Guarulhos informa teto de 1500 pés acima do aeródromo, temperatura de 16ºC, vento de 300 graus com 6 knots, visibilidade horizontal de 3000 metros e ajuste do altímetro de 1021 hPa. A pista em uso para pouso é a 27L. A partir de BGC, o comandante volta aos comandos do avião, para pousar, e o Primeiro Oficial volta à posição de PNF. O Primeiro Oficial ajusta os altímetros para 1021.
Carta de Aeródromo atual de Guarulhos
O APP Guarulhos solicita que o Speedbird 247 Heavy aproe o VOR BCO – Bonsucesso, e inicie um procedimento ILS para a pista 27L de Guarulhos. O comandante ordena Flaps 5, e reduz a velocidade para 210 Knots. Abre a curva, que é feita no modo HDG do Piloto Automático. No bloqueio de BCO, a tripulação aciona Flaps 10 e reduz a velocidade para 170 Knots indicados. O comandante passa o Piloto Automático para o modo LOC, e a aeronave busca o sinal do localizador da pista 27L. 
O G-CIVW decola rumo a Ezeiza
O pouso é autorizado pela Torre Guarulhos, e o comandante ordena: "Gear Down". O Primeiro Oficial baixa os trens de pouso e o Comandante coloca o botão do autobrake na posição 2. Os faróis de pouso estão acesos desde BGC, e a aeronave agora faz a aproximação final. O comandante aciona agora o modo APP no Piloto Automático, a 4700 pés de altitude. O comandante arma os spoilers automáticos, enquanto o Primeiro Oficial checa, no CDU do FMS, a VREF para Flaps 30, 147 Knots. O comandante ordena: “Flaps 30”, e a aeronave segue os sinais do Localizador e do Glide Slope do ILS - Instrument Landing System, até o Comandante desacoplar o AP e o Auto Throttle, a 400 pés acima da pista. 
Os terminais de passageiros do Aeroporto de Guarulhos
O Comandante opera agora a aeronave manualmente, até tocar suavemente na pista 27L de Guarulhos, às 07:42 UTC, 04:42, hora local. Os reversores de empuxo são acionados, para poupar os pneus e os freios. O voo chegou adiantado. O táxi é feito vagarosamente até a posição nos fingers, e, enquanto isso, os faróis de pouso são apagados, a APU é religada e seus geradores colocados na barra. Os motores 1 e 4 são cortados antes da parada total da aeronave, e os motores 2 e 3 logo após a aeronave parar definitivamente. São 05:00, hora local. Os comissários desarmam os Escape Slides, e aguardam que o pessoal de terra posicione os fingersna aeronave. Guarulhos é apenas uma escala para o voo 247, pois logo mais a aeronave irá voar ao Aeroporto Ezeiza, em Buenos Aires, destino final do voo. A aeronave silencia quando os mecânicos colocam as fontes externas e desligam a APU. As primeiras luzes do dia já aparecem no horizonte sobre o Aeroporto de Guarulhos e a grande cidade de São Paulo.

Blog Cultura Aeronáutica: um milhão de páginas visitadas!

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Menos de quatro anos após ser criado, em maio de 2009, o Blog Cultura Aeronáutica completou, às 23:59 do dia 25 de abril de 2013, nada menos que UM MILHÃO DE PÁGINAS VISUALIZADAS na internet.
Estatística do Blogspot, mostrando o momento em que um milhão de acessos foi registrado
Aproveitamos a ocasião para agradecer, imensamente, a todos os leitores assíduos ou eventuais, e espero ter colaborado para a disseminação da cultura aeronáutica e para aumentar o conhecimento de todas as pessoas que, de alguma forma, se interessam pela aviação, sua história, sua tecnologia, seus personagens, suas aventuras.
Acessos por país e por navegador
As estatísticas mostram que a maioria dos acessos veio do Brasil, vindo logo a seguir os acessos de Portugal e dos Estados Unidos. Na estatística, vejam os 10 países que mais acessam o "Cultura Aeronáutica. É realmente acessado do mundo inteiro.

URL de referência
O fato de ter tantos leitores me incentiva a escrever novos artigos, e com qualidade ainda melhor, pois acredito que a responsabilidade agora é grande. Lembramos que o blog não tem patrocinadores, e que é mantido apenas por satisfação pessoal, por ter tantos leitores fiéis.
Os artigos mais lidos do blog, em 25 de abril de 2013
Mais uma vez,muito obrigado aos meus leitores!


Professor JONAS LIASCH
Londrina/PR, 25 de abril de 2013.

O nascimento da aviação comercial brasileira: nas asas do "Atlântico"

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Com rodovias precárias ou inexistentes, viajar através do Brasil na década de 1920 não era uma tarefa fácil. A melhor opção era o trem, então movido por lentas locomotivas a vapor, mas que não atingia todas as regiões. Com essa situação, e com grande extensão territorial, o Brasil era o país ideal para se implantar o transporte aéreo.
O Dornier Wal "Atlântico" primeiro avião comercial do Brasil
Desde o final da Primeira Guerra Mundial, muitas empresas aéreas apareceram nos céus da Europa e dos Estados Unidos, e aqui no Brasil não faltaram propostas para implantar a novidade. Em 1890, Leopoldo Correa da Silva fundou a Companhia Particular de Navegação Aérea, em Cantagallo/RJ, e ofereceu ações à venda. Tinha a intenção de usar dirigíveis, que seriam construídos na Alemanha e cujos projetos já estavam patenteados. Claro que tal visão estava muito adiante do seu tempo, pois dez anos ainda se passariam antes que o Conde Zeppelin construísse sua primeira aeronave, e que Santos Dumont provasse a viabilidade de controle dos dirigíveis. Leopoldo teria construído as duas aeronaves na Alemanha, e teria feito experiências práticas entre 1890 e 1892. Os balões foram batizados com os nomes de "21 de Abril" e "Cruzeiro do Sul", mas jamais foram colocados em serviço comercial. Provavelmente, eram impraticáveis para essa função.
O "Atlântico" já com a matrícula brasileira. Foi o primeiro avião registrado no RAB
Outros emprendedores, como Nelson Guillobel, Henrique Lage, João Teixeira Soares e Antônio Rossi também conceberam suas empresas aéreas, mas tais iniciativas nunca entraram em prática.

Os alemães e os franceses viam na América do Sul um mercado propício à implantação de linhas aéreas, inclusive internacionais, e tomaram suas iniciativas. Uma empresa alemã, o Condor Syndikat, veio ao Brasil oferecer material aeronáutico alemão a empresas de navegação aérea. Ainda não havia nenhuma, e o próprio Condor, que não era uma companhia aérea, mas sim uma sociedade mercantil, acabaria realizando alguns voos em território brasileiro, sob concessão do governo.
O hidroavião "Atlântico", primeiro avião da VARIG
O Condor Syndikat foi fundado na Alemanha em maio de 1924, por iniciativa da Deustsche Aero Lloyd A.G., Schlubach Theimer e Peter Paul Von Bauer. Inicialmente, as atividades do Condor se concentraram na Colômbia, onde já existia uma empresa aérea, a SCADTA, precursora da atual Avianca. O Condor trouxe duas aeronaves Dornier O Wal, de projeto alemão mas construídas pela Costruzioni Meccaniche Aeronautiche S.A. na cidade de Pisa, na Itália, já que a Alemanha, pelos termos do Tratado de Versalhes, estava proibida de fabricar aviões. Os Dornier Wal eram aerobotes bimotores, de construção semi-metálica, que podiam levar de 8 até 12 passageiros em suas versões civis.
O hidroavião "Pacífico" no seu batismo, em foto de anúncio na Internet
As aeronaves que vieram para a Colômbia foram o I-DOOR, c/n 34, batizado com o nome de "Atlântico", e o I-DALG, c/n 35, batizado com o nome de Pacífico. Os dois aviões foram trazidos de navio e montados na ilha caribenha de Curaçao. Tais aeronaves estavam destinadas a voar da Colômbia para os Estados Unidos, através do Caribe, mas a SCADTA jamais conseguiu autorização para operar nos Estados Unidos, embora as duas aeronaves tivesse feito ao menos uma viagem para os EUA, em 1925. Esse e outros problemas acabaram por impedir que o Condor conseguisse atingir seus objetivos na Colômbia.
Fuselagem traseira do "Atlântico"
Enquanto o Condor enfrentava seus problemas na Colômbia, um imigrante alemão, Otto Ernst Meyer Labastille, ex oficial do Serviço Aeronáutico Alemão, e que tinha desembarcado no porto de Recife, em 1921, para trabalhar na empresa textil Irmãos Lundgreen (Casas Pernambucanas), tentava convencer os empresários pernambucanos a montar uma empresa de transporte aéreo. Sem conseguir qualquer apoio, Meyer mudou-se em 1924 para o Rio de Janeiro, onde também não conseguiu apoio. Sem desistir, Mayer mudou-se novamente, dessa vez para Porto Alegre, em 1925, e lá conseguiu apoio dos empresários e políticos gaúchos.
Otto Ernst Meyer Labastille, fundador e primeiro presidente da VARIG
Com o repaldo dos empresário e políticos, Otto Meyer embarcou para a Alemanha, em novembro de 1926, para adquirir aeronaves, componentes e outros materiais, e também para buscar pessoal para operar os aviões. Visitando os escritórios do Condor Syndikat em Hamburgo, acabou por fechar um acordo, pelo qual o Condor adquiriu 21 por cento das ações da empresa aérea que Otto Meyer estava montando. Esse capital consistiu em uma aeronave Dornier Wal, o D-1012, que na verdade era o mesmo avião "Atlântico", ex I-DOOR, que tinha passado pela Colômbia algum tempo antes, e que tinha sido trazido para a Alemanha e rematriculado.
Proa do "Atlântico"
As negociações entre Meyer e o Condor já tinham, na verdade, começado antes dessa viagem. O "Atlântico", de fato, já estava de volta à América do Sul. O Condor Syndikat o tinha embarcado, de navio, para Montevideo, onde seria montado e despachado para Buenos Aires, Argentina, em voo, junto com outro avião de apoio, o Dornier Wal, o D-861 "Hai" (c/n 41).

Os dois aviões seriam empregados em uma missão política-comercial ao Rio de Janeiro, mas o "Hai", no entanto, acabou não participando da viagem, pois foi danificado por uma tempestade em Buenos Aires. O "Hai" acabou sendo consertado provisoriamente e despachado em voo para o porto de Rio Grande, de onde voltaria para a Alemanha, de navio. Em 17 de novembro de 1926, começou a viagem de 10 dias, conduzindo o ex chanceler alemão Hans Luther ao Rio de Janeiro, tripulado por Fritz Hammer, representante do Condor, e dois outros tripulantes.

A viagem ao Rio de Janeiro tinha o objetivo de demonstrar o avião para as autoridades e ao público em geral. O Dornier Wal era uma aeronave robusta, que inspirava confiança, tanto que a Deutsche Luft Hansa empregou o tipo na sua linha postal intercontinental entre a Alemanha e a América do Sul, pouco tempo depois.
O Dornier Wal "Hai", que deveria acompanhar a missão Luther
Embora Luther e Hammer tivessem voltado à Alemanha, de navio, em 1º de dezembro, os demais, incluindo os tripulantes do "Hai", permaneceram no Rio, e fizeram vários voos locais sobre o Rio de Janeiro, para convidados.
O "Atlântico" pousado em Itajaí, conduzindo o ministro Victor Konder, em 2 de janeiro de 1927
A comissão Luther convidou o Ministro de Obras e Viação, Victor Konder, e alguns jornalistas a voar, no Dornier Wal, do Rio de Janeiro até Florianópolis, no dia 1º de janeiro de 1927, retornando ao Rio quatro dias depois. O piloto que conduziu a aeronave foi o experiente comandante Rudolf Cramer Von Clausbruch. Os alemães empenharam-se em mostrar a segurança e o conforto do Dornier Wal, e conseguiram impressionar o Ministro Konder, pois o governo concedeu ao Condor Syndikat, em 26 de janeiro de 1926, autorização para operar um linha aérea, dentro do território nacional, pelo prazo de um ano, já que o Condor Syndikat era uma empresa estrangeira e havia essa limitação legal.

Enquanto isso, Otto Meyer ainda organizava sua empresa aérea, com o nome provisório de Companhia Riograndense de Transportes Aéreos. O Condor faria os voos comerciais até que a nova empresa aérea brasileira, da qual era acionista, estivesse organizada e autorizada a operar.
O "Atlântico" atracado no cais
Em 27 de janeiro de 1927, o Dornier retornou a Porto Alegre, onde ficaria baseado. Pousou no Rio Guaíba, perto do Mercado Municipal, no dia 29, sendo assistido pela lancha "São Domingos", da Companhia Hamburguesa Sul Americana.No dia 3 de fevereiro, às 8:30 da manhã, o D-1012 decolou das calmas águas do Rio Guaíba, conduzindo os passageiros Maria Echenique, João Fernandes Moreira, Guilherme Gastal e João Oliveira Goulart, sendo os dois últimos os primeiros passageiros pagantes da história da aviação comercial brasileira. Como carga, o "Atlântico" levava doze malas postais. Estava inaugurada a primeira rota comercial da aviação brasileira, depois chamada de "Linha da Lagoa", pois o voo se fazia sobre a Lagoa dos Patos, e cujo destino era a cidade de Rio Grande, com escala na cidade de Pelotas.

Entre os dias 3 de fevereiro e 15 de junho de 1927, todos os 63 voos da Linha da Lagoa foram feitos pelo Condor Syndikat, com tripulantes e pessoal de apoio alemães, sob a chefia de Fritz Hammer. O piloto era Rudolf Cramer Von Clausbruch e o mecânico era Franz Nüelle.
O comandante Von Clausbruch, em uma notícia de jornal
Em 1º de abril de 1927, Otto Meyer convocou uma assembléia prévia para constituição da empresa, e em 7 de maio foi realizada a assembléia geral de constituição da primeira empresa aérea brasileira, com o nome de Sociedade Anônima Empreza de Viação Aérea Rio Grandense (VARIG), com 550 acionistas, quase todos gaúchos da capital e do interior. Todos os pilotos e funcionários era de origem alemã, exceto um contínuo brasileiro esperto e ativo, de 19 anos de idade, chamado Ruben Martin Berta.

Em 10 de junho de 1927, o governo autorizou. pelo decreto nº 17.832, a VARIG a operar tráfego aéreo comercial no litoral de Santa Catarina e em todo o Estado do Rio Grande do Sul, podendo estender suas linhas até Montevideo, no Uruguai, caso o governo desse país assim o permitisse.

Em 15 de junho, a Linha da Lagoa e o hidroavião "Atlântico" foram transferidos do Condor para a VARIG, sendo a aeronave registrada, no dia seguinte, 16 de junho, no Folha 1 do Livro 1 do novo Registro Aeronáutico Brasileiro - RAB, com a matrícula P-BAAA. Uma semana depois, no dia 22 de junho, a VARIG começou a operar os voos regulares na Linha da Lagoa.
O "Atlântico" na base da VARIG na Ilha Grande dos Marinheiros, Porto Alegre
A VARIG construiu uma rampa e algumas oficinas na Ilha Grande dos Marinheiros, na foz do Rio Jacuí, bem em frente à cidade de Porto Alegre, para servir como base de operações. A construção dessa base foi autorizada pelo Ministério de Viação e Obras Públicas em 12 de setembro de 1927. Ficava em frente à Ilha do Pavão, próximo ao Grêmio Náutico União.
Bancada de testes de motor na Ilha Grande dos Marinheiros (G. Ermakoff)
O voo até a cidade de Pelotas se fazia em baixa altitude, entre 20 e 50 metros, sobre as águas da Lagoa dos Patos, na velocidade de cruzeiro de 160 Km/h. O avião tinha capacidade para levar até 9 passageiros com as suas bagagens, além das malas postais. No "check-in", o passageiro era pesado junto com a sua bagagem, e o que passasse de 75 Kg era cobrado como excesso.
O time de futebol do São José viajou pela VARIG. Os 11 jogadores ultrapassaram a capacidade do avião e alguns voaram no compartimento de bagagens.
Os passageiros se alojavam no casco dianteiro, que era relativamente amplo e confortável, até mesmo para os padrões atuais. Os assentos de passageiros eram de vime, para reduzir o peso. As janelas eram amplas, oferecendo boa visibilidade aos passageiros, e podiam ser abertas em voo. Durante os pousos e decolagens, as janelas deviam ser fechadas, para evitar entrada de água na cabine.

Antes do voo, o mecânico de voo distribuía o "serviço de bordo", que consistia em chumaços de algodão e chicletes. Os chumaços de algodão deviam ser colocados nos ouvidos, para tentar conter o ruído dos motores Rolls-Royce Eagle, de 12 cilindros em V e 360 HP de potência cada, montados em tandem. Os chicletes serviam para evitar a sensação de "ouvido tapado", caso o avião tivesse que subir um pouco mais alto. Os dois tripulantes, piloto e mecânico de voo (não existia a figura do copiloto), operavam a aeronave de um cockpit aberto, atrás da cabine de passageiros, abaixo da asa e logo atrás da hélice dianteira. Como estavam expostos às intempéries, usavam capacetes de couro, óculos de proteção e pesadas jaquetas de couro.
O P-BAAA, primeira aeronave registrada no RAB
O voo até Pelotas durava cerca de duas horas, e a perna seguinte, até Rio Grande, durava 20 minutos, e o avião pousava no trecho da lagoa conhecida como Saco da Mangueira, destino final do voo. Sem dúvida, era uma viagem rápida por qualquer padrão da época, e não custava muito mais caro que uma passagem de trem. muito mais demorada.

Os aviões demandavam muita manutenção. Frequentemente, os motores e as asas deviam ser removidos, e o casco virado de dorso, para que os mecânicos removesses as cracas do casco, e calafetassem eventuais pontos de vazamento de água para o interior da aeronave. Nenhum acidente ou incidente grave ocorreu durante a operação do Atlântico na Linha da Lagoa, e a aeronave ganhou a merecida reputação de ser muito confiável e segura.
O Dornier Merkur "Gaúcho", segundo avião da VARIG
No final de 1927, a VARIG tinha transportado um total de 668 passageiros, e um hidroavião Dornier Merkur, matriculado P-BAAB e batizado com o nome de "Gaúcho", com capacidade de levar 6 passageiros, tinha sido agregado à frota em outubro.

Em 1926, o controlador do Condor Syndikat, o Deutsche Aero LLoyd havia se fundido com a Junkers Luftverkehr para formar uma nova empresa de bandeira alemã, a Deutsche Luft Hansa. Em 1º de julho de 1930, o Condor Syndikat deixa oficialmente de existir, como parte da reorganização interna da Luft Hansa, e se retira da sociedade com a Varig. A Luft Hansa criou uma subsidiária brasileira, o Syndicato Condor, e retomou os dois aviões que operaram a linha da Lagoa, o Wal (Atlântico) e o Merkur. O Atlântico foi transferido para o Syndicato Condor no dia 2 de julho de 1930, e rematriculado P-BCAA, e depois PP-CAA. Em uma certidão do RAB obtida em 1952, o registro P-BCAA não é citado, e é duvidoso que tenha sido realmente aplicado ao avião.  

O Syndicato Condor acabou se tornando uma outra empresa aérea brasileira, em 20 de janeiro de 1928, e foi posteriormente rebatizado como Cruzeiro do Sul, em 1943, quando já não tinha mais capital alemão. Em 1975, a VARIG adquire o controle acionário da Cruzeiro do Sul, que é finalmente extinta em 1992.
Carta aérea transportada pela VARIG, em 1930
O "Atlântico" ficou por pouco tempo no Syndicato Condor, e foi retirado de serviço em 1932. O Syndicato Condor pediu o cancelamento da matrícula PP-CAA em 19 de outubro de 1933, através do Requerimento 1.199. No Processo nº 1.174/33, um despacho de 28 de outubro de 1933 cancela oficialmente a matrícula PP-CAA do "Atlântico", o primeiro avião comercial brasileiro., que tem um fim melancólico e inglório, apesar da sua grande importância histórica.

O Atlântico foi desmanchado e transformado em sucata, no aterro da Ponta do Calabouço, na cidade do Rio de Janeiro, onde tinha sido realizada a exposição do Centenário da Independência do Brasil, em 1922, e onde seria construído, três anos mais tarde, o Aeroporto Santos-Dumont. De todas as peças do avião, sobrou apenas uma hélice de 4 pás, que posteriormente foi recuperada pela Varig e colocada em exposição no seu museu, em Porto Alegre. Com o fim da VARIG, o museu foi abandonado, e a situação dessa peça história hoje é muito incerta, pois não está definido quem é o dono de tal acervo.

1967: Acidente com o avião presidencial, com o Presidente a bordo!

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Em 1956, o Governo Juscelino Kubitschek adquiriu dois aviões quadrimotores Vickers Viscount 700 para atender a Presidência da República, em substituição aos obsoletos Lockheed VC-66 Lodestar. O primeiro desses aviões, que havia sido encomendado originalmente pela empresa aérea norueguesa Braathens - SAFE, já estava pronto, quando a empresa aérea desistiu da compra, e foi oferecido imediatamente ao governo brasileiro, que o comprou para a FAB, recebendo o registro FAB 2100.
O FAB 2100, logo após ser comprado pela FAB e ainda com pintura civil
O Viscount foi então reconfigurado como aeronave presidencial, com apenas 20 lugares, na Grã-Bretanha, e voou para o Brasil em fevereiro de 1957. O Viscount, rápido, confiável e isento de vibrações, fez sucesso imediato no serviço presidencial, pois podia levar rapidamente o Presidente JK para as obras da nova capital, Brasília. Uma segunda aeronave, o FAB 2101, foi incorporada em 1958.

O FAB 2100, no entanto, logo demonstrou ser uma aeronave "azarada". Na primeira vez, transportando o Presidente Juscelino no trecho voo São Luiz - Recife, teve falha dos motores por entupimentos no sistema de combustível, e teve que pousar em emergência no aeroporto de Fortaleza. O abastecimento com combustível contaminado em São Luiz foi o motivo da falha. A pane foi sanada, e a aeronave reabastecida com combustível limpo, mas o Presidente preferiu pegar um avião comercial para continuar a viagem.
O Presidente Arthur da Costa e Silva, que estava a bordo.
Em 1958, dessa vez sem o Presidente a bordo, o Cel.Av. Josino Maia de Assis, herói da Segunda Guerra, calculou mal a aproximação e quebrou o trem de pouso ao pousar na pista do Aeroporto Internacional do Galeão, no Rio de Janeiro. Um reparo provisório foi feito, e o avião foi trasladado à Inglaterra, onde foi revisado pelo fabricante. Mas, o pior ainda estava por vir...
O FAB 2100 ainda na Inglaterra, pouco após ser convertido em aeronave Presidencial
Na manhã do dia 8 de dezembro de 1967, o então Presidente Arthur da Costa e Silva embarcou em Brasília no já famigerado FAB 2100, tendo como destino o Aeroporto Santos-Dumont, no Rio de Janeiro. Junto com o Presidente, estavam o chefe do SNI, General Emílio Garrastazu Médici, o General Jaime Portela, chefe da Casa Militar, o Chefe da Casa Civil Rondon Pacheco, o Coronel Massa, subchefe da Casa Militar, o subchefe da Casa Civil, José Assis Aragão, o chefe do cerimonial Marques Coimbra, o Secretário de Imprensa Heráclito Sales, o Comandante Stalla, responsável pela segurança dos voos presidenciais, o médico do Presidente e alguns outros funcionários e funcionárias.
O então chefe do SNI, e futuro Presidente Emílio Médici, estava a bordo
Por volta das 10:30 da manhã, já sobre o espaço aéreo do Rio de Janeiro, o FAB 2100 recebeu instruções da Torre Rio para pousar na pista 02R do Aeroporto Santos-Dumont, aproximando-se, portanto, do lado do morro Pão de Açucar.

O comandante da aeronave, Capitão-Aviador Ariel, fez uma aproximação baixa, para fazer o avião tocar logo no começo da curta pista do aeroporto. Entretanto, por um erro de cálculo ou alguma rajada de vento, as rodas do trem de pouso direito bateram nas pedras proeminentes do quebra-mar que existe naquela cabeceira, ao lado da rua que dá acesso à Escola Naval, na Ilha de Villegaignon.
Croqui publicado pelo O Globo, no dia 9 de dezembro
Um dos pneus do trem estourou imediatamente, e houve vazamento de fluido hidráulico. As rodas se quebraram, o trem acabou cedendo, fazendo com que a asa direita tocasse na pista, assim como as hélices dessa asa. O piloto conseguiu segurar a aeronave na pista durante a corrida de 700 metros até a parada completa do avião. O motor 3 pegou fogo, assim como o fluido hidráulico que vazou do trem, mas os bombeiros do Aeroporto Santos-Dumont, atuando rápida e eficientemente, extinguiram imediatamente as chamas. Eram 10:45 da manhã de um quente dia de dezembro.

Surpreendemente, não houve pânico a bordo. Embora ainda existisse o risco de incêndio ou de explosão do avião, as coisas a bordo aconteceram quase que em câmera lenta. O Presidente resolveu assumir a liderança do salvamento e pediu que as senhoras desembarcassem primeiro. Alguém abriu a porta traseira da aeronave, e foi por lá que os passageiros desembarcaram.
Viscount FAB 2100 nos anos 60
O Presidente saiu calma e lentamente do local, apesar do risco ainda existente. Mas, dezesseis minutos após o acidente, chegou ao Palácio das Laranjeiras, cumpriu rapidamente a sua agenda e, demonstrando muita preocupação, recolheu-se aos aposentos do palácio para se recuperar do susto. A esposa do Presidente, D. Iolanda, que estava em Paris, recebeu a notícia do acidente, e no mesmo dia, às 22:30, embarcou para o Rio, chegando pela manhã do dia 9 de dezembro no aeroporto do Galeão.

O avião acidentado foi rapidamente removido do local, e lá pelas 11:30 da manhã, a pista já havia sido liberada. O pessoal da 3ª Zona Aérea, baseados ali mesmo no aeroporto, começaram as investigações de imediato.

Como se trata de uma aeronave militar, o relatório final do acidente jamais foi divulgado oficialmente, e permanece restrito nos arquivos da FAB. A aproximação foi muito baixa, o que é normal e costumeiro no Aeroporto Santos-Dumont, que tem uma pista muito curta, e qualquer turbulência, comum àquela hora do dia num dia quente, poderia ter baixado o avião o suficiente para que ele batesse o trem contra as pedras proeminentes e pontiagudas do quebra-mar, feito para proteger a pista da erosão das ondas. As pedras foram rebaixadas pouco depois, pela FAB.

Aspecto atual do quebra-mar do aeroporto Santos-Dumont (foto: Google Street View)
A aeronave azarada, no entanto, jamais voltou a voar. Depois de extensas avaliações, o avião foi dado como irrecuperável e foi desmontado. Tinha apenas 1.473 horas de voo. O Governo já tinha encomendado, no mesmo ano, duas aeronaves presidenciais novas, a jato: os BAC One-Eleven. Com a chegada dessas aeronaves, o Viscount sobrevivente, o FAB 2101, foi transferido ao CAN - Correio Aéreo Nacional, e sobreviveu muito tempo na FAB, graças inclusive às peças sobressalentes que foram aproveitadas da sucata do FAB 2100. O FAB 2101 teve uma longa carreira, foi reconfigurado como aeronave presidencial em 1971 e só foi aposentado em 1987, quando foi conduzido em voo ao Museu Aeroespacial, onde se encontra até hoje, perfeitamente preservado.
Foto do acidente. Fonte: Jornal "O Globo".
Em retrospectiva, é de se imaginar as consequências para a história do Brasil, se o acidente com o FAB 2100 tivesse sido mais grave, e se os seus passageiros tivessem morrido no acidente. Além do Presidente Costa e Silva, seu sucessor, o General Médici, também estava a bordo, e um acidente fatal, nesse caso, teria mudado totalmente os rumos da nossa história.
O Viscount acidentado (O Globo, 09/12/1967)
Algumas superstições cercam a história do FAB 2100. O final 00 não parece dar sorte aos aviões presidenciais. Assim como o Viscount que se acidentou, um dos seus sucessores não teve melhor sorte, o FAB 2400. Esse avião era um Boeing 707 da Varig, onde tinha a matrícula PP-VJK. Foi comprado pela FAB para ser avião presidencial e reabastecedor em voo, mas se acidentou tragicamente na Costa do Marfim, em janeiro de 1987, no que deveria ser seu último voo antes de passar para a FAB. Curiosamente, quando o Governo Brasileiro comprou um Airbus A319ACJ para uso da Presidência, mandou a FAB registrá-lo como FAB 2101...




Projeto Loon: os balões do Google

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Um dos mais bizarros projetos aeronáuticos civis surgidos nos últimos tempos é, sem dúvida, o Projeto Loon, uma rede de balões retransmissores de sinal da Internet lançada pelo Google, e que visa, oficialmente, levar a Internet ao mundo inteiro.

Balão do Projeto Loon sendo apresentado ao público na Nova Zelândia, em junho de 2013
 Considerado pelo Alexa o site mais visitado do mundo, o Google é uma empresa hoje poderosa e gigantesca, com valor de mercado superior a 250 bilhões de dólares americanos. A empresa é agressiva em termos tecnológicos e mercadológicos, e vem desenvolvendo produtos novos a cada momento, visando a expansão dos seus negócios.
Funcionamento de um balão Loon
O laboratório Google X, localizado a cerca de 800 metros da sede administrativa do Google, em Montain View, Califórnia, desenvolve atualmente oito projetos, entre eles o projeto Loon, embora tenha investido considerável investimento em coisas como o teletransporte, por exemplo. É uma instalação semi-secreta, de forma que muita coisa do que se faz lá não chega ao conhecimento da concorrência, e muito menos do grande público.
Balão Loon, construído em polietileno com 0,076 mm de espessura e preenchido com gás hélio
Em 2008, o Google chegou a considerar a compra de uma empresa especializada em lançar balões de comunicações, a Space Data Corp, que lançava balões de hélio a uma altitude de 32 Km, para oferecer comunicação rádio para motoristas de caminhão e operadores de plataformas de petróleo, mas as negociações não prosseguiram. No entanto, a partir desse contato, os pesquisadores do Google X passaram a desenvolver um projeto de balões para disseminar a Internet para todos os lugares imagináveis do mundo, sem depender dos caros satélites.

O Google X começou a desenvolver o Loon a partir de 2011, mas somente em 14 de junho de 2013 é que o projeto foi oficialmente lançado pelo Google. Ao invés de utilizar uma banda de ondas de rádio liberada para uso livre no mundo inteiro, o cientista Astro Teller, principal coordenador técnico do Google X, anunciou, em maio de 2014, que alugaria o sinal dos balões do Loon para os provedores móveis de Internet dos países por onde os balões sobrevoariam.

Um dia após o lançamento oficial, o Google deu início a um projeto piloto na Nova Zelândia, em Lake Tekapo, South Island. Devidamente coordenado com a autoridade aeronáutica civil da Nova Zelândia, foram lançados 30 balões experimentais, e 50 usuários voluntários, utilizando receptores com antenas especiais, experimentaram a navegação na Internet utilizando o sinal dos balões, que utiliza tecnologia equivalente à da banda 3G de telefonia celular, mas cuja célula é transmitida de balão em balão, ao invés de antenas terrestres.

A experiência piloto foi bem sucedida, e o Google projeta enviar, eventualmente, milhares de balões na estratosfera, criando uma rede eficiente e bem pouco custosa, se comparada a qualquer rede que pudesse ser baseada em satélites ou em antenas terrestres.
Balão Loon visto logo após ser lançado
Os balões do projeto Loon, que hoje estão sendo lançados de locais no mundo inteiro, circulam em altitudes duas vezes superior às utilizadas pelas aeronaves comerciais, acima de 60 mil pés. Os balões são manobrados para encontrar ventos de grande altitude, que circulam, nessa altitude, predominantemente, de oeste para leste. Os balões são equipados com estações retransmissoras de rádio, nas frequências não licenciadas de 2,8 e 5,4 GHz ISM, alimentadas por células solares instaladas em cada balão durante o dia, e por baterias durante a noite. Tais células geram cerca de 100 W, suficientes para manter a estação funcionando durante o dia e recarregar as baterias para o funcionamento noturno.

Os balões são feitos de polietileno, com diâmetro máximo de 15 metros e altura de 12 metros, e são preenchidos com hélio. Um sistema de bombas de ar permite manter a altitude constante, e um sistema de paraquedas permite a descida controlada do balão quando o mesmo chega ao final da sua vida útil, hoje em torno de 55 dias. O Google pretende, no entanto, aumentar a vida útil dos balões para 100 dias, o que diminuirá o seu custo operacional.
A Terra vista de um dos satélites do Projeto Loon, a 63 mil pés de altitude
O raio de ação de cada balão é relativamente pequeno, cerca de 20 Km ao redor de cada balão, o que cobre uma área total de 1256 Km quadrados, mas um número grande de balões pode oferecer, teoricamente, uma grande cobertura.

Em maio de 2014, o Google trouxe o Projeto Loon ao Brasil, lançando dois balões, no Piauí. No dia 6 de junho, uma segunda bateria de balões foi lançada, a partir das cidades de Teresina e Campo Maior, no Estado do Piauí. A empreitada foi apoiada pelo governo brasileiro, e foi o primeiro lançamento feito a partir de áreas equatoriais, e utiliza tecnologia 4G, em parceria com a operadora de telefonia celular Vivo e a Telebrás. Durante uma hora, uma escola rural do Piauí usou o sinal para oferecer recursos de Internet aos alunos.
Lançamento de um balão do Google em Teresina, Brasil.
Ninguém, além do Google, sabe o custo total do projeto. Podendo levar a Internet a países que não podem, ao menos por enquanto, oferecer cobertura de Internet via redes terrestres de fibra ótica e a uma fração do custo de uma cobertura via satélite, os balões do Projeto Loon tem sido bem recebidos no mundo, mas, obviamente, isso tem implicações políticas e até militares. Até que ponto vão tais implicações, ainda é cedo para descobrir. Mas, é fato, o balões do Google já estão por aí.
Balão Loon sendo rastreado pelo aluno Rafael Mattos, do curso de Ciências Aeronáuticas da Unopar, em junho de 2014


Soluções engenhosas para problemas espinhosos

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Desde a invenção do avião por Santos Dumont, em 1906, os fabricantes de aeronaves tem se deparado com problemas a resolver cada vez que criam um modelo novo ou quando são desafiados a projetar e fabricar aviões para determinados problemas específicos.

A capacidade criativa do homem parece inesgotável, e é muito difícil ocorrer um problema para o qual não se encontre uma solução. Alguns exemplos de soluções engenhosas, para alguns problemas espinhosos, na aviação, podem ser encontrados na lista abaixo:

Pneus de tundra: um dos maiores desafios enfrentados pelos pilotos que precisam operar me regiões muito frias é a grande instabilidade do terreno, durante o verão, quando a neve derrete. Nas altas latitudes, o solo nunca descongela por completo, sempre restando uma camada congelada abaixo, denominada permafrost. O maior problema é que o permafrost impede a infiltração da água que ficou acima, tornando o solo pantanoso e macio demais para a operação de aeronaves ou para a construção de pistas pavimentadas, a não ser a um custo muito muito alto.
Pneus de Tundra em um Piper Super Cub
A vegetação que cresce nesses terrenos, constituída basicamente por liquens, é a tundra, que pelas suas características, torna o terreno mais macio ainda.
A tundra e sua vegetação característica
A solução para a operação de aeronaves nesses terrenos é utilizar os pneus de tundra. Esses pneus tem construção semelhante à dos pneus comuns, mas possuem diâmetro e largura muito maiores, e utilizam pressões muito baixas para o seu enchimento. Como o peso do avião se distribui em uma área muito maior do solo que os pneus comuns, eles não afundam no terreno, ainda que esse seja muito macio.

Uma aeronave Sherpa com pneus de tundra
Como são de pressão muito baixa, os pneus absorvem melhor os choques, possibilitando pousos em terrenos pedregosos e muito irregulares sem forçar a estrutura da aeronave.

A FAA - Federal Aviation Administration, dos Estados Unidos, limita o tamanho dos pneus de tundra a 35 polegadas, ou 89 cm de diâmetro. O maior arrasto durante a decolagem é compensado de modo muito simples: diminuindo a corrida de decolagem utilizando mais potência do motor. Essa maior potência também permite que o avião faça a aproximação com ângulos de ataque enormes, em baixa velocidade, com o uso do motor, reduzindo também a corrida de pouso.

Embora sua invenção possa ser creditada a muitos inventores, em vários países, na América do Norte é atribuída ao canadense Welland Phipps.

APU - Auxiliary Power Unit: Quando os primeiros jatos comerciais entraram em operação, um dos problemas mais críticos enfrentados pelos seus operadores era a necessidade de grande apoio de solo, não apenas nos aeroportos normais de operação, mas também nos aeroportos que pudessem servir de alternativa, em caso de dificuldades.
APU de um Boeing 777 (foto: Blog Aviões e Música)
Normalmente, no solo, um jato comercial tem necessidade de energia elétrica e por ar comprimido em baixa pressão, utilizado não somente para ventilar e condicionar o ar da cabine, mas também para dar a partida nos motores da aeronave. Motores a reação do tipo turbofan precisam girar a velocidades relativamente altas até alcançar uma rotação que permita sua autosustentação, e motores a ar comprimido são utilizados quase universalmente para esse fim.

Os primitivos Boeing 707 e Douglas DC-8, utilizados então em longos voos internacionais em rotas de grande demanda de passageiros e operando em grande aeroportos internacionais, podiam contar com grande apoio de solo, mas quando a Boeing resolveu criar, em 1963, seu primeiro jato verdadeiramente doméstico, o Boeing 727, precisou repensar esse conceito, para aumentar o número de aeródromos onde o avião pudesse ser operado.
APU e seus componentes (foto: Adriano Scarpa)
Na verdade, a solução foi tirada da experiência da empresa com os grandes aerobotes comerciais dos anos 30. Esses aviões tinham um motor auxiliar, de ciclo dois tempos, que acionava um gerador elétrico de corrente alternada, necessário quando os motores do avião estivessem parados.

No Boeing 727 que, por conceito, deveria operar com o menor apoio de solo possível, foi instalado um motor do tipo turboeixo, que acionava um gerador elétrico de corrente alternada. Esse motor também fornecia, através de uma válvula de sangria (bleed valve), ar comprimido suficiente para dar a partida nos motores e para manter o avião ventilado e com temperatura agradável no solo.
APU do Boeing 727, instalada próxima aos trens de pouso principais
A ideia foi copiada por todos os outros fabricantes. No Boeing 727, esse motor auxiliar, hoje mais conhecido por sua designação em inglês Auxiliary Power Unit, ou simplesmente APU, foi instalado na barriga do avião, devido à sua configuração de três motores na cauda, mas na maioria dos outros aviões, a APU está instalada no cone de cauda, onde pode ser notada pelo seu cano de escapamento e pelo ruido intenso que produz.

Golden Canopy: Os canopies, "bolhas" plásticas que protegem o cockpit de vários tipos de aeronaves militares, são peças mais sofisticadas do que parecem.
Canopy do Lockheed-Martin F-16
Como consistem praticamente na única proteção do piloto, devem protegê-lo de todos os perigos existentes no voo normal, como baixas temperaturas, radiações perigosas e relâmpagos.

Os materiais normalmente usados na construção de canopies são o acrílico ou o policarbonato. Um dos problemas desses materiais é que eles não conduzem energia elétrica, o que aumenta o risco do piloto sofrer, por exemplo a descarga de um raio dentro ou próximo de uma nuvem cumulus-nimbus.
Canopy do F-22 Raptor
Outro perigo que os pilotos podem sofrer, especialmente em grande altitude, são as radiações solares ou cósmicas, como ultra-violeta, raios-x e raios gama.Quanto maior a altitude do voo, maior é a incidência de radiações não filtradas e absorvidas pela atmosfera.

A solução encontrada para esses problemas foi aplicar uma camada de ouro metálico, finíssima, sobre o canopy. O ouro é um metal muito denso, e tão dúctil que, de apenas um grama, pode ser feita uma lâmina quadrada de 70 cm de lado e com apenas um milésimo de milímetro de espessura, seis vezes mais fina que um fio de cabelo e praticamente transparente.

O ouro, devido à sua densidade, filtra as radiações em grande altitude, e fornece o efeito de "Gaiola de Faraday" para o canopy, tornando-o condutivo, protegendo o piloto de eventuais descargas elétricas na atmosfera.



Querosene de aviação: conheça o combustível dos motores a reação

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Ao contrário do que ocorre com os motores a pistão, que são extremamente exigentes em termos de combustível, os motores a reação podem consumir, ao menos teoricamente, muitos tipos de combustível, desde gás natural até óleo diesel, incluindo óleos de origem vegetal ou até animal.
Abastecimento por pressão de uma aeronave com querosene de aviação
Logo após a Segunda Guerra Mundial, época de criação dos primeiros motores a reação, verificou-se que o melhor combustível para uso nos motores a reação aeronáuticos era o querosene. Esse tipo de combustível era utilizado em grande quantidade para iluminação e aquecimento nas casas do mundo todo, antes do advento da distribuição doméstica de energia elétrica, mas, pós isso, sua utilidade ficou bastante reduzida.

O que é o querosene, afinal? É um derivado do petróleo, composto de hidrocarbonetos com 8 a 16 átomos por molécula, ou seja, é um derivado um pouco mais denso e oleoso que a gasolina. Sendo bem menos volátil que a gasolina, e mais barato que esta, o querosene apresentou grandes vantagens para uso nos motores a reação, que consomem um volume consideravelmente maior de combustível que os motores a pistão.

O fato de ser menos volátil que a gasolina é uma grande vantagem em termos de segurança no manuseio. O querosene comum de aviação tem um ponto de fulgor entre 38ºC e 60ºC, ou seja, somente produz vapores inflamáveis a partir dessas temperaturas. Só para efeitos de comparação, a gasolina tem um ponto de fulgor de -42,8ºC, sendo, portanto, muito mais perigosa.
O querosene é um líquido cuja cor varia do incolor ao amarelo-palha, mais viscoso e mais denso que a gasolina. Não se mistura com a água, embora sua densidade permita que a água fique, eventualmente, em suspensão no combustível, decantando com maior dificuldade do que na gasolina. Não tem tendência a polimerizar, embora a oxidação de alguns de seus componentes tendam a criar uma espécie de goma em combustíveis envelhecidos.

Para uso em aviação, o querosene deve ser aditivado, para prevenir problemas como congelamento, corrosão química ou biológica dos reservatórios ou formação de goma. Os principais aditivos acrescentados ao querosene de aviação são: 
  • Antioxidantes: quando armazenado por longo tempo, alguns compostos do querosene oxidam e formam uma espécie de goma. Os aditivos antioxidantes retardam o tempo de oxidação do combustível e evita a formação de goma. São à base de alquilados fenóis;
  • Antiestáticos: a viscosidade do querosene faz com que o líquido em movimento crie eletricidade estática, que eventualmente pode produzir faíscas. O DINNSA, um arilo do ácido sulfônico, pode prevenir essa tendência;
  • Inibidores de corrosão: esses aditivos, como o DCI-4A, previnem corrosão no sistema de combustível e nos motores;
  • Biocidas: alguns tipos de bactérias e fungos prosperam e se alimentam de hidrocarbonetos, e podem criar extensas colônias nos tanques das aeronaves. Dois tipos de biocida são utilizados como  aditivos no querosene: Kathon FP 1,5 e o Biobor JF
  •  Inibidores de formação de gelo no combustível: a água decanta com dificuldade no querosene, ao contrário do que ocorre na gasolina. Então, simplesmente drenar os tanques não elimina a água contida no combustível, e nas baixas temperaturas, essa água, suspensa sob forma de gotículas, pode congelar e obstruir os filtros de combustível das aeronaves, resultando em falha do motor. Os aditivos anticongelantes previnem esse congelamento, sendo essenciais em aeronaves que não dispõem de sistema de aquecimento do combustível.
  • Desativadores de metal: são aditivos que removem traços de metais que interferem na estabilidade térmica do combustível.

Existem vários tipos de querosene, mas basicamente apenas três tipos são utilizados na aviação civil:
  • Jet-A: Esse tipo de querosene atualmente só é oferecido no mercado nos Estados Unidos e em alguns aeroportos canadenses, como Toronto e Vancouver;
  • Jet-A1: Diferindo do Jet-A principalmente pelo ponto de congelamento mais baixo, -47ºC ao invés de -40º do Jet-A, é o querosene mais utilizado no mundo, disponível em todos os países do mundo. No Brasil, o maior distribuidor desse combustível, a Petrobrás, denomina esse combustível de QAV1;
  • Jet-B: Querosene bem mais volátil e com ponto de congelamento bem mais baixo que os Jet-A e Jet A-1, é utilizado apenas em regiões extremamente frias, sendo comparável ao combustível militar JP-4, e muitas vezes confundido com este. É composto de hidrocarbonetos de 5 a 15 átomos de carbono por molécula, sendo na prática uma mistura de gasolina com querosene.
Na aviação militar dos Estados Unidos e da OTAN, existem vários tipos de querosene com especificação militar, denominados:
  • JP-1: querosene mineral praticamente sem aditivação, utilizado antigamente, mas obsoleto na atualidade;
  • JP-2: querosene obsoleto desenvolvido durante a Segunda Guerra Mundial;
  • JP-3: querosene obsoleto desenvolvido durante a Segunda Guerra Mundial;
  • JP-4: mistura de querosene com gasolina, em proporção 50%-50%, muito volátil e perigosa. Foi amplamente. e preferencialmente, utilizada em aeronaves militares americanas e da OTAN entre 1951 e 1995. É muito semelhante ao combustível civil Jet-B. Não está mais em uso;
  • JP-5: querosene pouco volátil utilizada em aeronaves embarcadas em navios-aeródromos, e semelhante ao combustível civil Jet-A;
  • JP-6: querosene pouco volátil utilizada apenas na aeronave North American XB-70 Valkyrie, e abandonado com o cancelamento do programa desse avião;
  • JP-7: querosene pouco volátil utilizado apenas nas aeronaves Lockheed SR-71 Blackbird e similares (A-12 e YF-12A). Era bastante viscoso e exigia aquecimento prévio em terra para a partida dos motores;
  •  JP-8: praticamente idêntico ao combustível civil Jet-A, o JP-8 substituiu o perigoso JP-4 nas forças aéreas dos EUA e da OTAN em 1996.
  • JP-9 e JP-10: querosenes com ponto de congelamento consideravelmente mais baixo que os querosenes normais. Apenas o JP-9 ainda permanece em uso;
  • JTPS: tipo de querosene com baixo ponto de congelamento desenvolvido especificamente para as aeronaves Lockheed U-2;
  • Zip Fuel: combustível de alta energia, contendo boranos, compostos orgânicos com boro. Foi projetado para aeronaves estratégicas de longo alcance durante a Guerra Fria, mas ficou obsoleto com o advento dos mísseis balísticos intercontinentais, que tornou as aeronaves de ultralongo alcance dispensáveis;
  • Syntroleum: combustível sintético, não derivado de petróleo, desenvolvido pela empresa Syntroleum Corporation especialmente para uso militar nos Estados Unidos. Esse combustível é produzido a partir de gás natural, carvão ou biomassa pelo processo Fischer-Tropsch. Está sendo certificado para uso em todas as aeronaves militares norte americanas.
A presença de água no querosene de aviação é um dos maiores problemas enfrentados pelos operadores de aeronaves a reação. A umidade do ar, condensada em baixas temperaturas, encontradas em grandes altitudes, se mistura sob a forma de gotículas ao querosene e se decanta com grande dificuldade. Eliminar totalmente a água do querosene é praticamente impossível, e o maior problema é essa água congelar e entupir os filtros. Embora a maioria das aeronaves comerciais modernas tenham trocadores de calor lubrificante-combustível, nem sempre esses sistemas conseguem evitar o congelamento da água e a falha dos motores que ocorre em consequência. Um grave acidente ocorreu com o voo British 038, em 17 de janeiro de 2008. O Boeing 777-200 G-YMMM passou, durante o voo, por uma área de temperaturas próximas de -70ºC, o que causou a formação de gelo dentro do combustível, acima da capacidade dos trocadores de calor fazerem o degelo. Os motores falharam durante a aproximação e a aeronave chocou-se com o solo no Aeroporto de Heahtrow, felizmente sem fatalidades, mas com perda total da aeronave.

O querosene de aviação simplesmente não funciona em motores de ciclo Otto. Para evitar o abastecimento indevido de motores a gasolina com querosene, o que é catastrófico, os bocais de abastecimento das aeronaves de motor a pistão não podem ter mais que 60 mm, o que não permite a introdução do equipamento de abastecimento usado nos jatos. Todavia, ainda ocorrem casos de abastecimento indevido de motores a pistão com querosene.

Embora o combustível de jato seja concebido para uso em motores a reação, diversos tipo de motor a pistão de ciclo diesel podem utilizá-lo, sem problemas. É uma alternativa interessante aos motores de ciclo Otto, que usam a cara, perigosa e altamente venenosa gasolina de aviação. e poderá ficar ainda mais interessante, se a gasolina com adição de chumbo for proibida por normas ambientais, o que parece muito perto de acontecer.

Atualmente, diversas pesquisas estão em desenvolvimento para a criação de combustível de motores a reação não derivados de petróleo, mas sim de biomassa, mas isso será objeto de um artigo específico, futuramente.

Os sistemas de comunicação de uma aeronave moderna

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A comunicação de uma aeronave com os órgãos de controle de tráfego aéreo é essencial para manter a segurança das operações de voo, mas grande parte da população não tem uma ideia clara de quais são os equipamentos utilizados e nem quais são as suas funções.
Sistemas de comunicação e navegação à serviço de uma aeronave
Para começar, quase todas as pessoas pensam que o único órgão de controle de tráfego aéreo existente é a torre de controle. Na verdade, existe uma grande variedade de órgãos de controle de tráfego aéreo, e alguns desses órgãos sequer estão nos aeroportos. A rede de comunicação dedicada à navegação aérea e muito mais complexa do que as pessoas leigas imaginam, e existe comunicação analógica de curta distância, de longa distância, via satélite, assim como comunicação digital de curta e de longa distância.
Equipamento rádio de uma aeronave Cessna 206
Assim, além da torre de controle - TWR (Tower), responsável pelo tráfego aéreo ao redor de um aeródromo, existe um controle de aproximação, o APP (Approach Control), responsável não apenas pelo tráfego que está se aproximando, mas também pelo tráfego que se está se afastando, dentro de uma terminal aérea - TMA, ou de uma CTR (zona de controle). Fora das TMA e das CTR, o controle do tráfego aéreo é feito pelos centros (ACC - Area Control Center). Quando a aeronave está voando fora de um espaço aéreo controlado, ela pode receber informação de voo, ou assessoramento, nas mesmas frequências utilizadas pelos órgãos de controle.
Equipamento rádio de uma aeronave Boeing 767, situada em um pedestal entre as poltronas dos pilotos
Em aeroportos mais movimentados, existem frequências de rádio específicas para o controle de solo (GNDC - Ground Control), para autorização de plano de voo (CLRD - Clearence for Departures, ou Clearence Delivery), para informação automática de TMA (ATIS - Automatic Terminal Information Service), além de frequências de emergência (121,5 MHz ou 243 MHz), que são recebidas por diversos órgãos de controle, frequências específicas operadas por empresas aéreas e um frequência livre (123,45 MHz), que é usada para comunicação e coordenação entre aeronaves, onde não existem órgãos de controle de tráfego aéreo.

A comunicação aeronáutica depende essencialmente de ondas eletromagnéticas, que são oscilações em fase de campos magnéticos e elétricos, que se propagam através do espaço, não necessitando de um meio físico para isso. Essas ondas propagam energia sem a necessidade de um fio condutor. Propagando energia, podem também, em consequência, propagar informações, e isso é a essência dos equipamentos de rádio e radar, essenciais para a vida moderna. É difícil imaginar como seria a vida se não existissem as ondas eletromagnéticas.

Rádio VHF e transponder, sistema de radar secundário
As ondas eletromagnéticas possuem comportamento diferente conforme a frequência em são transmitidas. A frequência é o número de vezes que uma onda muda de polaridade, positiva ou negativa (um ciclo), em um segundo. Um ciclo por segundo é equivalente a 1 Hertz.

Ondas de baixa, média e alta frequência costumam ter longo alcance, desde que sejam propagadas em grande potência, pois a energia de uma onda tende a se dispersar no espaço, já que geralmente se espalham em todas as direções. Esse alcance ultrapassa a linha do horizonte, formando o que chamamos de ondas terrestres (que se se propagam acompanhando a curvatura da Terra), ou ondas refletidas, que se propagam em linha reta, mas se refletem na ionosfera, camada ionizada da atmosfera terrestre, alcançando receptores muito além da linha do horizonte. Já ondas de muito alta frequência (VHF - Very High Frequency)) e além, só se propagam em linha reta, o que limita seu alcance à linha do horizonte, por maior que seja a potência do transmissor.

Transmissores em VHF são tecnologicamente fáceis e baratos de se construir, além de possuir ótima qualidade de sinal, e são utilizados amplamente para os sistemas de controle de tráfego aéreo de curta distância, como TWR, APP, GNDC, CLRD e ATIS. Para os controle de ACC, antenas repetidoras de sinal ampliam o alcance.
Compartimento de equipamentos eletrônicos de um Boeing 747-400 da Cargolux
As autoridades, obedecendo a acordos internacionais, reservam determinadas faixas de frequência para diferentes usos. A faixa VHF destina à equipamentos de navegação aérea funciona entre as frequências de 108,1 a 117,975 MHz, enquanto a faixa de comunicações vai de 118 a 136 MHz. As transmissões de comunicação em VHF são feitas em amplitude modulada. O alcance varia conforme a altitude da aeronave, pois não ultrapassam a linha do horizonte.

O rádio em longa distância na aviação é provido por transmissores ou receptores em HF (High Frequency). As ondas HF costumam se propagar em repetidas reflexões na ionosfera, e desde que sejam transmitidas em grande potência, podem ter alcance global. Isso é essencial para a comunicação entre aeronaves voando sobre oceanos ou grandes áreas desabitadas e os órgãos de controle.
Compartimento de equipamentos eletrônicos (avionic bay) de um Boeing 747
Infelizmente, transmissões em HF são altamente sujeitas a interferências e ruídos de sinal, o que prejudica a qualidade dos sinais. Para evitar que os pilotos e controladores fiquem ouvindo os chiados e ruídos característicos dessas transmissões, foi criado um sistema chamado SELCAL (Selective Call), que funciona como se fosse um telefone: cada aeronave possui um código de chamada específico, de quatro letras, e o órgão de controle chama a aeronave que deseja por esse código, evitando que os pilotos tenham quer permanecer na escuta permanente do HF (ou até do VHF).
Código SELCAL de uma aeronave neozelandeza
Quando um órgão de controle, por exemplo, contata uma aeronave específica, sinais de aviso, visuais e sonoros, avisam a tripulação que o controle deseja se comunicar, e atendem, como se fosse um telefone.
Antena de HF tipo probe, no topo da deriva de um Boeing 707
Existem sistemas de comunicação via satélite, chamados genericamente de SATCOM. Satélites de comunicação estão geralmente em órbitas geoestacionárias (fixas em relação à superfície da Terra), mas possuem duas limitações importantes: existe um custo de uso do satélite, relativamente elevado, e uma limitação quanto à latitude onde podem operar. Acima dos círculos polares, o sistema praticamente não funciona. Funcionam em onda UHF (Ultra High Frequency). Entretanto, sistemas via satélite são muito úteis para fornecer sinais de Internet e telefonia para passageiros de aeronaves comerciais.
Antenas de uma antiga aeronave militar Douglas C-47
A comunicação aeronáutica convencional é feita por sinais analógicos, por canais de voz. Entretanto, com o aumento do volume de tráfego aéreo, criou-se um grande congestionamento das frequências, o que prejudica a qualidade da comunicação e aumenta o risco à segurança das operações. Para solucionar tal problemas, criou-se uma forma de digitalizar os sinais, convertendo voz ou outras informações em códigos binários, os chamados bytes. Dessa forma, amplia-se a velocidade e o tipo de informação que pode ser transmitidas, otimizando a comunicação. Podem ser transmitidos, nesse caso, mensagens de texto, imagens, ou qualquer tipo de informação que possa ser digitalizada.

Existem, atualmente. sistemas de comunicação digital em VHF, denominados ACARS (Aircraft Communications Addressing and Reporting System), e sistemas semelhantes que funcionam em HF, utilizados em longa distância, denominados HFDL (High Frequency Data Link). A grande vantagem é que esses sistemas podem transmitir mensagem de texto, que não precisam ler lidas em tempo real, e que podem transmitir mensagens automáticas, sem necessidade de intervenção dos tripulantes da aeronave. Atualmente, tais sistemas são utilizados apenas para transmissão de informações para a empresa operadora da aeronave, ou da aeronave para a empresa, mas serão utilizadas para otimizar as informações para o sistema de controle de tráfego aéreo em futuro próximo.
Mensagem meteorológica fornecida por equipamento HFDL
Entre as informações que podem ser transmitidas digitalmente, estão informações de manutenção ou de meteorologia. Uma aeronave pode transmitir, automaticamente, para os mecânicos da empresa, informações sobre mal funcionamento ou panes, sem intervenção dos pilotos. Os mecânicos, portanto, podem otimizar o atendimento à aeronave assim que a mesma pousar, minimizando o tempo necessário para a manutenção. Já houve casos em que tais informações foram utilizadas para esclarecer acidentes aeronáuticos.

Finalmente, complementando o leque de recursos de comunicação em uma aeronave, existem os sistemas de comunicação interna, que funcionam via cabo, e não via rádio. Esses sistemas podem ser simples intercomunicadores entre pilotos ou constituir verdadeiros sistemas de comunicação que possibilitam comunicação entre pilotos, tripulantes de cabine ou mecânicos no solo, que inserem fones/microfones em plugs apropriados, no compartimento do nariz, onde também são inseridas as tomadas para fornecimento de energia elétrica externa.
Painel de comunicação externo de um Boeing 737, que permite a comunicação de um mecânico em terra com os tripulantes do avião. O cabo abaixo fornece energia externa ao avião no solo.
Todos os canais de comunicação de uma aeronave podem ser selecionados através de dispositivos de seleção, que inclusive podem ser sintonizados nos sinais de áudio emitidos por equipamentos de rádio navegação, possibilitando a identificação do transmissor.
Painel de seleção de áudio de um Boeing 737
As antenas necessárias ao equipamento rádio e de radar estão posicionadas estrategicamente na fuselagem, asas e empenagem da aeronave, como mostra a figura abaixo.
Localização das antenas de uma aeronave comercial Boeing 767-200

Passageiro de primeira viagem: bem vindo a bordo!

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Sempre existe uma primeira vez. Durante muito tempo, viajar de avião foi privilégio de pessoas abastadas, e muito fora do alcance da grande maioria da população. Mas, felizmente, isso mudou, e para melhor.
Aeronave no finger, ponte de embarque coberta existente nos melhores aeroportos.
Viajar de avião, até mesmo para o exterior, ficou muito mais acessível para o passageiro brasileiro nos últimos 15 anos. Mesmo assim, grande parte dos passageiros de primeira viagem têm algum temor em relação a isso. É o medo do desconhecido, perfeitamente natural.

O primeiro medo, e o pior, talvez seja o medo do avião cair. Avião cai? Infelizmente sim, mas o índice de acidentes fatais de aviação é muito baixo. Morre muito mais gente por quedas no banheiro ou atingidas por raios do que por desastres aéreos. O risco de alguém morrer em desastres de carro ou de ônibus, é muito maior, então, não há razão para crer que aviões são mais perigosos, embora haja um fator psicológico nisso. Entretanto, existe um risco real, embora remoto.

Viajar de avião não é muito diferente de se viajar de ônibus. Entretanto, o transporte aéreo tem algumas peculiaridades.

Em primeiro lugar, o transporte aéreo é mais sensível às condições meteorológicas que o transporte terrestre. Isso é natural, e não depende tanto das companhias aéreas, nem dos aeroportos, e muito menos dos tripulantes. É o preço que se paga pela maior rapidez.

De acordo com algumas pesquisas, 17 por cento dos passageiros brasileiros utilizam o avião, muitos dos quais, pela primeira vez.

Eis aqui algumas recomendações para quem viaja de avião pela primeira vez:

01) Não espere muito conforto. Simplesmente, não há conforto... As poltronas de ônibus são muito melhores que as dos aviões, são mais largas, mais macias e reclinam mais. Poltronas de aviões são horríveis, e isso não é uma característica exclusiva dos aviões que voam no Brasil, e nem de voos domésticos. Isso é péssimo para pessoas com maior estatura, ou com maior peso que o normal de 1,70 m e 75 Kg de peso. Claro que existe a opção de voar na Classe Executiva ou na Primeira Classe, mas, no geral, uma poltrona na Executiva custa o dobro da passagem da Classe Econômica, e voar na Primeira Classe pode custar o dobro da Executiva. O problema de se sentar numa poltrona de avião não está restrito aos mais altos ou mais gordos. Experimente se sentar entre dois gordos, no famigerado "assento do meio"...
Classe econômica de um MD-11 da KLM: muito apertada e desconfortável
 02) Existe muito mais restrições de bagagem para o transporte aéreo do que para o transporte terrestre. Isso significa que coisas banais como o teu canivete suíço de estimação ou até a mamadeira do teu bebê podem ser barradas no famigerado "canal de inspeção". No ônibus, uma pessoa consegue embarcar até com uma bazuca na mala, mas no avião, até mesmo agulhas de tricô podem ser consideradas proibidas. Consulte os sites das empresas aéreas sobre quais itens de bagagem são permitidos ou proibidos, mas objetos pontiagudos ou cortantes, inflamáveis como isqueiros devem ser deixados em casa, ou embarcados na bagagem despachadas, de porão, e nunca na bagagem de mão.
Canal de inspeção do Aeroporto de Natal.
03) Quando se viaja de ônibus, se o passageiro chega à estação rodoviária um minuto antes da partida do ônibus, seu lugar está garantido. Nunca espere isso no transporte aéreo. No mínimo, é preciso comparecer ao balcão de check in uma hora antes da hora de decolagem. Se o passageiro chegar menos de 30 minutos antes, vai ficar no chão. Em voos internacionais, tais prazos são duplicados. Existe o risco de overbooking, que ocorre quando tem muitos passageiros se apresentando, com reserva, para o voo, sem que haja lugar para todos no avião. É infração grave da empresa aérea, mas ainda sim é comum. Por isso, se apresentar no check in com boa antecedência é importante, pois isso reduz o risco de overbooking.

04) Em voos internacionais, é necessário levar toda a documentação exigida no país de destino ou pelas autoridades de imigração e aduaneiras: passaporte, visto de entrada (caso exigida pelo país de destino), documentação pessoal, seguro (exigido por alguns países). Não adianta levar fotocópia autenticada.
Passaporte brasileiro: documento essencial em viagens internacionais
05) Passagens de avião podem ser compradas no balcão da empresa, por telefone, nas agências de turismo e até pela Internet. Comprar pela Internet pode ser vantajoso, pois consegue-se tarifas bem mais em conta.

06) Existe um limite de peso de bagagem, que em geral é de 23 Kg para voos domésticos, e de dois volumes de 32 Kg para voos internacionais, somado à 5 kg de bagagem de mão nos dois casos. Esses limites são genéricos e podem variar de empresa para empresa, ou de acordo com o destino.  As empresas cobram valores salgados pelo excesso de bagagem, então o passageiro deve levar o essencial.
Excesso de bagagem pode sair muito caro.
07) Coloque etiquetas, adesivos ou fitas coloridas nas malas, para poder identificar corretamente a bagagem na esteira onde as malas são devolvidas nos aeroportos. É bom utilizar malas coloridas, ao invés de pretas, a cor mais comum, pois será bem mais fácil identificá-las na esteira. Não leve nada frágil nas bagagens despachadas, ou então proteja bem os objetos frágeis, pois as empresas aéreas tratam bagagens de porão sem nenhum carinho. Também não leve objetos de valor ou dinheiro na bagagem despachada, pois furtos, infelizmente, são comuns.

08) É permitido levar comida para consumir a bordo, e até recomendado, já que o serviço de bordo oferecido pelas empresas aéreas, atualmente, é pouco, ruim e/ou cobrado à parte. Bebidas alcoólicas não devem ser levadas, pois a legislação só permite que o passageiro consuma álcool a bordo se a empresa fornecer a bebida ao passageiro. Em voos internacionais, pode haver alguma restrição à comida levada a bordo, devido às exigências das autoridades sanitárias, que variam de país para país.

09) Ao chegar ao aeroporto, é necessário ir ao balcão de check-in, onde o passageiro irá despachar sua bagagem de porão e onde irá pegar o cartão de embarque. Tenha em mãos um documento pessoal com foto como carteira de identidade ou passaporte, a passagem ou o número do localizador fornecido quando se compra a passagem pela Internet. Mantenha o cartão de embarque sempre à mão, pois será exigido em vários momentos até o embarque e mesmo dentro da aeronave, em certos casos.
Balcão de check-in: nem sempre são tão tranquilos...
10) O passageiro deve verificar em qual sala de embarque deverá embarcar, e ficar atento às instruções dos funcionários da empresa e aos monitores que indicam a situação do voo, espalhados pelo aeroporto. Ao ingressar na sala de embarque, os passageiros passam pelo canal de inspeção, onde existem aparelhos detectores de metal e aparelhos de raio-X. Bagagem de mão, objetos metálicos, eletrônicos e até mesmo sapatos e cintos devem ser retirados e colocados em bandejas para serem inspecionados separadamente. Evite sair da sala de embarque depois de entrar nela.
Cartão de embarque
11) O cartão de embarque indica claramente a poltrona onde o passageiro vai sentar. Poltronas de avião são numeradas por fileira no sentido do nariz para a cauda do avião, e possuem letras da direita para a esquerda. Assim, uma poltrona 5A fica na quinta fileira, a partir do nariz do avião, e na janela do lado esquerdo, por exemplo. Alguns números ou letras podem ser omitidos. Caso haja outro passageiro no lugar marcado, com certeza alguém está no voo errado, e o comissário deve ser chamado para resolver o problema. Caso seja possível escolher a poltrona com antecedência, consulte os mapas de poltronas fornecidos nos sites das empresas ou em sites especializados, como o Guru Seat, ou um artigo muito bom como o fornecido nesse blog (http://culturaaeronautica.blogspot.com.br/2011/03/como-escolher-um-bom-assento-na-classe.html).
Mapa de assentos de uma aeronave
12) Não é permitido fumar em nenhum lugar desde que o passageiro ingressa na área pública do aeroporto, e muito menos no avião. Caso o passageiro resolva fumar escondido no lavatório do avião, será imediatamente detectado, pois os lavatórios possuem um detector de fumaça extremamente sensível. Existem multas pesadas por fumo a bordo, e obstruir os detectores com fita adesiva, por exemplo, podem levar o passageiro a responder inquérito na Polícia Federal.

13) O passageiro deve prestar atenção às instruções dos comissários sobre situações de emergência. Um cartão explicativo sobre evacuação, despressurização ou outras emergências está disponível para cada passageiro. Tais cartões não devem ser removidos da aeronave, ao contrário de revistas de bordo e jornais, que podem ser levadas gratuitamente pelo passageiro.
Cartão de segurança de um Boeing 747
14) Telefones celulares devem ser desligados depois que as portas forem fechadas e os motores forem ligados. Devem permanecer desligados durante todo o voo, por lei. Algumas empresas permitem que fiquem ligados em "modo avião", no qual somente os acessórios, como jogos, por exemplo, ficam ligados, enquanto os recursos de telefonia ficam desligados. Caso a empresa forneça algum serviço de telefonia celular a bordo, fique atento para o custo, que pode ser bem salgado.

15) O passageiro deve permanecer sentado e com os cintos de segurança afivelados enquanto os avisos que ficam no teto estiverem acesos. recomenda-se que os cintos fiquem sempre afivelados enquanto o passageiro estiver sentado, pois pode ocorrer alguma turbulência ou manobra inesperada do avião, mesmo com os avisos de cintos apagados. Deve-se ficar sempre atento aos avisos da tripulação. Caso o avião passe por uma tempestade, as venezianas das janelas devem ser fechadas, para evitar o risco de ofuscamento provocado pelos relâmpagos. O passageiro não deve se preocupar se algum raio atingir a aeronave, pois geralmente isso ocorre sem risco algum para o voo.

16) Existem voos diretos, com escala e com conexões. O passageiro deve ficar atento. Voos diretos são voos nos quais a aeronave vai direto ao destino, sem pousar em nenhum outro aeroporto. Voos com escala são voos nos quais o avião pousa em algum aeroporto intermediário, mas não há troca de aeronave. Nesse caso, o passageiro deve permanecer a bordo, no seu lugar, até que a aeronave pouse no seu destino final. Caso haja conexão, o passageiro deve trocar de aeronave, levando consigo sua bagagem de mão. A bagagem de porão irá mudar de avião pela empresa aérea, e o passageiro não precisa de preocupar com ela. O passageiro deve ficar atento aos funcionários da empresa, que estão lá para ajudar.

17) O passageiro deve voar usando roupas e sapatos confortáveis. Por motivos de segurança, as mulheres não devem voar com sapatos de salto alto, pois os mesmos deverão ser abandonados em caso de evacuação. A temperatura do avião é mantida constante durante todo o voo, variando entre 21ºC  e 24ºC. Em assentos próximos às portas, a temperatura pode ficar bem abaixo disso, especialmente em longos voos internacionais. Portanto, é uma boa precaução levar casacos ou mantas nesses casos. O isolamento térmico das portas não é tão bom quanto o do restante da fuselagem.

18) Em voos longos, o passageiro deve evitar ficar sentado o tempo todo. Isso faz mal para a circulação e pode até causar problemas graves de saúde.As empresas aéreas, nos voos internacionais, geralmente fornecem um necessaire que contém um par de meias. O passageiro pode andar pelo corredores da aeronave usando essas meias. Não é necessário calçar os sapatos, e é até desaconselhável, uma vez que, depois de um longo tempo sentado, os pés tendem a ficar inchados, tornando desconfortável calçar os sapatos.

19) Embora as aeronaves comerciais, em sua grande maioria, sejam pressurizadas, é preciso saber que a pressão interna do avião não equivale à pressão do nível do mar, ou sequer do aeródromo de partida, mas sim a uma pressão existente à 8 mil pés (2400 metros) de altitude. Logo, é possível que o passageiro sinta alguma pressão no ouvido, e em alguns casos, até dor. Isso pode ser aliviado com um chiclete, ou uma bala. Algumas empresas costumam oferecer balas logo antes da decolagem, com essa finalidade, e especialmente em aviões bem gastos, que costumam apresentar vazamentos de compressão, facilmente identificáveis pelo passageiro, pois causam ruído de assobio.

20) No desembarque, nunca se levante da poltrona antes do avião parar completamente na sua posição no pátio. É ilegal, embora essa norma seja largamente, e perigosamente, desobedecida.

21) Ao recolher a bagagem na esteira, o passageiro deve verificar cuidadosamente se está pegando a bagagem correta. Como existem malas iguais, ou muito parecidas, o risco de se apanhar a bagagem de outro passageiro é real, e nem sempre a empresa confere isso. Caso a bagagem não apareça na esteira, ou apareça danificada, o passageiro deve reclamar de imediato na empresa, mas pode esperar muitos dissabores, e demora na resolução do problema. Infelizmente, extravios, ou danos, de bagagem ainda são muito comuns.

mala danificada por empresa aérea
O passageiro deve considerar que nem sempre o transporte aéreo é vantajoso. Para viagens cuja distância seja inferior a 500 Km, os ônibus podem oferecer grandes vantagens. Viajar de carro também pode ser vantajoso, desde que se considere o custo dos pedágios, além do combustível, e também o número de passageiros. O passageiro deve esquecer a questão status, pois há muito viajar de avião deixou de ser sinal exterior de riqueza, para usar um jargão típico da Receita Federal.

Medo de voar? Isso sempre vai existir, e não é incomum ver passageiros tirar imagens de santos da bagagem de mão após o pouso, e rezar fervorosamente. Estatisticamente, voar é muito seguro, mas...

O Blog Cultura Aeronáutica deseja a todos os passageiros de primeira viagem um ótimo voo, e pede que colaborem, contando experiências.










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